CapÃtulo 64
_ Luana, quem é Beth?
Luana estava saindo do banheiro de um restaurante no meio da estrada em que eles pararam para lanchar.
_ Não sei quem é Beth, não!
_ Então porque ela te mandou uma mensagem dizendo que logo voltaria à república e que adoraria continuar o que ela chama de “papo”.
Luana teve medo do olhar de ciúmes que Bruna lhe lançou:
_ Você anda fuçando de novo o meu celular?
_ Eu estava na internet quando a mensagem chegou e sem querer eu a abri. Desculpa, pensei que entre nós não existisse segredos.
_ E não existe, meu amor. Eu conheci a Beth lá na república, pois ela foi visitar uma das meninas que é amiga dela.
_ Então ela é botinha, certo?
_ Sim, ela é.
Bruna franziu a testa e entrou no carro apressando Gustavo e Gabriel que ainda estavam lanchando. Luana fez um sinal para que eles esperassem um pouco antes de entrar no carro.
Bruna acelerava o carro sem parar.
_ Pará com isso, por favor, Bruna. Não seja ciumenta, você não é assim.
_ A cada dia que passa eu amo você mais e vejo o quanto não saímos do lugar.
_ Peraí? Eu acabei de levar você para conhecer minha família!
_ Mas até hoje não foi visitar a minha. Sem falar que não faz questão de conhecer os meus amigos, em fazer parte do meu mundo. Eu sei que você me ama, sei que a Lisa não passa de passado, e eu não tenho mais que me preocupar com ela, mas, você continua morando numa república com um bando de adolescentes, como se, como se a vida fosse uma colônia de férias.
_ Ei, não seja injusta. Desculpe se eu não sou tão boa quanto às pessoas do seu mundo, onde as pessoas são excessivamente convencionais e apesar de dizer que aceitam homossexuais e blábláblá, não passam de hipócritas nos olhando torto pela rua.
Bruna desligou o carro e olhou para Luana.
_ Eu só queria entender o porquê de você não poder morar comigo.
_ Por que você não confia em mim. Não o bastante. Você mexe no meu celular e imagina coisas.
_ Vai dizer que essa Beth não deu em cima de você?
Luana abaixou o olhar e Bruna riu sarcasticamente.
_ Está vendo? Está vendo? O perigo é maior você morando lá.
_ A chance do quê? Eu não vou te trair, eu já te falei isso.
_ A carne é fraca, vai que uma delas fica pelada e pula em cima você?
Luana segurou para não rir, pois imaginou a cena e a achou hilária.
_ E ainda tem a garotinha da UFMG que trabalha com você e eu sei...
_ Aí meu Deus!
_ Eu sei que ela gosta ainda de você.
_ Ok, doutora, o que quer que eu faça?
_ Vai morar comigo com o seu irmão.
_ E você acha que isso será a solução de todos os nossos problemas?
_ Eu sei que não será, mas eu poderei te ajudar com o seu irmão e de quebra ter você todos os dias dormindo comigo, acordando comigo, vendo filmes comigo, voltando das festas comigo.
Luana refletiu. Olhou lá para fora e viu Gu e Biel olhando preocupados para o carro. Gu enchera o menino de Cheetos e toda a espécie de comida teen e o menino parecia capaz de comer um leão se lhe fosse oferecido tamanha a seu apetite insaciável. Luana riu para o irmão chamando-os de volta ao carro.
_ E então, Luana?
_ É melhor eu parar de mentir, querendo passar uma imagem de quem não quer ficar com você a todo o momento e mais, fingir que não estou com medo da minha responsabilidade e que vou sim, precisar de toda a ajuda que vier. Se você como minha mulher, quer me ajudar, eu vou aceitar sim, porque amo você acima de tudo e de todos, pela forma dedicada e compreensiva e carinhosa que você me trata. Eu prometo a você que vou tentar ser mais atenciosa com os seus amigos e marque para sexta agora, se possível, uma visita à casa de seus pais. Vamos começar já a fazer uma mudança em tudo antes que o nosso relacionamento estacione em brigas sem sentido e por motivos toscos.
