CapÃtulo 7
A decisão
A noite havia chegado e Lana seguiu para a casa de Adriana, que a esperava ansiosa. A campainha não havia soado e a porta já estava aberta.
— Entre. – Disse Adriana com voz carregada de preocupação. Lana havia falado no celular que precisava com urgência encontrar com ela e desligou.
Lana abraçou Adriana e a beijou nos lábios com intensa saudade, entrando em seguida e a porta foi fechada.
— O que houve? Eu fiquei preocupada, seu tom de voz me angustiou.
Lana soltou uma gargalhada e colocou ao lado no sofá uma pequena mochila, que somente naquele instante era vista por Adriana, que não perguntou nada, embora sentisse vontade.
— Olhe para mim, - disse Lana, tomando o rosto da amada entre suas mãos. — Eu vou me separar de Pedro, não quero mais viver assim, eu a amo, muito mais do que tudo aqui nessa Terra e não quero passar os dias amargando um casamento que não me faz mais feliz.
Adriana estava petrificada com a notícia. Lana continuou a falar.
— Ontem conversei muito com minha amiga Consuelo, aquela que apresentei a você no shopping, ela me falou muita coisa, falou de como foi difícil para ela também se aceitar, mas me disse algo que foi fundamental, disse que somente foi feliz, quando se aceitou. Falou que não foi fácil, que ela sofreu muito, mas que um dia adentrou um terreiro de Umbanda e que lá ela se sentiu em paz consigo mesma e hoje é feliz com Ana Luísa sua companheira de quinze anos. Então... Eu fiquei muito emocionada e ela finalizou dizendo que a vida é minha e que sou eu quem decide. E eu decido ficar com o amor, com o amor que sinto por você minha amada, sem peso e sem culpa.
Adriana chorava, seu corpo tremia pela emoção que havia envolvido seu ser, Lana abraçou Adriana e as duas trocaram um beijo sereno e cheio de amor.
Lá fora um homem ao celular.
— Sim, ela entrou no prédio. Sim. Acho que vai dormir, pois portava uma mochila.
Do outro lado da linha Pedro sentia seu corpo tremer. Então estava certo, sabia que Adriana era lésbica, não havia acreditado no começo daquela amizade, mas agora era um fato, Lana estava apaixonada por Adriana. Seus dentes trincaram, poderia matá-la se estivesse ali por perto. Buscou respirar.
— Continue...
— Nada mais.
— Fique aí até mais tarde, obrigado.
Pedro sentiu ódio profundo por Adriana, mas não poderia perder a razão. Precisava afastar Lana da mulher que ameaçava seu lar e foi deitar, pensando em como faria tudo para afastar as duas.
— Você não vai me dizer nada, Adriana? – Perguntou Lana fazendo beiço. As duas riram.
— Oh minha amada! Não sei o que dizer, mas, quero que me responda, tem certeza de que é isso mesmo que quer fazer? É casada há anos e assumir o amor por outra mulher não é algo muito fácil na nossa sociedade.
— Ouça minha amada, não precisamos afrontar ninguém com o nosso amor, não precisamos nos casar no papel. Deixaremos o tempo amainar a minha separação e então depois com o passar do tempo eu venho para cá ou iremos para outro lugar. Eu sei que ainda não estamos maduros o bastante para entendermos o amor entre os iguais, mas primeiro quero sanar o preconceito em mim, assumindo o que sinto, comigo mesma, entende?
— Sim minha querida. Faremos da maneira mais serena possível para que evitemos sofrimentos desnecessários para nós e para Pedro, que Deus nos ampare.
Lana abraçou com sua amada e ficou ali naquele amor, naquele aconchego de carinho.
O toque das mãos de Lana nos seus cabelos fez os olhos de Adriana marejar, os lábios das duas se uniram e o amor se fez naqueles corpos. Era a sensação de paz que as tomava, Adriana e Lana ficaram por minutos abraçadas, deixando que as vozes emudecessem. O amor não precisava de palavras, ele estava ali.
— Vamos comer algo fora ou pedimos?
