+ A obra contém cena de sexo leve entre mulheres.
Capítulo 1
Novembro Azul
Nelma Leonidio
São Paulo,
07 de fevereiro de 2016
Amada amiga
Era primavera. O céu estava mais azul, minha amiga, as flores já eram visíveis em algumas árvores, o vento balançava suas folhas e elas traziam um suave cheiro de jasmim misturado com orquídea. Fui feito um cão alemão farejando, tentando descobrir de onde vinha esse cheiro.
Depois de caminhar um pouco, do outro lado da rua, deparei-me com uma dama. Ela estava apreciando seus livros através do vidro.
- Bom dia! Posso ajudá-la? - disse ela.
E eu, olhando para ela, fiquei contemplando-a por alguns minutos sem falar nada. Nunca tinha visto uma mulher assim, tão esplêndida.
Elegante com seus 1,65 metros de altura. Cabelos ondulados repicados nas pontas, próximos ao ombro, brilhavam feito ouro refinado. Seus olhos! Ah, amiga, seus olhos... Por um momento, pensava que contemplava o céu azul de primavera, ela era tão linda, que, se Leonardo da Vinci a tivesse conhecido, de uma coisa pode ter certeza: ele a teria desenhado, e não pela metade, mas por completo. Seu corpo parecia curvas que levam ao paraíso.
Depois de perceber que eu estava hipnotizada, ela sorriu.
Boba, eu, achando que já tinha terminado de apreciar tudo nela, fui premiada com seu sorriso, tão branco, que parecia neve.
Depois que ela sorriu para mim, senti meu rosto queimando, acho que fiquei vermelha.
Eu retribuí o sorriso, sorrindo para ela também. Então, depois de fazer um esforço para a voz sair, eu disse:
- Bom dia! Sim, é claro, pode, sim, você pega para mim, por favor, aquele livro? - apontei em direção ao vidro. Foi quando apareceu um rapaz, mais ou menos da altura dela, cabelos claros, com as bochechas rosadas, um pouco magro.
Aproximou-se e deu um beijo no rosto dela, entrando na livraria.
Logo em seguida, ela fez um gesto pedindo para eu entrar. Foi até a prateleira, pegou o livro que eu tinha escolhido, paguei. Quando ela veio ao meu encontro do lado de fora, levantou a mão, olhando nos meus olhos, entregou-me o livro e, em cima dele, havia um pedaço de papel com o número do telefone dela. Fiquei surpresa!
Com meu sorriso de canto a canto, passei o número do meu telefone também.
Tentei tocar na mão dela, mas ela esquivou.
- Aqui não.
Olhou para dentro da livraria.
- Desculpe.
- Tudo bem.
Saí sem entender nada. Durante a volta para o meu trabalho, no meio do caminho, fiquei pensando: "Será que ela é casada?".
E aquele rapaz é marido, namorado ou filho?
Peguei o livro de dentro da sacola. Outra surpresa, não era o livro que eu tinha escolhido, ela trocara enquanto eu estava de costas. O livro estava com as páginas todas em branco, não tinha nada escrito. Eu caminhava lentamente, esperando que ela me ligasse, eu queria uma explicação.
Eram quase sete horas da manhã quando fui acordada com o barulho insuportável do despertador.
O vento batia de leve na janela, dava para ouvir o barulho dos carros de dentro do quarto, a temperatura estava amena, nem dava vontade de levantar, queria ficar dormindo mais um pouco, ou quem sabe sonhar.
Depois de alguns minutos lutando contra o sono, levantei, agradeci a Deus pela noite, peguei uma das camisas de manga longa, a maioria de estampa azul, separei meu sapato driver turquesa - não gostava de usar sapato de salto - e minha calça de sarja bege. Entrei no banheiro, tomei um banho quente, escovei os dentes, coloquei a roupa, fiquei uns dois minutos escolhendo qual dos perfumes usaria. Fui até a varanda, coloquei comida para os meus dois peixinhos, aproveitei e fiz um cafuné no meu cachorro Ralf. Enquanto isso, o leite quente, os cereais e algumas frutas já me esperavam na mesa da sala. Antes de sair de casa, aproveitei o espelho grande na sala, visualizei o meu cabelo castanho curto até o ombro, peguei a chave do carro e, antes de sair, pedi proteção a Deus, como de costume.
