Capítulo 9: COM UMA PULGA ATRÁS DA ORELHA
Uma semana depois, saindo do jornal, quase engoli meu coração que saltou à minha boca quando vi Marisa, encostada no seu carro na frente da secretaria de cultura.
- Olá Alexandra.
Respirei fundo, e caminhei em direção a ela me lembrando dos conselhos de Dan e Diego que me orientaram agir naturalmente quando ela aparecesse.
- Olá Marisa, quem é vivo sempre aparece.
- Tive que me ausentar uns dias da cidade, se você atendesse meus telefonemas saberia disso.
- Ah você me ligou? O serviço da minha operadora está péssimo esses dias...
- Liguei antes de viajar, onde eu estava não podia ligar.
Minha curiosidade foi devidamente contida por um ar de superioridade que me permitiu fingir que não me importava com as desculpas que ela me dava para seu sumiço.
- E então? Como foi de viagem?
- Tudo como esperado... Cumprindo obrigações. Vamos sair um pouco? Conversar?
- Estou um pouco ocupada... Preciso escrever...
- Você está me dispensando Alexandra?
Fiquei sem graça com a pergunta e logicamente estremeci com aquele olhar decepcionado que nublou o brilho dos olhos que me encantavam.
- Não, não estou te dispensando, estou realmente ocupada. É que... Que... Que...
Estava demorando... Meu gaguejado denunciou que minha aparente segurança estava se desfazendo que nem feitiço. Estava cheia de saudades de Marisa, mal conseguia encará-la, se o fizesse me derreteria e cairia em seus braços.
- Tudo bem Alex, acabei de chegar de viagem, nem passei em casa, vim direto te ver, mas não vou insistir. Bom trabalho pra você, até qualquer hora.
Vi Marisa entrar no carro com um olhar de frustração arrependi-me instantaneamente, mas não tive coragem de fazer nada que a impedisse. Chutei o ar revoltada comigo mesma, em casa, não me conformei com minha própria atitude, era noite quando decidi fazer uma surpresa a Marisa para me redimir e dar a chance para que ela me explicasse seu sumiço e o papel daquela morena na sua vida.
Inspirada em uma cena que vi em um dos clipes de casais lésbicos de séries de TV, mas menos ousada, vesti apenas uma lingerie preta sensual, na verdade uma das poucas que eu tinha, e por cima apenas um sobretudo e nos pés um tamanco de salto. Bati à porta da casa de Marisa depois de ensaiar a cena que memorizei, ela abriu a porta e antes que ela falasse qualquer coisa, desamarrei o laço do sobretudo já desabotoado e deixei que a peça caísse no chão expondo meu corpo quase nu, e lançando meu olhar cheio de sensualidade como quem se oferecia para ela.
Os olhos esbugalhados de Marisa e o rosto ruborizado pareceram sugar qualquer intenção de falar algo, e eu tomei a iniciativa:
- Vai ficar só olhando?
Marisa apertou os olhos, fez uma careta, e apontou pro lado, e vi Elaine e Fábio sentados no sofá boquiabertos.
- Ai meu Deus!
Saí correndo só de lingerie, equilibrando-me naquele salto, e o óbvio aconteceu, caí nas escadas da varanda enquanto Marisa me alcançava com o sobretudo nas mãos. Ajudou-me a levantar, vestiu o sobretudo e perguntou:
- Machucou alguma coisa?
- Sim, minha vergonha!
Marisa com muita delicadeza me envolveu no casaco, e disse:
- Venha, vamos entrar...
- Você está louca? Nunca mais na minha vida olho pra cara de Elaine e Fábio!
- Deixa de bobagem, você tem que levar as coisas menos a sério... Eles já estão indo embora, vieram só fazer uma visita rápida quando souberam que voltei de viagem.
- Vou esperar aqui escondida dentro do carro eles saírem...
- Alex, deixa de ser boba! Eles já viram o que podiam ver, vai se esconder agora por quê?
- Marisa!
- Você não tem do que se envergonhar... Seu corpo é perfeito e a lingerie está um espetáculo, estou ansiosa pra olhar com detalhes...
Marisa mordeu os lábios enquanto ajeitava meus cabelos que caíam no rosto. Ruborizei. Baixei a cabeça e disse:
- Vou esperar aqui no carro.
Entrei no carro sob o olhar atento de Marisa que sorria incrédula ao atestar que cumpri o que anunciei. Elaine e Fabio saíram da casa, acenaram para mim e ao passar de carro e me ver praticamente afundando no banco do carro comentaram em um tom jocoso:
- Não dá pra ficar só olhando Marisa! Não nos envergonhe!
Como desejei ter o verniz invisibilizador do Chapolim Colorado... Marisa sorriu e quando me procurou dentro do carro eu estava completamente abaixada no volante:
- Pronto Alexandra, sai daí vai... Vamos entrar, eles já foram embora.
Com a cara de um cão arrependido desci do carro, e Marisa me puxou pela mão até o interior de sua casa. Sem graça eu mal conseguia olhar nos olhos dela, desviei meus olhos para um canto da sala, enquanto Marisa me servia um cálice de vinho.
- Tome, vai te ajudar a relaxar.
- Obrigada.
Tomei o cálice inteiro em um só gole, Marisa me olhava com certa desconfiança até enfim perguntar:
- Você já pode me explicar o porquê disso?
- Disso o quê?
- Disso Alexandra: você aqui, vestida assim, depois de me dispensar como hoje à tarde.
- Ah isso! Justamente por causa de hoje à tarde, pensei que poderia vir aqui e te fazer uma surpresa... Idiota como eu sou, tinha que virar um festival de trapalhadas...
Marisa ficou pensativa e eu, mexia nos botões do casaco com cara de criança que acabara de fazer estripulia.
- Você ficou chateada comigo antes da minha viagem não foi?
- Não...
- Alexandra, você saiu daqui correndo, não atendeu meus telefonemas, e nem vem me dizer que foi problema da operadora...
