Capítulo 1 - Move on
PRÓLOGO
E mais uma vez aquele som ecoava em seu feitio gradual, carregado por distinta amabilidade. Só medo me habitava agora. Esse eco remete a volta ao tempo ou talvez sequer tenha saído dele. Por isso, só por isso eu novamente evito abrir os olhos. E ao observar através da superfície, você soube, que em mim os sentimentos mais intrínsecos e bonitos eram sempre mais perigosos. Contudo, te perder não foi um ato etéreo. Eu poderia perder tudo, perder do simples ao mais belo. Além disso, tudo nunca pareceu ser sério. Mas no fundo, bem no fundo eu até saiba... Não convém fazer escândalo no começo, quando a brisa quente ainda não se transformou num pequeno inferno. Porque no fim, quando eu acordar, pode ser possível te encontrar e ter aquele olhar tão singular que eu sempre vou amar.
POV Alexandra
23:59 de um domingo qualquer, o bip do relógio de pulso que estava dentro do armário me incomodava. Há tempos queria mudar esse despertador e não conseguia. Estava deitada de costas na cama do meu antigo quarto, olhando os adesivos fluorescentes colados no teto, um silêncio ensurdecedor preenchia a casa e de novo essa insônia, talvez fosse de tanto questionar o sentido da minha vida. Estava pensando em quanto tempo poderia levar da Estrada das palmeiras (onde ficava o haras) até a vila Olímpia, acho que cerca de uma hora se não tiver trânsito, mas pretendo fazer o percurso em apenas 40 minutos. “Se ao menos estivesse no meu apartamento...” pensei. Depois do último acontecido tinha prometido aos meus pais que mudaria, mas já tinham se passado alguns dias desde a última vez que sai para me divertir, e não era como se eu não fosse voltar mais.
Desci as escadas de meia, carregava o par de botas de couro preto nas mãos. Não tem ninguém na sala, acho que também não há ninguém na cozinha, esse é o lado bom desta casa ser tão grande. Lembrei que meu pai costuma fumar charutos escondido no escritório por volta das 23h30m, minha mãe odiava o cheiro, então provavelmente ele ainda estivesse por lá. A sala tinha apenas uma iluminação fraca e difusa, fui em passos lentos e silenciosos para a saída dos fundos que era ligada a lavanderia. A hylux preta estava fora da garagem, o que significa que ele ainda não tinha ido dormir.
Parei recostada na parede da entrada de serviço para calçar os sapatos. A parte de fora do haras estava em quase completa penumbra, exceto pelo caminho de coqueiros que levava até a porteira. A cada árvore havia um refletor de luz verde até o final do caminho, era possível ver qualquer carro que entrasse por ali. Quando Guto, Luiza e eu éramos pequenos, apostávamos corrida por todo esse trecho, eu sempre ganhava, até que Júlia chegou. Às vezes ela me vencia, às vezes eu a deixava vencer. O mesmo acontecia no riacho ao fundo do terreno, antes de colocarem a piscina. Quem chegasse por último era eleito “mulher do padre”, quase sempre esse título sobrava para Guto. Eu poderia ficar horas apenas contando os milhares de episódios que tenho nesse lugar. Como quando levei um coice do cavalo que ainda não era domado; o lugar onde Luiza e eu tentamos atear fogo em um vespeiro que acabou por queimar a árvore inteira; ou quando seu José, o caseiro contava histórias de terror em frente a fogueira e eu fingia não sentir medo, só para proteger Júlia, principalmente quando ela dormia na minha casa.
Ao ouvir apenas o som dos grilos no meio da escuridão, confirmei que estava sozinha. Fui até a garagem pegar a Diavel (era como chamava minha moto). Assim que abri o portão elevado percebi que havia alguém por ali, saquei uma chave inglesa que estava sobre a bancada, só então vi que na verdade era Guto, meu irmão. Assim que me viu, ele desligou o telefone e me perguntei há quanto tempo deveria estar ali.
-Resolveu sair da jaula? – Disse assim que desceu do carro.
-Sim. – Peguei o capacete preto fosco com viseira fumê que estava na prateleira mais alta do armário, quase o derrubei.
-Até que estava demorando.
-Pois é...
-Desta vez foram o que, 10 dias?