Bruna sorriu e se emocionou com as palavras de Luana.
Gu e Biel entraram no carro e repararam que Bruna ria e chorava.
Biel admirou a irmã mais uma vez pela capacidade de fazer as mulheres ficarem loucas por ela.
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E não era só isso que Biel admirava na irmã. Ela, desde muito nova, era sempre a defensora dos oprimidos na escola, a líder entre a garotada na rua, a única a encarar seu pai em casa.
Ela era sempre engraçada e muito, muito popular entre as meninas, sejam elas lésbicas ou não, velhas ou não, bonitas ou não.
Sem falar do jeito que conseguia enrolar várias mulheres ao mesmo tempo usando as desculpas mais inteligentes que ele já ouvira em toda a sua vida.
Mas com o tempo ela cresceu e se foi. E os outros irmãos não eram como ela.
Bernardo vivia ora trabalhando, ora trancado no quarto, ora viajando. Ele era chato e completamente burro.
Bárbara era totalmente aérea, uma completa alienada, que gostava de roupas caras (apesar de passar meses as pagando) e escolhia as pessoas do seu meio social pelo seu poder aquisitivo.
Sobrou a Gabriel a lembrança da irmã, única em casa que o escutava COM ATENÇÃO, sem aquela cara de que você está sendo um completo chato e mais, o entendia, discordava, debatia, era sua amiga antes de ser irmã, era um laço superior e anterior que os unia: o laço do amor entre amigos.
Com o distanciamento de Luana de casa, Biel cresceu em meio ao caos de uma escola aonde ele tinha poucos amigos e sofria muito por não se encaixar nos moldes de uma juventude criada e desenvolvida em um meio onde a burrice e a preguiça eram cultivadas e apreciadas.
Gabriel era considerado por muitos como um chato de galocha e talvez o fosse.
Escrevia textos e publicava em páginas virtuais. Lia muitos livros e suas coisa naquele momento de mudança total de ares, se resumia em poucas roupas, poucos sapatos e muitos, muitos livros.
Esse mesmo garoto cresceria em um lar onde todos poderiam dizer que nunca se formaria uma pessoa de caráter, séria e honrada, cresceria para a vida em um lar pouco respeitado e que muitas vezes nem chamado de lar é, pela sociedade e para a lei de muitos países.
Em muitos países, as suas novas “mães” poderiam ser condenadas à pena de morte pelo simples fato de se amarem e pelo simples ato de serem normais.
Eu, Gabriel, escutei essa história, todas essas histórias aos longos do vários anos em que vivi com Bruna e Luana, a quem chamo carinhosamente de minhas “mamães” por terem me tirado de um lugar onde eu não era e nem conseguia ser feliz e por terem me acolhido em um lar tão compreensivo e disciplinado como é a casa delas.
Elas fizeram tudo por mim, até mesmo pagaram a minha faculdade de advogado.
Eu escrevi esse livro não para fantasiar em cima de uma história tão parecida a tantas outras, nem para expô-las ao ridículo.
Eu escrevi esse livro porque achei que em um país que consegue lidar com tantos problemas em tantas áreas de necessidade primária, como saúde e que não conseguem nem ao menos oferecer a suas crianças uma educação de média qualidade, o que nos resta é aceitarmos uns aos outros, não fazendo distinção de ninguém, porque seja qual for o motivo do nosso preconceito, ele se dissolve e logo se mostra imbecil diante de pessoas tão comuns e tão belas como qualquer outro pessoa, como são os nossos amigos homossexuais.
Sem falsa ideologia nem fanatismo.
A bandeira do não ao preconceito deve está cravada no peito de todos nós, principalmente advindos de um país em que as pessoas são tão diferentes.
À todos o meu abraço e meu agradecimento pelos os minutos doados a essa linda história de amor pela vida (e por belas mulheres, paixão que herdei da minha irmã) que Luana ensina e carrega consigo.
Fim
Fim do capítulo
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