- É que... Eu cheguei aqui e aquela morena fatal abriu a porta...
- Morena fatal? Alexandra se você está falando da Larissa, eu já te disse que não tenho nada com ela.
- Mas o que você tem com ela afinal?
- Posso te garantir que meu relacionamento com ela não tem nada de amoroso.
- E que relacionamento é esse? Pra que tanto segredo Marisa?
- Alexandra, você só precisa saber disso... É melhor assim. Confie em mim quando digo que não tenho nada com ela.
- Isso é muito estranho... Esse mistério todo... Eu quero saber quem é ela e que relacionamento é esse que existe entre vocês!
- Alex... Estou explicando como posso, se você vai ou não me dá o crédito, é com você. Mas não tente me pressionar, isso não funciona comigo.
- Você não está me explicando nada, está me enrolando isso sim!
- Não tenho por que te enrolar, afinal, não temos nenhum compromisso não é mesmo?
A indagação de Marisa me calou. Não só por que ela tinha razão, mas por que doeu tal constatação vinda da boca dela. Baixei a cabeça evidenciando o quanto me desagradou o comentário dela, levantei-me e saí da casa dela amargando a dura realidade de uma rejeição. Era esse meu sentimento, de rejeição, Marisa expôs o contrário do que eu fantasiei em minha mente fértil, ou seja, que eu e ela tínhamos um relacionamento. Relacionamento ela devia ter com a tal morena, que agora eu sabia o nome: Larissa.
Naquela noite, meu romance sofreu influência direta do meu estado, escrevi um capítulo inteiro do sofrimento de minha protagonista depois de receber um fora da médica sexy. Percebi o quanto eu era leiga em relacionamento entre mulheres, tanta intensidade e paixão não valia um compromisso? Depois do papel ridículo que desempenhei naquela noite na casa de Marisa e um fim de noite ainda mais desastroso, pensei que o melhor era esquecer Marisa, e dormi com essa decisão.
Minha semana passou lenta, algumas vezes tentei ligar para Marisa, traindo minha própria decisão de esquecê-la. Comentei com o Dan o ocorrido, e o conselho dele foi que eu desse um tempo para me refazer, deixando claro que ele não acreditava na minha suposta experiência com mulheres. Marisa não me procurou, o que confesso me entristeceu de maneira absurda, passei a acreditar que ela realmente não tinha a capacidade de se prender a ninguém, e que já havia enjoado de mim, por isso me fez enxergar que não queria compromisso comigo.
A sexta-feira chegou, para mim, sem muita alegria, apesar do sucesso da nova edição do jornal, as pessoas nas ruas comentavam as notícias, e além de parabenizar, se mostravam ansiosas para o próximo número. Profissionalmente as coisas caminhavam bem, o meu romance, estava no ranking dos mais lidos, devo ter recebido algumas dezenas de cantadas por e-mail de leitoras apaixonadas desejando me conhecer e nem isso me empolgou, queria Marisa, sentia falta dela, apesar de magoada.
Antes de sair do jornal, Berta bateu à minha porta, anunciando uma visita inesperada:
- Alexandra, tem uma amiga sua aqui querendo te ver.
- Mande entrar Berta.
De supetão minha grande amiga surge à porta:
- Taram! Olha quem está aqui!
- Renatinha!
Minha grande amiga da capital estava ali, apareceu de surpresa para me visitar, abracei-a e pulamos abraçadas, animadas com o reencontro.
- Menina o que você está fazendo aqui?
- Ver você não é sua ingrata! Dois meses aqui nesse fim de mundo, e nenhuma visitinha às amigas Alex!
- Tenho trabalhado muito amiga...
- Imagino... Mas acho que tem mais do que trabalho te prendendo aqui... Desembucha vai!
Das minhas melhores amigas, Renatinha era a que mais me conhecia, e era também a mais divertida, não poderia ter melhor companhia naquele momento.
- Temos muito a conversar Rê, mas vamos pra minha casa, vou te acomodar, e atualizar nossos assuntos, quero saber tudo das meninas... Estou muito feliz de ter você aqui amiga!
- Opa, vamos lá então.
Renatinha não parava de falar no trajeto, me atualizou com as fofocas das meninas, contou que Marcinha estava solteira de novo, enquanto Eveline estava namorando com um “coroa rico”, o escândalo de Fernando, meu ex-noivo, continuava rendendo, afinal de contas o suposto namorado dele era casado com uma famosa dançarina baiana. Sobre ela, bem, Renatinha não tinha o hábito de se abrir muito, revelou apenas que continuava na sua rotina de baladas, e que estava se preparando para passar uma temporada em Buenos Aires a trabalho.
Acomodei-a no quarto de hóspedes, e ela não poupou elogios à minha nova casa, achou tudo fofo, de um jeito divertido fazia observações sobre a decoração e sobre meus móveis.
- Já falei demais pra variar! Agora é sua vez, estou escutando.
Renatinha deitou-se na cama virada para mim, aguardando minha fala.
- Ai Rê, está tudo bem amiga, estou trabalhando muito por que minha equipe é pequena, mas está valendo a pena, o jornal está sendo um sucesso, temos vários patrocinadores, triplicamos nossa tiragem, enfim, está tudo caminhando bem.
- Ai Alex isso eu já sabia! Você me contou isso no último e-mail... Quero saber dos detalhes picantes da sua vida, as fofocas quentes, sex*, drogas, fala garota!
Gargalhei com a curiosidade desmedida da minha amiga, sabia que não escaparia daquele interrogatório, e aí comecei a revelar os detalhes de minha vida social dos últimos meses:
- Rê, conheci alguém...
- Opa, isso muito me interessa, como ele é?
- Não é ele... É ela.
