Capítulo 19 - Todo dia ela faz tudo sempre igual, me sacode às seis horas da manhã, me sorri um sorriso pontual
Carol e Luísa desenvolveram uma rotina própria de comunicação. Embora não fossem um casal, se falavam todos os dias, várias vezes por dia. Carol ainda cuidava dos horários dos remédios e monitorava se Luísa estava cumprindo tudo que fora determinado pelo médico.
Vez por outra, tentava se aproximar para além dos telefonemas, mas Luísa sempre encontrava uma forma delicada de delimitar os espaços.
Mas qualquer espaço já era melhor que nenhum, pensava Carol.
Ela sabia que suas chances eram mínimas, mas tinha decidido investir todas as suas energias no resgate daquele relacionamento. E isso envolvia respeitar espaço e tempo. Portanto, se manteria firme nessa missão.
Uma semana havia se passado desde a consulta com o pneumologista, na qual tinha acompanhado Luísa. Ela estava na universidade, à tarde, quando a estagiária de Luísa ligou para ela dizendo que Lu estava se queixando de falta de ar e que aparentava cansaço.
Carol quis saber mais detalhes, mas a jovem explicou. Estava aproveitando que Luísa tinha ido ao banheiro para ligar e que não queria que ela ficasse sabendo que a iniciativa de contatar Carol tinha partido dela.
Carol pediu que ela não saísse de lá.
Então, ligou para o celular de Luísa.
- Oi, Carol - atendeu Luísa
- Oi, Lu, tudo bem?
- Tudo e você?
- Tudo certo. Olha, tava pensando se a gente podia conversar sobre a escritura da casa. Como tem todo um processo jurídico, queria ver se você me ajuda.
- Claro! Podemos marcar - respondeu
Carol percebeu que ela estava meio ofegante, o que batia com a dificuldade para respirar relatada pela estagiária.
- Você está ocupada? - perguntou Carol.
- Estou trabalhando em casa - disse.
- Estou te achando cansada - desafiou
- Hoje acordei com um pouco de falta de ar, mas tá tudo bem - contornou.
- Você já ligou para o médico? - quis saber Carol.
- Não é necessário - amenizou
- Olha, Lu, o que você teve foi muito sério. Ele falou dos riscos de uma recaída. Não acho que seja prudente esperar a situação se resolver sozinha - decretou
Luísa ficou um tempo em silêncio, como se estivesse ponderando o que tinha acabado de ouvir e então:
- Você pode ligar pra ele, então? - pediu Luísa.
- Claro que posso. Vou fazer isso e falo com você daqui a pouco - disse Carol.
Depois de ter ouvido do médico que Luísa precisava ser avaliada imediatamente, Carol ligou para ela de volta:
- Lu, ele disse que precisa lhe examinar. Eu estou saindo da universidade e passo aí pra pegar você.
- Mas...
- Você está só? - disse, fingindo não saber da presença da estagiária.
- Não. Letícia está aqui comigo - disse.
- Diga a ela que não saia daí até eu chegar, ok? - pediu.
- Tá bom.
Quando Carol chegou, Luísa e Letícia já estavam aguardando na portaria do prédio.
Luísa entrou no carro, enquanto Carol agradecia a Letícia, piscando com o olho direito para sua cúmplice.
O médico tirou a temperatura de Luísa e fez os exames de rotina. Ela tinha 38 de febre e respirava com dificuldade.
Foi rápido até os resultados apontarem para uma sinusite.
De volta ao início.
Mais antibióticos.
Mais antitérmicos.
Mais restrições.
Mais repouso.
O médico recomendou repouso absoluto e que ela não fosse deixada sozinha.
Luísa entrou no carro arrasada, pela doença e pela impotência. Portanto, corpo e alma padeciam.
Carol entrou no carro com uma certeza: não deixaria Luísa piorar.