— Pedimos. – Disse Lana. — Posso tomar um banho?
— Claro minha amada, essa é sua casa, venha, vou te mostrar o nosso quarto ou o seu, caso queira ficar sozinha.
— Mostre-me o nosso.
Adriana subiu as escadas de mãos dadas com Lana e mostrou a ela onde era o banheiro e tudo o que ela precisasse, enquanto isso ela iria pedir alguma coisa para comerem.
Lana ligou o chuveiro sentindo o calor da água e suspirou profundamente conforme a água ia descendo sobre seu corpo, nesse instante lembrou-se de Consuelo, ela tinha razão, era preciso decidir e ela estava em paz e ficaria melhor quando participasse sua decisão a Pedro. Nesse instante sentiu compaixão, sabia que ela a amava, mas não poderia mais prosseguir enganando a si e a ele, com o tempo, ele encontraria outra pessoa e ela pediu a Deus, ali, em seu coração que ele fosse feliz, ela iria ser.
Colocou um pijama e desceu, estava frio.
O jantar cheirava e Lana disse:
— O que pediu que está cheirando tanto?
— Carne ao molho madeira, arroz branco, salada de folhas com frutas e purê de batata. Eu fiz um suco de graviola.
— Nossa! Tudo o que eu gosto, acho que estou faminta.
— Venha amada, vamos jantar.
Lana e Adriana jantaram.
O homem que seguia Lana enfadou-se da demora e foi para casa, estava cansado.
A noite foi se aproximando e frio com ela foi ficando mais intenso. Adriana e Lana se recolheram, as vozes se calaram e os corpos se juntaram no abraço.
O dia amanheceu e Lana tomou banho, Adriana preparou o café e as duas seguiram para o trabalho.
Consuelo foi chamada por Lana até o escritório, a cafeteira já estava ligada e logo o cheiro do capuccino rescendia, Lana entregou para a amiga uma xícara e pegando outra se sentou dizendo:
— Consuelo você tem razão e ontem ouvir a sua história me fez entender muitas coisas, eu tomei uma decisão. Eu vou me separar de Pedro, assim que ele retornar de viagem eu vou contar a ele tudo, do amor que sinto por Adriana, de que desejo nossa separação. Eu quero seguir em paz, sem ficar amargando meus dias sendo infeliz e fazendo ao Pedro também infeliz.
— Oh minha querida! Fico feliz com a sua decisão.
— Fico triste, porque sei que Pedro vai sofrer e acho que ele não merece isso.
— Lana você gosta de omeletes?
Lana soltou uma gargalhada, sem entender o que a amiga queria com aquela pergunta.
— Gosto e muito.
— Então amada, não se pode fazer uma omelete sem se quebrar os ovos. Não tema o leão, nem mesmo o urso, olhe para o lado e veja os morangos, esqueça o leão e o urso e coma os morangos. Vá ser feliz. Pedro será também, quando chegar a hora dele.
— Eu acredito que sim, ele vai ser feliz sim. Ontem dormir na casa de Adriana, mas só vou voltar a fazer isso, quando eu resolver minha vida com meu marido, não quero me sentir mais traidora.
— Está correta. Eu acho importante quando vamos iniciar algo, deixarmos nossas pendências resolvidas. Desejo que você seja feliz minha amada. Hoje quando sairmos daqui podia jantar na minha casa, chame Adriana, Ana Luísa vai gostar de conhecer a ela.
— Combinado. Mais tarde ligo para ela.
O dia passou sereno e a noite não se fez demorar. Lana seguiu para casa depois que falou com Adriana, as duas seguiram para a casa de Consuelo.
O jantar foi servido e as quatro conversavam animadamente quando o celular de Lana toca, era Pedro.
— Oi Pedro.
— Oi minha amada, estou morrendo de saudade de você.
— Pedro eu estou jantando na casa de Consuelo com ela, Ana Luísa e Adriana, podemos nos falar mais tarde, meu querido?
Silêncio. Os dentes de Pedro trincaram de ódio, mas ele relutou para disfarçar a contrariedade e disse:
— Sim minha querida. Mais tarde quando puder me liga, então. Beijos.