A mandíbula da Renata praticamente se deslocou tamanha foi sua surpresa, de queixo caído e olhos esbugalhados ela me olhou incrédula, aproveitei o choque, e descarreguei o resto da história, a essa altura, Renata já estava sentada balançando a perna. Depois de não sei exatamente quanto tempo, e toda narrativa, minha amiga estava completamente atordoada.
- Alex, ainda estou processando tanta informação, como assim você virou lésbica? E quem é essa super médica? E essa morena fatal?
- Calma Rê, não sei se virei algo... Sei que me encantei por Marisa e tivemos algo intenso que mexeu muito comigo...
- Põe mexido nisso! Você está apaixonada! Fala dessa Marisa com um brilho no olhar...
Não adiantava eu tentar esconder meus sentimentos da Renata, ela me conhecia, e minha paixão por Marisa era mais que evidente. Com muita paciência, respondi todas as perguntas de Renata com detalhes, e o suposto fora que recebi despertou a indignação da minha amiga.
- Mas Alex, como assim depois de você se oferecer nua pra ela, essa sapatão diz que não tem compromisso com você?
Apesar de não gostar da forma como Renata se referiu a Marisa, eu não tinha argumentos para defendê-la, talvez por ainda estar magoada. Nosso papo foi interrompido pelo telefonema de Leandro, que ligou convidando-me para comemorar seu aniversário no “Chica’s”, o barzinho da chácara, o lugar onde conheci Marisa.
- Pronto, temos programação para nossa noite de sexta amiga, vamos nos arrumar, você vai conhecer meus novos amigos.
- Baladinha é comigo mesmo! Vamos lá!
E motivada pela animação da Renatinha, nos arrumamos com toda produção feminina disponível, e seguimos para o tal barzinho, tive o cuidado de explicar a alternatividade do lugar, o que a deixou ainda mais empolgada. Quando chegamos, Renata ficou surpresa com a quantidade de gente bonita e o bom gosto do local. Logo encontramos toda turma e apresentei-a a todos.
Por momentos esqueci-me de Marisa, mas logo a música, o clima, me fez recordar nosso primeiro encontro, e quando a cantora tocou Maria Gadú, me transportei até o momento em que ouvimos juntas essa música, e a saudade tomou de conta de mim, como se o mundo conspirasse, foi nesse exato instante que olhei para o bar, e Marisa estava lá, linda como sempre, usando um vestido curto e uma sandália de salto fino, cabelos soltos, simplesmente linda.
Cheguei a perder o fôlego, ao me deparar com aquela visão. Renatinha apesar de deslumbrada com o lugar e com a quantidade de homens bonitos apesar de inacessíveis para ela, percebeu minha súbita paralisia.
- Alex o que aconteceu? Você está pálida!
Não respondi, Renatinha olhou na mesma direção que eu, e deduziu tudo:
- Então aquela mulher é a tal doutora? É amiga, você entrou no mundo lésbico bombando heim...
Aparentemente Marisa não me viu, continuei olhando fixamente para ela, apesar das tentativas de Renatinha para desviar minha atenção. Talvez se eu tivesse cedido aos chamados da Rê, eu não veria Marisa flertando com uma mulher deslumbrante que estava sentada ao seu lado.
Renatinha viu o mesmo que eu, baixei minha cabeça e disse perto do ouvido de minha amiga:
- Rê, você se incomoda se nós formos embora?
- Claro que me importo! Você vai dar esse gostinho a ela?
- Rê, por favor...
Renata continuava olhando na direção que Marisa estava, e de repente começou a falar uma série de coisas sem nexo, acariciando meu rosto, mexendo nos meus cabelos:
- Alex, eu nunca gostei de mulher não, mas hoje você está tão linda, tão atraente, fiquei até curiosa sabe...
- Rê o que você bebeu? Está maluca sua doida?
- Relaxa gatinha...
Afastei a mão de Renata do meu rosto assustada, exortando minha amiga:
- Ow, você acha que por que virei lésbica vou sair catando tudo que é mulher?
- Cala a boca sua lesada! A doutora está vindo pra cá...
Bastou esse aviso para minhas pernas tremerem mais do que imagem de TV velha. Senti o perfume de Marisa bem perto, e meu coração acelerou ainda mais.
- Olá Alexandra, quanto tempo.
A voz dela despertava em mim mais do que nervosismo, era excitação, minhas mãos frias começaram a suar imediatamente, mesmo sentindo a mão de Renatinha apertando a minha.
- Oi Marisa.
- Não vai me apresentar sua amiga gatinha? – Perguntou Renata.
Olhei para a cara de Renata com uma interrogação na testa, franzi as sombracelhas e Marisa se apressou em se apresentar, já que eu não tomei a iniciativa:
- Marisa Becker. – Disse Marisa estendendo a mão para Renata
- Renata Braga, muito prazer.
- Chegou à cidade hoje Renata?
- Pois é, vim matar as saudades da minha gatinha, já que ela não foi me visitar nos últimos meses, tem trabalhado demais não é minha linda?
Minha cara de espanto, tinha requintes de um comportamento patético, por alguns momentos cheguei a acreditar que havia uma quarta pessoa ali, a qual Renata se referia, eu não podia ser...
- Vocês namoram há muito tempo? – Perguntou Marisa.
- Namoramos? – Retruquei espantada para em seguida receber um pisão no pé de Renata – Aaaaaaaaai, Renata!
- Essa sardentinha não tem jeito... Distraída... Estamos juntas há tanto tempo que ela nem me considera mais namorada... Na verdade estávamos dando um tempo, mas vim esse final de semana para nos acertarmos de vez, não foi amor? – Explicou Renata para meu espanto total.
- Han? – Renata apertou forte meus dedos – Ah sim, foi sim lindinha. – Respondi, disfarçando a careta de dor.
- Entendo... Então boa sorte nessa reconciliação, foi um prazer conhecer você Renata, Alexandra, até mais, divirtam-se.
Marisa se despediu com um sorriso discreto, caminhando de volta para o bar. Enquanto Renata passava seu braço pelos meus ombros cochichando:
- Mas como é difícil você entender as coisas manézona!
