Assim que entro na sala todas as meninas se viram em minha direção. Certamente estão se perguntando o que eu estava fazendo para ter permanecido no escritório a manhã toda. E com toda certeza também estão se perguntando como ainda estou viva depois de ter um encontro marcado com nossa queridíssima chefe. Bem, não conseguir nem me sentar e Joyce já me chamou em sua mesa.

- E então, como foi lá? Ela brigou? Sobre o que vocês conversaram?

- Cara, tudo tranquilo! Eu estava com a Juh, ajudando em algumas coisas que estavam pendentes, e não, ela não brigou.

- Nossa, que estanho... E sobre o que conversaram?

- Sério isso?  Sobre coisas de trabalho ué, o que mais poderíamos ter falado? – Aff, é só o que me faltava. Será que tenho cara de leva e trás?!

- Sei... A Juh é incrível né?! Inteligente, culta... É ótimo conversar com ela. - Que puxa- saco danada. 

- Sim, ela é incrível!

- Ok Diana, pode ajudar as meninas.

Um fato sobre a Joyce: não deixei de gostar dela, pelo o contrário, admiro-a demais, ela é totalmente dedicada a esse trabalho, é sempre a primeira a chegar e a última a sair. Pelo que fiquei sabendo já tem 6 anos de casa e uns 2 de encarregada. Porém essa mesma dedicação que vejo e admiro nela, me faz ficar com um pé atrás. Eu sei, não entendo muito disso de trabalho, contudo acho que ela deveria ser legal as meninas, não a chefia. Não estou dizendo com isso que ela deve ser desleal a alguém, não é isso. Só acho que ela deveria lutar pelos nossos interesses. Está confuso, eu sei. Mas é o que eu faria se estivesse no lugar dela. Não faria o que ela faz, como querer tirar nosso coro, nos obrigar a ficar depois de nosso horário, entre outras coisas.

- Di, tudo bem? Ela pegou pesado com você? – Carol me pergunta preocupada.

- Está tudo bem, amiga. De verdade, eu passei uma manhã incrível ao lado da Juh, aprendi muito.

- Nossa... Não imagino como alguém consiga se sentir bem ao lado daquela mulher, mas fico feliz que esteja tudo bem.

- Como assim ao lado daquela mulher? Como eu disse passei a manhã com a Juh!

- Aff Di, por que você fala como se a Juh e a coração de gelo fossem pessoas diferentes? Ela te enfeitiçou é isso? - Que caceta de pergunta é essa? Como assim a mesma pessoa?

- Do que você está falando, Carolina? A Juh não pode ser essa mulher, pode? – Minha cabeça começa a rolar... Como assim a mesma pessoa? Mas... É a Juh... Que monstro iria aceitar ser chamado assim?

- A Juh, ou Juliana Fábrega de Queiroz é a chefe! Sério que você não sabia, Di? – Como eu pude me enganar desde jeito? Que bicho te mordeu Diana? Da onde tirou que eram pessoas diferentes?

- Eu, eu...

Antes que eu pudesse responder, a porta se abre e o vento trás aquele perfume inconfundível. Só pode ser brincadeira, eu devo ainda está dormindo e sonhando... ou melhor, tendo um pesadelo!

- Boa tarde, meninas! – Cumprimenta Juh, ou melhor, Juliana Fábrega, assim que entra na sala.

- Boa tarde! – Todas respondem juntas.

              Nesta hora o silencio tomou conta do lugar. As conversas que antes estavam acontecendo ainda que baixo, acabaram completamente. E eu... eu ainda estava digerindo a informação da minha Juh, digo, da Juh, ser a desalmada, ao mesmo tempo que tentava me concentrar no trabalho, missão quase impossível com os vídeos das câmeras que eu estava examinando passando na velocidade máxima na minha frente.

- Ei, está deixando várias ocorrências passarem! 

 Acordo do meu transe quando sinto uma mão em cima da minha, dando pausa no vídeo. Agora que não me concentro em mais nada mesmo. Penso enquanto olho aquela mão perfeitamente quente por cima da minha.

- Está tudo bem? Sua mão está gelada? – Juh pergunta tão próxima ao meu ouvido, que fez com que meu corpo inteiro se arrepiasse.

- Estou bem... só me distrair, isso não costuma acontecer, não se preocupe que todos meus relatórios são confiáveis. 

