CapÃtulo 2
Entre Lambidas e Mordidas -- Capítulo 2
Havia várias baias, cada baia abrigava três cães. Todos da raça beagles. Daniel continuou sem entender o que estava acontecendo. O que eles faziam com tantos cães?
Ouviu vozes e encolheu-se o mais que pode, enfi*ndo o queixo entre os joelhos.
-- Ele ficou muito feliz; entraria para o rol dos homens valentes de Canoinhas -- Lauro, o capanga dos Vargas entrou no galpão conversando com outro empregado. Pegou um saco de ração e jogou sobre uma mesa -- Cara, estou cansado de cuidar desses cães, isso não é serviço pra mim.
-- Nem pra mim -- respondeu o outro.
-- Esse negócio de usar animais para estudar doenças humanas e testar drogas para uso humano é bem interessante. O que eu não concordo é da gente servir de babá pra eles.
Daniel estava literalmente aterrorizado. Seu punho cerrou ao ouvir aquilo.
-- Testes com animais... Meu Deus que horror! -- sussurrou para si.
O senhor Pauly saiu dali arrasado. Animais não podem defender-se sozinhos. Ficam reféns dos homens, da sua crueldade. Não maltratar os animais deveria ser o décimo primeiro mandamento.
Daniela colocou o seu cachorrinho no chão e sentou-se com uma sacola de mercado sobre as pernas.
-- Vem cá Pedra vamos...
-- Ei menina.
-- Aiiiiii... -- A garota assustou-se ao ouvir a voz grave -- Quer me matar de susto seu maluco?
-- O que você está fazendo sentada aí? -- perguntou o menino do outro lado da cerca.
-- Não falo com estranhos -- disse, olhando com indiferença para ele.
-- Não sou estranho, sou o Matias -- levantou a mão para segurar na cerca...
-- NÃO!!! -- Daniela berrou e foi a vez do menino se assustar.
-- O que foi? -- olhou assustado em volta, examinando o que poderia ser tão terrível.
-- Não encosta na cerca. Ela dá choque.
Matias gargalhou.
-- O que foi? -- Daniela se levantou -- Você não acredita?
-- Quem falou isso pra você?
-- Meu pai que falou.
-- Seu pai é um mentiroso.
-- É não!
-- É sim. Ele mentiu pra você -- colocou as duas mãos na cerca e sacudiu -- Viu como ele é mentiroso?
-- Nooossa... -- Daniela também colocou as mãos na cerca -- Como você descobriu isso?
-- Se ela desse choque meu pai teria me falado.
-- Quem é o seu pai? -- perguntou e voltou a sentar-se.
-- É o Luiz Vargas -- ele disse sem um pingo de emoção na voz.
-- Seu pai é um assassino.
-- Foi seu pai quem disse isso?
-- Foi -- Daniela abriu a sacola plástica e tirou um pequeno embrulho -- Eu tenho pão, quer um pedaço?
Matias sentou no chão próximo a cerca.
-- Pão com o que?
-- Pão com banha -- passou a língua pelos lábios -- Uma delicia!
-- Arghhh! Que nojo! -- o menino passou a mão pela boca.
-- Não é nojo, não. Você já comeu?
-- Não, mas deve ser horrível.
-- Então come um pedaço, se você não gostar me devolve.
Matias pegou o pedaço de pão e ficou olhando para ele. Engoliu em seco e deu uma pequena mordida.
-- Então? Gostou? -- seus olhos verdes brilhavam de ansiedade.
-- Hum... Até que é bom -- disse colocando outro pedaço na boca.
-- Viu, não falei que é gostoso? Pega mais.
-- Tá bom! Amanhã eu trago pão com Nutella para você comer.
-- O que é Nutella?
A luta progredia, surpreendentemente entraram na roça do vô Timóteo e queimaram tudo, não o mataram porque ele e a vó Dinda não se encontrava em casa naquele momento.
Daniel revoltado foi tirar satisfação com Luiz Carlos Vargas. E no meio da discussão, com os ânimos exaltados, Daniel falou o que não devia.
-- Seu bandido! Eu sei que sua empresa farmacêutica está utilizando animais em testes de produtos e medicamentos para consumo humano.
