Capítulo 9
Esther
Os meus olhos tremeram, abrindo com certa dificuldade, ainda sentia o meu corpo pesar. Suspirei baixinho, sentindo a minha cabeça latejando. Aos poucos, fui me acostumando com a claridade do ambiente. Demorei um instante para ter noção de onde eu estava. O seu carinho me confortou, quando me deparei com o seu olhar preocupado. Lúcia, beijou a minha testa antes de levantar e ir atender a porta. Me sentia zonza. Desnorteada o suficiente, para não entender o que falaram.
– Esther? – Chamou – Como você está se sentindo, meu amor? – Os seus olhos estavam apreensivos – Sente alguma dor?
Tentei sentar, mas foi uma péssima ideia, gemi baixinho.
– A minha cabeça doí muito! – Falei num fio de voz.
Tia Lúcia foi até o banheiro, trouxe um copo com água, e um comprimido.
– Tome, vai aliviar a dor… – Ofereceu, sentando-se ao meu lado.
– Obrigada. – Devolvi o copo, voltando a fechar os meus olhos.
Respirei fundo, deixando o meu corpo relaxar em seu colo. Estava quase dormindo, quando ouvi a voz de Mia, chamando. Voltei a sentir aquela sensação ruim, angustiante. Os meus olhos arderam novamente e um nó se formou em minha garganta.
– Por favor… – Pedi, minha voz embargou.
– Está tudo bem, amor! – Confortou-me – Apenas, tente dormir um pouco. – Beijou a minha testa, saindo do abraço.
Forcei para manter os meus olhos fechados, mas eles me traíram. Olhei em direção a porta, e encontrei rapidamente com o olhar preocupado de Mia. Levei a mão ao peito, senti opressão. O meu peito doía de um jeito, que eu só senti quando a minha mãe morreu. Foi apenas um instante, antes da porta voltar a fechar, e eu, ser acolhida novamente em um abraço protetor.
***
Amélia
– Esther… – Manuela respondeu, com o cenho preocupado.
Não esperei ela terminar de dizer o que houve, sai pela porta, buscando por Esther.
“Meu Deus! O que houve?”. Senti uma angustia tomando conta do meu ser, fui em direção ao quarto de mamãe, ouvindo Manuela dizer que ela havia sido levada para lá. Alcancei a maçaneta, tentando abrir a porta. Estava trancada. Bati suavemente na porta, chamando.
– Mãe? – Suspirei impaciente, aguardando resposta.
“Ela nunca tranca essa porta!”. Insisti, até que finalmente, a minha mãe entreabriu a porta.
– O que aconteceu com Esther? – Falei agitada, tentando entrar, mas fui impedida.
Mamãe, abriu a porta o suficiente para sair, e nesse momento, encontrei rapidamente com o olhar de Esther.
– O que houve com ela? – Insisti nervosa.
– Calma, filha! – Tocou o meu rosto – Ela só está com uma enxaqueca. – Tentou me tranquilizar – Deve ser por conta da pizza…
– Eu quero vê-la! – Tentei avançar, porém, fui repelida.
– Amélia, escute! – Segurou-me pelos ombros – Ela vai ficar bem! – Me fez encará-la – Já mediquei ela, daqui a pouco, o remédio fará efeito! – Assegurou.
– Mas, eu quero vê-la! – Pedi, sentindo um aperto forte no peito.
– Mia, por favor… – Suavizou a voz – Ela ficara bem, confie! – Acariciava o meu rosto – Esther, precisa de silêncio e dormir um pouco, que acordara melhor!
Engoli seco, ficando cabisbaixa, concordando. Minha mãe olhou para as meninas, logo atrás de mim.
– Bom dia, meninas! – Mamãe falou animada – Dormiram bem? – Sorriu.
– Sim! – Responderam.
– Que bom! Eu não sei vocês, mas acordei com apetite! Preparei um café da manhã bem reforçado para nós! Fiz rabanada! – Piscou para Manuela.
– Oba! – Manuela, ampliou o sorriso – Achei que só fosse comer no natal! – Comentou satisfeita.
– Falta poucos dias, então, por que não antecipar? – Sorriu em cumplicidade – Filha? – Chamou – Você pode acompanhar as meninas? – Pediu – Eu gostaria de ficar atenta, caso Esther, precise de algo.
Suspirei concordando. Recebi um beijo na testa, antes dela retornar para o quarto. Toquei a porta, e por mais que mamãe dissesse que ficaria tudo bem, o incomodo que eu sentia, não passava. Dani aproximou, tocando suavemente o meu braço. Respirei fundo, acompanhando elas para o desjejum.
