@mor.com por Carla Gentil
Capítulo 8
- Senta aqui, dona Laura! E fique sabendo que agora você só levanta quando contar tudo pra gente – o tom de Lupe e o olhar atento das irmãs Martinez mostravam que o pelotão estava pronto para o fuzilamento.
Como de costume, as irmãs tinham entrado sem muita cerimônia em seu apartamento, enquanto ela estava sentada em sua poltrona lendo um jornal.
Elas a pegaram pela mão e a sentaram no sofá entre elas. Não pareciam dispostas a dar brechas para fuga.
- Ah, bom dia para vocês também, pessoas simpáticas – cumprimentou enquanto via seu jornal voar para a mesinha. – Nem vi o resultado do Celta ainda...
- Não começa a enrolar, não! Pode começar a contar!
- Tudo bem, eu conto! Eu sei que é triste e vai ser um choque para vocês, mas é verdade – com um tom pesaroso, completou. – A Xena morreu mesmo no fim da série e Gabrielle ficou sozinha, carregando a versão em pó daquela morena deliciosamente parecida comigo.
Imediatamente, uma saraivada de almofadas começaram a se chocar contra Laura, que rindo, tentava se defender.
- Sua palhaça! Conta pra gente o que está acontecendo com você!
"Palhaça... Acho tão gracioso quando ela me chama assim! Deu até saudade...”.
- Não sei do que estão falando! – Laura falou para ganhar tempo.
- Olha só! Não estou dizendo! Olha pra sua cara agora e você vai ver do que estamos falando. Pura paixão! E das bravas! – Dana olhava divertida para o ar ligeiramente patético no rosto da amiga. - Este olhar... Inebriado, palavra que só existe naquelas histórias que você lê... E agora tá ai na sua cara!
- Conta, Laura. Mais dia menos dia você vai contar mesmo, então economiza no calendário.
Elas eram como uma família para Laura, porém sempre havia o incômodo dos sentimentos de Lupe em relação a ela para preocupá-la.
Ela sabia que as Martinez tinham notado o comportamento da irmã do meio, mas não falar sobre o assunto era um acordo tácito. Era um equilíbrio que Laura fazia grande esforço para não romper. Lupe, ao contrário das irmãs, não parecia nada festiva com a novidade.
- Tudo bem, tudo bem... Vamos lá, podem perguntar que eu respondo.
- Está bem, eu quero saber... TUDO!
- Tudo... – lembrou-se da cam na noite anterior, abrindo um sorriso involuntário. - Impraticável. Tem crianças no recinto – completou sorrindo para Su e se protegendo da almofada que a espanhola usou para bater em sua cabeça.
- Na hora de despistar as “gajas” do banheiro eu não era criança, né!
- Ai! Nem me lembra daquela noite em Porto...
- Você está namorando? Mesmo?
- Estou sim, Lupe – Laura respondeu parando de rir. Odiava ferir os sentimentos dela, mas era melhor ser sincera e por um ponto final na sentença que sequer quis começar.
- Brincadeira! Achei que você fosse imune aos laços! Conta ai, como é que isto começou?
- Bem, eu não sei direito como explicar, nós ainda não nos conhecemos pessoalmente e...
- Você acessa estes programas de namoro por telefone? Que desespero de causa, Laura!
- Não, Su! Também não estou catando papel em ventania, me poupe! A gente se conheceu, por acaso na Internet e eu não estava caçando, foi obra do destino.
- E como é que é esta garota que está te deixando com esta cara de besta? Você já viu, pelo menos?
- Vi... – novamente a lembrança da cam a fez ficar com uma expressão abobalhada.
- Ei, não vai babar em mim! E trate de começar a falar, sua tarada! Dá até pra sentir o calor subindo! – Dana falou, levantando para sentar na poltrona em frente. – Até imagino o que é que você andou vendo na webcam. Ou fazendo...
- Jura?! – perguntou Su empolgadíssima. – Já estão de sacanagem por net? Você é minha ídola, Lau! – Laura e ela bateram as mãos no mesmo cumprimento que usavam no vôlei de praia.
- Tô podendo! – riu, mas logo se concentrou pra escolher as palavras e descrever Sam para as amigas. - Ela é uma loirinha bem pequenininha, com carinha de boneca, toda bem feitinha, umas coxas magníficas... Ai, ai...