Luiz Carlos gelou. O que menos queria naquele momento era ter que bater de frente com todas aquelas ONGs de defesa dos direitos animais.
-- Não sei do que você está falando.
-- Não sabe? Você está me dizendo que não sabe que no seu galpão tem dezenas de cachorros?
-- Eu gosto de animais por isso...
-- Me poupe Luiz Carlos. Eu sei muito bem qual a utilidade daqueles inocentes bichinhos.
Naquele momento Luiz Carlos decidiu, teria que dar uma lição no caipira de qualquer jeito, pois este já tinha ido longe demais.
Anita estava tão irritada com a demora na compra das propriedades, que decidiu viajar até Canoinhas e tentar ela própria, resolver o impasse.
-- Meu Deus homem! Estou lhe estranhando. Em outros tempos você teria acabado com essa teimosia a bala -- com os olhos avermelhados andava pela sala, zangada -- Se esse caipira é o problema. Elimine o problema.
-- Não é bem assim Anita. Não posso simplesmente sair por aí matando todo mundo que atravessa o nosso caminho.
-- Será que é esse o real motivo?
-- E qual seria? -- perguntou temendo a resposta.
-- A revolta de uma bela italiana. Quem sabe?
-- Você está louca! -- Luiz saiu da sala batendo a porta com força.
-- Quer enganar a quem Luiz? -- sentou no sofá, cruzou as pernas e apoiou as mãos nos joelhos com elegância -- Lauro -- chamou o empregado que apareceu de imediato.
-- Sim, senhora?
-- Precisamos conversar.
Daniela e Matias encontravam-se todos os dias no mesmo lugar. A cerca que os separava não foi problema para eles. Fizeram um furo na tela por onde trocavam brinquedos e lanches.
-- Porque você não pula para o lado de cá? A gente podia brincar na beirada do lago.
-- Não posso. Eu receberia o castigo grau dez -- falou demonstrando medo.
-- O que quer dizer castigo grau dez? -- Matias aproximou-se ainda mais da cerca.
-- É o pior castigo de todos -- fez cara de horror -- Nunca ninguém recebeu, mas dizem que é horrível.
-- Poxa. Você já recebeu algum castigo?
-- O grau cinco. Tive que lavar a louça por um mês todinho.
Matias sentou-se no chão com um pacotinho na mão.
-- Amanhã vou trazer uma pedra para eu sentar -- ajeitou-se no chão com as pernas trançadas -- O que você trouxe hoje pra comer?
-- Pão frito e bolinho de chuva -- disse orgulhosa -- Foi minha vô quem fez. E você o que trouxe?
-- Croissant recheado.
-- Croi... O que?
-- Croissant. Come, é uma delicia -- Matias entregou o saquinho para ela -- O que você tem nessa bolsinha?
-- Ah! São roupinhas pra cachorro abandonado. Eu mesma que faço, olha só.
-- Legal!
-- Quando eu crescer serei médica de cachorro -- lembrou-se dos filhotes do galpão -- Você que é feliz, tem uma casa cheia de cachorros.
-- Nós não temos cachorro -- disse admirado com a afirmação da garota.
-- Tem sim. Tem um montão de filhotes dentro daquela casa grande.
Matias olhou para o galpão, depois para Daniela.
-- Sério? Eu não sabia. Vou perguntar para o meu pai. Talvez ele me deixe levar um para São Paulo.
-- Pede um pra mim também. Eu tenho o Pedra, mas quero mais. Mais que um se ele der.
-- Tá bom, eu peço.
Dias depois tentaram matar Daniel. A emboscada armada para ele não foi bem-sucedida. O homem na tocaia ficou morto em seu lugar.
Sérgio Ventura, um amigo muito querido percebeu o que estava acontecendo, reuniu alguns lavradores e em legitima defesa mataram o jagunço.
Luiz Vargas chamou todos os seus empregados e tentou arrancar deles o mandante da tocaia, mas ninguém sabia, ou fingiam não saber.
Todavia, durante a noite de Natal daquele ano, uma tragédia se abateu sobre os Pauly.
-- Meuuu... Que delicia! Frango assado! -- Daniela vibrou de felicidade -- O meu preferido mãe.
