Dentro do Uber eu tentava descobrir qual erro eu havia cometido para ter sido encontrada dessa vez. Nos últimos quatro anos eu havia tomado cuidado, não usava redes sociais, não tirava fotos,não ia a eventos onde poderia ser filmada ou aparecer em fotos de jornais ou revistas. E o principal ,não tinha  relacionamentos que durassem mais que uma noite.Ela saciava os desejos do meu corpo ,mas não permitia que nenhuma mulher entrasse ou permanecesse na minha vida. As pessoas sequer sabiam que eu era Fernanda Maia, a dona da Black Night.A administrei das sombras, cuidando da burocracia no escritório do meu apartamento e fazendo Sávio ser o rosto da boate quando necessário. Era ele quem comparecia aos eventos para os quais eu era convidada, inclusive foi ele quem recebeu o prêmio Destaque do ano , que ganhei do comitê de turismo e entretenimento da cidade, graças á minha parceria com alguns hotéis. Apesar da minha perseguidora conhecer seu rosto ,ela desconhecia seu nome e ele havia mudado muito fisicamente nos últimos anos. Fui ingênua e me deixei levar pela falsa sensação de segurança que adquiri por ter um nome novo, em uma cidade nova  e um país novo. Infelizmente esse fosse sonho terminou e agora eu precisava mais uma vez deixar de existir .Pedi ao Uber para me deixar  algumas ruas antes da minha casa. Observei por um tempo para ver se havia alguma movimentação estranha,em seguida segui para meu apartamento. Ao colocar as chaves na porta notei que estava aberta, por alguns instantes relutei em entrar ,ela poderia estar lá dentro a minha espera, pensei um pouco ,me enchi de coragem e entrei. Meu  coração estava acelerado e minhas mãos trêmulas, caminhei devagar pelos cômodos até chegar ao meu quarto .A porta estava entreaberta e dava para ver que parte das minhas roupas  estavam  sobre a cama e haviam algumas roupas dentro  de uma grande mala. Respirei fundo e abri a porta. Senti meu sangue voltar a circular ao ver o rosto preocupado de Sávio.
-Sabrina!!!Graças aos deuses!!!Eu estava morto  de preocupação!
-Estou bem...Fiquei um tempo observando antes de entrar .
-Eu fiquei apavorado quando a vi.
-Ela te viu?
-Assim que a reconheci eu me escondi e liguei para você! Depois pedi ao Henrique para me cobrir e vim fazer nossas malas. Resolveremos o fechamento da boate depois.Eu já até escolhi nossa casa nova.  Tenho certeza que ela não vai mais nos encontrar.
-Dessa vez eu irei sozinha! Esse é o meu fardo! Não é justo continuar te arrastando comigo!
-Aquele dia no hospital eu jurei que estaria ao seu lado até o fim de nossas vidas. Onde você for ,eu irei!
-Por favor ,amigo! Preciso que fique e cuide da Black Night!Ela é o meu sonho! Meu único legado! E você é minha única familia.Preciso saber que ambos continuam bem e progredindo. Só assim terei forças pra recomeçar mais uma vez.
-Sabrina...eu não sei se consigo...
-Por favor...
-E se você precisar de mim?Ou se sentir sozinha? E se ela te encontrar de novo?...
-Vou ficar bem!Acredite!
-Está bem...mas me prometa! Se ficar difícil demais ou se mudar de idéia ,me ligue!Eu irei até você! Não importa onde você esteja! Promete que vai me ligar?
-Prometo!
-Aqui estão as informações da cidade ,localização, melhores rotas. E nessa bolsa estão seus novos documentos e a escritura da casa.
-Como conseguiu tudo isso tão rápido?
-Esse plano está pronto desde a inauguração da boate.Eu queria estar preparado então passei um tempo procurando novos lugares e montando um plano de ação. A cidade nova viola uma de nossas regras, mas analisei a região ,observei os prós e contras e cheguei a conclusão que é seguro se mudar pra lá. Já transferi o dinheiro das contas antigas para as novas e continuarei depositando os lucros da boate a cada três meses. Espero que você possa viver bem e confortavelmente. Quem sabe possa até ser feliz.
-A Felicidade nunca vai ser algo que pertença a mim... Obrigada por sempre cuidar de mim.
-Vou sentir tanto a sua falta...
-Também sentirei a sua. Adeus meu amigo!
-Até breve! Nunca te direi adeus.
Meu coração estava apertadinho durante aquele abraço de despedida. Saber que ele não estaria ao meu lado fazia o caminho a frente parecer ainda mais assustador,porém,eu precisava ir adiante...Depois de me despedir de Sávio entrei no carro e deixei a  quente e agitada Salvador que foi meu lar naqueles dois anos. A cidade escolhida por Sávio foi Imperatriz do Sul ,que ficava no sul do estado do Paraná. Ele escolheu essa cidade pois as imagens de do lago me encantaram o bastante para inspirar e dar a minha  boate o mesmo nome, Black Night.De acordo com as informações sobre a cidade,eu levaria aproximadamente dois dias. De avião eu levaria apenas algumas horas, porém ,essa era uma das regras que estabeleci para mim mesma .Jamais  utilizar meios de transporte que exigisse identificação. Não ficar em lugares onde meu rosto poderia ser pego em câmeras de segurança. Permanecer sempre em grandes cidades onde eu pudesse me misturar facilmente na multidão. Era a  primeira vez que eu violava uma das minhas regras, A cidade para onde eu estava indo ,era pequena com bem poucos moradores.
