Capítulo contado pelo POV de Giulia e Marina
Capítulo 5
– Giulia –
Acordei no meio da madrugada, ofegante e chorando. Tive um pesadelo horrível. Sonhei com Marina e a cena pra lá de esquisita que presenciei no estacionamento. Mas no sonho era como se eu estivesse participando, e eu fosse o motivo da discussão entre elas. Via Verônica beijar e acariciar o rosto de Marina sem tirar dos lábios aquele sorriso, que na hora me espezinhava, dilacerava.
Marina também sorria, e esse fazia com que eu me sentisse humilhada, destruída. Beijavam-se e depois riam da minha cara. Me sentia minúscula no meio daquela situação. E meu peito ardia como se estivesse sendo perfurado. Eu chorava me sentia angustiada, sentia uma mágoa indescritível. O ar me faltava e eu já não enxergava mais nada além de borrões causados pelas lágrimas abundantes que desciam freneticamente pelo meu rosto.
Fui até a cozinha me servir de um copo d’água. Toda aquela sensação do sonho se fazia presente, como se tudo o que vive no sonho tivesse mesmo acabado de acontecer. Parecia tudo tão real. Tão palpável. Voltei para minha cama, olhei o relógio e ainda eram 3:40 da madrugada. Deite-me e fechei os olhos, porém o sono estava bem distante de mim. Deixou-me ali largada naquela cama de casal, com uma enorme angústia no peito.
Passei horas e mais horas tentando encontrar um significado para aquele sonho. Sonho não, diante de tudo o que senti e ainda estava sentindo, aquilo era um pesadelo. Como há muito tempo eu não tinha. Voltei a olhar para o relógio. Passava-se das 5:00hs da manhã. Eu tinha que dormir ou ficaria um caco. Tentei ficar de maneira confortável debaixo das cobertas, suspirei e tentei esvaziar a minha mente, deixar que meu peito se acalmasse e aquela sensação ruim esvaísse. Deu certo, acabei pegando no sono.
-- Giulia? Acorda Giulia.
Ouvia uma voz longe, bem longe me chamando, pedindo para acordar, além de um toque suave em meu ombro.
-- Giulia você vai se atrasar. Ei minha pequena?
-- Huum? – perguntei começando a despertar.
Olhei para o lado e lá estava Vick, toda arrumada, sentada ao meu lado na cama com o seu sorriso mais meigo e acolhedor.
-- Não teve uma boa noite não é?
-- Não. – disse sentando na cama.
-- Vi você indo até a cozinha no meio da madrugada, depois de um tempo eu vim até a porta do seu quarto e lhe vi virando de um lado para o outro na cama. O que aconteceu?
-- Não sei explicar. – meu peito voltou a apertar com a lembrança do sonho.
-- Pois então vai tomar o seu banho, rapidinho e se arruma também rapidinho ou você vai chegar bastante atrasada. Eu já tenho que ir. O café ta na mesa.
-- Café? Na mesa? Como não estou sentindo cheiro de queimado? Cadê os bombeiros? Meu Deus! Cadê... – fui interrompida com o baque do travesseiro que Vick jogou em minha direção.
-- Sua bocó! Fui até a padaria e comprei o que você gosta. Mal agradecida.
-- To brincando meu chuchu! Vou tomar meu banho e ver o que a senhorita aprontou. – disse dando um beijo em seu rosto e indo para o banheiro.
A água morna fez com o que o meu corpo relaxasse um pouco diante da noite mal dormida. A essa altura meus olhos deveriam estar terríveis, com enormes olheiras, roxas e bem chamativas. Nada que uma boa maquiagem não deva resolver. – pensei comigo.
-- Gi! Corre você vai se atrasar. Eu já estou indo. Beijos. – Vick gritava da sala, e logo após ouvi a porta bater.
Fechei o chuveiro e sai. Precisava me arrumar às pressas, pelo adiantar das horas com certeza eu enfrentaria um pequeno congestionamento, o que me tiraria mais alguns minutos do meu escasso tempo. Sai enrolada em uma toalha, enquanto mantinha outra em meu cabelo. Coloquei uma música no som pra quem sabe conseguisse me arrumar no ritmo da música.
Vesti uma blusa de seda, com mangas longas, uma saia risca de giz um pouco acima dos joelhos, uma sandália preta de salto alto. Os cabelos presos em um rabo de cavalo, uma boa maquiagem pra disfarçar sinais da noite mal dormida, e acessórios dourados – simples e discreto. Desliguei o som e sai do quarto na direção da cozinha cantando a música que tocava agora a pouco.
Vick havia acertado em cheio! Havia compro croissants recheados de frango – meu predileto -, café preto, e havia cortado algumas frutas em uma tigela com linhaça. Praticamente engoli tudo. Peguei a chave do carro, a bolsa, notebook, tranquei o apartamento e desci até o estacionamento.
A quase duas quadras da agência entrei em um pequeno congestionamento – como havia previsto. Olhei o relógio em meu pulso e eu tinha menos de 15 minutos para chegar sem atrasos.
Batucava os dedos indicadores impacientemente no volante e nada de os carros a minha frente movimentarem-se no mínimo um centímetro. Pensei em ligar para alguém, mas me dei conta de que fui relapsa e não tinha o número de ninguém na agência. Que droga! Estava tão perto e ao mesmo tempo tão longe. Carros buzinavam escandalosamente logo atrás de mim, como se eu tivesse parado ali de propósito. Os dedos indicadores contagiaram toda a mão, e agora eu batia com as duas mãos espalmadas no volante como se aquilo fosse fazer o trânsito andar. Anda, anda!
Lentamente os carros começaram a se mover, e eu entrei na primeira rua que me levasse para longe daquela lentidão e me fizesse chegar o quanto antes na agência.