- Ah eu sou manezona? Você incorpora uma pomba gira sapatão e não diz coisa com coisa, e espera que eu me comporte como? Como se não já bastasse todo meu nervosismo em rever Marisa, você me faz agir como idiota na frente dela!
- Será que você não entendeu meu plano?
- Bom, depois de quase ficar sem as unhas dos dedos dos pés, e de você ter quebrado minhas falanges das mãos, suponho que você inventou tudo isso para tentar provocar ciúmes em Marisa, é isso?
- Deeer! Claro né! Ou você achou mesmo que eu quisesse experimentar essa vida no brejo?
- Brejo?
- É Alex, no meio das sapas...
Dei um tapa no braço de Renata meio indignada, e ela prosseguiu:
- Ainda tem chama nessa fogueira amiga, o jeito que ela te olhou... Percebi desde que ela te viu ainda do bar, por isso comecei o teatrinho, que vamos continuar, por que já vi não há possibilidade de eu me dar bem com homem essa noite aqui...
- Ah então quer se dar bem com mulher é? – Brinquei com Renata.
- Quem sabe... Sou uma pessoa aberta, você sabe!
Gargalhamos, e relaxei um pouco daquela situação, até notar Marisa no bar, bebendo uma dose atrás da outra sentada no balcão. Preocupei-me por que sabia que ela apesar de beber com freqüência, era também moderada e a forma como ela estava bebendo, não inspirava moderação.
- Alex se você ficar olhando fixamente para a doutora, eu vou ficar no papel de corna aqui! – Esbravejou Renata, apertando minha cintura.
- Estou preocupada Rê, a Marisa está bebendo muito...
- Você está é dando bandeira, isso sim! Vamos passear, dar pinta por aí, vamos.
E assim, Renatinha saiu me puxando pelo dedo mínimo, senti-me uma criança brincando com uma amiguinha no parquinho da escola, andando com os dedos entrelaçados. Diego e Daniel estranharam essa minha ex-namorada caindo de pára-quedas em Nova Esperança, e eu não tinha nada em minha cabeça para justificar a nova lésbica possessiva do pedaço.
O problema é que minha suposta namorada, era muito tarada por homens, e não demorou muito para nosso passeio de dar pinta, virasse uma paquera descarada da Renatinha com os possíveis heteros ou bissexuais do lugar.
A noite se tornou numa farsa ridícula, Renatinha tinha tanta vodka no sangue que passou a ser impossível esconder de qual fruta ela gostava de fato. Eu, não tirava os olhos de Marisa, que insistia em beber sem parar, a ponto de esquecer sua discrição e dar em cima de mulheres abertamente por onde passava cambaleando.
Atônito com a situação, e muito sensato como sempre, Daniel se aproximou de mim preocupado, enquanto Renatinha estava perto do palco com o Leandro:
- Mona, que circo é esse que se instalou aqui?
- Nem me fala Dandan, estou mais perdida do que bombom em boca de banguelo...
- Essa Renatinha não é entendida nem aqui, nem na parada gay! Ela deu em cima do Beto agora pouco...
- Não, ela não é lésbica, gosta mais de homem do que você! Ela me convenceu, ainda não sei como, a fazer um teatrinho para provocar ciúmes na Marisa...
- E deu certo?
- Olha para Marisa praticamente atacando as mulheres no bar... Acha que deu certo?
- Quem eu estou vendo ali nem se parece com a doutora Marisa que eu conheço... Se deu certo eu não sei, mas que alguma coisa abalou nossa doutora, isso com certeza!
Renatinha voltou para a mesa, e lembrou-se de nosso teatrinho, e não só ela lembrou-se disso, Marisa deixou de lado o festival do flerte e passou a me encarar de uma maneira que chegou a me deixar desconfortável. Enquanto Renata envolvia-me pela cintura por trás, beijando meu pescoço, Marisa virava outra dose de bebida, e eu desejava que o chão se abrisse ou que algum disco voador me abduzisse daquela situação.
Tentando fugir do olhar fixo desconcertante de Marisa, chamei Renata para ir ao banheiro, para minha surpresa, fomos seguidas por Marisa, pra coroar meu infortúnio da noite, minha amiga mal esperou que entrássemos no banheiro, e avançou na minha boca, me roubando um beijo desastroso. Afastei-a abruptamente, esquecendo qualquer teatro, temendo que Marisa tivesse presenciado aquela cena.
- Renata Lemos! Agora você passou dos limites!
- Ah Alex, para de ser tão puritana! Fiz de propósito, a doutora viu tudo!
Era isso que eu temia, ouvi o barulho da porta do banheiro bater forte, corri e vi Marisa caminhar apressada entre as mesas, tropeçando, e o desespero começou a tomar conta de mim, imaginando que aquele beijo tinha me custado a esperança de me reconciliar com Marisa.
Segui Marisa angustiada, e no meio das pessoas acabei perdendo-a de vista, quando encontrei Diego:
- Di, você viu a Marisa?
- Passou aqui batida! Deve ter ido embora... A professora está bebassa...
Saí correndo em direção ao estacionamento, chegando a tempo de me jogar na frente do carro de Marisa que partia.
Marisa freou bem a tempo de não me atropelar, abriu a janela do carro e berrou:
- Virou suicida agora? Pirou Alexandra?
- Você não vai dirigir bêbada assim Marisa!
- Quem aqui está se comportando como uma bêbada é você!
- Sai desse carro Marisa, daqui você só sai dirigindo se passar por cima de mim!
Minha afirmação soou para Marisa como provocação, que ficou acelerando o motor com o carro parado, como uma ameaça.
- Não adianta Marisa, não vou sair daqui, desça desse carro, eu dirijo.
- E você vai deixar sua namoradinha aqui?
- Não posso permitir que você se mate assim!