-- Mas vamos ter que esperar o vô e a vó chegarem, né mãe? -- Débora disse enquanto ajudava a colocar os pratos e os copos na mesa.
-- É isso mesmo. Eles foram à missa, mas logo estão chegando.
-- Que bom porque estou morrendo de fome -- Daniela falou passando a mão na barriga e rindo.
Na casa dos Vargas.
-- Eu não acredito que você fez isso Anita? Como pôde dar uma ordem dessas aos meus homens sem me consultar antes? -- andava de um lado para outro passava a mão pelo cabelo, chutava os móveis, berrava.
Ao ouvir os berros, Matias se escondeu atrás da porta para ouvir a conversa de Anita e Luiz.
-- Se você não toma uma atitude eu tomo.
-- Sua louca! -- berrou -- Vai nos levar a desgraça. Matar Daniel Pauly vai deixar esse povo enfurecido.
Anita arregalou os olhos.
-- Agora é tarde. Os homens já estão a caminho da propriedade dos Pauly.
-- Não! -- Matias levou suas mãos até o rosto. Sentiu suas próprias lágrimas descerem abundantemente -- Não pode ser... Dani...
Matias saiu correndo naquela triste aflição. Cheio de pavor e conflitos, o garoto embrenhou-se na mata para cortar caminho rumo a seu destino: Salvar a família da sua querida amiga.
Na casa dos Pauly
-- Esse presente é para a minha menina loira. Quem será?
Daniela olhou para Débora e para a mãe chegando à conclusão que só poderia ser ela. Pulou no colo de Daniel, dominada por uma felicidade contagiante.
-- Sou eu pai -- agarrou o embrulho que estava na mão dele e rasgou em segundos -- Uau! A minha boina do Super Mario! Obrigada pai era o meu sonho -- comemorou.
-- Agora para a minha morena rosa. Quem será?
-- Morena rosa é você mana. Pega lá, corre.
-- Eu sei que é pra mim sua enxerida -- Débora pegou o presente e deu um beijo no pai -- Obrigada paizão.
Houve um estrondo repentino e todos se viraram para ver o que era. Dois desconhecidos entraram após arrombarem a porta da residência com violência. Um dos bandidos permaneceu do lado de fora, dando cobertura aos parceiros que entraram no imóvel efetuando vários disparos.
As meninas gritavam e choravam. Daniel as defendia com o próprio corpo.
-- Corram para o quarto -- empurrava a esposa e as filhas -- Tira elas daqui.
Sem muita escolha, Sonia correu arrastando as filhas em direção a outro cômodo da casa.
--PAI, PAIZINHO -- Elas gritavam desesperadas.
Daniel corria de um lado para o outro se defendendo dos tiros. Escondia-se atrás de armários, mesa, de tudo que encontrava pela frente. Porém um tiro que ele não conseguiu evitar feriu-o no ombro e ele caiu de joelhos.
Daniel compreendeu que não era mais possível a fuga. Olhou para o lado e viu o cachorrinho de Daniela morto. Olhou em direção a porta do quarto e viu sua pequena, assustada, encolhida, chorando.
A invasão da casa pelos homens de Luiz Carlos pôs fim à vida de Daniel. O pai de Daniela e Débora ainda tentou reagir, mas caiu morto na frente das filhas e esposa com dois tiros no peito.
Os bandidos só fugiram porque vô Timóteo que chegava com vó Dinda para a ceia disparou alguns tiros para o alto gritando que era a polícia.
Assim que saíram do quarto, mãe e filhas se jogaram sobre o corpo sem vida do bondoso homem.
Impossível descrever a dor que elas sentiam naquele momento.
Daniela pegou o seu cachorro no colo. O corpinho do animalzinho estava coberto de sangue. Apertou ele contra si e beijou sua cabeça. Pedra não existia mais, seu pai não existia mais. O rosto dela ficou coberto pela tristeza.
Seus olhos por alguns instantes se encontraram com os de Matias.
Uma nuvem negra os cobriu e surgiu um abismo intransponível entre eles. Aqueles olhos verdes tristes, temerosos, revoltados e cheios de lágrimas o convenciam disso. Ele ajeitou a camisa por dentro da calça e foi embora. Não disse nada porque estava ainda procurando entender a razão de tudo.
