Jasmine estava em seu antigo quarto separando algumas roupas que havia deixado, mas que agora queria levar para a casa de Fernanda enquanto conversava com Ana Júlia. O assunto era o ultimo encontro que ela e Alexya tinham tido na noite anterior. Era uma tarde de sábado que coincidia com um feriado nacional e, pela primeira vez na história, Fernanda havia dado o dia inteiro de folga a toda a redação. A fotógrafa guardava as roupas numa mochila enquanto Ana Júlia, que estava sentada na antiga cama da amiga, dobrava as peças para ela.

- Então, três meses e seis encontros depois, o que vocês são? – perguntou ela com um sorriso enquanto pegava a calça dobrada que a amiga lhe estendia.

- Ainda nada – confessou Ana Júlia rindo – Estamos juntas e não é um relacionamento aberto, mas ainda não definimos um compromisso mais sério. Estamos agindo como duas pessoas normais e indo devagar – falou ela e depois gargalhou quando viu a fotógrafa rolar os olhos.

- Não enrole ela demais Anjú – falou Jasmine ignorando a ultima frase da amiga – Ela é a primeira mulher com quem você fica. Não deixe que ela pense que está com ela só por curiosidade. Dá pra ver que ela realmente está gostando de você e eu sei que o sentimento é recíproco, mas se a enrolar demais as dúvidas vão começar a aparecer.

- Mas eu não estou só me aproveitando por qualquer curiosidade que seja – falou Ana Júlia ficando emburrada e se deitando na cama, as roupas haviam acabado – Eu sequer estou experimentando mesmo as coisas, já disse que estamos indo realmente devagar.

Jasmine ia dizer algo mais sobre dúvidas não serem tão racionais quando se deu conta das palavras que a amiga havia utilizado. Ela encarou Ana Júlia, se aproximou e olhou para o rosto da amiga que quando viu o olhar da fotógrafa sobre si cobriu o rosto com um dos braços. Mas já era tarde, Jas tinha visto claramente o leve rubor no rosto da amiga.

- Vocês ainda não trans*ram?? – perguntou Jasmine diretamente com um tom um tanto exagerado de surpresa que fez Ana Júlia cobrir ainda mais o rosto usando o outro braço – Anjú vocês já passaram várias noites juntas, lá e aqui. Como assim ainda não trans*ram????

- Imbecil – acusou Ana Júlia se sentando com o rosto todo vermelho e encarando o colchão e suas pernas cruzadas com suas mãos repousando sobre seus tornozelos – Só não aconteceu ainda, falei que estamos indo devagar. Nós beijamos muito, nos tocamos bastante....mas ainda não cruzamos essa linha de intimidade.

- Deus – murmurou Jasmine se sentando na cama de frente para a amiga – Casa com essa mulher. Ela provavelmente te ama! – falou rindo da expressão surpresa e quase assustada da amiga – Anjú ela esta seguindo seu tempo, te deixando ditar os passos. Não é só estar indo devagar, ela está esperando você querer e iniciar isso porque não quer te pressionar. Talvez ela não tenha tanta certeza assim de que você queira estar dessa forma com ela.

- Não tem como não saber que eu quero Jasmine – bufou Ana Júlia se levantando e começando a andar de um lado a outro, um claro sinal de que estava nervosa e desconfortável com o assunto – Chega a ser humilhante a facilidade com que fico excitada com ela, é impossível ela não saber que eu quero. Só estamos mesmo indo devagar, não queremos apressar as coisas.

- Ana Júlia, ela não quer apressar você. É diferente – falou a fotógrafa num tom calmo e cuidadoso – Você devia conversar com ela. Realmente conversar. Perguntar como ela se sente e o que ela pensa sobre estarem indo lentamente.

- O que quer dizer com isso tudo? – questionou Ana Júlia se irritando – Que ela acha que eu nunca vou querer fazer sex* com ela? E, por achar isso, não me pressiona pra que eu não me afaste??

