Capitulo 14
Lívia Duarte
Aquilo não podia estar acontecendo. Tinha acabado de me reconciliar com o meu pai. Ele não podia ter morrido. Era só o que eu pensava durante o seu velório. Porque você fez isso, voltou pra minha vida só para depois ir embora de novo. Segurei na mão de Kimi, que estava ao meu lado.
- Não sei se vou aguentar. - Comentei para que somente ela escutasse.
- Se quiser podemos sair daqui. - Pensei nessa possibilidade, mas não podia deixar Gabriel e Gabi.
- Não posso deixá-los sozinhos. Eles precisam de mim. - Meus irmãos estavam com suas cabecinhas baixas e olhavam para nosso pai deitado no caixão.
- Tem razão. Eles precisam de nós. - Kimi fez algo que me surpreendeu, ela foi até os meus irmãos e começou a conversar com eles. Depois de observar um pouco a interação dos três, resolvi me juntar a eles.
Me aproximei e abracei Gabriel que estava mais calado. Enquanto a Gabi estava sentada no colo de Kimi e conversava com ela sobre desenhos e princesas.
- Porque o papi não acorda? Ele já dormiu muito. Quero brincar com ele. - Gabriel me surpreendeu com a sua pergunta. Era evidente que ele não entendia o que estava acontecendo. Não sabia o que falar, fiquei sem palavras.
- Porque a mamãe está chorando? - Ele continuou a fazer perguntas. Não tinha a menor noção de como lhe contar que nosso pai tinha morrido. Nem sei se ele sabia o que era morrer. Acariciei seus cabelos escuros e beijei seu rosto.
- O seu papai precisou dormir meu amor, ele me disse que estava com muita dor. A sua mãe está chorando porque ela sente falta do seu Papai. - Kimi foi quem respondeu. Gabriel olhou fixamente para o caixão e disse.
- A mamãe precisa de um abraço. - Ele correu até onde Clara estava e lhe abraçou. Ela o acolheu em seus braços enquanto ele secava suas lágrimas com as suas mãozinhas.
- Obrigada, eu não sabia o que falar. - Agradeci a Kimi.
- Sei que está sofrendo tanto quanto eles, vem cá. - Kimi me puxou para um abraço e senti o corpinho quente da minha irmãzinha se juntar ao nosso abraço. Tudo podia estar desmoronando, mas sabia que sempre teria Kimi ao meu lado.
Kimi disse que precisava falar com Clara e se afastou por alguns minutos, fiquei com minha mãe e Roberto que estavam lá desde o início da cerimônia fúnebre.
- Lívia, preciso conversar com você. - Lucas se aproximou e estendeu a mão para que eu fosse com ele.
- Não pode ser depois? - Falei.
- Não, precisa ser agora. - Minha mãe me olhou desaprovando a atitude dele. Não queria mais confusões por isso aceitei falar com Lucas.
- Tudo bem. - Disse para minha mãe que logo voltaria e fui com Lucas para o lado de fora da igreja. O que será que ele tinha pra mim dizer que não podia esperar o velório terminar.
- O que a Yana tá fazendo aqui? - Aquela com certeza era a última pergunta que eu esperava ouvir.
- Ela é minha melhor amiga.
- Vi vocês abraçadas. Não precisa mentir pra mim. Sei que você está escondendo alguma coisa de mim. - Ele só podia estar louco.
- Você perdeu o juízo Lucas. Vai ter uma crise de ciúmes logo agora. - Falei chateada e não acreditando no que tinha acabado de ouvir.
- Não estou com ciúmes, só não gosto de ser feito de trouxa.
- Olha, eu não quero conversar agora. Será que você não entende que é um momento difícil pra mim.
- Entendo e é por isso que vim prestar meu apoio. Mas quando cheguei vi você nos braços da Yana. - Ele estava tão cego de ciúmes que enxergava o que queria e não percebia que o que eu tinha com a Kimi era uma amizade muito profunda e nada mais.
- De verdade, não vou perder meu tempo te dando satisfação. Acredita no que você quiser. Se me der licença, vou entrar. - Passei por ele sem nem virar o rosto para lhe olhar.
- Se você entrar estará tudo terminado entre a gente. - Que idiota, como pude achar que gostava dele. Não me virei, apenas voltei para o lado da minha mãe e Kimi já estava lá me esperando. Seu olhar estava desconfiado, as vezes me assombrava o fato dela me conhecer mais do que eu mesma me conhecia.
