CapÃtulo 33
Entre Lambidas e Mordidas -- Capítulo 33
Pedro vibrou com a notícia, mas por precaução preferiu não agir naquele momento.
-- Não faça nada. Sai daí e evite ser visto por alguém. Não vamos nos precipitar, tudo tem que ser muito bem planejado. Amanhã me encontre no lugar de sempre e lhe explicarei o que quero que faça.
Desligou o celular e guardou no bolso interior do casaco.
-- Finalmente vamos nos reencontrar hein, Yasmin? -- o sorriso largo que tinha nos lábios mostrava o quanto estava satisfeito.
-- Falando sozinho, Pedro? -- Anita apareceu de repente na porta -- Estava ansiosa pela sua volta.
Pedro estava de pé na grande sala repleta de quadros. Parou diante da tela com a foto de Luiz Carlos Vargas. Seu olhar se prendeu naquele que preferiu deixar seus bens à filha bastarda.
-- Você sabe por que ele preferiu a Daniela, mãe? -- Pedro perguntou, apontando na direção da parede -- Por que ele preferiu aquela caipira?
-- Não sei Pedro. Talvez para me enfrentar, me punir, sei lá.
-- Acho que nenhum desses motivos -- Pedro continuava a olhar para o quadro -- Acho que ele gostava mais dela, mãe. Ele queria uma filha, ele queria uma menina. Ele gostava mais dela do que de nós.
-- Deixa de falar besteira. Seu pai sequer tinha contato com ela -- Anita parecia irritada. O rosto dela ruborizou enquanto olhava para ele com os olhos que pareciam faiscar.
-- Isso é o que você pensa. Ele sabia de tudo o que acontecia com ela. Aquela cidade era pequena demais. Parecia um reality show. Os amigos, vizinhos, inimigos, todos conheciam a rotina um do outro. Sabiam o momento do passeio com o cachorro, quais os dias de ir ao mercado...
Anita se virou incomodada com as palavras do filho. Foi até o balcão, onde preparou uma bebida.
-- Prefiro não falar mais sobre esse assunto tão desagradável -- A senhora Vargas tomou um gole generoso da bebida vermelha.
-- Você sempre foge dessa conversa porque não quer admitir que o casamento de vocês foi uma grande farsa. Casaram-se por conveniência. A união de duas famílias ricas buscando o poder absoluto. Não foi isso mãe?
-- Eu amava o Luiz Carlos -- disse olhando de lado para o filho -- E ele também me amava.
-- Não me faça de bobo, dona Anita. Papai amava Sonia. E, se você o amasse realmente, não teria ficado em São Paulo, permitindo que ele fosse morar sozinho em Canoinhas. A senhora deixou o caminho livre para outra mulher.
Anita segurava o copo com tanta força, que seus dedos estavam brancos, mas falou tentando parecer tranquila.
-- Agora a culpa é minha, então? -- levantou as sobrancelhas, já zangada -- Eu devo merecer -- balançou a mão, resignada -- Deveríamos nos preocupar com o investigador, isso sim. Ele saiu daqui faz uma hora -- mais uma vez Anita fugiu do assunto.
Pedro olhou para ela atentamente, e se calou. Anita percebeu que ele não demonstrou sinais de preocupação. Com certeza já estava preparado para essa situação.
Na manhã seguinte, Lavínia estava a caminho do hospital, quando viu Paula saindo do carro no estacionamento do condomínio. Elas não se encontravam desde a noite anterior. Estava imaginando o que ela fazia tão cedo na rua.
-- Caiu da cama? -- Lavínia perguntou segurando a porta do carro enquanto Paula retirava alguns embrulhos do banco traseiro.
-- Precisei sair cedo para comprar produtos para limpeza energética e espiritual dos ambientes!
Paula parecia bem cansada: seu rosto estava cheio de preocupação e as mãos mexiam os embrulhos com nervosismo.
-- Vou te contar algo, Mas quero que você prometa que vai acreditar em mim -- pediu Paula olhando ao redor.
-- Claro! Pode falar Paula -- a forma assustada com que a amiga falou, fez com que aumentasse ainda mais a curiosidade de Lavínia.
-- Eu vi o espírito da Débora no espelho do quarto dela -- falou baixinho, com um ligeiro tremor na voz -- Estou tentando descobrir o que ela quer de mim.