Mantive meus pés firmes, apesar de temer que o estado alcoolizado de Marisa, junto com sua raiva de mim, roubasse um pouco da sanidade dela. A ameaça continuava, agora Marisa buzinava insistentemente, para mostrar que eu não arredaria o pé dali, sentei-me no capô do carro e cruzei os braços, fechei os olhos e pensei : “Seja lá o que Deus quiser!”.
Os momentos de tensão, cessaram com o silêncio do motor do carro desligando, e os faróis apagarem, e Marisa caminhou até a frente do carro onde eu estava instalada.
- Dá pra você sair de cima do meu carro?
Permaneci de braços cruzados olhando para Marisa de mãos na cintura balançando a perna.
- Alexandra, desce do meu carro agora!
- Vem me tirar então...
Provoquei Marisa, e ela balançou a cabeça negativamente dizendo:
- Você é que está pedindo...
Avançou sobre mim, me puxando para perto de seu corpo e eu, envolvi minhas pernas em sua cintura, em segundos nem mesmo o hálito de vodka dela me fez desejar menos aquela boca, Marisa encaixou ainda mais seu corpo entre minhas pernas puxou meu rosto para junto do seu segurando meus cabelos, beijando-me com voracidade e urgência.
Marisa desceu com sua língua quente pelo meu pescoço, provocando arrepios em todo meu corpo, deslizando suas mãos nas minhas pernas, levando-me à loucura.
- Vamos sair daqui Mah...
- E sua namoradinha?
- Você me quer ou não?
Marisa parou de me beijar, se afastou, encarou-me e respondeu:
- Essa pergunta deveria ser eu a fazer...
Desci do capô do carro, segurei-a pelo pescoço e beijei-a mordiscando seus lábios em seguida sussurrei:
- Quer descobrir? Então vem comigo...
Entrei no carro de Marisa, dei a partida, e esperei que ela entrasse no banco do carona. Não tive pressa no trajeto, dirigi lentamente naquela estrada escura, senti a mão de Marisa entre minhas pernas e pedi:
- Não faz isso vai... Fico daquele jeito Mah...
- Ah por quê? Um carinho inocente como esse?
- Inocente é? Vamos ver se é tão inocente isso...
Repeti o gesto de Marisa, subindo uma de minhas mãos por baixo de seu vestido, entre as pernas dela até seu sex*, que rapidamente ficou molhado encharcando sua calcinha aumentando minha excitação. Movimentei meus dedos na altura do seu clit*ris, enquanto Marisa abria ainda mais as pernas dando-me permissão para continuar os movimentos, numa expressão de prazer incontestável, intensificada pelos seus gemidos altos.
Mantive a velocidade do carro muito baixa, para que não precisasse tirar minha mão do sex* de Marisa, eu sentia as coxas dela tremerem, e orgasmo se desenhar em sua face. As bochechas ruborizadas, e a respiração ofegante de Marisa, lhe davam um ar ainda mais sensual.
- Você está bem Mah?
Marisa só meneou a cabeça recuperando o fôlego, em seguida disse:
- Minha casa é mais perto daqui, vamos pra minha casa agora!
- Você é que manda doutora...
E assim, segui o trajeto para casa de Marisa, excitada pelo clima, e pelo orgasmo dela, nem me lembrei da Renatinha, por isso estranhei a ligação no meu celular do Dan.
- Onde você está sardenta?
- Ai Dan, desculpa... Saí sem avisar, mas estou com Marisa...
- A Renata está louca te procurando aqui!
- Dan, me faz um favor, leve-a para minha casa, a chave está dentro do meu carro, a chave está com o manobrista.
- Tudo bem, vou fazer isso agora, fique tranqüila e trate de se acertar com a doutora aí!
Chegamos à casa de Marisa, e tive que ajudá-la a encontrar a chave, abracei-a quase que segurando-a, já que a tontura não permitia que ela ficasse com os pés firmes no chão. Entramos enfim, e eu mesma a conduzi até o quarto dela, deitei-a, Marisa me puxou por cima dela, arrancando-me beijos e carícias quentes.
Arrancou minha roupa, e beijou cada pedaço de minha pele nua, acendendo meu corpo ainda mais, mexendo seus quadris por cima de mim, em instantes meu sex* estava encharcado, ansiando que ela me tomasse, e me fizesse sua mais uma vez. Senti Marisa diminuir o ritmo de seus movimentos, ficou do meu lado, e quando eu joguei meu corpo sobre o dela, roçando meu sex* no dela, Marisa fez um comentário inusitado:
- Ei... Eu estou muito bêbada...
Sorri como se concordasse com algo que eu já sabia, mas nem deu tempo eu exteriorizar meu pensamento, Marisa caiu no sono, ali comigo em cima dela nua. Não me restava mais nada a não ser sorrir e velar o sono dela. Durante um bom tempo daquela noite, permaneci ali, parada, contemplando Marisa dormir, me perguntando o que seria de nós depois daquela noite.
Peguei no sono deitada sobre o peito de Marisa, fazendo planos de no dia seguinte abrir meu coração para ela, não podia deixar que um sentimento tão forte como o que eu via nascer em mim, fosse abafado por pura covardia da minha parte.
Acordei cedo para preparar o café de Marisa, mas dessa vez não ousei mexer na cozinha impecável dela. Lembrei-me de guardar o telefone da delicatess que comprei a cesta de guloseimas da última vez, e encomendei uma cesta de café da manhã completa.
Arrumei a mesa com capricho, eu mesma colhi algumas rosas no jardim da casa, depois com muito cuidado para não fazer barulho, enchi a banheira, deixando o banho de sais pronto para Marisa, tão logo ela acordasse pudesse curar a ressaca com aqueles mimos.
Sentei-me na poltrona ao lado da cama, aguardando Marisa acordar, depois de ligar para casa e me certificar que Renatinha estava bem. Notei na mesa de cabeceira um álbum de fotos e fiquei curiosa para ver.