-Acho que por aí...
Vesti o capacete e dei partida na moto, fiz o motor roncar, 1-2-3-4 vezes. Não queria ser percebida por ninguém, mas agora acho que já era tarde demais.
-Tenta voltar inteira dessa vez, tá? – Ele coçava a cabeça, fazia isso sempre que estava preocupado ou pensativo.
Imaginei que fosse dar sermão, tentar me convencer a ficar em casa. Dizer que meus pais fossem ter um ataque cardíaco ou algo do tipo por preocupação com a querida Alex. Mas não, Guto expressou nenhum drama.
-O importante é que eu volto – Respondi com meio sorriso.
Arranquei com a moto, parei logo a frente para abrir a cancela de madeira tratada e observei Guto pelo retrovisor.. Fui de zero a 100 km em poucos segundos, atingi 200 e já estava me arriscando entre os carros, passava tão rápido por entre os obstáculos que pareciam meros borrões. A sensação de risco me deixava vidrada, era o raro momento em que me sentia viva. Era bom, me mantinha longe de algo mais forte, talvez mais perigoso. Acho que na verdade eu apenas fiz uma escolha, me arriscar em algo que pode matar em segundos ao invés de algo que possa me matar aos poucos...
Cheguei ao Royal em 40 minutos, tempo record. Já estava lotado, mas não enfrentei fila porque já conhecia Marcão o segurança de 2 metros. Passei por entre a multidão até encontrar uma banqueta livre no bar e aproveitei para me sentar. Do outro lado do balcão Gregório, cara de camiseta preta colada e braço direito tomado por tatuagens que também era um dos barmen, me viu e acenou com a mão livre, acho que ele quis dizer para esperar. Costumava frequentar o bar com tanta frequência que Greg e eu nos tornamos bons amigos ou talvez ele fosse até meu terapeuta de tanto que me ouvia reclamar da vida.
-Heei! Você sumiu, pensei que já tivesse viajado. – Elevou a mão para que eu tocasse de volta. Era como nos cumprimentávamos.
-Ainda não fui Greg. Só amanhã...
-Aposto que vai te fazer bem. – Disse enquanto girava uma bebida num daqueles copos de alumínio que quase sempre me deixavam tonta.
-É... Talvez até faça. – Concordei.
-Claro que faz, afinal, quem não gostaria de passar um mês na Europa.
Apenas sorri.
-O que vai beber hoje? – Ele perguntou.
-Faça algum que eu ainda não tenha provado.
Greg serviu uma mistura estranha que levava até pimenta. Por algum momento questionei se teria coragem de virar aquele projeto de secreção do inferno. Virei de uma vez. Era horrível.
-Uísque, vodka, absinto, me dê qualquer coisa que tire esse gosto horrível da boca.
Greg riu do meu desespero e me deu um copo d’água.
Passei alguns minutos olhando para o celular, mas não havia nenhuma notificação importante, me arrependi assim que vi uma foto antiga de Júlia em algum lugar bonito. Pensei nas confusões em que me meti desde que tudo aconteceu, acho que lidei da pior maneira possível. Depois de tudo que eu já havia feito para fugir dos problemas, era normal a preocupação dos meus pais e por um lado não os posso culpar, não tornei os últimos meses fáceis, ao contrário, só havia tomado decisões que fossem autodestrutíveis. A lista de números para se ligar em caso de Alex sumir eram longos. Iam desde necrotérios, hospitais a delegacias ou pessoas procuradas pela policia.
-Alex, olha a morena da mesa 33 – direcionou o olhar para a mesa. Era uma daquelas próximas a parede, estilo lanchonete americana. – Finalmente está sozinha... Olhei disfarçadamente, sem virar o rosto.
-Não é aquela que nós apostamos outro dia se era hétero ou gay?
-A própria.
Era uma morena de cabelos lisos e olhos negros. Estava acompanhada com mais duas moças quando entrei.
-Então acho que o mínimo que eu posso fazer é ir até lá falar com ela, certo?
-É, bem no mínimo.
-O quarto negro está aberto?
Quarto negro era uma sala de paredes escuras no andar de cima, aonde os casais iam para se agarrar. A maioria não ficava apenas no amasso.
