Confronto Inesperado
Era sexta-feira, e o clima no bar estava descontraído. O som das conversas altas e risadas preencheu o ambiente, enquanto Bianca e seus colegas de trabalho relaxavam após uma semana intensa. Lucas estava, como sempre, ao lado de Bianca, sorrindo, rindo de suas piadas e encontrando pequenas desculpas para tocá-la, ainda que de maneira sutil.
Bianca, em sua naturalidade, apreciava a companhia de todos. Ela gostava do ambiente animado, das conversas fáceis e da leveza do momento. Lucas se esforçava para ser sempre o mais atencioso possível, preenchendo o espaço ao lado dela como se aquele fosse o seu lugar. Ele continuava com pequenas investidas — sorrisos prolongados, um toque no ombro, olhares mais intensos. Mas, para Bianca, era apenas Lucas sendo... Lucas.
— Você parece estar se divertindo — disse ele, inclinando-se mais próximo dela quando uma música começou a tocar mais alto no bar. — Hoje não rolou de sair só nós dois, mas temos que combinar, aposto que teria ainda mais diversão.
Bianca sorriu de novo, sem perceber a intenção velada. — Sim, quem sabe um dia. Mas eu gosto da turma toda junta, sabe?
Lucas suspirou, não era a resposta que ele queria. Ele sabia que precisava de algo mais para quebrar aquela barreira de amizade que Bianca inconscientemente erguia. Então, quando ela se virou para conversar com outro colega, Lucas aproveitou o momento para envolvê-la em um abraço amigável, mas firme o suficiente para ser notado.
— Ei, você é incrível, sabia? — sussurrou ele, ainda com os braços ao redor dela.
O que Lucas não sabia era que Fernanda estava a caminho. Decidira fazer uma surpresa para Bianca, algo que raramente fazia, fazer algo que sua amada sempre quis, apresentá-la a todos os seus amigos.
Chegou em tempo de ver a cena.
Fernanda sentiu o corpo enrijecer, os olhos ficando fixos no modo como Lucas abraçava Bianca, e uma onda de raiva subiu por sua espinha.
Fernanda entrou no bar com passos rápidos e decididos, seus olhos fixos nas mãos de Lucas. Ela não permitiria que ninguém ultrapassasse a linha com Bianca — e muito menos da maneira como Lucas estava fazendo. Sem hesitar, Fernanda se aproximou deles, e quando Lucas ainda estava de braços ao redor de Bianca, ela o afastou com um empurrão forte.
— O que você pensa que está fazendo? — A voz de Fernanda saiu grave, carregada de uma raiva controlada, mas claramente perceptível.
Lucas, surpreso e confuso, cambaleou para trás, olhando para Fernanda com descrença. — Quem você pensa que é pra chegar assim?
Bianca, por outro lado, ficou paralisada, sem saber como reagir àquela explosão repentina. Fernanda nunca agiu dessa forma com ela — agressiva, tão cheia de possessividade. Era como se a mulher que ela conhecia tivesse desaparecido por um momento, e o olhar intenso que Fernanda lançava para Lucas a assustou.
— Sou a namorada dela — Fernanda respondeu com um tom gélido, sem tirar os olhos de Lucas. — E você está muito perto do que não te pertence.
O bar inteiro pareceu congelar naquele instante. A tensão entre os três era palpável, e Bianca se viu no meio de um confronto que nunca imaginou acontecer. Lucas, sentiu sua raiva crescer. Não estava acostumado a ser desafiado daquela forma.
— Bianca pode falar por si mesma, não acha? — Lucas retrucou, cruzando os braços sussurrou para Fernanda — Ela não reclamou em nenhum momento, ela gosta.
Quando Fernanda iria partir pra cima de Lucas...
Bianca, sentindo o calor subir ao rosto, finalmente se colocou entre os dois, tentando acalmar a situação. — Gente, calma! O que está acontecendo?
— O que está acontecendo é que esse cara aqui acha que pode te tratar como se fosse um brinquedo dele — Fernanda disparou, ainda sem tirar os olhos de Lucas. — E eu não vou permitir isso.
Bianca ficou atordoada com a agressividade de Fernanda. Nunca a tinha visto reagir assim, e aquilo a deixou desconfortável. Ela puxou o braço de Fernanda, tentando afastá-la da confusão.
— Fernanda, para com isso. Não é nada demais... Lucas é só um amigo!
— Amigo? — Fernanda riu sem humor, olhando diretamente para Lucas. — Isso que ele está fazendo não é coisa de amigo. E você é ingênua demais pra ver o que ele realmente quer.
O clima estava tão tenso que parecia que qualquer palavra poderia desencadear algo ainda pior. Lucas deu um passo à frente, encarando Fernanda com olhos cheios de raiva agora.
— Você acha que porque é namorada dela, pode tratar todo mundo como lixo?
