Capítulo 2
- Posso me sentar ao seu lado?
Meu deus, que sorriso era aquele? Sempre tive não uma queda, mas um abismo por pessoas com sorriso bonito.
Dei de ombros e disse
- Tanto faz.
A garota nova desfez o sorriso e um pouco surpresa se dirigiu a duas carteiras depois da minha. Talvez tenha ficado assustada com meu tom de voz. Mateus materializou da santa luz de Jesus Cristo na carteira atrás de mim e me deu um beliscão. Virei para ele sussurrando:
- Ai! Vai ficar roxo, sabia?!
- Escuta, tava aqui pensando... Será que pelo menos uma vez na vida você poderia não bancar a bicho do mato e socializar como qualquer pessoa normal nesse mundo faria? Com humanos de preferência.
- Não.
- É, eu imaginei.
- Cala boca, ow. A professora tá falando.
- Pega leve com a loirinha, eu gostei das roupas dela. Quem sabe eu possa até pedir umas dicas pra ela, ou ajuda pra vestir você melhor, talvez.
Mateus sussurrava olhando diretamente para a novata e ela nos olhava de soslaio desconfiada.
- Ter que aguentar duas patricinhas na minha vida, sendo uma delas o meu melhor amigo, com certeza tudo que eu pedi a Deus.
-Deixa de ser chata, guria! - Mateus me deu um tapinha no ombro e riu, eu o acompanhei - Ah, Alice, até as meias dela são melhores do que aqueles trapos que você chama de roupa... Quando veste aquelas suas camisetas de banda fica parecendo uma amante de Satã enviada pra terra.
- Antes fosse, assim eu já teria pedido a ele pra te fazer calar a boca e me deixar prestar atenção na aula.
Mateus riu e finalmente tinha calado a boca quando escutamos a professora:
- O que o clubinho do sussurro aí atrás tem de tão interessante para compartilhar conosco?
De repente nos pegamos sendo observados pela sala inteira, inclusive pelo olhar divertido da novata que parecia estar adorando a situação. Mateus estava assustado pelo tom de voz da professora e apenas me olhava com cara de tacho. Fui obrigada a tomar medidas drásticas. Respirei fundo e respondi.
- Ahn... O Mateus professora... O Mateus... Ele só queria tirar duvidas sobre... Sobre... Aquele número bem ali. Pergunta, Math!
-Ah... Eu... É, Sim! Ah, o número...
O sinal tocou fazendo nós dois quase pularmos da cadeira. A professora nos olhou e fez sinal de negação com a cabeça enquanto nós apenas sorriamos sem graça. Todos saíam da sala quando escutei uma voz atrás de mim.
-Alice Heins, prepare-se para o seu funeral... Não, nada de funeral, acho que vou jogar seu corpo em uma vala qualquer.
Levantei rapidamente, soltei uma gargalhada e saí correndo.
-Te encontro na lanchonete!
Eu andava nos corredores olhando toda aquela gente, alguns felizes, outros apenas "na deles", outros vazios. Quase sempre me sentia andando em meio a uma multidão de plástico, pessoas tão vazias por dentro que poderiam ser derrubados até pelo vento de uma brisa de primavera. Quase ninguém gostava de mim ali, e eu não gostava de quase ninguém. Estava viajando em mim mesma, como sempre, quando senti o impacto de alguém se chocando contra o meu corpo.
- Au! Nossa, me desculpe... Eu...
- Você...?
- É... Eu...
A novata me olhava assustada e eu começava a ficar sem paciência.
- Já sei! Você... Deveria olhar por onde anda. Tente fazer isso. É mágico.
Eu a deixei sozinha e segui meu caminho sem olhar pra trás. Minha primeira impressão da garota não havia sido boa. Havia algo nela que me incomodava, mas eu não sabia muito bem o porquê. Levando em consideração que metade da escola provavelmente pensava o mesmo sobre as impressões que eu passava, tratei de esquecer o assunto. Engraçado como estamos sempre julgando uns aos outros mesmo inconscientemente. Fui à biblioteca e peguei alguns livros. Minutos depois encontrei Mateus na lanchonete.
- E então? Já tirou sua dúvida sobre a aula de hoje, Mateus? - Disse me aproximando dele com um sorriso debochado.