- De onde é? – Lupe perguntou secamente.
- Brasil... Aliás, é de Recife, acreditam? E pelo que vi, nem mora muito longe dos meus pais.
- Mora perto dos seus pais e você dizendo que estava correndo o mundo pra achar sua cara-metade – Dana estava rindo da amiga e de olho em Lupe. – Este mundo é muito pequeno mesmo! Ela faz o que da vida?
- Ela é fotógrafa, só que são fotos artísticas. Hum... Também come lasanhas e, por último, mas não menos importante, dá olhares suuuper safados e desestruturantes pra sortuda da namoradinha dela.
- Por uma webcam! Namoro por Internet, Laura? Isto não vai levar a lugar nenhum! Desde quando você se tornou celibatária? Namoro por internet nem é namoro... Não passa de conversa à toa – Lupe concluiu, seu tom mais aliviado, apesar dela não estar rindo como as outras.
- Pois é, eu também nunca levei fé nestas coisas. Não só por ser com uma pessoa que, como é meu caso, nunca rolou de se ver pessoalmente, mas também porque estar longe é fogo! Sempre que ouvia falar destes casos, pensava que estava imune a isto. Estou pagando a língua. Apesar de ainda achar que distância é uma merd*.
- E que bicho te mordeu pra você mudar assim de opinião? – Dana interrompeu.
- Vindo da Laura... Só pode ser por um jeito novo de safadeza! – Su falou rindo.
- Não, Su! Nem rolou safadeza... Ainda. Se bem que... Quer dizer, ah, sei lá...
Nada proposital. O que foi o melhor...
- Esta parte eu vou querer ouvir com mínimos detalhes!
- Não vai ouvir nem com mínimos e nem com máximos, nem com nada! Já falei demais sobre o assunto... E pronto – o tom de Laura foi conclusivo o suficiente para que Su fizesse um biquinho e desistisse do interrogatório. – E respondendo sua pergunta, Dana, eu não sei o que me fez mudar de opinião. Desde a primeira vez que nós conversamos, eu senti tantas mudanças na minha cabeça, no meu modo de pensar, senti tanta vontade de falar com ela e esta vontade cresceu tanto que quando eu vi me sentia ‘dependente’. Eu fui conversar com ela de forma impulsiva, voltamos a nos falar sem explicação... Não sei dizer como acabou virando essa avalanche de sentimentos tão intensos em tão pouco tempo, com tão pouco contato.
- Você não a conhecia antes? Nunca se esbarraram enquanto você morava perto dela?
- Não que eu saiba. Ela é mais nova que eu, então acho que nós nem chegamos a nos cruzar na escola ou mesmo que tivéssemos o mesmo círculo de amigos.
- Mas desde quando vocês estão conversando? Você parece diferente desde que voltou dessa sua última viagem.
- Né! Foi desde o dia que eu voltei da viagem. Muito perspicaz você, mocinha!
- Uhhh! Perspicaz! Sulamita, a pulga perspicaz! - Dana adorava provocar a irmã caçula, que se esquentava com facilidade e odiava as tiras do Luiz Fernando Veríssimo com a infame “Sulamita, a pulga lasciva”.
- Ah, para com isto! Vou te contar quem é a pulga – falou isto já pulando no pescoço da irmã, empurrando-a para o chão.
- Zeus! Vocês não imaginam o quanto é complicado pra uma pessoa como eu ter que assistir duas espanholas bronzeadas, gatésimas rolando no meu tapete! – Laura falou com cara de quem estava babando. Sabia que isto era o melhor remédio pra desconcertar as duas gatas de rinha, o que de fato funcionou.
- Se você gosta de espanholas, porque foi namorar com uma brasileira? Acaso te falta opção aqui, Laura?
- Não é isto, Lupe. Eu não posso negar que acho... – olhou fixamente para ela. – As espanholas lindas, super desejáveis e se acaso eu sentisse despertar por uma delas algum sentimento, poderia viver pra sempre com esta pessoa. Acontece que este tal sentimento surgiu involuntariamente por essa brasileira. Eu não estou à procura de uma nacionalidade, mas de um amor.
- E que espécie de sentimento é assim tão poderoso que em dois meses, sem ao menos se verem pessoalmente, faz você estar assim, se dizendo mudada? Isso beira o ridículo! E não venha me falar em “amor”! Você nem viu esta pessoa pra falar que ama!