O trânsito, como sempre, congestionado: parecia que os mais de 11 milhões de habitantes com carros resolveram sair ao mesmo tempo. Tentei diminuir o estresse causado pelo trânsito ouvindo uma música. Tentei até acompanhar a canção, cantando também.
Eu gosto tanto de ouvir música, que, até quando estou dormindo, eu sonho ouvindo, sou movida à música.
Gosto também de ficar olhando, quando vou trabalhar, do lado esquerdo da avenida, onde o verde é mais constante, o ar fica mais puro aqui, é interessante ver o vai e vem dos carros, motos, caminhões, ônibus, o barco dentro do Rio Pinheiros, avião, que passa próximo aos gigantescos prédios em forma de cubo, tudo isso em meio ao barulho do trem. Minha ex-professora de Geografia iria gostar de ver praticamente todos os meios de transportes a poucos metros de distância.
Em um dia sem muito trânsito, eu chegaria ao trabalho em quarenta minutos; cheguei em uma hora e meia.
Eu sou dona de uma enorme floricultura em um bairro nobre: "Passione Flores" é o nome. Eu gosto de ir praticamente todos os dias da semana, faço questão de acordar de madrugada para escolher as flores na central de abastecimento de São Paulo. Para mim, é prazeroso poder escolher cada uma delas, pois serão flores que arrancarão sorrisos, flores que estarão presentes diante de um "sim", "sim, eu aceito", flores que farão parte da decoração de uma casa, ambiente de trabalho, igreja, de uma sala de escritório... Flores que participarão de uma festa-surpresa de aniversário, flores diante de um pedido de namoro, casamento, flores até mesmo diante de um "até breve" em meio às lágrimas. Vendo flores para todo o estado de São Paulo. Apesar de, às vezes, lutar contra o sono de manhã, a paixão que tenho pelas flores é o que fez a diferença no crescimento da empresa.
Não importa o que você faz, procure sempre fazer o que gosta, mesmo diante dos obstáculos que durante a caminhada irá encontrar. Lembre-se de uma coisa: quando fazemos algo que gostamos, sempre procuramos fazer o melhor, a paixão nos move até chegarmos ao último degrau, mesmo tropeçando.
Chegando ao trabalho, do lado esquerdo, há uma moldura feita da árvore topiaria, envolvendo uma pintura de dois homens, um com violão e outro com um violino e um coração pequeno ao lado; no meio do caminho, tapetes de grama; entre os azulejos, ao lado direito, outra tela, agora de uma mulher sentada contemplando os músicos. O cenário na entrada combinava com a fachada azul da floricultura.
Falei com o segurança, que me recebeu com um sorriso.
- Bom dia!
- Bom dia, Senhora Laura.
- E sua família, Diego, está bem?
- Sim, graças a Deus.
- Que bom! Bom trabalho.
- Obrigado! Para a senhora também.
- Obrigada!
Cumprimentei os outros funcionários que estavam preparando uma cesta de café da manhã; e outros que, em dez minutos, terminavam de montar um buquê de flores vermelhas.
Todos me receberam com um sorriso, mas também, em um ambiente daquele, não poderia ser diferente. Como de costume, olhei alguns vasos de flores, entrei na minha sala, fiquei olhando o site da empresa e fiz algumas ligações para fornecedores.
Nesse dia, trabalhei até as 16h. O sol ainda nem se escondeu, e eu já estou na ponte. E fico diante do cartão-postal: Ponte Estaiada. É tão esplêndido ver o seu reflexo no rio e suas curvas conectadas a um mesmo mastro! É curioso ver gigantescos prédios de cabeça para baixo, uma cidade dentro do rio. Lembrei que a ração do meu cachorro estava acabando, como eu tinha que comprar pão integral, parei no caminho e fui ao supermercado.