- Nerd, tenho uma surpresa pra você - disse ele dando um gole em seu suco e me olhando sarcástico - e ela estará na sua frente em 3...
- Oi, Mateus!
- Droga, Rafaela. Você nem me deixou terminar a contagem! - Disse rindo para a novata que agora tinha um nome.
Às vezes eu realmente tenho medo do universo, ele parece gostar de me ferrar. Aquela guria era algum tipo de stalker ou o quê? Mateus sabia muito bem que eu odiava pessoas novas, odiava interagir, mas mesmo assim insistia em me fazer mais "sociável".
-Oi, Rafa! - Disse ele a abraçando - Rafaela, esta é Alice, minha melhor amiga anti-social e desconfio também de amante de Satã. Alice, esta é Rafaela, a novata dos olhos mais lindos do mundo e que vai me acompanhar no Shopping hoje para umas dicas de moda.
-É, a aniquiladora de pessoas inocentes que andam em corredores, já conheci. - Respondi seca e a encarei.
Rafaela parecia sem graça e sem palavras. Peguei meu suco, levantei da mesa e saí. Ótimo, Lei de Murphy... Lei da minha vida. Meu melhor amigo fazendo amizade com uma pessoa que ele conheceu há menos de 3 horas. Como ele conseguia se aproximar das pessoas tão fácil assim?
NA LANCHONETE
- Eu acho que sua amiga não gosta muito de mim, Mateus.
- Math, chama de Math, gata. Mateus é politicamente correto demais pra mim. E relaxa, a Alice é assim mesmo. Fechada, dura, mas se você for uma das pessoas que ela escolhe pra confiar e deixar entrar ela acaba se mostrando o ser humano mais incrível da face dessa terra.
- Nossa... Você parece gostar mesmo dela. E ela parece ser legal, pena que toda vez que me olha parece querer comer meu coração em um espeto.
Mateus riu.
- É, é assim com todo mundo. Mas hoje é só seu primeiro dia. Ânimo pois você ainda vai ter que aguentar um ano inteiro de torturas se quiser se aproximar dela ou de qualquer um aqui dentro. Menos de mim, é claro, pois eu sou uma deusa do amor.
Ri da graça de Mateus e dei um gole no meu suco. Meu primeiro dia na escola estava sendo assustador. Eu estava procurando por um lugar na lanchonete quando ele me chamou para sentar em sua mesa, depois de 20 minutos de conversa eu já estava encantada com seu jeito tranquilo e engraçado de lidar com as pessoas. Ele havia me contado sobre a vida ali na escola, sobre si e sobre sua amiga que parecia estar mal humorada o tempo todo. Havia algo nela que me chamava atenção e não era o fato de ela ser grossa comigo o tempo todo. Voltei minha atenção à conversa e decidi comentar sobre isso com Mateus.
- A sua amiga, sabe... Gostei dela desde o momento em que a vi, sabe aquele tipo de pessoa que se destaca em meio à multidão? Ela tem um mistério nos olhos...
- Ih, gata, aquilo ali é uma caixa de mistérios que não é aberta nem pro melhor amigo aqui.
- Imagino. Eu realmente não tenho ninguém aqui, nenhum amigo. Mudei pra cá semana passada e não conheço nada. Sua amiga vai ser meu novo desafio, meu nome não será mais Rafaela Albuquerque se eu não conseguir me tornar ao menos colega de vocês dois!
- Por mim você já pode ser considerada a mais nova Miss melhor amiga se me levar ao Shopping hoje, agora a Alice... - Disse ele sério.
-Veremos.
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Estava saindo da biblioteca e indo ao banheiro, as últimas aulas já deviam ter acabado e eu realmente estava distraída demais pra notar. Quando estou no meio dos meus livros sempre perco a noção de tempo e espaço. Eu abri a porta e quando entrei no banheiro, a novata dos olhos verdes assustada, tendo tanto espaço para escorregar, resolve fazer isso bem em cima de mim. E eu? Eu a segurei. Como se não bastasse a droga do sorriso e olhos lindos, ela ainda tinha que ter um cheiro delicioso e uma boca... Boca que estava a centímetros da minha e tudo que eu conseguia fazer era tentar controlar meus pensamentos a mil por hora, o coração no mesmo ritmo.
O universo definitivamente me odeia.
Fim do capítulo
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