- Estão juntas a três meses. Você disse que não tem como ela não saber o quanto te excita, mas mesmo assim vocês ainda não fizeram nada demais. Sinal de que ela não tentou nada mais – falou Jasmine pontuando as informações – Então sim, estou querendo dizer que ela pode estar realmente achando isso. E se eu estiver certa então Alexya merece um prêmio porque desse jeito parece que ela está se contentando apenas em ter você com ela achando que nunca terão nada de mais, abrindo mão do que realmente quer ter com você pra não te afastar – Ana Júlia não respondeu e, quando notou que ela não o faria, a fotógrafa se levantou pegando sua mochila – Pense muito bem sobre o que quer com ela e até que ponto vocês estão realmente indo devagar ou com medo de ir adiante e se arrepender. Depois, quando tiver uma resposta consistente, converse com ela.

Aquela conversa ficou na mente de Ana Júlia desde o instante em que elas a finalizaram. Jasmine saiu meia hora depois com a promessa de almoçarem na segunda, mas as palavras dela não saíram da mente da editora-assistente. Sim, editora assistente. A promoção, que vinha sendo planejada por Fernanda a quase um ano atrás sem que ela soubesse, havia ocorrido no mês anterior. Seu salário, infelizmente, continuava o mesmo, mas Ana Júlia assumiu uma posição muito mais importante dentro da revista. Ela continuava responsável pela agenda de Fernanda, mas a editora-chefe havia passado alguma de suas responsabilidades. Ana Júlia agora tinha uma secretária que ocupava uma mesa posicionada logo ao lado da porta de sua sala e era responsável por aprovar 35% das matérias da revista física e 50% da digital. A única coisa ainda restrita à Fernanda eram as reuniões com empresários, modelos, entrevistados, acionistas e anunciantes.

A possibilidade de Alexya estar indo tão lentamente com ela ser relacionado ao fato de que ela tem medo de que se o fizer isso as afastaria deixava Ana Júlia preocupada. Preocupada a respeito de não estar sendo direta o bastante ou não estar passando segurança suficiente para que a advogada entendesse que ela realmente queria estar onde estava. Não era nenhum tipo de experiência para ela, não era curiosidade. Ana Júlia realmente adorava estar com a morena, adorava a sensação de estar nos braços dela, adorava o cheiro, o toque, a pele macia. Imaginar que Alexya não sabia que ela sentia isso a fazia se assustar com o fato de que ela poderia estar magoando a advogada sem saber.

Sua mente ficou ocupada com aquilo o resto do dia. Perto das 18h Alexya lhe mandou uma mensagem perguntando se poderia passar o final da tarde com ela e Ana Júlia viu sua chance de tirar suas dúvidas e, caso Jasmine estivesse certa, reverter aquilo. Era hora de ter uma conversa séria com a advogada, disse que ela deveria vir. Sentou-se em seu sofá sem se preocupar em se trocar ficando com o moletom marrom quer era maior que ela e o short amarelo de malha que mal tinha mais que um palmo. Meia hora depois quatro batidas na porta anunciaram a chegada da morena e a editora-assistente se levantou do sofá e correu para abrir.

Encontrou a advogada do outro lado em trajes mais casuais; coisa que ela já havia se acostumado a ver. Alexya usava um jeans um tanto justo e uma camisa social azul escura com as mangas dobradas até os cotovelos e com a barra por fora da calça, mas não havia deixado o salto. Nas mãos ela tinha duas sacolas de algum supermercado com suco, pipoca, alguns doces e comida congelada. Ana Júlia sorriu vendo que a morena havia vindo preparada para alguma sessão de filmes e elas trocaram um selinho antes da mais alta entrar e a menor fechar a porta.

- Você está linda – disse Alexya passando o braço livre pela cintura de Ana Júlia e colocando o rosto contra a nuca da menor – E cheirosa.

- Posso dizer o mesmo de você – disse ela rindo baixo e se encostando contra o peito da advogada enquanto aproveitava a proximidade para sentir o cheiro do perfume da outra – Vamos guardar essas coisas logo.

- Primeiro – murmurou Alexya virando Ana Júlia de frente para ela, trazendo-a para mais perto e juntando os lábios ao da menor.

