Capitulo 1
Antônia
Eu sabia que por muito tempo aquela tarde chuvosa me assombraria, era inverno e fazia frio, foi em meio a chuva que enterrei meu pai ao lado da sua atual esposa, ambos haviam falecido num acidente de carro.
Meus olhos mais uma vez marejados, insistiam em buscar a mulher que carregava o bebê nos braços, seu motorista sempre a postos, segurava um enorme guarda chuvas para protege-los da água que caía impiedosamente.
Não podia acreditar na sorte daquela criança, que em meio ao terrível acidente fora a única sobrevivente, segundo os socorristas o bebê conforto estava intacto, ele era um verdadeiro milagre.
A jovem mulher protegia o bebê nos braços, enquanto deixava o choro fluir copiosamente, ela parecia desolada com a perda da mãe.
Voltei minha atenção para os funcionários do cemitério, que naquele instante jogavam terra sobre os caixões, com certeza era o momento mais triste para quem perde alguém, pois naquela hora a fixa caí e sabemos que não tem como voltar atrás, o que está feito está feito e é irreversível.
Respirei fundo, a água corria pelo meu corpo trêmulo arrepiando-me numa onda insuportável de frio. Assim que os caixões foram cobertos, as pessoas dispersaram rapidamente, restando apenas eu e os irmãos a minha frente, além do motorista que não arredou o pé um único instante sequer.
Engolindo o choro e o pouco de orgulho que ainda me restava, andei até eles me posicionando onde pudesse ver o rosto pequeno da linda menina de olhos cor de mel, ela tinha os mesmos traços que meu pai, os mesmos olhos que eu e os mesmos cabelos que a irmã que a segurava fortemente no colo.
Sem pronunciar uma única palavra, deixei meus olhos pousarem sobre a jovem mulher, ela era absolutamente linda, assim como sua mãe. Ainda que não tivesse nenhum contato com a nova família do meu pai, eu conhecia sua mulher e a semelhança com sua filha era incrível.
Tentei sorrir, um sorriso frouxo e amarelo mas que tinha muitos significados, e depois de um breve momento de silêncio com a enteada do meu falecido pai, andei na direção da saída do cemitério, onde meu amigo Eliseu me aguardava no carro, pois segundo ele eu não tinha condições de dirigir e ele estaria a minha disposição naquele triste dia.
Depois de chegar em casa, Eliseu se dispôs a preparar um lanche pra mim, e mesmo que soubesse que eu não comeria, ele fez mesmo assim pois eu estava de jejum desde a noite anterior quando recebi a notícia. Tomei um banho quente e demorado, enquanto remoía os últimos acontecimentos, estava tudo tão confuso e a morte do meu pai só fez piorar. Há alguns anos minha mãe falecera vítima de um AVC, ela era muito jovem mais infelizmente sua hora havia chegado, depois disso me afastei muito do meu pai, porquê logo ele se envolveu com Elisa e se casou, formando uma linda família a qual eu não aceitava. No entanto, lá estava eu, chorando a morte do pai que eu culpei, afastei e simplesmente odiei por tempo demais, por motivos fúteis demais.
-- Eu não vou comer isso!
Resmunguei enquanto me deitava no sofá da sala, ignorando os sanduíches e o suco de laranja que Eliseu havia preparado pra mim.
-- Você precisa! Não vou te socorrer se desmaiar de fome.
Revirei os olhos enquanto apanhava o controle da TV.
-- Por favor Antônia! Você não precisa ficar sem comer pra demonstrar que está triste .
Dei de ombros, ignorando-o por completo coloquei uma série qualquer na TV, precisava distrair a cabeça e evitar aquele cuidado todo do meu velho amigo, sabia que só queria ajudar, mas me sufocava.
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Helena
Ao chegar em casa, deixei minha irmãzinha aos cuidados da babá, indo rapidamente para o quarto, pois precisava de e um banho quente e depois uma xícara imensa de chá.
Joguei-me na cama envolta na toalha de banho, e apesar do frio, deixei-me ficar ali por alguns minutos na mesma posição, enquanto tentava por a cabeça no lugar.
A dor de perder a mãe era inexplicável, mas olhar para um bebê e saber que ele não terá sua mãe ao seu lado, nos melhores e nos piores momentos da sua vida, isso era devastador. Eu não sabia como lidar com aquela situação, eu não fazia ideia de como seria a partir dali, pois eu não estava preparada para aquela situação e menos ainda, pra fazer papel de mãe.