-O que? Você vai levar ela para lá? - Greg pareceu incrédulo.
-O que você acha?
-A gente nem sabe se ela é hétero, bi, ou lésbica. Aposto que você não consegue levar essa para lá.
-Quanto?
Ele sorriu em um tom jocoso, mas demorou em responder.
-Em troca do chivas 18 anos que você sempre quer tomar durante as sociais na minha casa.
-Pobre Greg... – balancei a cabeça em negativa - Tem certeza?
Greg apenas piscou, confirmando.
-Não vai conseguir, nem com esses olhos azuis. Você sabe que de todas as vezes que a vimos aqui, ela nunca saiu com ninguém. Sempre vem e volta com as amigas.
Alcancei o uísque por detrás do balcão de Greg e servi duas doses em dois copos. Respirei fundo como se incorporasse um personagem, me virei, e fui em direção à mesa 33, olhando diretamente para ela. Primeira informação: Não era tímida, não desviou do meu olhar em nenhum instante¹. Aproximei-me dela, passei a mão entre os cabelos, jogando-os para trás. Ela apenas analisou. Lancei um sorriso que normalmente era infalível, ela correspondeu².
-Olá!
-Oi.
-Posso? - Indiquei para o sofá.
-Claro.
Me sentei de frente para ela, não tão perto, mas também não muito longe. Ofereci a ela o copo com uísque, aceitou. Virei o meu, mas sem quebrar o contato visual.
-Sempre venho aqui... Sempre vejo você... Mas sempre está acompanhada...
-Minhas amigas foram para a área aberta fumar... - Passeava meus dedos ao redor da boca do copo. – E eu preferi ficar.
-E te deixaram aqui sozinha? - Tentei parecer não acreditar.
-Na verdade eu quis ficar. Estava observando uma pessoa.
-Sério...? Então talvez seja melhor eu ir, estou atrapalhando você. – Ameacei levantar. Ela segurou meu braço³.
-Estou te esperando lá em cima. – Olhou para a escada que dava acesso para o tal quarto.
Mordi os lábios e segurei o sorriso mais sem vergonha que teimava em surgir. Ela saiu na minha frente, antes de levantar olhei para Greg que assistia a tudo boquiaberto.
A música no andar de cima tinha uma batida mais envolvente e alta, acho que fazia parte do cenário. Logo senti suas mãos em mim. A morena anônima até que beijava bem. Coloquei-a contra parede, afinal essa ainda era minha caçada. Beijei seu pescoço, ela colocou sua perna ao meu redor, colando meu corpo ao dela. Minhas mãos percorriam e apertavam suas coxas. Abri o botão do seu jeans colado, ela pareceu não se importar, continuava mordendo e beijando meu pescoço. Aprofundei, ela desfaleceu, mas eu a segurava.
-Vamos para outro lugar? – Sua voz quase não saiu.
Normalmente eu não faria isso, mas abri uma exceção.
-Me espera lá fora, ao lado de uma moto ducati preta.
Ela desceu as escadas em direção à saída, eu fui falar com Greg.
-Você ainda tem aquele meu capacete reserva aí?
- Só entrego se você me passar o segredo.
-Algum dia eu falo. – Tomei o capacete das mãos dele, estava contrariado.
Acenei para Greg e saí do bar. Lá fora a moça me esperava como o combinado, estava encostada sobre a moto. Passei o capacete para ela e montei.
-Vamos?
Fim do capítulo
Este é o primeiro capítulo da minha primeira história. Espero que gostem.
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CarolM4
Em: 01/02/2017
Hahhaha alambique foi ótimo !!!
Cara bem vinda ao " vc dar uma olhadinha" , "vcs trabalham por amor, não?" Kkkkkkkkk zuera, parabéns pela carreira e como diria meu professor , vc já é uma veterinária, só falta o diploma rsrs
Agora me tira uma dúvida, como conseguiu escrever?!?! Caso raro uma veterinária com vida hahaha mas continue arrumando tempo para postar pq está ótimo. Se mando a maldição das 3h rsrs
Bjs
Resposta do autor:
Aí... nem me fale nesse "dar uma olhadinha" "vcs trabalham por amor, não?" e tem outras mais absurdas ainda. Tipo "óleo queimado curando demodécica" kkkkkkkkkk São ócios do ofício não é mesmo? As vezes a gente ainda ri.