- Lupe! “Coração dos outros é terra que ninguém pisa”, não se esqueça disso. É muito fácil ficar de fora e apontar os dedos para as atitudes das pessoas, sem saber exatamente o que as motiva – apartou Dana.
- O duro é que eu sou obrigada a concordar com ela, Dana. Eu também não entendo como isto aconteceu tão rápido. Dois meses... Na verdade não foram necessários dois meses. Como eu disse, me senti mudada desde a primeira conversa. Não posso dizer que foi “paixão”, “amor”, ou o que seja... Eu não sei, juro que eu não sei que nome dar ao que estou sentindo! Só sei que é um sentimento poderoso, é bom, me dá uma sensação de conforto... Entre inúmeras outras sensações.
- Então se livra disso, Laura! Por que ficar dando corda a um relacionamento que começou do nada? Com certeza vai acabar do nada, também! Vai que a guria tem mau-hálito, ou tem uma voz horrível, ou..
- A voz dela é linda! Ela tem a voz meio rouquinha e tem balanço e...
- Ah! Para! Você não está nem ouvindo o que eu estou falando! Quer saber, Laura? Vai atrás desta idiotice, perca seu tempo, perca suas amigas, perca a mim... Perca tudo o que você diz que gosta de ter!
- Lupe, não precisa disso! Tem espaço pra todo mundo na minha vida. O que a gente viveu nunca vai deixar de existir. Você sabe que eu amo a sua família, nunca vou deixar de ser grata a vocês!
- Pro inferno com este amor! Não é isto que eu quero, nunca foi isto que eu quis e você sabe muito bem disso!
Lupe levantou e saiu correndo da casa de Laura, Su fez menção de segui-la, mas Dana a impediu.
O acordo de silêncio estava à beira de ser rompido e Laura notou, com pesar, que as coisas poderiam ficar muito diferentes dali para frente.
***
Sam ajeitava a câmera para começar a fotografar a Ponte Velha, no centro da cidade, quando o celular tocou.
- Ah, vejo que decorou o número!
- Discagem rápida... E se quer saber, eu quase liguei pro Arthur.
- Hum! Devo ficar com ciúmes?
- Nem! Ele tem voz de snoopy e sabe que eu gosto mais de Garfield, não sabe?
- Não sei... Você ainda não me contou. Aliás, ligou para...?
- Saber se você dormiu bem – respondeu de pronto. – Sonhou comigo?
- Não – mentiu. Sam ainda se sentia relutante em dar o braço a torcer, ainda que fosse para Laura. – Assim que paramos de conversar, virei de lado e dormi. Estava cansada, nem pensei em nada... Tá rindo por quê?
Laura não conseguiu responder. Nem deixar de rir... Decididamente, Sam era marrenta. Adorável. Mas marrenta.
- Puxa, então você nem pensou em mim!
- Não... – Sam respondeu sem muita convicção.
- Você fica falando “Laura, Laura... É, só como vício de linguagem?
- Quê?? Tá falando do quê, La... Uhn! Tá falando do quê? – perguntou assustada, lembrando como é que ficou repetindo o nome da morena na noite anterior.
Laura gargalhou. Sam compreendeu. A cada palavra que tentava começar, Laura ria mais.
- Ah, não fica brava, não! Foi tão... Lindo!
- Laura... Vai se... – desligou o telefone. Roxa de vergonha. Azul de raiva.
Vermelha de tesão.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Monica Franca
Em: 15/05/2017
Não sei porque , maa acho que era pra sair um capítulo de 3 em 3 horas. Rsrsrsrs
Ta cada capítulo melhor...
Resposta do autor:
Ok, ok... ganhei o dia. B|
Beijinhos o/
[Faça o login para poder comentar]
Suzi
Em: 15/05/2017
ops!! Lupe botando as garrinhas pra fora.
amei a reação de Sam...kkkkk na próxima fecha o note direitinho..
adorando
Suzi
Resposta do autor:
Por incrível que pareça eu tenho problemas com vergonha alheia. Até pulei essa parte na revisão. E tem outras piores pra vir. #Socooorro
Bjins
[Faça o login para poder comentar]
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook:
[Faça o login para poder comentar]