Estacionei. Olhei o relógio mais uma vez, restavam-me 3 minutos apenas. Nem dei muita atenção quando tranquei e acionei o alarme do carro. Peguei todas as minhas coisas e corri na direção do elevador que tinha acabado de chegar. O elevador parou no segundo andar, e quase nem esperei as portas abrirem, novamente sai correndo. Não cheguei a ver nada, apenas senti o choque, e quando dei por mim estava no chão.
-- Esta tudo bem?
-- Está sim. Me desculpa, eu estava correndo, eu não lhe vi. – disse de cabeça baixa tentando juntar todas as minhas coisas. Coitado do meu notebook.
-- Não foi nada Giulia. Quer ajuda? – vi uma mão estendida a minha frente e ai sim olhei para cima. Aceitei.
-- Obrigada Ramon. E me desculpa mais uma vez.
-- Não foi nada. Você se machucou? – maneei a cabeça em sinal negativo – Mas não precisa correr assim não, você ainda tem 10 minutos de tolerância, isso não vai contar como atraso. – sorriu.
-- Não sabia. – bobamente foi apenas isso que eu disse.
-- Vem, deixa eu te ajudar. – ele disse pegando as coisas de minhas mãos.
-- Não precisa, não quero te incomodar Ramon.
-- Não é incomodo nenhum. Você pode bater o ponto, eu levo as suas coisas pra sua mesa.
-- Ta certo. Muito obrigada Ramon.
-- A sua disposição.
Ele se retirou e eu fiquei alguns segundos o olhando. Esse não pode ser o mesmo homem de ontem. Esse me parecia muito gentil e muito educado, impressão totalmente da que eu tive do Ramon de ontem.
Sai de minha inércia, e fui bater o ponto antes que a minha tolerância também se esgotasse. Entrei na sala e desejei bom dia a todos. Cheguei a minha mesa e minhas coisas haviam sido dispostas de maneira organizada. Ramon olhava para mim e sorria - dessa vez o sorriso me lembrou um pouco o do dia anterior, e isso não me agradou, relevei - sorri de volta em forma de agradecimento e sentei ligando meu computador.
Liguei o notebook, o colocando em um cantinho da mesa e tirei o celular de minha bolsa. Vi que tinha uma mensagem, e só abri porque vi que havia sido Vick quem tinha mando.
De Vick:
Gi você não vai acreditar, to usando aquele celular pequeninho, o reserva. Aconteceu um pequeno acidente com o outro. Por isso to te mandando um SMS. Mas e aí, chegou bem?
Sorri ao terminar de ler a mensagem e imaginar qual teria sido o tal “pequeno acidente” que separou Vick do seu objeto mais importante, seu celular. O “acidentado” era o terceiro celular que ela comprava em menos de um ano. Sempre acontecia algo com eles, os perdia, deixava cair dentro d’água ou sofriam quedas desastrosas os espatifando irremediavelmente. Não agüentei, tinha que saber o que tinha acontecido dessa vez. Resolvi perguntar.
De Giulia:
Vick o que houve com o seu celular?
Foi uma mensagem curta e rápida de ser digitada, porém alguém se incomodou com isso.
-- Você não pode usar o celular aqui novata. Você está em horário de trabalho e o uso de aparelhos celular está terminantemente proibido. – ela disse parada atrás de mim.
-- Desculpa Verônica. – falei o colocando de volta na bolsa.
Instintivamente, olhei para os lados buscando a prova de que aquilo era mesmo proibido e ninguém ali dentro não fazia uso. Surpreendi-me quando vi que todo mundo tinha o celular em cima da mesa, alguns falavam enquanto sorriam, outros mandavam mensagem assim como eu estava fazendo segundos antes.
Eu não queria confrontar e nem me fazer de injustiçada, mas era isso mesmo que tinha acontecido comigo, eu estava sendo injustiçada. Porque somente eu não poderia usar o celular se todo mundo ali usava?
-- Pode me entregar. – ela disse seca.
-- O celular? – perguntei desacreditada.
-- Isso mesmo! Quando você for embora eu lhe entrego. Isso será a sua rotina, sempre que chegar a empresa baterá a ponto, e depois passará em meu gabinete e entregara o seu celular. Quando for sair da mesma maneira, depois de bater o ponto você o busca.
-- Isso tem mesmo necessidade? – ousei - Eu posso guardar o celular na bolsa, e assim o uso apenas no meu horário de almoço.
-- Não seja petulante! Você não passa de uma novata que ainda terá que se encaixar nas normas da agência. Então não queira subestimar uma superior direta sua.
-- Tudo bem!
Vi que não ia adiantar nada ficar ali discutindo ou questionando os motivos pelo qual somente eu tinha que me encaixar naquela regra. A contra gosto e muito chateada, desliguei e entreguei o aparelho. Ela pegou o meu celular, e sem olhar ou chamar atenção de mais ninguém ela se retirou do setor. Não sem antes sussurrar “Novata petulante!”.
Pensei em Vick, pensei o quanto ela ficaria preocupada por eu não ter conseguido responder a sua mensagem. Ela pensaria um monte de coisa, e garanto que nenhuma delas seriam boas. Ficaria muito preocupada por eu não ter avisado, sendo que sai de casa atrasada, ou seja, em sua talvez tivesse acontecido algo comigo porque sai de casa que nem uma louca, dirigindo que nem uma demente, e tudo pra não chegar atrasada.
Suspirei e tentei esquecer o acontecido. Caso contrário ficaria remoendo cada vez mais a atitude da loira aguada e consequentemente me sentiria mais injustiçada.