Yana Kimi
Depois do Velório fui deixar Clara e os gêmeos em um hotel. Eles ficariam hospedados lá até amanhã e depois voltariam para casa. Quando estive na casa deles, percebi que eles eram muito humildes e não tinham tanta condição financeira. Não queria que a situação ficasse mais complicada do que já estava então antes de sair deixei meu número de telefone e um envelope com dinheiro suficiente para eles se manterem por um tempo. Convenci Clara a me ligar assim que chegassem em casa e prometi que lhe ajudaria a conseguir um emprego. Não suportava a ideia de ver os irmãos de Lívia passando necessidade. Sabia que Lili faria de tudo por eles, mas sabia que ela ainda estava em processo de estabilizar a sua vida financeira então não tinha recursos pra sustentar seus irmãos. Fiz Clara prometer para mim que não contaria nada para ninguém, porque eu estava fazendo aquilo de coração e não queria que ninguém soubesse. Me despedi dos três e fui para a casa da minha amiga.
Quando cheguei, não encontrei ninguém na sala. Subi as escadas e fui direto para o quarto de Lívia. Bati na porta e pedi permissão para entrar.
- Pode entrar Kimi. - Lívia estava sentada em sua cama. Ela tinha uma toalha enrolada no corpo e outra na cabeça. Claramente tinha acabado de sair do banho.
- Posso esperar lá em baixo até você se trocar. - Sugeri.
- Não precisa, senta aqui do meu lado amiga. - Caminhei em sua direção um pouco receosa e sentei na cama, mas fiquei o mais longe que consegui. Vê-la de toalha me desconcertava e eu não podia deixar com que ela percebesse.
- Meus irmãos estão bem?
- Quando saí de lá eles estavam dormindo. Tenho certeza que estão bem. Vai demorar um tempo pra eles entenderem o que aconteceu, mas aos poucos eles vão entender. Difícil está sendo para a Clara, não consigo imaginar o dor que deve ser perder o seu companheiro de vida. Ela parecia assustada.
- Obrigada por ter levado eles até o hotel. Queria poder ajudá-los. - Lili estava triste. Me aproximei e limpei as lágrimas que escorriam por seu rosto.
- Não fique se martirizando, você também está precisando de cuidados. Ele era seu pai, eu não tenho palavras pra dizer o quanto sinto pela sua perda. - Envolvi Lili em um abraço.
- Vem, deixa eu cuidar de você. - Tirei a toalha da cabeça de Lívia e comecei a pentear os seus cabelos. Depois escolhi uma roupa e lhe entreguei. Ela estava tão fraca. Lhe ajudei a vestir sua roupa, sem olhar para seu corpo desnudo. Ela deitou na cama, lhe embrulhei e beijei sua testa.
- Você precisa descansar. Vou deixar você dormir um pouco. - Fiz menção de levantar da cama, mas Lili me segurou.
- Não vai, fica aqui comigo. - Me deitei ao seu lado de frente pra ela. Que encostou sua testa na minha. Da mesma forma como fez quando estávamos no pico da bandeira. - Porque dói tanto?
- Porque você o amava. - Foi o que consegui dizer.
- Mas ele fez tanto mal pra mim, não devia sentir tristeza com a morte dele. - Ela sussurrava como se alguém pudesse nos escutar.
- Acho que você se sente mal porque sabe que ele mudou e estava tentando de verdade se aproximar de você. Ele sabia que não tinha muito tempo para conseguir o seu perdão.
- E eu o perdoei. Ontem no hospital foi uma das perguntas que ele me fez. Se o perdoava, e eu disse que sim. Estava cansada de guardar mágoas dele. Queria que ele descansasse em paz. Mas não sabia que ele morreria tão rápido. O que ele falou pra você?
- Pediu pra mim cuidar de você. Ele sabia que não estaria aqui para participar das suas conquistas e pediu pra mim representar ele. - Falei parte do que ele me disse, a parte que Lívia precisava ouvir.
- E o que você disse?
- Que eu estaria sempre com você.
- Obrigada você é a melhor. - Lívia se aproximou de mim e me abraçou. Depois acariciou meu rosto e ficou bem perto de mim. Conseguia sentir sua respiração e ouvir seus batimentos cardíacos. Era tentador me aproximar mais e sentir o gosto de seus lábios, mas não me arriscaria, é claro.
Para minha surpresa, Lívia roçou seus lábios nos meus. Não conseguia me mover. Tinha medo de fazer qualquer coisa e estragar aquele momento. Mal respirava quando ela depositou um selinho em meus lábios. O contato demorou somente alguns segundos, mas pra mim tinha sido o momento mais íntimo que já tinha compartilhado com alguém. Depois Lívia virou e se aconchegou colocando meu braço ao seu redor em nossa posição favorita. Em pouco tempo ela estava dormindo. Mas eu não consegui pregar os olhos a noite inteira. Só ficava revivendo aqueles momento mágico em minha cabeça. O que aquilo significava?
Fim do capítulo
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