Alice

- Dou-lhe uma, Dou-lhe duas ...

- QUINHENTOS E VINTE MIL !!

- A senhorita ali ofertou quinhentos e vinte mil! Alguém dá mais?

Olhei pra trás e não podia ter visto outra pessoa a não ser ela mesma !! Como de costume, estava exuberante com um turbante cor marsala com arabescos dourados e que se compunham maravilhosamente bem com dourados brincos de argolas grandes. Aparentava uma expressão concentrada, porém com um leve sorriso nos lábios e pude perceber quando direcionou seus olhos para minha pessoa, fazendo expressão de desdém ..

- Quinhentos e cinquenta mil - falei rápido e alto com certo furor, levantando minha placa de leilão - enquanto voltava minha atenção novamente ao senhor leiloeiro.

- A senhorita aqui ofertou quinhentos e cinquenta mil. Alguém dá mais ??

- Seiscentos e quinhentos mil !! - novamente ouviu-se ao fundo da sala.

- UAU !! Isso é bastante !! Seiscentos e quinhentos mil para a senhorita ali! Alguém dá mais ???

Isso já ultrapassa os meus limites. Peguei meu celular e digitei:

(- Perdemos a compra da NetCell)

Enviei ao Joseph, CEO da companhia na qual eu estava representando.

- Dou-lhe uma, dou-lhe duas, dou-lhe três! - ninguém se manifestou, ouviu-se então o som do martelo batendo três vezes contra a madeira - Vendida a empresa NetCell Enterprise para a senhorita de inscrição número 024.

Minha ida àquele leilão tinha sido apenas para o arremate dessa tal empresa que o investidor estava em polvorosa para conseguir, visto que a prospecção de mercado estava em alta. Como perdi a compra, não precisava mais acompanhar o leilão de outras empresas que estavam disponíveis e eu ainda tinha uma reunião para participar logo após o almoço.
Estava muito irritada com o resultado pois já sabia que a Srta Veiga estaria disputando a mesma aquisição e mesmo tendo avisado ao Joseph, ele não me deu ouvidos. Insistiu que o teto para a aquisição seria de seiscentos mil e que não teria ninguém extravagante o suficiente para cobrir essa proposta. Ledo engano, afinal, se tem uma coisa que Laura Veiga sabe ser, é personificar a pura extravagância.

Juntei minha bolsa do chão e voltei novamente meus olhos ao fundo da sala que se cruzaram com os dela. Ela sutilmente franziu o cenho arqueando levemente a sobrancelha e esboçou um leve sorriso sem vontade, meneando a cabeça em cumprimento a mim. Apenas franzi a testa em resposta ao cumprimento debochado.

Levantei-me enquanto o leiloeiro continuava anunciando a próxima empresa a ser leiloada. Me virei pedindo licença ao senhor que estava sentado ao meu lado e se mostrara incomodado com a minha saída enquanto era anunciado os dados da empresa do momento. Estava passando pela última cadeira quando tropecei em uma garrafinha de água que estava no chão, chamando atenção de todo o salão para a minha pessoa. Ruborizei de vergonha.

Definitivamente, esse não era o meu dia de sorte, aliás, meu dia de falta de sorte já havia começado logo pela manhã, quando ao ir pegar minha moto para ir ao leilão, constatei que o pneu dianteiro estava furado. Aguardei o seguro chegar para me ajudar, mas esse demorou além do esperado, pois segundo o motorista do guincho, uma mulher parou seu carro na avenida a fim de ajudar uma senhora atravessar, mesmo estando o semáforo apontando livre direção aos automóveis. Com isso formou-se um trânsito carregado e ele se atrasou em meu socorro, que me atrasei para chegar ao leilão.

Me desculpei com o senhor da água e me dirigi a porta de saída de emergência.

Recebi uma mensagem do Joseph me chamando para uma reunião de emergência.

Me apressei então em ir ao estacionamento quando vi que pela porta principal, saiu ainda mais apressada que eu, a Laura Veiga, em sua plenitude como se estivesse desfilando em uma passarela.
Segurei um pouco meu passo e só observei aquela mulher linda, de pele negra e corpo farto, vestida com uma bata marsala e legging de couro preto e no pé um scarpin salto agulha preto. Tão elegante. Poderosa!!
Olhei mais a frente e vi um senhor de terno e gravata, esperando-a para entrar em seu carro.
Me peguei analisando aqueles detalhes, meio que boquiaberta com tanta beleza e sofisticação.
Ela apesar de ser um poço de arrogância, é uma fonte de inspiração! Não é sempre que uma menina órfã consegue se tornar uma das principais CEO da capital paulista e eu a admiro muito por isso.

Tão logo cheguei ao estacionamento e peguei minha moto, saindo o mais rápido que podia rumo a reunião emergencial com Joseph.

Assim que estacionei em frente ao prédio onde fica o escritório, dei uma olhada na banca de revistas que fica bem ao lado da entrada e estavam expostas meia dúzia de exemplares da revista "Pequenas empresas, grandes negócios" com a seguinte manchete: Senhorita Veiga, como gosta de ser chamada, bate novamente o recorde em arremates de leilões e seu lucro empresarial já ultrapassa a meta anual - fiz um bico de espanto e admiração para aquela reportagem e me apressei em subir para a reunião.

Havia acabado de perder uma compra para a própria Veiga, não poderia pensar mais nada a não ser, admirar.

Fim do capítulo