Ao chegar no prédio de Luísa, Carol buzinou para que o porteiro abrisse o portão da garagem. Luísa olhou de lado pra ela e ia começar a falar, quando Carol a interrompeu:
- Lu, não perca seu tempo. Eu não vou deixar você sozinha e estou apenas seguindo as recomendações do médico e, sobretudo, as do meu coração. Então, vamos evitar desgastes. Prometo que se você preferir, eu nem dirijo a palavra a você, mas só, você não vai ficar. Se você preferir ligar pra alguém vir ficar com você, tudo bem, mas só saio daqui quando a pessoa que você escolher chegar.
Luísa olhou para ela com preguiça, saiu do carro sem dizer nada. Ambas caminharam até o elevador e subiram juntas sem dar uma palavra. Entraram em casa e subiram até o quarto. Enquanto Luísa tomava banho, Carol ligou para a farmácia, pediu os remédios e improvisou alguma coisa para elas comerem.
Luísa comeu calada, só falou o estritamente necessário. Tornou a subir para o quarto. Carol fez um chá, pegou os remédios e subiu. Colocou tudo na cabeceira de Lu e perguntou:
- Posso tomar um banho?
- Pode.
- Você me empresta um pijama? Amanhã não dou aula de manhã, então passo em casa e pego algumas roupas. Já liguei para Maria vir para cá logo cedo. - avisou.
- Pode pegar um pijama no guarda-roupa.
- Obrigada.
Carol saiu do banheiro vestida de Luísa. Embora Carol fosse mais alta, tinham praticamente o mesmo corpo, o que facilitava as coisas. Nunca compartilharam roupas, pois tinham estilos muito diferentes. Carol mais despojada, Luísa sempre mais formal, na maioria das vezes, por força do trabalho.
Carol pegou um travesseiro e um cobertor e já ia descendo. Quando Luísa perguntou:
- Você vai pra onde?
- Lá pra baixo, pro sofá.
- Não tem necessidade disso, Carol - reclamou Luísa.
- Só achei que você não ficaria à vontade - explicou.
- Passei quase um mês na sua casa e você dormiu comigo todos os dias. Não vai ser agora que vou criar caso - falou.
- Tudo bem, já que você insiste... - disse ela, brincando.
- Sem graça! - resmungou Luísa.
Carol olhou pra ela e percebeu a expressão de cansaço, que deixava seus olhos frágeis.
- Você tá se sentindo bem?
- Estou cansada disso tudo - disse ela, deixando as lágrimas rolarem.
Carol abraçou ela, que soluçava sem parar.
- Ei, calma. Vai ficar tudo bem. Sei que é difícil estar nessa esse tempo todo, mas entenda, você precisa dar um tempo para o seu corpo. Ele está se recuperando de uma tormenta, está frágil. Que tal diminuir o ritmo? Você tira uma semana de férias, sem nenhum trabalho. Se dê esse tempo.
Aos poucos, a respiração foi voltando ao ritmo normal e os soluços foram se espaçando. Mas ela não soltou Carol. Continuava ali, firme, como se aquela fosse sua única segurança.
Carol deixou que ela ficasse até se sentir segura para ir se soltando aos poucos. Elas então deitaram-se lado a lado, Luísa com a cabeça no seu ombro e Carol alisando-lhe os cabelos.
Luísa dormiu rápido, mas Carol ainda ficou um bom tempo olhando para ela, num sono tranquilo, tentando imaginar como ela devia estar se sentindo, presa dentro de casa, com alguém que talvez ela não quisesse ali.
E esse alguém era ela.
Carol saiu da cama, desceu, ligou para Solange.
- Oi, Carol, aconteceu alguma coisa?
- Oi, Solange, desculpa ligar a essa hora, mas é que Luísa teve uma recaída. Está com febre e respirando com dificuldade. O médico recomendou repouso absoluto.
- Não é possível! Posso ajudar em alguma coisa?