Olha... Não vou dizer que é fácil arrumar tempo, mas as vezes acontece, tipo de madrugada kkkkkkkkkk. Brincadeira. Escrever ajuda a relaxar, é divertido, então a gente sempre arruma um tempinho para o que diverte, não é? E eu não costumo sair muito, acho que isso favorece.
Me explica esse negócio da maldição das 3h kkkkkkkk.
Beijos.
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CarolM4
Em: 01/02/2017
Olá,
Consegui pelo seu nome a playlist, vlw !!!
Acho que é a primeira vez que vejo uma Vet, normalmente advogadas é empresárias rsrs adoreiiiiiii !!! Mais um motivo para continuar a leitura, e agora acompanhando a trilha !!!
Bjs !! Boa semana !!!
Resposta do autor:
É verdade, sempre vejo advogadas, empresárias, entre outras... Vet é mais difícil de encontrar, mas não posso falar muito porque sou suspeita em favorecer a profissão kkkkk.
Que bom que deu certo, espero que goste das músicas e também da história. :D
Beijos, ótima semana!!
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fla_nascimento
Em: 20/01/2017
Uai, até assustei com as notificações de atualizações dessa história no meu e-mail, já tinha aceitado o possível abandono da autora, nos deixando mais uma vez jogada a mercê de mais uma história abandonada :(
Faz isso mais não moça, tu mata a gente do coração trem u.u
Como antes, continua encantadora, parabéns!
Ps: Alex gostosa, me beija!
Resposta do autor:
Oi Fla, como vai?
Estive ausente por alguns dias, mas não desisti. Quase morro quando uma história é abandonada sem terminar, fica aquele gosto amargo de "e agora? o que aconteceu? Eu jamais saberei..." Então isso não vai acontecer com a gente kkkkkk. Eu juro.
Ps: Vai Alex! #teamAlex.
kkkkkk
Beijão e até o próximo.
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tata22
Em: 08/11/2016
lisboa tipo praça do comercio? cais sodre? urgh, pode ser pelas obras que andam la agora que aumentou, ou vc tava com sorte msm hahahaha ~
valeu.
Resposta do autor:
hahahah Nossa! faz um tempo que estive em Lisboa hein... Mas não era tão ruim, era bem agradável até rsrsrs. Talvez eu tive sorte.
Acho que posto quinta-feira.
Beijinhos!
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BrunaElidia
Em: 22/10/2016
Amo muito essa história, fico ansiosa para novos capítulos o ruim é que demora muito pra sair novos capítulos :(
Mas estou amando o rumo que a história está tendo, ansiosa para o capítulo 8 e todos os outros.
Bjs.
Resposta do autor:
Olá Bruna, como vai?
Fico feliz que esteja gostando. Hehehee
Então, eu estou em final de semestre e por isso demoro um pouco para postar, mas logo estarei de ferias e apostagens serão mais frequentes. Prometo!
Não desista hein kkkkk
Beijão
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rhina
Em: 04/10/2016
Olá.
Boa noite.
Alex....
Uma grande aventura surge.....E se faz necessária. ...pois um corpo tem sua alma sendo levada pelo vento....sem direção. ..sem rumos....sem destino ou sentido....
Uma alma louca de desespero para encontrar um fim.....um fim que anseia....busca. ...mas não sabe o endereço. ....
Seja bem vinda.
Até.
Rhina
Resposta do autor:
Olá Rhina, uma ótima noite.
Adorei seu comentário, representa muito bem a Alex nesta jornada.
As vezes o melhor a se fazer, quando se tem o coração quebrado é se lançar em um destino que seja ditado pelo acaso. Porque a maioria das coisas acontecem quando menos esperamos, quando estamos em busca de algo que não sabemos.
Beijos, até.
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Mille
Em: 27/09/2016
Olá seja bem vinda e gostei desses dois capítulos.
Num mês tudo pode mudar e espero que no Brasil também se não mais problemas para a Alexandra.
Bjus e até o próximo
Resposta do autor:
Olá, obrigada por comentar. Então... em um mês muita água passa debaixo da Ponte. Alexandra ainda vai ter muitas surpresas...
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