Para uma pessoa curiosa como eu, curiosidade ainda mais atiçada pelo instinto jornalístico e a vontade de conhecer mais de Marisa, não hesitei: peguei o álbum e comecei a folhear e logo estranhei, não haviam fotos convencionais, haviam apenas negativos, e em encaixada na capa do álbum uma matéria de jornal antiga, de cerca de quinze anos atrás, que noticiava a morte do embaixador do Brasil em Honduras e de sua família, assassinados supostamente por guerrilheiros.
Antes que eu lesse o recorte de jornal, fui surpreendida com um grito de Marisa:
- O que você está fazendo? Quem te deu o direito de mexer nas minhas coisas Alexandra?
O tom de voz de Marisa me assustou a tal ponto que larguei o álbum no chão, espalhando tudo que tinha dentro. Ela abaixou-se imediatamente, recolhendo com pressa sem sequer me deixar ajudar:
- Não toque nisso, deixe que eu pego!
- Marisa calma...
Eu só consegui balbuciar isso, diante de uma Marisa completamente transtornada.
- Nunca mais mexa nas minhas coisas!
- Não se preocupe, não tocarei em mais nada seu...
Meu tom magoado parece ter despertado Marisa daquele transe de raiva, enquanto eu recolhia minhas roupas para vestir-me na intenção de ir embora, ela guardou o tal álbum no seu guarda-roupa e se aproximou de mim perguntando com um tom de voz mais calmo:
- Aonde você vai?
- Pra longe de você!
Saí pela casa me vestindo, descalça, seguida por Marisa que ao ver a mesa posta se sensibilizou ainda mais e quase me implorando segurou meu braço:
- Alex, desculpe-me... Fica...
O timbre doce da voz de Marisa me acalmou, suspirei alto respirando fundo, e balancei a cabeça positivamente, Marisa me abraçou por trás envolvendo minha cintura e disse baixinho:
- Vamos ver agora o que você preparou, e o principal sem destruir minha cozinha...
- Você é muito mal agradecida viu...
Marisa sorriu, e me abraçou com ternura, não contive meu comentário:
- Ai Mah... Você está com cheiro de chão de bodega!
- Que comentário romântico Alex...
- Ah... Eu não sei mentir! Banho, já!
Empurrei Marisa até o banheiro e a surpreendi com a banheira pronta para ela.
- Nossa, você caprichou nos preparativos Alex...
- E até agora não derrubei nada...
Marisa sorriu, e antes de entrar na banheira, ela me pediu:
- Alex, no armário tem espuma de banho, você pode pegar por favor?
- Claro Mah...
- E depois... Entra aqui comigo...
O olhar de Marisa era pura malícia, peguei a tal espuma de banho ansiosa para cair naquela banheira com Marisa que tirou a última peça de roupa mordendo os lábios olhando para mim, aquilo foi para mim mais que um convite, foi uma intimação, e pela pressa, acabei pecando, escorreguei perto da banheira, caindo com o pote de espuma aberto dentro da banheira.
- Alex!
Marisa gritou preocupada comigo que permaneci com a cabeça mergulhada na espuma e as pernas pra fora da banheira. Apesar de escutá-la chamando meu nome, eu respondia balançando as pernas, já que tinha engolido espuma o suficiente para me sentir asfixiada. Rapidamente Marisa me ajudou a erguer a cabeça, surgi diante dela depois de me sentar na banheira com a espuma cobrindo meu rosto:
- Você está bem?
- Si...Sim
Minha resposta foi acompanhada de duas bolas de sabão por minha boca, fato que despertou uma crise de risos em Marisa. Eu fui limpando meu rosto, mas nem me importei com os risos dela, afinal de contas, a comicidade da cena era incontestável. Rindo ainda, Marisa disse:
- Deixa eu te ajudar a tirar essas roupas molhadas, minha trapalhona predileta!
Eu nem podia dizer não a esse pedido tão doce. Deixei que Marisa me despisse daquelas peças já grudadas no meu corpo, acariciou meu rosto com carinho, e observou se havia algum hematoma pelo choque do escorregão, beijou com ternura minha testa, e puxou meu corpo para perto do seu, encaixando-me entre suas pernas.
As mãos de Marisa me dominavam completamente, não que ela não me dominasse só no olhar... Mas nas mãos dela, eu me perdia e me encontrava, eu me desfazia em desejo e me refazia em entrega, cada toque dela fosse com suas mãos, fosse com seus lábios, anunciavam que meu corpo em pouco tempo sofreria uma erupção de sensações de prazer.
Encaixada, com as minhas pernas envoltas na cintura de Marisa, ela penetrou com dois dedos meu sex*, impulsionando meu corpo para movimentar-se, ela me puxava dando ritmo às estocadas. Os movimentos do nosso corpo obviamente também provocaram movimentos na água, e gradualmente a espuma foi crescendo, a tal ponto de praticamente nos submergir.
Não consegui disfarçar, ao invés de gem*r com o prazer que sentia com Marisa dentro de mim, eu soprava a espuma que me cercava, e um gesto completamente inusitado, Marisa ao ver tal atitude minha, caiu no riso falando:
- Poxa Alex! Soprando? Assim brocha!
Abracei Marisa, e rimos nos divertindo com a espuma que já estava espalhada no chão do banheiro:
- Ai Alex... Você é insuperável...
A observação de Marisa me deixou confusa, não sabia se ser insuperável era bom ou ruim, mas achei melhor não quebrar o clima daquele momento com algum tipo de DR, saímos da banheira com cuidado para não escorregar de novo, Marisa me cobriu com o seu roupão, e se envolveu com uma toalha conduzindo-me até a cozinha.
Pedi que ela se sentasse:
- Faço questão de serviço completo, vou servir você...
- Adoro... Apesar de não ter muito apetite...
- Ressaca?
- Sim... Mas confesso que estou adorando esse mimo todo.