***
Esther
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“Caminhei devagar pela margem de um riacho, sem direção, apenas sentindo a brisa suave. Não muito longe, avistei uma criança. Aproximei, e ela estava brincando na beirada, molhando os pezinhos. Presentou-me com um sorriso sapeca, chamando-me para perto. Agachei ao seu lado, e ela me entregou uma florzinha, beijando em seguida, o meu rosto. Sorrimos. Ela possuía olhos; castanho escuro, assim com os seus cabelos. Tinha um jeito sapeca que me fazia lembrar alguém. O seu rosto estava sujo de terra, limpei, e ela apontou para o outro lado do riacho. O céu havia ficado escuro, e as flores do campo, sofriam com a corrente forte de vento. Do outro lado pude ver, uma menininha de cabelos claros; sentada, próxima a beirada, parecia chorar. Procurei uma maneira de atravessar aquele riacho, uma sensação de querer protegê-la, se fez gritante. Olhei para onde eu havia vindo, tinha uma pequena ponte. Peguei a mãozinha da moreninha, que só sorria. Quando estávamos atravessando, ouvi um grito. Procurei para ver de onde vinha, senti a mão menor; puxando-me, apontando para outra direção. Uma onda gigante cobria todo o percurso do riacho, notei alguém na água. Mia!”
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Despertei no susto, o meu coração parecia querer sair pela boca, fui envolvida por um abraço protetor.
– Psiu… Calma, meu amor! – Acariciava as minhas costas – Respira fundo! Foi apenas um pesadelo! – Beijou a minha testa.
– Foi tão real… – Murmurei assustada.
Fiquei em seu colo, até me acalmar. Suspirei baixinho com o meu rosto em seu pescoço, relaxando com os seus carinhos. Um sentimento nostálgico, me fez recordar do colo de minha mãe.
– Você está menos quente! A febre abaixou… – Pausa – Você precisa comer algo, meu anjo.
Indicou uma bandeja com desjejum, incentivando-me a comer. Aceitei, mas estava sem apetite. Tia Lúcia, me acompanhava, comemos em silêncio. Na verdade, o silêncio era o que reinava no restante da casa, ela percebeu e comentou que, as meninas, haviam saído para não perturbar o meu descanso.
– Mia? – Falei receosa.
– Foi difícil despachá-la! – Sorriu ternamente – Queria arrombar a porta para vê-la! – Brincou.
Silêncio.
– Ela e Dani… – Minha voz falhou.
– O quê? – Arqueou suavemente a sobrancelha.
“Será que foi parte do pesadelo?!”. Questionei, incomodada. Engoli seco, encarando os seus olhos… castanho escuro. Desviei o olhar, agitada.
– Ei, calma! – Segurou a minha mão – Quer me dizer alguma coisa? – Incentivou.
Beberiquei o suco, antes de responder.
– Tive um pesadelo com Mia… – Fugi de seu olhar.
– Quer contar? – Falou suavemente.
– Não… – Falei num fio de voz.
Terminamos o desjejum, eu ainda evitava encarar o seu olhar. Ela retirou a bandeja, colocando-a num criado-mudo. Ligou a TV, e fechou as cortinas. Deitou-se e me puxou para o seu colo, buscando por algum filme.
– Estava com saudades de passar um tempo com a minha caçulinha! – Beijou a minha testa.
Relaxei em seus braços.
***
Amélia
Após o desjejum, levei uma bandeja para minha mãe e Esther, afim de vê-la, o que novamente, fui impedida. Mamãe, convenceu as meninas, que eu precisava de ar fresco, assim ela poderia cuidar de Esther, sem mais interrupções. Muito contrariedade, eu cedi, e viemos para pracinha que ficava próxima da minha casa. Dani e eu, estávamos sentadas no banco, vendo as crianças brincarem.
– Ela ficara bem, Mia! – Dani comentou.
Encostei as minhas costas no banco, Dani tocou a minha mão.
– A sua mãe disse que foi indisposição. – Tentou tranquilizar-me – Daqui a pouco, ela estará brigando com você! – Sorriu.
– É morena, desfaz essa carranca! – Manu, falou, sentada no balanço – Já está assustando as criancinhas! – Indicou as crianças que nos olhavam – Aliás, até eu estou ficando com medo! – Fez careta e correu assustada, até as crianças que fugiram.
“No fundo, será sempre, uma eterna criança!”. Sorri, vendo a interação de Manuela com as crianças.
– Mia… – Chamou.
Encontrei o seu olhar, estava sem graça. Sabia que o queria dizer.
– Por favor, Dani! Agora não… – Pedi, ficou tristonha – Olhe para mim… – Toquei o seu queixo.
– Desculpa… Eu sei que está preocupada… – Interrompi.
– Estou sim! Esther, não é de ficar doente! – Falei sincera – E sobre o que aconteceu… – Acariciei o seu rosto – Foi maravilhoso!
Sorri contida, enquanto a loira corou.
– E eu, quero repetir! – Sorri suavemente.
– Eu também… – Falou tímida, cobrindo a minha mão com a sua.
Fechou os olhos, curtindo o meu carinho.
– Desculpe… – Encarou-me – É que, enquanto eu não vê-la, para saber se está bem, não consigo pensar em outra coisa.
– Eu sei! – Falou compreensiva – Precisamos conversar a respeito…
Aproximei, beijando o seu rosto com carinho.
– Iremos! – Falei decidida – Não desejo que nada estrague a nossa amizade! – Encarei aqueles olhos azuis – Você é muito importante para mim!