A viagem foi longa o bastante para eu me sentir como se estivesse indo para o outro lado do mundo ,em foram exatas quarenta e duas horas dirigindo , parando apenas para dormir e tomar café, muito café. Ao entrar na cidade logo comecei a duvidar se era o melhor lugar para eu me esconder, as pessoas dali , demonstravam uma grande curiosidade com minha presença, quando parei para pedir informações sobre a localização da casa.
-Bom dia,me desculpe o incomodo ,mas estou um pouco perdida, será que você poderia me dizer onde fica esse endereço?
-Claro! Qual o nome da rua?
-Esse é o problema, aqui só diz casa 21 ,Lago dos Pinheiros.
-Ah!Esse lugar fica um pouco afastado da cidade ,por isso não tem o nome da rua. Pra chegar lá você deve seguir por essa rua ,virar na rua á direita, seguir por ela até ver um casarão. Quando chegar ao casarão você deve entrar na rua de paralelepípedos ao lado dele e seguir por um quilometro. A casa que procura se não me engano é a ultima da estrada.
-Obrigada!
-Nós entregamos á domicílio se a senhora precisar de alguma coisa.
-Certo! Mais uma vez obrigada! 
Sávio definitivamente conseguiu encontrar o lugar mais escondido que da face da terra.Dirigi por meia hora antes de finalmente encontrar a casa que estava escondida entre as arvores e de costas para o lago o.Me sentia cansada e um pouco irritada pois acreditava que encontraria a casa ainda sem luz e água portanto não conseguiria tomar um bom banho quente, no entanto, ao entrar na casa ,me surpreendi ,tirando a poeira que se acumulou por estar fechada, Sávio a mantinha mobiliada completamente funcional. Caminhei vasculhando os cômodos e a irritação foi desaparecendo. A cara era pequena, prática e aconchegante ,perfeita pra mim.E a vista do lago nos fundos da casa me causava a sensação de paz e serenidade. Depois de efetuar uma  limpeza básica nos lugares essenciais, fiz um sanduiche ,me sentei em uma cadeira e fiquei admirando as aguas tranquilas até anoitecer. Quando estava prestes a entrar ,notei uma luz distante que parecia vir do outro lado do lago, na direção da estrada que ia para a montanha. Confesso que fiquei um pouco curiosa ,quem será que morava lá? Tirei os lençóis que cobriam a cama e me deitei. O cansaço logo me pegou e eu adormeci.
Na manhã seguinte peguei o carro e fui até a cidade para comprar lençóis ,panelas e outros utensílios de casa. Depois de dias vivendo de sanduiches, decidi que iria me fazer um agrado e almoçar em um dos restaurantes do centro comercial, infelizmente era alta temporada de turismo e os todos os restaurantes estavam lotados.Caminhava de volta para minha casa quando uma mulher aparentando ter aproximadamente oitenta anos esbarrou em mim.Ela parecia estar  confusa, falava comigo como se nos conhecêssemos a muito tempo, ela  procurava por um lugar chamado Del Luna, que ninguém parecia conhecer. A única solução possível era  encaminhar a senhora até a delegacia local , o que não me agradava afinal,eu precisava me manter fora do radar porém aquela senhora segurava tão firme a minha mão que não pude abandona la ,enquanto levava ela ate o meu carro ,um garoto que passava reconheceu e disse   conhecer também o lugar onde ela morava .Peguei o carro coloquei a senhora e o garoto dentro e comecei a dirigir pelas ruas seguindo as orientações dele. Fiquei um pouco assustada quando começamos a nos distanciar da cidade, porém ,a paisagem ao nosso redor logo me distraiu e eu passei a curtir o passeio. Meia hora depois o garoto pediu que eu  entrasse em uma estrada de  chão. A senhora que até então estava em silêncio ,começou a se animar dizendo que finalmente  estava chegando em casa. A essa altura eu já estava achando que tanto o garoto quanto ela estavam loucos pois não parecia ter nada ali, mas me surpreendi ao ver uma linda e  grande casa surgir escondida no fundo de um bosque. Paramos o carro na entrada e descemos, a senhora pegou minha mão e foi me arrastando para dentro da casa. Ia pedir ao garoto para esperar ,mas quando olhei ele havia sumido. E isso era um grande problema eu tinha que encontrá lo ,no entanto ,naquele momento eu tinha que primeiro "entregar "a senhora para seus familiares.
 A casa por fora era pintada em tons pasteis que faziam ou s acabamentos em madeira envernizada se destacarem. A sala era ampla com paredes claras, o chão era de madeira escura e estava devidamente restaurado e encerado, achei verdadeiramente bonito. Os móveis estavam cobertos por lençóis ou ainda embalados  no canto da sala. Seguimos até a cozinha e foi lá que eu a conheci. Em cima de uma escada passando o que parecia ser verniz em armário de madeira ,estava uma mulher loira ,que deveria ter a minha altura, vestindo roupas surradas e sujas de tinta, que não ofuscavam sua beleza estonteante, principalmente seus olhos, que eram em um tom âmbar inesquecível.

Fim do capítulo