Servi suco, pedaços de frutas com granola, em meio a beijos e carinhos no rosto de Marisa, que apesar de sorrir, não escondia a aparência de ressaca. Pediu que eu pegasse um analgésico em seu armário, e me puxou até a varanda, onde deitamos na rede armada, e ficamos por ali abraçadas.
- Alex, e sua namorada? Onde ela está?
- Meu Deus!
Nem me lembrava mais de Renatinha, só sabia que ela estava em casa, mas como ela estava eu ignorava, que bela amiga anfitriã me saí...
- O que foi? Você a perdeu em algum lugar?
Não sabia como reagir àquela expressão de desagrado de Marisa, e estava preocupada com Renatinha, sem pensar muito, disse:
- Tenho que ir pra casa Mah...
Marisa baixou a cabeça, mexeu nos talheres como se engolisse a decepção da minha decisão anunciada.
- Eu ligo pra você mais tarde... Precisamos conversar.
Falei constrangida, e surpreendentemente, Marisa disse:
- Vou te deixar em casa então.
- Não precisa Marisa, chamo um táxi.
- Deixa de bobagem, não me custa nada, vou me vestir.
A carinha de Marisa decepcionada me deu vontade de gritar que não havia motivos para insegurança dela, gritar a verdade que Renatinha era só uma amiga hetero, e meu suposto namoro com ela era puro teatrinho para provocá-la. Mas não falei, não senti que aquele fosse o momento.
No trajeto até minha casa, não conversamos muito, o silêncio só foi quebrado pelo som baixo do rádio que Marisa ligou. Diante da porta de minha casa, me assustei me deparando com a porta aberta, supus o pior, assalto, tragédia...
Notando meu receio, Marisa se ofereceu para entrar comigo, subi as escadas silenciosamente apoiada pela mão de Marisa nas minhas costas depois de não notar sinais de destruição ou arrombamento no andar de baixo de minha casa. Minha preocupação era com minha amiga Renata, especialmente agravada pelo peso na consciência de tê-la abandonado na noite anterior.
Entrei no meu quarto, e encontrei Renatinha deitada, semi-nua, mas minha surpresa maior foi, ver saindo do meu banheiro, igualmente trajada, Luiza.
- Luiza?- Indaguei espantada.
- Oi Alexandra... Oi Marisa.
- Mas o que você está fazendo aqui?
Eu não conseguia conceber o óbvio, até o momento que Renatinha acordou e logicamente se assustou com aquela população no meu quarto vendo-a praticamente nua.
- Ai meu Deus! Alex! Ai... Super doutora? Lu...
Renatinha se cobriu com pressa, e fez uma careta engraçada antes de esconder o rosto debaixo da coberta.
- Mas Rê... O que está acontecendo aqui? – Perguntei com um aspecto abobado.
- Alex, acho que está mais do que claro o que aconteceu aqui... – Marisa cochichou.
Incrédula eu puxei a coberta do rosto de Renata e berrei:
- Renata Lemos, precisamos conversar seriamente!
Percebendo o clima constrangedor instalado, Marisa disse:
- Luiza, você quer uma carona?
- Aceito doutora.
E assim, Luiza recolheu as roupas espalhadas pelo quarto e se vestiu rapidamente de qualquer jeito e desceu as escadas com pressa sem se despedir, enquanto Marisa se aproximou de mim e falou baixinho:
- Espero você me ligar mais tarde.
Balancei a cabeça positivamente a cabeça, sem desviar o olhar de Renata que fazia cara de menina levada que acabara de quebrar um vaso caro da mãe.
- Agora somos nós, trata de me explicar o que aconteceu aqui!
Renata estava mais desconfiada do que bebê com fralda suja...
- Fala Renata!
- O que você quer saber Alexandra? Quer que eu confirme se eu dormi com a Luiza? A resposta é sim! Não ressuscita essa Alex puritana, reprimida sexual não!
- Mas como foi isso?
- Ah... Acho que fui contaminada pelo vírus arco-íris naquele lugar... De repente a Luiza me pareceu tão atraente, tão interessante... Pintou um clima, ela se ofereceu para me deixar aqui na sua casa... Quando fomos nos despedir, a pegação começou e terminou aqui na cama!
- Na minha cama não é Renata?
Renata gargalhou, e toda aquela desconfiança já se desfizera, e o velho tom despachado dela já reinava na narrativa de sua primeira experiência lésbica.
- Alex eu nunca poderia imaginar que o sex* entre mulheres fosse tão bom! Se eu soubesse já teria experimentado antes! Tudo bem que falta um detalhe, pra mim, muito importante, mas tem outras compensações...
A cara de Renata me deixava ruborizada, percebendo isso, ela extrapolou nos detalhes, apesar da minha insistência em não querer saber.
- Ótimo... Agora como a gente fica heim Renata?
- Ai Alex, você acreditou que eu estivesse mesmo interessada em você amiga? Ai... Eu não te disse que era teatro?
- Para de falar besteira! Claro que não acreditei em coisa nenhuma, mas a Marisa sim... E o pessoal na festa também.
- Então, você vai ter que ficar com um chifrezinho de mentirinha...
Renata gargalhava da minha irritação, e eu, não tinha nenhuma mostra de domínio daquela situação:
- Amiga quer saber? Você está fazendo drama à toa... Que eu me lembre, a senhorita saiu da festa ontem com a doutora gostosona e só agora, quase meio-dia você apareceu aqui, com ela! Então foram chifres cruzados, tudo perdoado!
Joguei um travesseiro na cara de Renata que não conseguia parar de rir:
- Ai Renata, vá se vestir!
- Agora é sua vez, me conta, se entendeu com a doutora gostosona?
Fiz charme mas acabei contando, claro sem detalhes minha noite com Marisa. Saímos para almoçar e tive a sensação que Luiza despertou o número 44 na Renatinha... Ela começou a reparar nas mulheres em sua volta de uma maneira diferente, e isso atingiu o máximo do cômico, se eu contasse isso a Márcinha e a Eveline, com certeza seria chamada de louca, uma vez que a Renata sempre foi a de maior currículo de peguete entre nós quatro...
