Andressa ficou estática na porta quando a moça lhe disse que era filha de Márcia. Sentiu um pequeno mal estar e Perfídia percebendo amparou a esposa da coronel que logo se refez e perguntou:

-- Você é o que?

-- Sou filha dela. Sei que pode estar surpresa, mas eu só vim conversar com a minha mãe.

Márcia percebeu que alguma coisa acontecia e dirigindo-se até a porta perguntou:

-- O que foi amor você está bem?

-- Sim só uma pequena tontura já passou.

Olhou para a moça e perguntou:

-- Quem é você minha jovem? Perguntou reparando que a moça também tinha os olhos azuis acinzentados.

-- Muito prazer em conhecê-la coronel Mantovanni, eu me chamo Perfídia e sou sua filha.

Dessa vez quem ficou estática foi Márcia. Se refazendo do baque perguntou:

-- Minha filha? – Isso só pode ser brincadeira, eu só tenho aqueles cinco pestinhas que estão ali na sala brincando.

-- Não é não coronel. A senhora se lembra de uma mulher chamada Denilha? – Pois bem ela é a minha mãe e eu sou fruto do romance de vocês.

Márcia olhou espantada para a esposa. Essa não dizia nada e ela percebeu que a coronel não estava bem. Ela percebeu que Márcia estava tão surpresa quanto ela.

-- Entre menina não precisamos ficar as três aqui na porta olhando uma para a outra. Venha. Disse pegando a mão da moça e conduzindo para dentro.

Ao chegarem na sala, o pai de Márcia perguntou:

-- Quem é essa moça linda! Disse o velho reparando na feição da moça?

Márcia fez um pleno silêncio e respondeu:

-- Essa moça se chama Perfídia e disse que é sua neta, ou seja, minha filha!

O silêncio foi geral. O velho quase caiu duro, a mãe então nem se fala e os outros presentes muito menos. Os filhos ficaram com um ponto de interrogação na cabeça. Celina perguntou:

-- Você é minha irmã?

Perfídia olhou para os irmãos mais novos e respondeu:

-- Sim eu sou sua irmã. É uma história muito longa e eu vim somente para conhecer a coronel, nada mais. Mas também posso ir embora se eu estiver incomodando, ou melhor, desculpe atrapalhar a sessão família coronel. Eu não deveria ter vindo não queria constranger à senhora e nem a sua esposa. Desculpe-me. Disse levantando do sofá e se dirigindo à porta.

Andressa segurou o braço de Perfídia e respondeu:

-- Fique, por favor, você tem uma história para contar e tanto eu como a sua mãe queremos ouvir.

-- Pois bem dona Andressa eu vou contar e se a digníssima coronel Mantovanni quiser fazer DNA estou a sua inteira disposição.

Marieta que estava com a marido e até então não havia falado nada se manifestou.

-- Tenho certeza de que isso não será necessário você tem alguns traços do meu pai e depois do que ouvirmos creio que não haverá duvidas.

Cláudia comentou com Tavares:

-- Por essa eu não esperava. Estou roxa quem diria a Marcinha!!!

-- É eu também estou de boca aberta até agora. Nunca soube que ela tivesse uma filha, ainda mais nessa idade!

Depois que todos fizeram silêncio Perfídia começou a contar.

-- Há muitos anos atrás minha mãe conheceu a coronel Mantovanni em uma boate que ela trabalhava como dançarina. Ela junto com mais três policiais salvaram a minha mãe de um homem que já tinha passagens por tráfico de drogas e homicídio. Passado uns meses minha mãe morava na Mooca e a coronel que na época era soldado também morava se encontraram meio que sem querer. Minha mãe interceptou a caminhada e perguntou para a nossa coronel se ela se lembrava dela. A coronel disse que não e então a senhora Denilha tratou de esclarecer quem ela era. Depois de algum tempo elas começaram a namorar e essa convivência durou uns dois anos. Minha mãe se apaixonou por você coronel e decidiu que queria ter um filho seu. Foi aonde segundo ela mesma me disse em uma noite que vocês foram a um motel o assunto gerou em torno de filhos e você havia concordado de fazer a inseminação. Fizeram sim, mas quando minha mãe se descobriu grávida resolveu ir embora porque o meu avô aquele velho desgraçado que o diabo o mantenha no inferno, ameaçou de te matar ou tira-la da polícia. Minha mãe ficou desesperada porque tempos depois ela descobriu que ele tinha contato com traficantes perigosos e com isso ela resolveu anoitecer e não amanhecer. Fomos morar em Jaú e lá minha mãe conheceu outra mulher que cuidou de mim até que fizesse dezoito anos. Elas ainda moram juntas, porém minha mãe está com alguns problemas de saúde e como eu sempre soube de tudo, resolvi procurar você. Mas não se preocupe eu não quero o seu dinheiro porque não preciso, tenho profissão, sou engenheira e só quero o seu reconhecimento. Somente isso.