Fernanda o encarou, os punhos cerrados, mas antes que pudesse responder, Bianca, que já estava à beira das lágrimas, interrompeu:
— Chega! — Sua voz saiu alta, cortando o barulho ao redor. — Eu não aguento mais isso. Vamos embora, Fernanda. Agora!
Fernanda olhou para Bianca, vendo o desconforto nos olhos da mulher que amava. A raiva dentro dela começou a ceder, mas o olhar para Lucas permaneceu carregado de ameaça. Ela sabia que aquele assunto não tinha acabado, mas naquele momento, sair dali era o melhor a fazer.
Sem mais uma palavra, Fernanda tomou a mão de Bianca e a guiou para fora do bar, deixando Lucas para trás, ainda com o coração cheio de raiva e uma sensação de impotência que ele não aceitaria tão facilmente.
______
O caminho de volta para casa foi silencioso. O som abafado dos pneus no asfalto parecia ressoar no silêncio tenso entre as duas. Bianca olhava pela janela, as mãos inquietas em seu colo, enquanto Fernanda, concentrada na estrada, sentia um peso crescente no peito. A raiva que havia sentido no bar ainda queimava sob a superfície, mas agora, ela era consumida por uma preocupação maior — o estado de Bianca. O silêncio da namorada era mais doloroso que qualquer discussão. Algo estava profundamente errado.
Assim que entraram no apartamento, Bianca foi direto para o quarto, sem trocar uma palavra. Fernanda fechou a porta atrás de si, respirando fundo antes de segui-la. Ela sabia que tinha passado dos limites, que sua agressividade tinha assustado Bianca, e isso a corroía por dentro.
— Amor... — chamou Fernanda suavemente, ao entrar no quarto. Ela encontrou a namorada sentada na beira da cama, de cabeça baixa, mexendo nervosamente nas mãos.
Bianca não respondeu. Fernanda se aproximou lentamente, sentando-se ao lado dela, mas mantendo uma distância que parecia necessária naquele momento. O silêncio entre elas era quase insuportável.
— Eu... eu não queria te assustar — disse Fernanda, a voz mais suave e vulnerável do que ela gostaria. — Só que quando eu vi ele te abraçando daquele jeito... Não consegui me controlar.
Bianca continuava em silêncio, o rosto virado para longe. Fernanda estendeu a mão, tentando tocar o ombro dela, mas Bianca se encolheu ligeiramente. O pequeno movimento foi como uma faca cravada no coração de Fernanda. Ela jamais imaginou que a mulher que amava pudesse ter medo dela. O choque de perceber isso era tão profundo que fez sua respiração falhar por um momento.
— Você... está com medo de mim? — perguntou Fernanda, quase num sussurro, seus olhos fixos no perfil de Bianca.
Bianca fechou os olhos com força, como se as palavras de Fernanda a atingissem com força. Quando finalmente falou, sua voz era baixa e trêmula:
— Eu não... eu não te reconheci lá no bar, Fernanda. Nunca te vi agir assim. Você estava... diferente, tão agressiva. Parecia outra pessoa.
Fernanda sentiu o coração apertar. O peso do que ela era, do que fazia, sempre foi algo que ela carregava sozinha. Mas agora, ver como isso impactava Bianca — mesmo sem ela saber a verdade sobre suas "viagens" — era devastador. O que mais a aterrorizava era a possibilidade de perder Bianca por causa desse lado sombrio.
—Eu sou... complicada — começou Fernanda, tentando encontrar as palavras certas. — Tenho coisas que carrego comigo, coisas do meu passado. Eu sei que essa raiva que você viu hoje foi demais, mas... isso é só porque eu te amo tanto que o pensamento de te perder me faz perder o controle.
Bianca piscou, surpresa com a vulnerabilidade de Fernanda. Era raro vê-la falar de seus sentimentos dessa forma, e isso a desarmou um pouco.
— Você nunca me falou sobre essas "coisas" — disse Bianca, ainda com a voz baixa. — Se eu soubesse o que se passa com você... Talvez eu pudesse entender melhor. Talvez isso não tivesse acontecido hoje.
Fernanda olhou para o chão, lutando contra o desejo de contar tudo. Queria desesperadamente que Bianca soubesse que ela faria qualquer coisa para mantê-la segura, mas o que aconteceria se ela soubesse o que Fernanda realmente era? Que ela tinha prazer em matar, mesmo que criminosos, Bianca entenderia?
— Eu não sei se consigo te contar tudo — admitiu Fernanda, a voz carregada de sinceridade. — Mas o que eu sei, com toda a certeza, é que eu não quero te perder. Nunca.
Bianca suspirou, o coração ainda confuso, mas a sinceridade nos olhos de Fernanda mexia com ela. Talvez houvesse mais para descobrir, mais para entender. E, apesar de todo o medo e confusão, ela sabia que ainda a amava.
—Eu te amo
—Eu te amo mais.
Fim do capítulo
Comentar este capítulo:
Sem comentários
Deixe seu comentário sobre a capitulo usando seu Facebook: