Capítulo Único
Você não acredita.
Sim, ela está ali na sua cama, virada para a janela, mas mesmo assim você não acredita. Ela é a Rainha Alexandra e você... Bom. Você é só a Eleanor. Ela é o futuro daquele reino caótico, e você um mero peão daquele jogo. Talvez a nomenclatura não fizesse jus ao seu real papel na guerra, mas em qualquer jogo o peão acaba sendo sacrificado pelo bem da rainha.
Você se sacrificaria por ela em um piscar de olhos.
Ultimamente, durante o dia, ela não tem falado muito. Treinava por horas com sua espada, arco e flecha, e um conjunto de facas para ter certeza de que seu corpo não a abandonaria na hora decisiva. Ela é a pessoa mais forte que você conhece. A mais persistente, mais focada e determinada. E teimosa. Às vezes, após uma hora de treino, ela entrava na cabana com pequenos cortes e hematomas, e você tinha que obrigá-la a sentar-se para que pudesse tratá-los antes de outra sessão. Ela não descansava. Nunca gastava mais do que quinze minutos em uma refeição, sempre agradecia pela comida e voltava para fora para continuar a balançar suas armas contra inimigos imaginários.
Ela pode colocar qualquer máscara que quiser; de guerreira, rainha, de líder implacável, mas se há alguém que não pode enganar, é você. Você sabe que ela está apavorada.
Você sabe também que não é fácil ter o peso de um reino inteiro nos ombros. As pessoas precisam de você para sobreviver ao tempo, à falta de água, e agora aos tiranos que roubaram seu trono. Mas você é uma pessoa só. Ela é uma pessoa só. Sim, ela tem sangue real nas veias, todo o conhecimento possível para comandar suas terras, mas como não desabar? Como não mostrar vulnerabilidade quando sua cabeça põe tanta pressão em si mesma?
Mas você não sabe o que ela pensa. Não de verdade. Ela não fala muito sobre isso; sobre o que sente com relação à batalha, suas preocupações. Talvez não existissem preocupações. Talvez só estivesse esperando começar para que pudesse por um fim de uma vez por todas. Mas será que poderia?
Você pressiona seus olhos com a ponta dos dedos e tenta não pensar nisso. Com cuidado, caminha de volta para a cama, onde o sol da primavera colore os lençóis brancos e cobre a pele bronzeada da mulher deitada. Com seu movimento, ela também se mexe, virando para o seu lado de olhos semiabertos, um mar de verde esmeralda ainda um pouco sonolento.
- Tive um sonho estranho - ela começa, sua voz rouca enchendo seus ouvidos.
- Me conta.
- Eu estava em uma colina, toda verde e cheia de flores amarelas. Minha mãe estava sentada embaixo de uma árvore. Ela queria que eu sentasse com ela, mas não consegui me mexer. O sol estava muito brilhante, e você segurava minha mão. Olhei pra você, você sorriu, e eu soube que tudo ficaria bem.
- Tudo vai ficar bem.
Ela respira fundo e puxa os lençóis para cobrir os ombros.
- Eu não queria acordar. Assim como não quero sair daqui. Isso me faz uma rainha ruim?
- Não - responde, acariciando a lateral de seu rosto e pondo para trás uma mecha de seu cabelo. - Faz de você um ser humano.
- Isso não pode acontecer, Eleanor.
- O quê?
- Nós. Assim.
- Eu sei.
- Se descobrirem durante a batalha, usarão você contra mim.
- Eu sei.
- Por mais que eu esteja tentando lutar contra o que sinto por você, estou falhando miseravelmente.
- Eu também.
- E eu não quero te perder. Não aguentaria.
- Você não vai me perder.
Você a puxa para si e ela se aconchega entre seus braços, uma pequena alma perdida tentanto achar o caminho da vitória. Você ouve o som dos grilos lá fora, de pássaros cantando melodias diferentes na floresta, do vento balançando as folhas das árvores. Você nunca vai esquecer esse momento; os sons, o cheiro de lavanda de seu cabelo, da sua pele encostando na sua, do calor do seu corpo e de toda a sua confiança.
Você costumava odiá-la, mas agora sabe. Agora você a ama.
- Prometo que isso não vai mais acontecer - ela diz contra seu peito.
- Não prometa coisas que não pode cumprir.
Ela não responde mais, vocês duas tentando aproveitar a atmosfera da melhor forma possível antes que a realidade volte a bater na porta. Você sabe que essa não vai ser a última vez que dividirão a cama. Não immporta quantas promessas faça ou quantas vezes peça que fique longe. Ela precisa de você tanto quanto você precisa dela, e isso nunca vai mudar.
Fim do capítulo
Obrigada pela leitura :)
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