— Beijo.
Adriana não disse nada e Lana falou:
— Perdão meninas.
— Fique tranquila Lana, isso tudo vai passar. – Disse Ana Luísa.
— Sim Ana Luísa eu sinto que sim. Mas vamos voltar ao nosso assunto.
E voltaram a falar da Umbanda, do quanto, Consuelo e Ana Luísa haviam aprendido a viver melhor desde dia que começaram a frequentar o terreiro.
— Você acha mesmo Ana Luísa que lá no terreiro, as pessoas não discriminam a opção de vocês?
— Adriana na verdade nenhuma religião é perfeita, porque elas são feitas de humanos, não é? Então querer que todos os umbandistas tenham superado seus limites, é não ser caridoso. Somos todos seres humanos e ainda temos nossas limitações, mas, confesso que o terreiro, isso não nos afeta, porque se alguém sente preconceito em relação a nós, essa pessoa busca trabalhar em si isso.
— Fico feliz em saber disso, acho que um dia vou adentrar o solo umbandista, apesar do medo que eu tenho.
— E de quê você tem medo Adriana?
— Acho que das coisas que eu vi quando era pequena ou das histórias que ouvia, eu acho.
— A verdade Adriana a Umbanda é cheia de mito, as pessoas não estudam sobre ela e saem por aí falando às bobagens que ouvem dos leigos. A Umbanda é um culto sagrado, trabalha no amor e na caridade do Cristo. Eu te faço o convite de ir ao terreiro um dia conosco, não é minha amada? – Disse pegando na mão de Consuelo.
— Sim claro, será muito bem vinda lá Adriana.
— Eu vou aceitar o convite, um dia.
Já eram vinte e três horas quando elas se despediram. Lana seguiu para sua casa, embora sentisse imensa vontade de ir para a casa de Adriana, mas queria resolver primeiro sua separação para depois seguir sem peso da culpa.
Os dias passaram e Pedro estava de volta, Lana o esperava com ansiedade, tudo iria ficar bem. Pediu a Josélia que orasse por ela, que pedisse aos Orixás que velassem por ela.
— Josélia eu espero que Pedro entenda.
— Lana minha querida tudo está nas mãos dos orixás, ontem pedi no terreiro por você.
— Eu agradeço Josélia, assim que tudo isso passar eu vou lá, quero agradecer e conversar com a vó.
Eram dezoito horas quando Pedro adentrou a porta da sala, Lana estava em casa, ele a tomou nos braços, buscando seus lábios com sofreguidão.
— Oi minha querida, eu estava enlouquecendo de saudades.
— Como foi de viagem meu querido? – Perguntou Lana, evitando falar de saudade.
— Não muito bem minha amada. – Disse Pedro carregando a voz de uma tristeza inexistente.
— O que aconteceu? Não deu certo com o cliente?
Pedro forçou duas lágrimas descerem pelo rosto e disse:
— Oh meu amor! Não é nada, venha me dê seu abraço, eu não quero preocupar você.
Lana sentiu uma pontada aguda no peito, era mau presságio, Pedro não estava bem, não falaria nada hoje.
Depois de um abraço mais demorado, ela insistiu:
— Pedro o que aconteceu? Conte-me.
— Oh minha amada eu confesso que preferia sofrer sozinho, mas preciso de você nesse momento, mais do que nunca.
— Minha nossa senhora dos peregrinos, está me assustando, conte-me, o que houve?
— Lana eu estou com câncer. Fui fazer uns exames e o médico constatou, vou ter que ficar algum tempo em São Paulo e, por favor, meu amor, venha comigo. Não me deixe ficar nó nesse momento.
O chão sumiu dos pés de Lana. Câncer? Como assim? Seu marido estava com câncer? E ela pensando em deixa-lo? Como poderia fazer isso agora?
Não poderia, era falta de gratidão.
— Querida... – Chamou Pedro percebendo o vendaval que passava dentro do coração da esposa.
— Oi meu querido, estou ouvindo. Perdoe-me é que isso me deixou preocupada.