- Não estou preocupada com os relatórios, e sim com você! O que te distraiu e essa resposta rebelde? Fiz alguma coisa?

- Obrigada por se preocupar ainda que não precise. Não foi nada... E não teve resposta rebelde nenhuma, só constatei um fato para te tranquilizar. Ficar ciente que suas funcionárias são boas no que fazem e não costumam deixar passar nenhuma ocorrência!

- Funcionárias? Entendi... – Diz ela se levantando – Meninas hoje precisaremos que fiquem até mais tarde. Querem falar alguma coisa? – Todas balançam a cabeça negando. - Alguém... Diana... Bom, era isso, Joyce estou lá em cima, e Diana, me acompanhe, por favor!- Era só o que me faltava.

Saio logo atrás dela, assim que estamos fora da sala ela se aproxima, segura no meu braço e me encaminha para uma sala próxima.

- Agora vai me dizer o que está acontecendo? – Questiona impaciente.

- Já disse que não está acontecendo nada. Por que me tirou de lá? Se vamos precisar ficar até mais tarde, suponho que seja por conta do muito trabalho, então quanto mais tempo eu me ausentar, mais tarde teremos que sair.

- Olha Diana, não me provoque! Você não sabe do que eu sou capaz. Pelo que vejo já fizeram o favor de esclarecer o engano que você mesma criou. É por isso que está me tratando assim? Me diz que culpa tenho eu por você ter se enganado?

- Não estou provocando ninguém! Tem razão, não tenho a menor ideia do que seja capaz. E sim, esclareceram o engano que eu mesma criei como disse você, que bom né, antes tarde do que nunca, já que por você parece que eu nunca saberia.

- É claro que saberia, não seja dramática. Só achei fofo ter me confundido, por isso ainda não tinha dito nada. – Ela fala sorrindo, me deixando com mais raiva ainda da minha burrice.

- Está certo, Juliana... posso voltar? 

              Antes que eu perceba ela rompe o espaço entre a gente, entrelaça minha cintura, me olha nos olhos e diz:

- Saia...antes que eu  faça uma loucura! Vai Diana, vai !!

Saio o mais rápido possível dali, com o coração disparado no peito. Não sei se pelo que ela falou, ou por ainda sentir o calor de suas mãos em minha cintura. Nunca a tinha visto assim. Descontrolada.  Quem essa mulher pensa que é?! 

Trabalhamos até as 19h. Como saímos tarde resolvemos chamar um Uber para chegar mais rápido em casa.

- Meninas, eu sei que hoje ainda é segunda, mas queria chamar vocês pra conhecer um lugar comigo no final de semana. - Digo assim que entramos no Uber.

- Sério isso? Como você consegue ter energia pra pensar em final de semana, depois de ter trabalhado igual a uma mula? – Pergunta Bianca fazendo caras e bocas.

- Para de ser velha Bianca, como eu disse, hoje ainda é segunda, até o fim de semana, já estaremos mais que descansadas!

- A Di tem razão,Bianca! Diz ai, aonde iremos? Pera, o Bruno não vem esse fim de semana?- Se pronuncia Carol.

- Obrigada pelo apoio amiga! Então, uma pessoa me disse que eu não conhecia nada da vida, e, não deixa de ser verdade, nada é exagero, porém a real é que nosso mundinho, quando digo nosso, estou incluindo as duas nisso também, nosso mundinho é muito seletivo, não nos abrimos a novas amizades, quando saímos sempre vamos aos menos lugares. Enfim, meninas, o que eu estou tentando dizer é: devemos nos permitir, nos abrir para conhecer novas coisas e pessoas... Acho que é isso! E sim, o Bruno vem esse fim de semana, porém, chega na sexta pela manhã, e volta no sábado à tarde.

- Meu voto é seu Di! Não entendi aonde quer chegar, mas gostei da animação! – Graceja Bianca.

- Aff, pois eu entendi, e concordo contigo! Por onde começamos nesta busca de novos “conhecimentos”? – Se interessa Carol.

- Bem... pra começar radicalizando, eu pensei em uma boate GLS. Porque é algo que só entendemos superficialmente, o que acham? – Mandei a bomba e fiquei aguardando ansiosa a reação das duas.

- Cara... bem que eu achei você muito próxima a Ariel esses últimos dias. Pintou curiosidade foi?- Questiona Bianca referindo- se a Ariel, uma das duas garotas lésbicas que trabalha com a gente.