Lavínia olhou para ela por alguns segundos em silêncio antes de cair na gargalhada.
-- Eu sempre soube que você é louca, mas a ponto de ver espíritos, isso já é demais.
-- No começo acreditava se tratar de um fantasma, porém estive pesquisando e descobri que é o espirito dela que quer algo de mim.
-- Porque de você e não da Roberta ou da Dani?
-- Sei lá, talvez por ser mais receptível ao mundo espiritual.
-- Paula pare com essas ideias. Esqueça essa loucura! Daqui a pouco vão lhe internar em uma ala psiquiátrica.
Lavínia saiu balançando a cabeça.
-- Amanhã vai ser a minha apresentação para a banca examinadora -- Daniela colocou várias pastas sobre a mesa e sentou-se para revisa-las mais uma vez.
-- Tenho certeza que você vai sair-se maravilhosamente bem -- disse Yasmin sentando-se ao seu lado.
Daniela a olhou de relance. Esboçou um sorriso.
-- Vou falar sobre o: Bem-Estar Animal. Não sobre tudo, vou falar apenas sobre um item, que é: Liberdade Psicológica.
-- Bem-Estar Animal? Liberdade Psicológica? Estou voando -- Yasmin sorriu divertida.
-- Bem-estar animal refere-se a uma boa ou satisfatória qualidade de vida que envolve determinados aspectos referentes ao animal tal como a saúde, a felicidade, a longevidade. Pode se dizer que é um estado de completa saúde física e mental, em que o animal está em harmonia com o ambiente que o rodeia ou ainda, sua capacidade em se adaptar ao seu meio ambiente.
-- E Liberdade Psicológica?
-- Foi criada uma série de práticas e manejos que visam preservar os comportamentos naturais do animal, sem agredi-lo, preservando sua integridade. Em resumo são os cinco pontos o que constam na declaração Universal do Bem-Estar Animal: Liberdade Fisiológica; Liberdade Ambiental; Liberdade Sanitária; Liberdade Comportamental e a Liberdade Psicológica, que é o tema do meu TCC -- Daniela abriu uma das pastas e mostrou à foto de uma galinha -- Isso não serve apenas para gatos, cães e outros bichinhos de estimação. É para todos. Veja essa galinha. Nessa granja elas vivem em um ambiente adequado para seu desenvolvimento: utiliza-se a densidade de alojamento de 6 aves/m2. Dessa forma, as aves têm liberdade suficiente para andar, correr, brincar, ciscar e tomar banho de areia. Não é legal?
-- Para quem está prestes a morrer? -- Yasmin deu de ombros -- Não vejo nada de legal.
-- Quando se mata o suficiente para o sustento, é a lei da vida. Além de levar saúde a você, leva um produto ético, que respeita a natureza. Muito ao contrário de quando se usa para testes laboratoriais. Isso é crueldade, isso é ganância -- a voz dela soou irônica e fria.
Yasmin olhou para Daniela sem entender e pensando qual seria o motivo daquele tom de voz tão incomum.
-- Qual o motivo desse comentário tão irônico?
-- Vai me dizer que não sabia que a Vargas S.A. usa animais em experiências laboratoriais?
-- Não! Não sabia -- disse, tentando parecer normal.
-- Conta outra Yasmin. Com certeza todos os funcionários devem saber -- olhou de frente para Yasmin, sem piscar -- Porque nunca denunciaram?
-- Eu não sabia -- enxugou uma lágrima dos olhos -- Se soubesse teria denunciado.
Quando viu Yasmin chorando, Daniela arrependeu-se.
-- Desculpa! Não devia ter tocado nesse assunto. É o meu problema. Sempre falo antes de pensar. É um hábito que terei que perder -- carinhosamente ela fez um gesto com a mão para que ficasse calma -- Não chora!
-- Como você descobriu se nem eu que trabalhava lá dentro sabia?
-- Quando eu era criança, via dezenas de cães brincando no terreno que pertencia à Vargas. Na sua grande maioria eram beagles, porque a raça tem, geralmente, um comportamento dócil. Como toda criança ingênua, achei que eles, como eu amassem os animais e, com o passar dos anos, acabei esquecendo.
-- Então os testes são feitos na filial de Canoinhas? -- sua voz saiu abafada pelas lágrimas -- Por isso eu não sabia. Poucas vezes estive lá e as vezes que fui, foram para tratar de assuntos administrativos.