— Querida tudo vai ficar bem, o médico disse que ainda está no começo e que feito à cirurgia tudo correrá bem. Desejo ir para São Paulo depois de amanhã, ficarei um mês por lá e desejo que esteja comigo, sua presença me ajudará a ficar melhor o mais rápido possível.
— Claro meu querido, eu irei com você. Amanhã organizo umas coisas na loja junto a Consuelo e sigo contigo.
Ouvindo isso Pedro abraçou a esposa, que nada disse.
A noite chegou e Lana não sabia como concatenar suas ideias, sentia como se o chão tivesse sumido de seus pés. Viajaria dentro de dois dias, deixando para trás Adriana, levando adiante uma situação que ela havia prometido para si que iria por fim, mas como se separar de Pedro doente e que precisava dela?
O sono demorou a ser seu companheiro e quando ela finalmente adormeceu se viu fora do corpo, ali estava Maria Navalha a pomba gira que era sua guardiã.
Lana olhou para ela e deixou às lágrimas caírem, Maria Navalha tomou sua mão e volitou com ela para a CASA DO PASSADO. A noite trazia uma aragem deliciosa e tocava no rosto de Lana que respirava profundamente, agradecendo a presença da pomba gira.
— Eu não sei o que fazer. – Disse Lana.
— Por que tudo isso senhora Maria Navalha? Eu decidir seguir meu caminho e agora Pedro precisa de mim, ele está doente e eu não posso deixa-lo nesse momento de dor.
Maria Navalha não dizia nada, ouvia pacientemente o que a pupila dizia no auge do desespero.
— Preciso me separar, quero seguir o amor que sinto por Adriana, mas como fazer isso agora? Por favor, senhora Maria Navalha me ajude a enxergar uma saída.
Nesse instante Maria Navalha recebeu dois copos com o suco da alegria, que Maria Padilha lhe ofertou, com um sorriso a pomba gira agradeceu a outra, saldando a sua força e Maria Padilha seguiu.
Lana tomou o suco e foi sentindo mais calma.
— Ouça Lana nós enxergamos o que queremos enxergar, seguimos para onde queremos seguir, fazemos o que queremos fazer e nada e nem ninguém nos obriga a fazer aquilo que não queremos fazer.
— Desculpa-me senhora, mas eu não entendi o que a senhora quis dizer.
— Que cada um de nós, é livre.
— Eu não sou. Sou casada e agora meu marido está doente e precisa de mim, não posso ser ingrata com ele, depois de tudo o que fez por mim.
— Eu entendo minha querida, mas seguir seu caminho não lhe faz ser ingrata com ninguém. Ouça Lana, a vida é muito mais do que o que você enxerga, a gratidão por alguém, não nos obriga a nos sacrificar por ele ou por ela, ser grato não é isso.
— Eu não sei o que fazer senhora, quero seguir com Adriana, mas não tenho coragem de abandonar Pedro nesse momento de dor para ele.
— Ouça minha querida, faça aquilo que você dá conta no momento, confie em Deus e faça o que seu coração lhe direciona.
Nada mais foi dito, Lana retornou ao corpo adormecido e o dia amanheceu.
Era horário do almoço e ela saiu da loja indo ao restaurante onde Adriana a esperava.
Depois do abraço, Lana sentou-se em frente à Adriana e começou a falar:
— Vou viajar amanhã com Pedro para São Paulo, ele fez exames e está com câncer. – As lágrimas começaram a descer pelo rosto de Lana, Adriana segurou sua mão.
— Tenha calma amada. Conte-me tudo, saberei entender.
— Adriana eu segurei amando você, mas, nesse momento não posso deixar Pedro sozinho, seria muita ingratidão. Eu vou com ele e assim que eu puder contarei a ele da minha decisão e então nós seguiremos minha amada.
— Eu entendo. Não fique assim desesperada, tudo tem a hora certa e quando chegar a nossa hora, nós duas seremos felizes, eu sinto isso.
O almoço terminou e as duas retornaram para o trabalho.
Fim do capítulo
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