Nem fazia mais questão de entender as atitudes dela para comigo, iria ficar na minha e não rebater nada do que ela pudesse falar ou fazer. Se eram as regras da empresa, eu iria me adequar a todas elas sem pestanejar.
Voltei a minha mesa e alguns minutos depois Natália me chamou para darmos continuidade ao projeto que eu iniciei com ela no dia anterior. O lado bom de trabalhar com ela, é que ela aceitava todas as minhas idéias e opiniões, e quando isso acontece, principalmente em um trabalho como o nosso é maravilhoso, porque assim rendemos muito mais. Um consenso é primordial!
Como previsto, conseguimos render bastante, fazíamos uma boa dupla. Gostei muito de trabalhar com ela. Adiantamos bem o trabalho e com certeza terminaríamos sem extrapolar o prazo que nos foi dado.
Dessa vez ficamos atentas ao horário do almoço, e nos organizamos e dividimos em carros antecipadamente para que não ficasse ninguém para trás por falta de espaço em um dos carros. Natália mais uma vez foi comigo, seríamos somente nós duas, a menina de ontem havia ido em outro carro. Fomos até o elevador. As portas se abriram e ninguém mais ninguém menos do que Alice já estava lá dentro falando ao celular. Entramos e ela nos cumprimentou com um aceno de cabeça.
-- Estão indo para o Veneza? – ela perguntou assim que encerrou a ligação.
-- Estamos sim. – respondi.
-- Será que tem mais um lugarzinho nesse carro pra mim? Estou sem carro hoje, liguei para virem me buscar mas no momento não podem. Tempo pra mim nunca tem. – ela disse baixando a cabeça, quase num desabafo.
-- Claro Alice! Pode vir conosco.
-- Almoço com Alice Vasquez será comédia na certa. – disse Natália sorridente.
Não sei dizer se Natália disse aquilo para animar Alice, ou apenas fez um comentário sem intenção alguma. O importante é que surtiu efeito, Alice sorriu abertamente, e em seguida deu uma piscadinha com o olho direito. Não tem jeito, ela foi feita pra Vick. Tenho que ligar pra ela, dar algum sinal de vida, nem que seja de fumaça.
Quando chegamos ao restaurante, quase não havia mesas desocupadas, estava praticamente lotado, porém, tranqüilo. Encontramos uma mesa próxima a uma janela, bem próxima a escada que dava acesso ao piso superior. Logo fomos atendidas por um simpático garçom, que tive a impressão de cantar Natália. Nossos pedidos não demoraram a chegar, mas eu demorei bastante para terminar de comer, eu não conseguia para de rir das coisas que Alice contava. Ou comia ou ria, os dois resultariam em um engasgo. Alice era muito divertida!
Tínhamos acabado de comer, mas mesmo assim permanecemos na mesa conversando. Natália pediu licença e foi ao banheiro. Permanecemos Alice e eu na mesa, ainda conversávamos quando ela falou uma frase que Vick costumava dizer: “Isso é muito relativo!” – ela costumava dizer isso quando ela estava errada mas não queria admitir. Vick...
-- Alice, queria te pedir um favor, aliás, queria te pedir algo emprestado.
-- Pode pedir, não se acanhe. – sorria facilmente.
-- Será que você poderia me emprestar seu celular? Preciso fazer uma ligação rapidinho e infelizmente estou “proibida” – disse fazendo aspas no ar com os dedos – de usar o meu.
-- Por que está proibida?
-- Verônica o recolheu hoje cedo, disse que era proibido o uso do celular no horário de trabalho, e só irá me devolve-lo quando bater o ponto no horário de saída.
-- Não acredito que ela fez isso! Que mulherzinha mais insuportável. Isso não tem nada haver, e muito menos é regra dentro da agência, tanto que quem encontra com ela ai pelos corredores a vê falando ao celular. Toma, pode usar o meu, não se preocupa não. – ela disse entregando-me o seu celular.
Achei engraçada a sua expressão de enfado ao falar de Verônica.
-- Não tenha pressa ta? Pode falar a vontade, eu só vou ali à mesa ao lado e volto logo.
-- Ta certo. Obrigada Alice!
-- Disponha...maluquinha! – disse isso com um sorriso maroto e se retirou.
Passei uns segundos tentando lembrar o número do celular de Vick. Engraçado quando na hora que eu mais precisava da minha memória ela me deixava na mão. “Já sei!”- disquei rapidamente para não correr o risco de esquecer novamente.
-- Alô? – ouvi a sua voz séria do outro lado.
-- Vick?
-- Giulia você quer me matar do coração? O que aconteceu com você? Porque não me respondeu? Onde você estava? Eu estava muito preocupada com você eu lhe liguei umas milhões de vezes e... – nem me deixou falar, me bombardeou com perguntas.
-- Calma Vick. – a interrompi – Uma pergunta de cada vez. Mas tentando responder algumas: Não, não quero lhe matar do coração. Não aconteceu nada, estou bem. Eu não respondi por que estou seu meu celular, ele foi recolhido, não posso usá-lo lá, são regras da agência. Desculpe-me por deixá-la preocupada, mas estou bem não se preocupe. Não posso falar muito ta? O celular é emprestado e eu não quero abusar da boa vontade alheia. Liguei apenas pra avisar que está tudo bem.
-- Tudo bem! Estou mais tranquila agora. Vou chegar um pouco tarde ta?
-- Será que eu posso...
Não consegui terminar a frase, fiquei paralisada com uma visão. Marina descia sorrindo as escadas, seus cabelos esvoaçantes como se fosse algo proposital. Seus passos eram firmes, o salto alto dava um toque todo especial para as pernas bem torneadas que estavam expostas graças a saia de fenda que ela usava. Meu Deus, que mulher é essa? – me perguntei. Ao seu lado estava a sua secretária, Fernanda. Mas eu nem me importava, olhava descaradamente para ela e somente ela. Estava prestes a pedir um babador.
-- Giulia? Giulia você ainda está ai? Alô?
-- O o oi. Tô...tô aqui sim. Desculpa.
-- O que houve?
-- Nada.
-- Mentira Giulia! Você está gaguejando.
-- Desculpa, é que vi uma pessoa lá da agência. – falava enquanto acompanhava a mulher deslumbrante a minha frente andar em direção a saída do restaurante.
-- Quem? Quem tem o poder de fazer você voltar a gaguejar?
-- Ah Vick ninguém não. – cortei antes que me entregasse.
-- Ta certo então. Pequena hoje eu vou chegar um pouquinho mais tarde viu?
-- Ta certo. – agora conseguia me concentrar, Marina já havia saído.
-- E se eu precisar falar com você?
-- Ah Vick, não sei. Só vou estar com o meu celular no final de expediente, antes disso não sei como nos falamos.
-- E de quem é esse número?
-- Da Alice, mas ela não trabalha na mesma sala que eu. – sorri.
-- Se for urgente eu não dispenso. – sorriu também – Tenho que ir aqui pequena. Até mais tarde. Cuide dessa gagueira ai viu?
-- Ai Vick! – fiquei ruborizada pelo simples comentário. – Um beijo. Até mais tarde.
-- Um beijo. Tchau!
Encerrei a ligação e deixei o celular sobre a mesa, onde antes Alice estava sentada. O celular começou a tocar, e eu passei a vista pelo restaurante, a sua procura. Quando o aparelho tocou pela terceira vez não aguentei a curiosidade e olhei a tela, tinha escrito “amor”.
-- Desculpa a demora Giulia, fui falar com um pessoal bom de papo e quase não me liberam de lá. – disse sentando. – Cadê a Natália?
Nossa, eu havia esquecido completamente dela. Ela havia saído para ir ao banheiro algum tempo antes de Alice também sair, e até agora ela não havia retornado. Onde será que ela havia se metido? Olhei para os lados e nada dela.
O celular voltou a vibrar.
-- Ele estava tocando agora a pouco. – disse a olhando enquanto ela encarava o celular em cima da mesa.
-- Ah sim. Só um minutinho.
Ela atendeu e falava baixinho ao celular.
-- Oi. Não. Estou no horário de almoço. Não posso ficar a sua disposição 25h por dia se você não fica por mim nem mesmo 2 horas consecutivas. Daqui a pouco volto pra JUMP. Tudo bem, eu lhe espero em casa.
Alice passou a me olhar sem nada dizer, mas eu seu rosto era possível notar uma pequena ruga no meio de suas sobrancelhas.
-- Desculpa a demora gente. – chegou a Natalia no exato momento que tive a impressão de que Alice falaria algo.
Encerramos a nossa conta e voltamos para a agência.
Chegamos a JUMP e vi que o carro de Marina já estava lá. Coloquei o carro em minha vaga e subi acompanhada de Natália e Alice, fomos até o banheiro fazer a nossa higiene, e de lá Alice separou-se da gente. Batemos o ponto e fomos para a nossa sala. Quando cheguei ao meu setor nem fui para a minha, fui direto para a mesa de Natália e lá passamos praticamente a parte toda discutindo – no bom sentido – sobre o projeto. Estava empolgada demais com o meu primeiro trabalho na agência.
Mais ou menos no meio do segundo turno Marina foi até o setor. Eu paralisei quando a vi entrar, minhas mãos soavam e minha boca parecia seca como se tivesse comido quilos e mais quilos de sal.
Todos falavam e a cumprimentavam normalmente, só eu que permanecia com aquela cara de débil, a olhando sem parar e sem mover sequer um músculo. Só conseguia admira-la. Marina se aproximou, parando bem a perto de mim, pra falar a verdade bem do meu lado. Eu podia sentir seu perfume em todo o ambiente, e aquilo mexia demais comigo, quando ela chegou perto de mim eu quase cai da cadeira.
Não conseguia controlar nenhuma reação que ela estava causando em meu corpo mesmo sem querer. Ela perguntou como estávamos com o projeto. Meu coração nunca havia saltado e nem batido tanto em meu peito como naquele momento. Ela logo deixou a sala, mas o tempo que ela ficou ali me pareceu longo demais, intenso demais.
-- Acho que por hoje já deu! – ela disse espreguiçando-se quando o relógio marcou 18hs.
-- Foi bem proveitoso hoje.
-- Com certeza. – ela desligava tudo e guardava seus pertences – Vamos?
Lembrei que Vick havia dito que chegaria um pouco mais tarde em casa hoje, e quando ela dizia isso, ela queria dizer que chegaria quase às 22hs. Eu não estava nem um pouco a fim de ficar em casa sozinha hoje. Preferia ficar mais um pouquinho por ali mesmo.
-- Acho que ainda vou ficar mais um pouquinho por aqui Natália, não tenho nada de tão importante que me faça ir correndo pra casa.
-- Não tem mesmo? – respondi negativamente com um manear de cabeça – Tem certeza? Vai ficar bem ai?
-- Tenho sim. – sorri – Pode ir.
-- Então ta certo. Até amanhã Giulia
-- Até amanhã.
Bati meu ponto no horário certinho e voltei para a minha mesa. Ainda tinha algumas pessoas sentadas em suas mesas, provavelmente terminando algum trabalho. Liguei meu notebook, tentei fazer algo que ocupasse a minha mente, e que fizesse o tempo voar.
Um senhor me interrompeu quando veio até a sala avisando que precisava fechá-la. Quando cheguei ao estacionamento passava das 21hs. Joguei a minha bolsa no banco traseiro e tentei dar partida no carro. Nada. Tentei novamente. Sem resultado. Só podia ser brincadeira. Uma hora daquela e o bendito carro não queria ligar? Tentei mais uma vez para desencargo de consciência. Nada. Eu não sabia o que fazer, não entendia nada de carros.
Tinha que ligar pra Vick. Me estiquei e peguei a minha bolsa no banco detrás do carro. No instante que abri a bolsa para pegar o bendito celular foi que lembrei que eu não havia pego ele com Verônica. Loira aguada! Abri a minha carteira em busca de dinheiro para pegar um ônibus. E adivinha! Não havia dinheiro. Eu não gostava de andar com valores altos em minha carteira, sempre andava só com o básico e cartões. E hoje tive a genialidade de pagar o almoço em dinheiro. Droga! Eu só estava com o cartão de crédito e débito.
Sentei no banco do motorista com a porta do carro aberta e as pernas para fora. Estava na tentativa frustrada de ter alguma idéia brilhante.
-- Algum problema ai? – no mesmo instante meu coração saltou.
-- Na..não D. Marina.
-- Ah não. Nada de dona. O que você ainda está fazendo por aqui uma hora dessas? Aconteceu alguma coisa?
-- Me distrai fazendo um trabalho pessoal e esqueci da vida. – disse me colocando de pé a sua frente.
-- Eu voltei para pegar uns documentos e lhe vi aqui sozinha, achei estranho e resolvi vir perguntar se está precisando de algo.
-- Na verdade, eu acho que preciso de um celular pra ligar pra algum mecânico, pra Vick, algo que resolva o problema do meu carro.
-- Acho que conseguir um mecânico uma hora dessas vai ser bem complicado.
-- Eu posso ligar pra Vick.
De repente ela ficou séria, parecia pensar. Ela colocou a mão no bolso de sua calça moletom e estendeu o aparelho celular em minha direção.
-- Pode ligar. – ela disse séria.
Estranhei a mudança repentina dela, mas aceitei. Liguei para Vick e para a minha mais pura sorte, seu celular estava desligado. Tentei uma, duas, três vezes e nada. Mais que droga!
-- Ela não atende. – disse totalmente frustrada e vencida.
-- Eu posso te levar em casa. – ela disse voltando a sorrir.
-- Imagina não precisa. Eu dou um jeito.
-- Nada disso, se você ficar, eu fico aqui com você.
-- Não! – disse mais alto e mais alvoroçada do que pretendia.
-- Então você vem?
Eu perdia meu total controle perto daquela linda mulher. Como eu poderia ficar sozinha em sua companhia? Meu coração estava que nem um louco.
-- Você vem? – ela insistiu.
– Marina –
Hoje, especialmente hoje havia acordado com uma sensação gostosa percorrer meu corpo. Eu não costumava ser mau humorada, mas, meu humor hoje estava realmente invejável. Nem me reconhecia com isso.
Cheguei na agência a tempo de ver Giulia deixar seu carro com os braços repletos de coisas. Correu na direção do elevador, apressa, atrapalhada e desajeitada. Sorri com a cena. Giulia era a mistura perfeita de mulher e menina. Isso despertava a minha atenção. Admirava-a ainda mais.
Acho que isso foi exatamente uma das coisas que me fizeram reparar de uma forma mais profunda do que um dia já reparei em alguma mulher. Aquele jeito de menina, a vivacidade que ela transparecia com uma facilidade natural no olhar.
-- Bom dia Nanda! – disse quando passei por sua mesa.
-- Bom dia chefinha.
Já ia alcançando minha sala quando ela tornou a falar.
-- Ah Marina, ia esquecendo, o Alberto ligou ontem no final da tarde e pediu para lhe lembrar da reunião com os patrocinadores da campanha de lingerie. – Nanda disse olhando a sua inseparável agenda.
-- Ah! Obrigada. Se não tivesse falado agora com certeza eu esqueceria.
-- Não se esqueça de levar as propostas e o contrato.
-- A reunião é só amanhã não é? – perguntei com a mão na maçaneta da porta.
-- Sim! Mas é a sua primeira tarefa do dia, a reunião vai ser no escritório do Alberto, terá que estar lá as 8hs, ele quer falar sobre outro assunto com você antes mesmo da reunião.
-- E o que temos para hoje?
-- Sem reuniões por hoje. Somente Pablo e Juliano entrarão em reunião. Hoje você tem a inspeção de setor e o acompanhamento dos novos publicitários.
Sorri ao me dar conta de que logo logo veria Giulia novamente. Nanda me olhou atentamente e balançou a cabeça em negativa com um sorriso no rosto. Adentrei minha sala antes que ela perguntasse algo.
Passei a manhã envolvida e mergulhada no trabalho, em papéis e mais papéis. A dor de cabeça começava a dar sinal de vida. Apesar de amar muito tudo o que eu fazia, eu tinha que ler milhares de contratos, de propostas, entre outras coisas que sempre insistiam em serem escritas em letras minúsculas e que com o passar do tempo de leitura começavam a se embaralhar sozinhas diante de meus olhos.
Como de praxe, convidei meus amigos para almoçarem comigo no Veneza.
Chegamos ao restaurante e entramos pela parte detrás, tratei logo de falar com Estevão – gerente e administrador do lugar -, para assinar uns papéis autorizando a expansão do ambiente com a compra de mais duas casas ao lado. Papelada assinada, tudo ok, pedi a Estevão que nos conseguisse uma mesa no piso superior do restaurante. Era o meu lugar preferido ali, me dava toda a visão da parte de entrada principal do restaurante, quem entrava e quem saía.
Fazia pouco tempo que tínhamos chegado ao restaurante, pouquíssimo tempo mesmo. Gelei dos pés a cabeça, meu coração pareceu falar, de repente comecei a tremer. Mesmo assim eu mantinha o olhar fixo no mesmo ponto. Eu acompanhava cada passo seu sem que meu coração se acalmasse um mísero instante. Estava petrificada, apenas meus olhos pareciam ter vida. Não ouvia e nem via mais nada. Apenas Giulia que adentrava o restaurante sorridente.
-- Marina? Marina? Ei?
-- Hã? Que foi? – perguntei saindo do transe.
-- Eu que pergunto. O que foi?
-- O que foi o quê? – dei mais olhadinha para a mesa onde Giulia agora estava sentada.
Nanda olhou para o mesmo lugar que eu olhei por pouquíssimos segundos, mas aquilo foi o suficiente para eu me entregar, e ela sacar tudo. Era melhor abrir o jogo.
-- A Giulia está aqui.
-- Isso eu já vi, bem que você podia ter dito logo. – fez falsa expressão de raiva – Mas o que é que tem ela estar aqui? Quase todo mundo da JUMP almoça aqui normalmente.
-- Eu não sei.
-- Diga a verdade agora. O que houve?
Ela perguntava como se esperasse uma confissão.
-- Não consigo explicar as sensações que ela causa em mim, mas foi só ela entrar aqui pra meu coração acelerar que nem louco e as mãos soarem. Acho que até tremi. Eu nunca senti isso de maneira tão intensa como eu sinto perto dela, e olha que eu nem a conheço direito. Não sei de nada da vida dela.
-- Você não sabe como eu me sinto em lhe ouvir falar dessa maneira Marina, fico muito feliz por ver que finalmente você está se permitindo. Talvez tudo isso que você esteja sentindo seja indícios de uma paixão.
Paixão? Será?
Enquanto almoçava vez ou outra eu olhava de soslaio para a mesa onde Giulia estava, ela ainda estava acompanhada de duas funcionárias da JUMP, Alice e Natália. Eu não conseguia evitar a pontada de ciúmes que eu sentia quando via Natália falar mais próxima de Giulia, ou quando tocava o seu braço lhe chamando a atenção. Não era nada demais, era algo normal, Nanda mesmo já havia feito isso comigo só ali naquela mesa milhares de vezes, porém eu não conseguia de maneira nenhuma não sentir aquilo. As vezes quando algo lá embaixo, naquele mesa me incomodava era inevitável eu olhar, na verdade ficar de frente para onde elas estavam e ficar encarando, petrificada. Isso até Nanda bater a sua perna por baixo da mesa na minha chamando a minha atenção sussurrando “Disfarça!”.
Depois de terminarmos nossa refeição, os meninos saíram para resolver problemas e apenas Nanda ficou ali comigo. Que não tardou em me interpelar.
-- Agora vamos conversar direito. Eu já tinha notado, mas quero que me conte. O que está acontecendo com você Marina? Me diz a verdade, eu quero te entender e quero te ajudar, mas pra isso preciso que você me conte a verdade.
-- Eu não sei bem qual é a verdade Nanda, tudo o que eu sei é que essa garota esta mexendo comigo de uma maneira que... – suspirei - eu não sei.
-- Você ficou inquieta desde que ela chegou, não parou de olhar para a mesa onde ela estava, ficava encarando. Por pouco Juliano e Pablo não perceberam tudo.
-- É tão intenso Nanda, parece que algo se move dentro do meu estômago. Eu fico inquieta, fico boba, fico sem fala, penso nela o tempo todo, sonho com ela, quero estar perto dela. E o estranho de tudo isso, é que ela começou a mexer comigo desde que eu vi uma simples foto dela. É algo no olhar...não sei. Sinceramente não sei definir tudo o que eu tenho sentido desde a chegada dela. – falei com o olhar distante, tentando focar nas novas sensações.
-- Eu acho que você está realmente apaixonada! – sentenciou.
-- Isso é um pouco assustador.
-- Mas você estaria disposta a investir?
-- Acho que sim. – suspirei.
-- O que falta pra você ter certeza Marina?
-- Muita coisa. Primeiro de tudo eu nem mesmo sei se ela namora, tem uma tal de Vick que ela diz que mora com ela há mais de sete anos, mas a relação delas me pareceu bem mais que amizade, não sei, pode ser que eu esteja errada. Pode ser também que ela tenha um namorado, pode ser que nem passe pela cabeça dela namorar outra mulher. E segundo, tem o fato de ela ser mais nova do que eu, de eu ser a chefe dela...
-- Desculpas! – me interrompeu.
-- O quê?
-- Tudo isso é desculpa. Mas vamos tirar tudo isso a limpo! Vamos? – perguntou levantando da mesa.
-- Pra onde?
-- Nós vamos embora. Você vai descer essas escadas praticamente desfilando em um tapete vermelho, rebol*ndo e dando o seu maior sorriso. Vamos aproveitar que ela está sozinha, e, se ela olhar pra você, ficar babando ai teremos quase certeza de que ela não repugna a idéia de namorar outra mulher.
-- Namorar? – perguntei surpresa.
-- Marina anda logo, levanta dessa cadeira.
-- Mas...
-- Anda Marina! Você faz o seu papel e eu faço o meu, você deslumbra e eu observo as reações dela.
Nanda descia as escadas a um passo atrás de mim, quase ao meu lado, olhei para o lado e vi que ela estava totalmente concentrada em Giulia, na tentativa de captar a sua reação ao me ver. Quando me viu olhar para Giulia me recriminou.
-- Não olha! Rebola Marina, rebol*!
Não pude deixar de sorrir verdadeiramente com isso, e Nanda me acompanhou também. A escada parecia maior do que ela realmente era, não acabava mais, e isso estava me deixando ainda mais nervosa. Quando cheguei na porta do restaurante quase corri na direção do meu carro, e minha amiga me seguia do mesmo jeito. Pareciamos duas adolescentes que tinha acabado de aprontar alguma.
Entrei no carro rapidamente e assim que Nanda entrou não pude esperar mais que um segundo.
-- E ai? Ela olhou?
Ela ficou calada, séria, parecia pensar. Meu coração batia cada vez mais acelerado e minha mãos não paravam de soar em contato com o volante que eu apertava tamanho meu nervosismo.
-- Marina. – hesitou - Pelo amor de Deus corre e agarra essa menina! – falou com grande animação e terminou sorrindo.
-- Ela olhou? – perguntei compartilhando da alegria que Nanda.
-- Se ela olhou? Meu amor ela quase babou o chão inteiro do restaurante Marina, ela não tirou os olhos de você, estava vidrada. Acho que você tem uma chance. – disse balançando as sobrancelhas e empurrando meu ombro com o seu.
-- Não brinca Nanda, ela é jovem, nunca vai querer ficar comigo, nunca vai me olhar com outros olhos, eu sempre vou ser a chefe dela e nada mais. Ela deve ter ficado surpresa por ter me visto aqui, só isso. – falei dando uma desanimada.
-- Deixa de tirar conclusões precipitadas Marina, como você tem tanta certeza das coisas se ainda nem tentou?
Não disse mais nada, nem mesmo sabia o que deveria falar diante da pergunta de Nanda. Dei partida no carro.
-- Não vai me responder Marina?
-- Eu não sei o que fazer Nanda. – disse como um desabafo.
-- Como não sabe? É claro que sabe! Se aproxime mais dela, a conquiste se for necessário. Você é uma mulher especial, romântica, meiga, carinhosa, encantadora, inteligente, astuta, fiel...não vai ser uma tarefa difícil.
-- E se ela já estiver comprometida ou apaixonada por alguém?
-- Isso você não vai descobrir perguntando pra mim amiga, só ela pode te responder isso, então, a única coisa que você pode fazer é se aproximar dela, criar um vínculo, uma amizade, e só assim você vai descobrir isso. E muito mais claro.
-- Eu vou tentar! – disse com um sorriso de lado.
-- Não não, você vai conseguir! Ai Marina! – disse dando um gritinho e batendo as palmas com entusiasmo – Ela é linda Marina, vocês formariam um belo casal, perfeito!
Estava decidido, eu precisava me aproximar da Giulia, e era isso mesmo que eu ia fazer, pouco a pouco eu iria conquistar um pedacinho, um cantinho na vida dela. Eu queria aquilo, precisava, iria investir com toda a certeza do mundo. Se dependesse de mim eu traria Giulia pra mim.
Assim que chegamos à agência tranquei-me em minha sala, queria pensar e confabular uma maneira sutil e eficaz de me aproximar de Giulia. Não parava de pensar nela um segundo sequer, e era só a sua imagem vir a minha cabeça que todas as sensações vinham com força.
Perto do final do expediente, resolvi seguir um pouco a minha rotina, mas dessa vez com um gostinho a mais, Giulia estava em meu “caminho” dessa vez, fazia parte do meu dia. E era algo extraordinário somente poder olhar pra ela. Desci para uma rápida “inspeção” no meu setor, só pra saber como as coisas estavam, em que pé estavam os novos projetos e pra saber como ela estava se saindo.
Mais uma vez no dia eu me sentia nervosa, completamente nervosa. Parei uns instantes junto a porta do setor, me preparava para entrar. Respirei fundo, e sorri por ansiar a minha visão predileta.
Falei com cada um, mas a única mesa em que eu me demorei foi na de Natália e Giulia. Parei bem próximo a ela, e de onde estava podia sentir o perfume de sua pele, de seus cabelos. Minhas pernas quiseram fraquejar, isso fez com que protelasse a minha saída um pouco mais ali, parada, bem ao lado dela. Falei com elas sem conseguir desfazer o sorriso que se formou em meus lábios.
Não me demorei muito, mas quando deixei o ambiente retornando para a minha sala, trouxe o perfume dela comigo.
O dia havia passado extremamente rápido. O expediente já havia acabado. Passei quase o dia inteiro completamente desligada, alheia. Tudo o que eu conseguia pensar era nela.
Pouco tempo depois que havia chegado em casa recebia uma ligação de Alberto - meu advogado, me perguntando se estava tudo pronto para a nossa reunião no outro dia, se eu estava preparada. Só depois dessa ligação foi que lembrei da papelada que eu precisava levar para Alberto. Que cabeça a minha! Eu havia esquecido a pasta com todos os documentos em minha sala, na agência. Eu não podia ir para a reunião sem estar munida deles. O jeito era voltar até a agência para buscá-los. Tomei um banho rápido, vesti uma roupa mais confortável, e voltei a dirigir na direção da JUMP.
Entrei no estacionamento dirigindo lentamente. Quase não haviam carros no estacionamento aquela hora, estava praticamente deserto, a não ser pelo carro de um dos chefes da segurança, um do pessoal do RH, e um carro que não sabia a quem pertencia, mas estava lá desde a hora que fui embora.
De longe avistei que tinha alguém sentado no banco do motorista mantendo a porta aberta. Estacionei longe daquele carro em específico, e resolvi ir andando lentamente na direção do mesmo. Eram pernas femininas. Meu coração parou por alguns segundo quando consegui identificar quem era dentro daquele carro. Era Giulia! Instintivamente, olhei para o relógio, era tarde, muito tarde. O que será que ela ainda fazia por ali, sozinha dentro daquele carro? O que será que tinha acontecido? Me aproximei sem ser vista.