– Idem! – Sorrimos.
Manuela aproximou, apontando para o sorveteiro que passava.
– Alguma de vocês, têm dinheiro? – Pediu.
– Você não tem jeito! – Dani criticou, brincalhona.
***
Esther
Há muito tempo, eu já não prestava atenção no filme, a minha mente estava voltada para os últimos meses. Tentei descobrir há quanto tempo, Mia, deveria estar sendo assediada por Bruna. E aproximação repentina com Daniele. Pensei em suas constantes mudanças de humor, e como o envolvimento delas, poderia estar sendo refletido nisso. Recordei do que a loira me falou.
– Não deixe a escuridão invadir a sua mente. Não confunda, o mau caráter dessa garota, pela sua orientação sexu*l*! São coisas totalmente distintas!
Divaguei, acariciando o meu pingente.
– Assim, vai tirar toda a cor dele… – Sorriu – A sua mãe, o adorava! – Olhou carinhosa.
Sorri, era bom falar dela. Olhei para aquele pequeno objeto prateado, em formato de coração. Estava um pouco desbotado, mas, eu não me importava.
– É a única coisa dela, que gosto de carregar! – Toquei com carinho.
Lúcia, sorriu discretamente e acendeu o abajur. Pegou o pingente, piscando para mim, antes de usar a ponta da unha para pressionar; o que parecia ser uma trinca, mas na verdade, era uma abertura para o seu interior.
– Eu não sabia que ele abria! – Falei surpresa, sorri.
– Quase ninguém sabe, é um segredo! – Confidenciou.
Havia uma pequena descrição em seu interior. Não compreendi, mas Lúcia falou em um francês perfeito.
– “Vous êtes ma lumière!” – Sorriu – Você é minha luz! – Olhou nostálgica.
Sorri emocionada.
– Agora, eu entendo, porque ela o amava tanto ele! – Refleti – Mas, por que o papai não me disse? – Sussurrei pensativa.
– Dizer, o quê? – Olhou curiosa.
– Que ele abria! – Sorri, acariciando o seu interior – Afinal, foi o amor da vida dela, que o deu!
Tia Lúcia me olhou um instante, sorrindo em seguida.
– Ele deve ter esquecido, meu anjo! – Beijou a minha testa, acolhendo-me novamente.
Fiquei tão feliz com aquela nova descoberta sobre a minha mãe, que esqueci os meus medos por hora.
***
Amélia
– Nossa, Manuela! – Suspirei – Você conseguiu se lambuzar mais que aquelas crianças! – Reclamei.
– Sinal que ele estava muito bom! – Sorriu com travessura, lavando as mãos.
Daniele, jogava um pouco de água em suas mãos para limpá-las, havíamos comprado uma garrafinha e um sorvete para Manu.
– Vocês já pensaram na festinha de aniversário de Esther? – Manu, perguntou, secando as mãos em suas roupas.
– Pra variar, a metida da Beatriz, já planejou a festa! – Resmunguei.
– Mas, éramos nós, que iríamos preparar! – Manu, reclamou.
– Para você ver, que até nisso, a megera se mete! – Comentei, displicente – Fernando, vai apresentar a namorada dele para elas. – Sentamos.
Manu, levantou de supetão, entusiasmada.
– Uau! Sinal de casamento! – Falou com euforia contida.
– O quê? – Assustei com a possibilidade.
– Lógico! – Sorriu – Por que mais ele iria levar a coitada para o abate? – Levantou as sobrancelhas – Encarar mãe e filha?! – Gesticulou – Acorda, morena! – Colocando as mãos na cintura.
– Hmm… – Estreitei os olhos, pensativa.
– Pense no lado bom! – Sorriu – A megera ficara tão entretida em atormentar a nora, que vai esquecer da nossa estrelinha! – Falou com inocência.
– Tomara! – Franzi a testa.
Suspirei, pressionando as minhas mandíbulas.
– Meninas, vamos? – Dani sugeriu – O sol está quente demais! – Estendendo a mão para mim, aceitei.
Trocamos olhares, ela sabia, que eu estava cansada de esperar. Assim que chegamos, fui direto pro quarto de mamãe para saber de Esther. As meninas me seguiram. Bati suavemente na porta, esperando resposta. Esther, abriu. Não soube identificar a sua expressão.
– Oi! – Dissemos juntas – Você melhorou? – Falei preocupada.
Ela olhou para as meninas, puxando-me para um abraço apertado.
“Mesmo quando tudo parece desabar, cabe a mim decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar; porque descobri, no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir.”
Cora Coralina
Continua….
Fim do capítulo
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Ana_Clara
Em: 10/12/2015
Ah, eu esqueci de dizer que acho muito suspeita a amizade da tia Lucia com a mãe da Esther. Pra mim as duas eram apaixonadas e na verdade o grande amor da mãe da Estherzinha era a Lúcia. Muito improvável essa minha ideia? Kkkkk
Resposta do autor em 10/12/2015:
kkkkkkkk digo nada, vai lendo xD
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