- Renata se comporte!
- Ai deixa de ser tão estraga prazer Alex! É novidade pra mim...
- Precisamos combinar uma estória, vamos dizer o que? Que depois do flagrante, nós simplesmente nos tornamos amiguinhas de infância?
- Ah sim! As sapatilhas não são civilizadas a tal ponto?
- Não fala besteira Renata! Isso não tem nada a ver com ser homem ou mulher!
- Eu sei, estou só te irritando mesmo... Mas acho que você pode dizer que nós tentamos nos acertar, mas ficou claro que não nos gostamos mais, e resolvemos preservar a amizade...
- Não gosto de continuar essa mentira, queria dizer a verdade a Marisa. Mas...
- Mas o que?
- Aconteceu algo hoje de manhã que me deixou intrigada e um pouco insegura sobre me abrir com ela.
Contei para Renata o episódio do álbum de negativos, e sobre a reação de Marisa.
- Aí tem coisa Alex... Coisa cabeluda!
- Eu não queria invadir assim a vida dela, mas é mais forte que eu... Vou investigar esse assassinato da família do embaixador, saber o que isso tem haver com Marisa.
- É isso aí menina! Mas agora preciso de um conselho lésbico... Quanto tempo tenho que esperar para ligar pra Luiza?
- Ai Rê! Sou novata nesse mundo também... Mas a julgar como Luiza saiu lá de casa, praticamente fugida, eu não demoraria a esclarecer que nós “terminamos” numa boa.
- Então vamos terminar de almoçar, depois eu ligo...
Liguei para Marisa assim que saí do restaurante:
- Mah... Queria te ver...
- Como ficou a situação com sua namorada?
- Tudo resolvido, esclarecemos tudo, não há nada mais entre nós, exceto amizade.
- Bom saber... Então, vamos subir a serra?
- Subir a serra?
- É... No hotel fazenda tem uns chalés aconchegantes, e eu pensei que poderíamos curtir o final da tarde por lá, e esticaríamos até amanhã.
- Convite irrecusável.
- Passo na sua casa então daqui a uma hora, prepare umas roupinhas de frio...
Segui as orientações de Marisa tranquilamente, depois que Luiza também convidou Renatinha para sair, assim, não abandonaria minha amiga mais uma vez. Na hora marcada, Marisa estava à minha porta, seguimos para serra, conversando sobre o flagrante da manhã.
- Nem sabia como agir hoje de manhã no seu quarto, afinal, eu estava praticamente na mesma situação que Luiza... E pensei que você estava tomada de ciúmes de sua namorada... Ou melhor ex-namorada.
- Não foram ciúmes, senti-me ofendida, ela me trair na minha própria cama.
- É você tem razão, eu não ficaria tão calma como você estava, nem parecia que ela sua namorada...
Notei desconfiança no comentário de Marisa, mas disfarcei, fazendo cara de paisagem literalmente, comentando a beleza daquele cenário. Os chalés eram ainda mais encantadores, a decoração rústica era um charme a parte, e o clima serrano contribuíam para o romantismo.
Depois de nos acomodarmos, Marisa me convidou para um passeio pela propriedade. Pinheiros altos, um lago belíssimo cercado por um gramado que mais parecia um tapete verde, compunham a paisagem do pôr-do-sol. Ficamos por ali mesmo, sentadas na grama, recostadas em uma árvore, aos poucos Marisa foi se deitando no meu colo enquanto eu acariciava seus cabelos.
- Mah o que está acontecendo entre nós?
- Como assim?
- O que nós somos? Amigas? Namoradas?
- Você precisa de um título que defina nosso relacionamento?
- Sim. Você não namora? Não gosta de compromissos?
- Mas não posso ter compromissos com quem já é comprometida com outra pessoa.
- Do que você está falando Mah?
- Até hoje de manhã você tinha namorada, como poderia namorar comigo?
- O problema é esse? Não existe mais...
- Você está me pedindo em namoro Alex?
Meu coração acelerou, praticamente o engoli para impedir que ele saltasse naquele gramado pela minha boca, encarei os olhos castanhos claros de Marisa, enchi-me de segurança e respondi:
- Sim, você aceita ou não?
Marisa desviou o olhar, sentou-se e olhando para o lago me perguntou:
- Não há mais nada entre você e a Renata?
- Você quer uma prova? Ligo pra Renata agora mesmo e você fala com ela...
- Ei... Calma, não estou duvidando de você, só quero ter certeza que minha nova namorada é mesmo só minha...
- Mas se você quiser eu ligo agora... Peraí... Você disse, nova namorada? Então você aceita?
- Claro sua boba! Era isso que eu queria quando te perguntei se existia algum compromisso entre nós, pensei que você não me quisesse, saiu correndo naquele dia!
- Ai Marisa! E você me deixou esse tempo todo sem me dizer isso!
- Ai você sumiu, me deu um gelo quando voltei de viagem... Depois me aparece com uma namorada!
Fiz menção de beijá-la, mas Marisa me impediu:
- Ei... O cenário é convidativo, mas o nosso primeiro beijo como namoradas não pode ser em público...
- Desculpa, você tem razão.
- Está esfriando muito, vamos pro chalé.
Entramos no chalé, e nossa primeira noite juntas como namoradas foi mais que perfeita. Dormimos abraçadas em baixo do edredom depois de nos amarmos ali perto da lareira. Não me lembro de uma sensação mais plena de felicidade na minha vida até aquele momento, e mesmo assim, a reação dela quando me viu segurando aquela velha matéria de jornal não saía da minha cabeça, eu precisava investigar isso.
Fim do capítulo
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MartaGamaAurelia
Em: 25/05/2018
Este é o melhor conto que já li, me instigou desde o primeiro Capitulo. Estou lendo pela 2ª Vez.
Obrigada!
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