Ofereci ajuda e lá veio ela falar da tal amiga.
Vick? Quem era Vick? – me perguntei. Se ela quisesse, eu a levaria para onde quisesse, não precisava ligar para ninguém, eu a deixaria em casa com todo o prazer do mundo. Tudo em troca de ficar um tempo a mais com ela, e isso seria perfeito para começar a me aproximar dela.
Mas se ela queria tanto assim falar com a tal moça, que seja. Busquei o celular em meu bolso e o entreguei para ela, mesmo a contra gosto.
Ela me olhou por alguns segundos e acabou aceitando o celular que eu lhe entregava. Fiquei olhando-a, admirando enquanto ela tentava inutilmente falar com a Vick. Não a conheço, mas já não gostei dela.
Já que a tal Vick não atendia o celular, novamente ofereci minha ajuda dizendo que a deixaria em casa. O que ela negou. Claro que eu não a deixaria ali sozinha.
-- Então você vem? – perguntei me colocando a sua frente novamente.
Ela parou por alguns instantes, pensativa, parecia diante de um grande dilema com a minha pergunta. Ela me encarava, me olhava fixamente. Aquilo estava me desestruturando completamente. Aquele olhar me instigava. Uma vontade louca de beijá-la me acometeu.
-- Você vem? – insisti.
Ela abria e fechava a boca várias vezes, mas sem emitir nenhum som. Me olhava como se tivesse dividida.
-- Tudo bem! Se não for lhe incomodar de maneira nenhuma eu aceito a sua carona.
-- Não será incomodo nenhum. Mas... – já ia esquecendo do que tinha ido fazer ali.
-- Mas?
-- Você se incomoda de me esperar um pouquinho? Preciso ir até a minha sala pegar uns documentos, ai poderemos ir.
-- Claro que não. Eu que já estou abusando da sua boa vontade. – disse sorrindo.
Busquei de uma força que eu não sabia que existia, tudo para me segurar e não avançar em sua boca. A vontade de sentir seus lábios nos meus só aumentava.
-- Então eu vou lá. – disse já me distanciando.
-- Espera! Eu posso ir com você? É...é que eu não queria mais ficar aqui sozinha.
-- Claro! Pode vir!
Meu Deus, isso é muito difícil, não consigo frear a vontade de descobrir o sabor dos lábios dela.
Em instantes ela se colocou ao me lado e pegamos o elevador na direção de minha sala. O silêncio ali dentro era absoluto. Permanecemos ao lado uma da outra, ainda sim deixando uma certa distância entre nós.
Cheguei a minha sala, a destranquei e tentei ligar a luz. Apertava o interruptor e nada. Entrei assim mesmo, a sala estava escura, iluminada apenas por pequenos fechos de luz que vinham dos postes na rua, invadindo a sala pelas persianas.
-- O vigia deve ter desligado o quadro das luzes de novo. Droga! – disse ao bater o pé em algo que não consegui identificar.
-- Tudo bem? – ela quase sussurrou.
-- Tudo. - parei onde estava - Giulia você tem medo do escuro? – não me contive em perguntar diante de seu jeitinho assustado.
Giulia estava bem atrás de mim, quase colada em minhas costas. Ela acompanhava todos os meus movimentos.
-- Hunrum.
Sorri e consegui chegar a minha mesa. Tateei em busca da pasta que eu havia deixado bem em cima da mesa, mas tudo o que consegui foi joga-lo no chão ao esbarrar minha mão nele. Abaixei-me a passei a tatear o chão em busca daqueles benditos documentos.
Eu podia sentir a respiração de Giulia bem atrás de mim enquanto ainda permanecia abaixada.
-- Encontrei! - disse me levantando de sopetão.
Foi tão rápido que Giulia nem mesmo teve tempo de dar alguns passos para trás. No momento que me ergui, foi inevitável, acabei esbarrando de frente com Giulia que acompanhava todos os meus movimentos bem de perto.
O choque a pegou de surpresa, e como consequência ela desequilibrou-se. Como já havia acontecido outra vez tirei reflexo não sei de onde, mas consegui segurá-la pela cintura antes que ela caísse. Não pensei duas vezes, soltei a pasta que havia acabado de encontrar e segurei Giulia a puxando para mim. Nesse movimento ela acabou ficando a pouquíssimos centímetros de mim.
-- Desculpe. Tudo bem?
O contato com o corpo de Giulia me fez tremer inconscientemente, e minhas mãos soassem. Não sei se isso seria algo bom ou ruim, mas isso não passou despercebido por ela.
-- Tudo bem. – parou por alguns instantes - Você está tremendo! - constatou.
Não consegui falar nada, senti minhas bochechas arderem, podia apostar que elas estavam vermelhas. Acho que por muito pouco ela não conseguia ouvir meus batimentos. Meu coração estava mega acelerado. Eu não conseguia esboçar nenhuma reação, nenhuma palavra, apenas olhava para seu rosto que estava mais do que perfeito debaixo do pequenos fechos de luz que iluminava especialmente seus olhos e sua boca.
-- Marina?
-- O que você fez comigo? - perguntei apertando um pouco mais a sua cintura.
-- É...é Marina me desculpe, não foi intencional, só estava um pouco assustada e...
-- Não estou falando disso. - a interrompi e a puxei contra meu corpo.
-- Do que...
Não dava mais, eu não aguentava mais aquilo, estava sendo torturante. Venci de uma vez a distância e rocei meus lábios nos seus.
-- Giulia. - falei se nome após um suspiro e antes de beijá-la.
Fim do capítulo
Desculpem se o capítulo ficou grandinho...
Mas espero que gostem.
uma ótima leitura
Beijos
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