- Acho que sim. Eu não sei se ela me quer aqui de verdade ou se só está acuada, sem saída. Não sei até que ponto minha presença aqui ajuda, entende?
- Ela falou alguma coisa sobre isso pra você?
- Na verdade, eu não deixei que ela falasse. Mas sugeri que se ela não quisesse a mim, que ligasse para outra pessoa, mas que sozinha ela não ficaria.
- Ela ligou para alguém?
- Não.
- Então qual é o seu medo, Carol?
- De estar forçando a barra.
- Você acha que está?
- Não, mas estou com medo.
- Carol, é até engraçado te ouvir falar assim. Você está sempre tão certa de tudo e agora está aí, toda insegura!
- Faz tempo que não tenho mais segurança quando o assunto é Luísa.
- O mundo dá voltas, né?
- Muitas.
- Bom, mas, respondendo ao que você me perguntou, acho que, ao contrário de você, Luísa nunca esteve tão segura quando o assunto é Carol! Então, acho que se ela permitiu que você ficasse aí, talvez ela queira você e não outra pessoa. Ela sabe que tem a quem recorrer, que não precisa ser a você.
- Mas ela estava cansada e também eu não deixei ela falar...
- Carol, você acha que ela se calaria porque você a interrompeu?
- Não é isso, mas ...
- Carol, você não tem nenhum poder sobre ela.
- Eu sei. Na verdade, nunca quis ter, só não quero atrapalhar.
- Você já influenciou Luísa muitas vezes quando estavam juntas, mas desde que tudo aconteceu, ela aprendeu a tomar as próprias decisões e está se saindo muito bem.
- Concordo com você. Também percebo ela muito mais madura, segura. Minha única preocupação é mesmo não acabar deixando ela pouco à vontade.
- Olha, Carol, eu acho que antes de qualquer coisa vocês têm uma história. Luísa está fragilizada com a doença e acho que ela quer ao lado dela alguém com quem tenha intimidade. Claro que ela tem opções, tem a mim, a Marcos, a Marina. Mas ninguém tem intimidade suficiente para levá-la ao banheiro, para limpar vômito, por mais que façamos sem nenhum problema, ela não se sente à vontade como ainda se sente com você. Então, se eu fosse você, ficava aí.
- Solange, não sei como agradecer.
- Não agradeça, fiz por Luísa. Outra coisa, você precisa de ajuda amanhã?
- Não dou aula amanhã e pedi para Maria vir pra cá enquanto for preciso.
- Eu passo por aí à tarde para dar uma olhada nela e ai a gente combina o que fazer nos outros dias, OK?
- Tá certo, ela vai gostar de ver você. Estou preocupada com ela.
- Alguma coisa em especial?
- Ela chorou bastante agora à noite. Chorou tanto que pegou no sono. Ela está sentindo falta do trabalho, de correr, acho que até de ficar só, sem ninguém cuidando dela, sabe?
- Normal, Carol. Ela vem de uma internação, de um tratamento com remédios fortes, fora as dores, o mal estar e a saída da rotina, que a gente sabe que, no caso de Luísa, é devastador. Temos que cuidar para ela sair logo dessa e para manter o ânimo em alta.
- Verdade e, mais uma vez, obrigada!
- Até amanhã.
Fim do capítulo
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Jebsk
Em: 04/09/2018
Apoio a NovaAqui, Luísa esta precisando e muito de uma boa noite sexo. Vai por mim, resolve tudo. Eu aqui com os meus problemas respiratórios e contra as orientações do pneumo, fico sem respirar mas o sexo jamais... ofegante por ofegante dá na mesma.
Queria saber que chá foi esse que a Luisa deu na Carol. Ela não desgruda. O amor é uma droga mesmo, qdo vicia já era pro apaixonado.
Resposta do autor:
Não tem asma que resista a um bom programa de exercícios sexuais! O negócio é focar na bombinha. Vamo mostrar os caminhos pra Luísa, pra ver se esse jogo sai do 0x0.
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