Estacionei o carro. Como eu estava com pressa, fui direto ao setor de rações: enquanto eu caminhava distraída, a ração bateu na mesa de livros - o setor de livros era próximo ao da ração. Um livro caiu. Foi quando me abaixei para pegar e, ainda abaixada, ouvi um barulho suave de sapato de salto alto. Olhei. O que era aquilo, minha amiga?! O sapato preto de bico e o salto fino de prata brilhavam tanto, que eu via o reflexo do meu rosto. Confesso que não gosto de usar, mas não consigo resistir a uma mulher de salto. Fui levantando devagarzinho, admirando seu belo par de pernas, que pareciam mais duas colunas de ouro de Ofir. Lembro-me como se fosse hoje: ela usava uma saia preta com um corte pequeno acima do joelho e uma blusa de cetim de manga longa cinza com botões na frente e um colar de pérolas grande e fino branco. Quando parei de admirar seu corpo e olhei em seus olhos, só não voltei ao chão de novo porque estava segurando do lado da mesa dos livros.
Fiquei assustada com a semelhança com a mulher com quem eu tinha sonhado.
Seus olhos pareciam o oceano, não no seu momento de fúria, mas de calmaria. Ela percebeu que eu a olhava diferente, e sorriu. Eu devolvi o sorriso meio tímido e, em seguida, falei:
- Desculpe!
- Desculpe por quê?
- Por não resistir à sua beleza.
Ela fez uma cara de quem gostou de receber elogio.
Depois disso, rimos. Eu, com as bochechas vermelhas, não queria perturbá-la mais. Saí antes que ela falasse, fiquei com medo da sua reação. Pensei: "Vai que ela goste da coisa!". Temos que correr das tentações, e não ir ao encontro delas.
As mulheres elegantes e lindas sempre foram o meu mal, posso até conseguir resistir a elas por um tempo, mas, por todo o tempo, será que consigo?
Há um ano eu não me relacionava. Estava tendo um momento de autoavaliação sobre o que valia a pena, o que realmente era importante e necessário na vida. Nunca fui de baladas, não consumia nenhum tipo de álcool, nem cigarros, tinha uma alimentação correta e gostava de programas light. O meu último relacionamento foi meio conturbado e doído. E quem nunca sofreu de amor? Sei bem que a maioria das pessoas opta em não ficar muito tempo só, talvez com medo da solidão, por não suportar a sua própria companhia, ou por acreditar que, se ficar com outra pessoa, logo vai esquecer a anterior. Acontece, porém, que não é bem assim, o sofrimento é inevitável, principalmente quando a outra pessoa deixa você. Mas o alívio da dor só acontece com o tempo, se você quiser. Senão vai passar o resto da sua vida presa a algo que não é possível. No começo, foi muito difícil, achei que eu nunca iria gostar de alguém de novo, só servia aquela pessoa, tive que aprender a transformar aquele amor em carinho. E é nessa hora que você tem que amadurecer, mesmo em meio à rejeição, à perda, à dor, nada é para sempre, a não ser o amor de Deus.
Depois de passar na padaria e no caixa, fui embora.
Chegando a casa, fui logo recebida com o carinho do meu cachorro. Depois de bagunçar os pelos dele, fui tomar banho. Depois, como de rotina, sentei na varanda com o meu chimarrão na mão, o som ligado, encostei meu corpo na cadeira de balanço. Um bando de pássaros passou próximo. Foi quando os olhei e vi o céu. O sol ainda não tinha se escondido por completo. Lembrei-me do sonho que tive na noite anterior e da semelhança daquela mulher que eu vi no supermercado. Lembrei-me do sorriso mágico dela e sorri também. Fiquei me interrogando: não olhei na mão dela para ver se era casada. Ah! Mas deve ser. Qual é o homem que não gostaria de tê-la ao lado, qual?
"E se eu voltar lá, será que vou encontrá-la de novo?"
"Será que ela tem filhos?"
Com certeza ela deve morar perto, mas onde?
Fiquei indagando por um bom tempo, antes de ir dormir. Li alguns versículos da Bíblia e adormeci.
Nessa noite, eu não sonhei com nenhuma mulher. Era comum isso acontecer. Acho que é porque estou sem ficar com mulheres há muito tempo. Minha mente está cheia de desejos, e não os coloco em prática. Antes de dormir, peço a Deus para me proteger, principalmente quando estou dormindo.