Todos ficaram emocionados com a história da moça. Andressa se aproximou daquela menina e a abraçou. A coronel não sabia o que fazer e olhando para a filha perguntou:

-- Porque você não me procurou antes, a sua mãe não deveria ter fugido assim, ela deveria ter me contado sobre a gravidez, eu nunca soube e quando perguntei ela disse que não havia dado certo e logo depois ela sumiu. Levou você e eu nunca mais a vi. Ela barrou a minha presença em sua vida, ela não podia ter feito isso! – Eu perdi de te ver crescer, de te abraçar, te orientar, de ver você sorrir. Ela foi egoísta me tirando um sonho que eu sempre tive. Ela tirou a minha felicidade Andressa! Disse se dirigindo para a esposa.

-- Ela tinha seus motivos coronel. A minha mãe sempre te amou e esse sentimento só foi aliviado quando ela conheceu a Silvia que foi a minha outra mãe por todos esses anos. Minha mãe foi tão vítima quanto você. Meu avô era um demônio, porque você acha que a minha mãe foi ser dançarina de boate? – Porque ele fez a minha mãe se prostituir e foi onde ela te conheceu. Portanto não venha culpar a minha mãe. E se você tivesse um pouco mais de interesse, já há muito tempo teria descoberto a minha existência. Falou num tom carregado de magoa.

-- Mas eu procurei a sua mãe por muito tempo sem sucesso algum, eu não sabia de nada. Logo depois entrei na academia conheci a minha primeira esposa e mesmo assim continuei a procurar. Depois que a Celina faleceu eu conheci a Andressa e fomos morar juntas. Já fazia cinco anos que estava viúva. Depois vieram seus irmãos Celina e André, quase um ano depois Nicola e Antônia e há oito anos chegou Gabriel. E hoje recebo uma surpresa dessas. Sabe gente a vida é engraçada. Eu quis tanto ter filhos quando jovem tenho eles agora e depois de muitos anos me aparece uma filha com trinta e um anos.

Andressa pediu licença para os demais e seguiu com Márcia até a biblioteca. Quando estavam sozinhas perguntou:

-- E agora amor o que você vai fazer?

-- Eu não sei Andressa, vou assumir essa moça, dar meu sobrenome a ela e recuperar o tempo perdido. Eu me lembro muito bem da mãe dela. Era uma morena bonita de cabelos escuros e olhos negros. Tinha um sorriso lindo, mas me traiu, tirou de mim o sonho de compartilhar com ela o nascimento da minha filha.

-- Eu sei disso meu anjo, você está magoada com a Denilha, mas tente entender os motivos que fizeram ela se afastar de você. Quando somos ameaçados tomamos atitudes drásticas. Você mesmo fez isso quando matou o Barbatana pelo simples fato de ele ameaçar a mim e aos nossos filhos. Agora que a vida te deu outra chance vai lá, curta a sua filha, faça tudo por ela e se a mãe dela precisar ajude-a, tenho certeza que ela sofreu tanto quanto você sofre agora. Por favor, releve isso que ela fez, o importante é que hoje se abriu uma nova página em sua vida e você só tem que ler.

Márcia ficou pensativa depois de refletir falou para Andressa:

-- E você meu amor? – Vai aceitar minha filha nessa casa? – Vai crucifica-la por um erro que a mãe dela fez no passado? – Vai conseguir conviver com isso, lembre-se que ela é fruto de um relacionamento de muitos anos que eu tive com a Denilha.

-- Meu amor entenda, ela é sua filha e será minha também, posso dar amor para ela, assim como os nossos filhos vão adorar ter uma irmã mais velha por perto. Você reparou nas crianças a cara que elas fizeram? – Tudo vai ficar bem!

Márcia abraçou Andressa e falou:

-- Meu amor eu estou tão surpresa quanto vocês ficaram, mas eu quero amar muito essa moça e quero também que saiba de uma coisa, eu nunca te trai me perdoa essa minha falha, perdoa a minha filha. Eu juro que não sabia da existência dela. Também nunca trai a Celina, só peço que nunca desconfie de mim, só peço isso.

-- Eu sei meu amor que você não me trairia e sei também que nunca traiu a Celina, por isso que nós te amamos e quanto a Perfídia ela será nossa filha.

-- Mas você não ficou com raiva, querendo me matar, não ficou chateada?

-- Confesso que no começo senti um baque muito grande quando ela me disse ser sua filha, mas depois da história que ela contou fiquei mais aliviada. E eu não tenho do que te perdoar, você é tão vítima das circunstâncias quanto elas. Não se aflija, vamos comunicar o que decidimos para a nossa família e acolher a nossa filha de braços abertos.

-- Obrigada meu amor, obrigada por tudo, por estar ao meu lado e ser essa fortaleza que a cada dia que passa me dá forças para viver. Eu te amo.

Elas permaneceram abraçadas cada uma perdida em seus pensamentos. Perfídia fará parte dos Mantovanni e logo quem sabe chegará um neto ou uma neta para a coronel. Andressa entendeu a situação e o próximo passo será apresentar definitivamente a mais nova integrante da família.

Fim do capítulo