Batidas na porta me tiraram dos meus devaneios.
-- Helena?! O Henrique está te aguardando na sala.
-- Obrigada pai!
-- Tenho que ir! Fica bem minha filha!
-- Fico sim! Obrigada pai.
Graças a Deus Henrique havia chegado, amava meu pai mas naquele momento eu precisava muito de carinho e principalmente de ajuda, e meu namorado, era ótimo em achar soluções para situações difíceis. Papai era um matuto que não sabia lidar com aquele tipo de situação.
Henrique havia viajado uma semana atrás, estava trabalhando em um caso muito difícil e havia ido buscar provas para o caso numa pequena cidade do interior, ele era um advogado brilhante.
Rapidamente me vesti, indo encontrar meu namorado que na sala de visitas fazia uma ligação e tudo indicava que era importante, porém, mesmo sabendo que não deveria atrapalhar, pendurei-me na sua cintura encostando a cabeça no seu peito, deixando-me ser acarinhada.
Henrique logo encerrou a ligação, envolvendo-me num abraço carinhoso.
-- Sinto muitíssimo meu bem!
Me permiti ser cuidada, senti seus beijos no topo da minha cabeça e me aconcheguei ainda mais nos seus braços. Henrique era um bom homem, já estávamos juntos a alguns anos e cada dia que se passava eu tinha mais certeza de que ele era o amor da minha vida.
-- Eu não sei o que fazer...
-- Você não precisa saber, não hoje, não agora. Está tudo bem meu amor. Eu tô aqui.
Ele definitivamente era uma ótima pessoa.
A noite caiu e com ela muitas lágrimas, me deixei ser vencida pela angústia e desespero, deixei o cansaço tomar conta de mim e sob os cuidados de quem me amava, entreguei-me ao sono.
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Antônia
Os dias se passaram e a rotina insistia em se instalar na minha vida novamente, o trabalho já não tinha tanta graça, o treino de muay thai não fazia sentido, o happy hour não parecia apropriado e eu me vi presa num casulo de culpas e arrependimentos.
Eliseu tentava a todo custo me animar, dizia ele que eu precisava deixar a vida seguir seu curso e voltar a viver, mas, eu tinha uma opinião diferente e estava disposta a por em prática tudo que minha mente remoera durante os dois meses seguintes ao falecimento do meu pai.
A leitura do testamento era naquela tarde, estava muito ansiosa porque iria me encontrar com a enteada do meu pai e poderia finalmente ter uma conversa descente com ela, o que poderia definir o rumo da nossa história.
Cheguei cedo no fórum, meu advogado sabia bem qual era minha posição diante aquele acontecimento e não tardou a comparecer, esperando ansiosamente junto comigo a chegada da enteada.
No horário marcado ela se fez presente juntamente com seu advogado, um rapaz jovem e belo que curiosamente estava de mãos dadas com Helena.
Mais que depressa me adiantei em cumprimenta-la, confesso ter sentido certa hostilidade da sua parte, o que me deixou deveras desconcertada.
-- Bom dia! Antônia Deitoz! É um prazer conhecê-la.
-- Bom dia! Já nos conhecemos.
-- É claro! Já nos conhecíamos, mas as circunstâncias não foram das melhores.
-- Ainda não são!
Nesse instante o jovem advogado interveio, assim como eu ele parecia não entender a grosseria da sua namorada, e apressou-se a quebrar o clima desagradável que estava se instalando.
-- Com licença! Eu me chamo Henrique Dias, sou o advogado e namorado da Helena.
-- É um prazer!
-- Todo meu! Desculpe-nos por fazermos esperar.
-- Capaz! Sem problema!
-- Acredito que já podemos começar.
Educadamente os dois advogados se cumprimentaram e então adentramos na sala do juiz. Onde o mesmo deu início a leitura dos testamentos.
Elisa Pillar deixou tudo para as filhas como era de se esperar, já meu pai surpreendeu-nos, uma surpresa que parecia difícil demais de assimilar para a jovem a minha frente.
-- Como assim?
Helena estava incrédula, o juiz lera o testamento e a carta deixada por meu pai, onde ele deixava tudo o que possuía para as três filhas, exatamente assim se referiu a Helena, como filha, meu pai desejava que suas filhas dividissem tudo que era seu.
-- A vontade do senhor Ernesto Deitoz é que as duas filhas legítimas e a enteada herdem tudo que era seu.