- Aff Bianca, Ariel? Nada a ver, somos colegas apenas. Não viaja. Mas sim, conversei bastante com ela. E não temos ninguém próximo lês, gay... Vai ser bom para ampliarmos nossos horizontes.

- Verdade né?! Estamos sempre na Lapa, onde tem várias tribos, porém nunca nos enturmamos. Tá ai... Que venha sábado, e que traga  a boate GLS.  Mas pera, onde tem essas boates? 

- Isso é o de menos Carol, fazemos assim, vocês vão à tarde no sábado lá pra casa, então pesquisaremos uma boate de referencia, aproveitem e já levem as roupas e se arrumem lá.

- Sim senhora... Já que estamos falando sobre isso, tipo, não que eu morra de curiosidade nem nada... Mas como será que as lésbicas trans*m? – Pergunta Bianca envergonhada.

- Nossa... cara Bianca, você consegue ser pior do que eu... – Digo sorrindo.

- Ai Di, ué, já que vamos entrar nesse universo, sei lá, você já viu por acaso? Se não viu, não sabe como é... 

- Claro que nunca vi né, Bianca, mas imagino criatura.

- Aff meninas, o que seria de vocês se não fosse euzinha aqui? – Se pronuncia Carol.- Como estamos nessa atmosfera arco-íris, sugiro acrescentarmos filmes com essa temática, para conhecermos um pouco mais do mundo delas. 

              Depois daquela conversa de segunda- feira no Uber a semana passou rápido e logo chegou o sábado!  Como combinado as meninas chegaram à minha casa logo depois que o Bruno saiu.                     Então, assistirmos ao filme Elena Undone. Iríamos ver azul é a cor mais quente, porém não deu tempo. Depois de muito pesquisarmos, resolvemos ir à The Week.

              Chegamos 23:30h , estávamos nos sentindo um peixe fora d’água, apesar de não ter nada de diferentes de outras boates, a não ser que  estava cheia de Maurícinhos e patricinhas,  se pegando entre si, nada anormal. Música alta, jogo de luzes... bebidas. 

- Chegamos gostosas! Agora o próximo passo é dar uma circulada por ai... Bora começar pela pista... - Grita Carol .

- Vamos! – Gritamos de volta.

              Quando estávamos passando no meio da pista de dança sinto meu corpo ser puxado bruscamente e ir de encontro com alguém!

- Diana? O que está fazendo aqui? – É ... a gente sempre se encontra.

- Qual seu problema? Está louca... Me machucou! – Grito revoltada.

- Me desculpe, não foi minha intenção! – Diz Juliana enlaçando minha cintura. - Mas você não me respondeu, o que faz aqui?

- Mas que pergunta... O que se faz em uma boate? Vim me divertir ué, conhecer outras pessoas, me permitir... Você deveria saber, já que foi quem sugeriu. - Respondo tentando me livrar das mãos dela, porém ao invés de me soltar me prende ainda mais.

- Pois não devia andar sozinha no meio dessas predadoras! – Juh fala em meu ouvido me desorientando.

- Não estou sozinha, vim com minhas amigas. E quanto a “predadoras”, não se preocupe porque sei me cuidar!- Digo e olho em volta procurando por minhas amigas, que parecem que viraram fumaça. Eu mereço!

- Amigas? Não vejo ninguém. 

- Elas estão conhecendo o local. Agora posso ir? Com você me empatando não vai dar pra conhecer outras pessoas, nem descobrir novas coisas... - Paro de falar ao senti-la me estreitar ainda mais em seus braços!

- Então você quer experimentar coisas novas Diana? Sendo assim acho que deva me dar preferência, já que fui eu a dar essa sugestão... – Ela fala com a boca tão próxima a minha que consigo sentir seu hálito refrescante e com um delicioso cheiro de menta.

             Antes que pudesse organizar meus pensamentos, empurra-la e sair correndo dali, sinto seus lábios tocando os meus de um jeito tão doce e carinhoso que não conseguir fazer mais nada a não ser desfrutar do sabor delicioso que eles possuíam, tão macios e gostosos, que faziam minha cabeça e meu mundo girar. Quando penso que não poderia existir nada no mundo mais gostoso que esse beijo, sua língua quente encosta na minha e me faz ter certeza que nunca provei nada tão bom na vida...

Fim do capítulo