-- A Lavínia esteve em Canoinhas e viu com os próprios olhos o que os Vargas escondem a sete chaves.
-- Por isso as várias demissões sem motivo. Os farmacêuticos não concordavam e eram mandados embora.
-- Todos esses anos praticando maus-tratos à animais em prol dos testes de medicamentos. Estou esperando me formar para me juntar a um grupo de ativistas. Vamos invadir o laboratório resgatar os cães e destruir tudo. Testes em animais tem que ser abolidos, já que existem hoje opções substitutivas e não se precisa mais usar animal.
As palavras de Daniela aumentaram ainda mais a raiva de Yasmin.
-- Eu não sabia Dani. Juro que não sabia -- sua voz saiu fraquinha e seu olhar triste.
-- Eu acredito amor -- ela olhou-a carinhosamente -- Me perdoa por duvidar de você. Vem cá e me dá um beijo gostoso.
O amor brilhava nos olhos de ambas quando se beijaram.
-- Paula do céu! Você está fumando maconha com excesso de agrotóxico! -- Marjorie disse, colocando as mãos no rosto da amiga -- Meu Deus! Quantas vezes já lhe falei que vários produtores de maconha estão recorrendo a práticas do agronegócio, como o uso de pesticidas para aumentar a produtividade. Fumar produtos com agrotóxicos é ainda mais arriscado do que ingeri-los, já que as substâncias entram na corrente sanguínea sem que antes sejam metabolizadas pelo sistema digestivo.
Paula se jogou desanimada no sofá.
-- Será que ninguém acredita em mim?
-- Eu acredito que você esteja vendo espíritos. A maconha provoca alterações na percepção (alucinação) visual, auditiva e temporal. Já fumei muita maconha, e uma das coisas que achava legal era me concentrar em pequenos barulhos, como músicas distantes, ou canto de pássaros, quase imperceptíveis, e conseguir ouvi-los com uma clareza absurda. Já vi gnomos, bruxas... Mas nunca vi espíritos...
-- Quem está vendo espíritos? -- Bianca abriu a geladeira e pegou uma cerveja.
-- Eu! E não me venha com gracinhas -- Paula falou irritada.
-- Cara é muito bom ser espírita -- Bianca deu um gole na cerveja -- Ter sempre alguém para conversar. Que maneiro... A parte ruim é quando te forçam a usar uma camisa de força por conta disso.
Deixando o seu consultório, Doutor Müller foi até a UTI. Assim que o viram se aproximar, Roberta e Daniela sorriram apreensivas.
-- Bom dia! -- o médico sorriu ao se sentar na beirada de um pequeno balcão.
-- Bom dia doutor -- falaram juntas procurando não demonstrar a grande ansiedade que sentiam.
-- O senhor nos chamou? -- perguntou Roberta.
-- Sim, chamei -- Doutor Müller era o seu médico de confiança e ela o conhecia desde que viera morar em São Paulo, há muitos anos -- Infelizmente não tenho boas noticias -- fez um trejeito tristonho -- O quadro clinico da Débora é irreversível. Ela está impossibilitada de reagir devido ao estado vegetativo. A direção do hospital e uma junta médica me enviaram para propor à família, o desligamento dos aparelhos. Sinto muito!
Facebook da autora:
https://www.facebook.com/ojardim.dosanjos.5
Fontes:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Bem-estar_animal
http://www.agricultura.gov.br/animal/bem-estar-animal
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
cidinhamanu
Em: 11/12/2017
No Review
Mille
Em: 28/11/2016
Olá Vandinha
Doutor deu uma péssima notícia para a Dani e Roberta e nós, cais matar a Débora??? Faz isso não. Paula ajuda ai, o que ela quer deixar de mensagem. Tadinha todas acha que ela está maluca, fica triste não Paulinha eu estou contigo e acho que tu irá salvar sua alma gêmea (ou eu que capitei a mensagem errada!?).
E o que dizer do início do capítulo, Pedro acusando a mãe de deixar o pai sozinho e acabou que deixou um fruto, ainda por cima mulher e deixou a empresa para ela. Eu acho que o Luiz com o conhecimento da filha que tem um coração bondoso e é protetora dos animado a deixou como a presidente da empresa para poder mudar o seu erro no passado e mudar a visão dos irmãos.
Bjus e até o próximo
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