-- Eu não esperava por isso!
Helena parecia extasiada com a situação, cheguei a rir diante o seu momento de letargia, eu não era ambiciosa, se meu pai queria assim por mim tudo bem, até porque, eu tinha minha própria empresa, uma rede de supermercados com sete filiais que ia muito bem. Não me incomodava minimamente que ela fizesse parte daquilo, muito pelo contrário, havia passado tempo demais odiando e não teria oportunidade de me retratar, se aquele era o desejo do meu pai eu o honraria com mérito. Até por que, meu maior desejo naquele momento era me aproximar da minha irmã e consequentemente da enteada do meu pai, se ele a amava a esse ponto, eu queria amar também, eu queria conhecer e conviver em respeito a ele, em homenagem a ele, essa seria a minha forma de me redimir.
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Helena
Eu estava em choque, como assim eu era uma das herdeiras? Fato que Ernesto e eu sempre nos demos muito bem, mas isso não fazia de mim uma Deitoz. Incrédula com a situação, depositei minha atenção sobre a tão falada Antônia Deitoz, a arrogante e mesquinha que dera as costas ao pai pelo simples fato de que ele resolvera tocar a vida.
Nada, não havia nada desagradável ou de fútil naquele olhar castanho claro e reluzente, a mulher a minha frente sorria, um sorriso de canto e complacente, demonstrando muito mais humanidade do que eu esperava. Confesso que um ataque histérico me assustaria bem menos que aquela calma e condescendência.
Henrique sorria contidamente, e com sua mão apertou minha coxa por debaixo da mesa, seu olhar deixava claro que estava comemorando aquela notícia.
Ainda embasbacada com a novidade, me dirigi para o estacionamento em busca do carro de Henrique, ele o advogado da Antônia estavam acertando alguns detalhes com o juiz.
-- Helena, por favor! Me dê um minuto da sua atenção.
Eu nunca quis conhecer a filha do Ernesto, vi o quanto ele sofreu com a distância entre eles e não achava que alguém como ela merecesse minha atenção. Porém, ela estava ali e não parecia ser aquela mulher que a minha imaginação criou, então sim, ela tinha um minuto da minha atenção.
-- Claro! Pode falar.
Meus olhos rapidamente analisaram a mulher. Ela era alta, quase da altura do Henrique, cabelos negros curtos e bagunçados, um tanto charmosos na verdade, os olhos idênticos aos da Isa, corpo muito bem feito, extremamente elegante no seu terninho.
-- Em primeiro lugar! Eu sinto muitíssimo pela sua mãe, sei bem o que deve estar passando!
-- Obrigada!
-- Em segundo lugar! Fico muito contente com a decisão do meu pai, com certeza você foi muito mais filha pra ele do que eu.
Ela suspirou um tanto incomodada com as próprias palavras, havia muito sofrimento impregnado na sua voz.
-- E por último, eu queria muito poder me retratar com o meu pai, mas infelizmente é tarde demais pra mim. Eu deixei as coisas saírem do controle e me arrependo muito! Por isso eu tô aqui, pra te pedir um grande favor!
-- Qual favor?
Aquelas palavras dispararam todos os meus alertas, alguma coisa me dizia que aquilo estava prestes a sair do controle.
-- Eu quero conhecer a minha irmã! Quero fazer parte da vida dela, quero... Fazer parte da sua vida! Meu pai te amava tanto ou mais do que a mim, e eu quero saber o porque, eu quero fazer parte das suas vidas porque de uma forma ou de outra vocês são o mais próximo de uma família que me resta.
Eu estava completamente surpresa com aquele disparate, não esperava nada naquele teor e não sabia como reagir. Sorri incrédula sem pensar muito no que aquilo significava, e embarquei numa viagem que provavelmente não teria volta.
-- Ok! Ok é... Por mim tudo bem! Vai ser muito bom... Pra Isabela!
E foi nesse instante, que eu vi pela primeira vez o sorriso que por muito tempo atormentaria as minhas noites de sono.
Fim do capítulo
Olá meninas! Espero de coração que vocês gostem. Não deixe de dar sua opinião, será de grande importância. Obrigada beijoos.
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Marta Andrade dos Santos
Em: 09/01/2022
Eita kkkkk gostei espero ansiosa pelao próximo capítulo.
Resposta do autor: Que maravilha! Fico muito feliz. Beijão
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