Foi à última vez que Daniela e Matias se encontraram.
"Enquanto o homem continuar a ser destruidor impiedoso dos seres animados dos planos inferiores, não conhecerá a saúde nem a paz. Enquanto os homens massacrarem os animais, eles se matarão uns aos outros. Aquele que semeia a morte e o sofrimento não pode colher a alegria e o amor." Pitágoras.
Se você tiver um animalzinho de estimação e quiser mandar a foto dele para participar da capa de uns dos capítulos do romance, envie nesse whats: 47 91333878. Não se esqueça de colocar o nome do fofinho (a) para participar da história.
Os bichinhos que não saíram nessa capa, sairão na próxima.
Fim do capítulo
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flawer
Em: 10/08/2016
Rapaz...
Estou no veneno aqui com esta Anita!!!!! (carinha pra lá de irritada aqui)
Acabei de me sentar elegantemente de pernas cruzadas, ao meu lado um saquinho de veludo cheio de pedras do tamanho de um ovo, no bolso traseiro de minha saia, um badogue (estilingue pra vcs ai. kkkkkk) Aguardando pacientemente que Anita, a enviada do hades, apareça de novo pra que eu possa lhe estourar a cabeça à badogadas. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
P.s.: Autora, prepara uma ambulância para socorrê-la, se não quiser que tua personagem venha a óbito. kkkkkkkkkkkkkk
Vandinha, amando estória! ah... E a idéia da capa foi perfeita!
Beijinhos lindona
Lekanto
Em: 01/08/2016
Nenhuma criança deveria passar por um trauma desses. E perder tanto o pai quanto o Pedra num mesmo ato violento, acredito que será demais para essa criança.
Estou amando. Louca para ler o próximo.
Fique bem
Resposta do autor:
Olá Lekanto.
Em pensar que a realidade é bem pior, nos causa grande apreensão não é mesmo? Temos exemplos todos os dias na Siria, nos atentados terroristas pelo mundo, enfim, em nossas ruas. É a nossa dura e cruel realidade minha querida. Infelizmente.
Beijos e fique com Deus.
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Pipoca ramos
Em: 01/08/2016
Olá Vandinha que capítulo triste chorrei viu?😣😣😢,anciosa pra saber qual vai a atitude que a Sônia vai tomar em relação ao Luiz,😙😙😙😙
Resposta do autor:
Olá Pipoca.
Triste né. Também achei. Infelizmente histórias como essa da Daniela são mais comum do que imaginamos.
Os Vargas destruiram a familia Pauly, os que ficaram levarão consigo traumas para o resto da vida. Essa é a dura realidade.
Beijão até terça.
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lia-andrade
Em: 01/08/2016
Que triste...tadinha da Dani..
Beijos
Resposta do autor:
Verdade Lia. Muito triste. Bjs.
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wood
Em: 01/08/2016
Triste esse capítulo muita crueldade pra família dos Pauly,tão linda a amizade das crianças quanta inocência também passou pela minha cabeça a reprise do filme o menino do pijama listrado segurei as lágrimas.Até o próximo beijão minha linda!
Resposta do autor:
Olá Wood.
Obrigada pelo comentário. Bjs.
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patty-321
Em: 01/08/2016
Q triste o final. Até onde vai a ganância? Até mandar tirar a vida de pessoas e animais. E o Matias, mesmo inocente, carrega os pecados dos pais. Uma linda famÃlia marcada p violência. Boa semana. Bjs
Resposta do autor:
Obrigada Paty. Bjs.
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Mille
Em: 01/08/2016
Que crueldade tanto do Luiz Viegas e da esposa Anita fiquei aqui com os olhos cheios de lagrimas.
A pequena Dany e o Matias a amizade quebrada pela estupidez da mãe de Matias, espero que isso não possa fazer a loirinha desistir das pessoas.
A cena deles da cerca mim fez lembra do filme O menino do pijama listrado, rir muito do jeitinho deles em trocar alimentos, como um não conhecia achava que era ruim, e quando experimenta acha uma marivilha.
Bjus e até o próximo
Resposta do autor:
Bjs Mille.
Continue comigo. Até.
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