A de cabelos claros segurou os dois lados do rosto da advogada enquanto retribuía o beijo e sentia seu corpo ser apertado contra o da outra com força. Encerraram o contato com vários selinhos e Ana Júlia deixou uma pequena mordida no queixo da maior antes de se soltar e pegar as sacolas levando-as para a cozinha. Ela colocou um pacote de pipoca no micro-ondas e começou a guardar as coisas. Alexya alcançou uma vasilha grande para a pipoca e foi separar dois copos; eram coisas comuns para as duas, pois a cena se repetia muitas vezes durante as semanas. Mas dessa vez Ana Júlia manteve se olhar na morena a todo o momento enquanto pensava na conversa de mais cedo com a amiga.

- Por que me olha tanto? – quis saber Alexya ao notar a intensidade do olhar da menor – Tem algo errado na minha roupa? – perguntou ela sorrindo e se aproximando da outra que tinha acabado de fechar a geladeira deixando para fora apenas uma das garrafas de suco. 

- Não tem absolutamente nada de errado com você – murmurou a editora-assistente vendo a mais alta se aproximar dela e segurá-la pela cintura – O que vai querer assistir? – ela pergunta com um sorriso colocando as mãos nos ombros da morena e depois começando um carinho sutil no lado esquerdo do rosto da advogada.

- Qualquer coisa que você queira – ela disse beijando o canto da boca de Ana Júlia – Pode até ser uma daquelas comédias românticas que você adora que eu não me importo. Vou passar o filme todo olhando pra você.

- Então qual a razão de colocarmos um filme? – questionou a menor rindo e o sorriso da morena aumentou ainda mais.

- Eu só quero uma desculpa pra ficar abraçada com você por duas horas seguidas – admitiu Alexya dando de ombros e sorrindo de novo – Mas eu juro que não te atrapalho, só vou ficar te admirando e te fazendo carinho.

- Não precisa do filme pra isso – disse Ana Júlia passando os braços em volta do pescoço da advogada e se inclinando para beijar os lábios que estavam desprovidos de batom, assim como o rosto da morena que não tinha absolutamente nada de maquiagem.

- I know Angel – sussurrou a de olhos verdes contra os lábios da outra – Mas eu sei que você adora ver esses filmes, comer pipoca e se encher de doces. E eu adoro ficar abraçada com você. Então juntamos as duas coisas em uma só.

O beijo trocado foi calmo carinhoso, apenas um encostar de lábios, uma apreciando a textura da boca da outra contra a sua. Quando se separaram Ana Júlia encarou o fundo dos olhos verdes vendo todo o carinho que aquela mulher tinha por ela e algo dentro de si sentiu a necessidade de afastar a possibilidade da morena não entender o que significava na vida dela. Sua mão direita se espalmou no rosto, seus dedos acariciando a pele branca com delicadeza.

- Hoje Jas esteve aqui – contou ela ainda mantendo o rosto da mais alta perto do seu – Nós conversamos um pouco.

- Que bom, você já me disse que sente falta dela morando aqui, é bom que ela venha te visitar – falou a advogada sorrindo pela menor ter recebido a visita e por conta do carinho que recebia no rosto.

- Conversamos sobre nós duas – murmurou Ana Júlia com uma expressão calma e os olhos verdes ficaram curiosos numa pergunta muda a respeito de como havia sido a conversa – Ela me disse algumas coisas que ficaram na minha cabeça.

- Que coisas foram essas? – quis saber a morena dando um sorriso encorajador.

- Você sabe o que você significa pra mim Ale? – perguntou Ana Júlia ficando um pouco mais séria, mas ainda aparentando calma, mesmo quando viu a morena desviar o olhar e soltar um suspiro.

- Eu não saberia dizer realmente – falou ela colocando o rosto no pescoço da menor para evitar ter que encará-la – Você se refere a o que somos em relação a um relacionamento ou em geral na sua vida? A verdade é que eu não sei responder. Nós não conversamos muito sobre esses assuntos.

- O que eu significo pra você Alexya? – perguntou Ana Júlia fazendo um carinho de leve nos cabelos negros.

- Você realmente quer falar sobre isso agora? – perguntou a advogada erguendo o rosto com uma expressão acanhada e confusa – mas antes que Ana Júlia respondesse o micro-ondas emitiu um som avisando que a pipoca das duas já estava pronta.

Fim do capítulo