Fiquei uns três dias sem ir ao supermercado, era próximo ao bairro em que eu morava. Estava ansiosa em vê-la de novo, e com um pouco de medo, medo de não conseguir resistir à sua elegância. Fiquei meio aérea o dia todo, lutando contra meus próprios pensamentos. Depois de sair do trabalho, passei em casa e resolvi ir ao supermercado de táxi. Dessa vez não fui ao setor de rações, iria comprar algumas frutas e água. E, para a alegria dos meus olhos, ela estava lá, em um corredor, na minha frente, só que de costas. Então eu aumentei os meus passos e passei com certa distância na frente dela, fingi que não a tinha visto.
Minha amiga, não sei como ela conseguiu chegar em questão de minutos, jogou o carrinho de cliente, quase bateu na minha perna. Quando eu levantei a cabeça, assustada, naquele momento, eu só conseguia ver os olhos dela em cima dos meus. A reação dos meus lábios foi imediata, abriram-se e, quando ela deu aquela famosa balançada de cabelo, os meus olhos não conseguiam parar de olhar os olhos dela. Eu fiquei mais uma vez hipnotizada. Parecia que ela fazia de propósito. Por que as mulheres são assim? Gostam de seduzir, de se sentir o centro das atenções, de ser cobiçadas, admiradas.
Mesmo que essa admiração toda seja por outra mulher.
Quem vai entender a cabeça de uma mulher?
Às vezes, falo como se eu não fosse uma, não falo?
Pensei em enchê-la de perguntas. Eu não gostava de ser atrevida, esperei uma iniciativa da parte dela.
- Tudo bom? - disse ela, com aquele olhar profundo.
Como eu iria dizer que não estava tudo bom, se eu ouvi uma voz tão suave e doce?!
A minha vontade, naquele momento, era de tomá-la em meus braços e sentir a maciez de sua pele com os meus lábios. Eu tive que me conter, pois o lugar não era apropriado.
Eu não conseguia mais ficar calada diante dela.
Então eu, sorrindo, falei:
- Tudo, sim. E com você?
- Estou bem também.
Perguntei o seu nome.
- Giovanna - disse ela, sorrindo.
Acho que ela queria que eu perdesse o meu controle, toda vez que ela sorria para mim, eu tremia.
- Laura, o prazer é todo meu.
Entre risos, saímos caminhando. Eu já estava me sentindo à vontade diante da beleza dela.
- Você deve me achar uma boba, não?
- Por quê?
- Por não conseguir parar de olhar para você.
Ela sorriu.
- Não. Imagina. Sempre é bom ser admirada de vez em quando.
Rimos.
- Me fala, você mora aqui perto? - perguntei.
- Sim. E você?
- Sim, faz um mês que mudei, ainda não deu para conhecer a vizinhança.
Rimos, novamente.
- Se precisar de uma guia, é só falar.
- Seria muito prazeroso ter a companhia de uma mulher tão gentil ao meu lado.
Rimos o tempo todo, parecia que já éramos íntimas há muito tempo.
Acompanhei-a até o carro dela com as compras. Falei que eu iria pegar um táxi, estava sem carro.
- Não, eu a levo a casa, só precisa de me falar onde é.
- Não quero incomodá-la.
- Imagina.
Abri a porta do carro para ela entrar e, em seguida, entrei do outro lado.
Já sentia meu coração acelerar. Só ela e eu dentro do carro, vidro escuro. Eu respirei fundo quando ela ficou me olhando e sorrindo, acho que ela gostava de presenciar a minha agonia.
Ela tocou em minha mão de propósito quando ia passar a marcha. Senti um calafrio daqueles, aquele calafrio que há muito tempo não sentia. Aproveitei e olhei se ela usava aliança, não queria perguntar, não naquele momento. Ela usava apenas um anel grosso, parecendo uma folha, não vi aliança. Não sei se eu sentia alívio ou medo.
Você deve estar se perguntando "Por que medo, se era o que você queria?".
Eu queria, sim, e quem não queria?
Era uma luta dentro de mim. Essa luta só terminava quando eu a via. Eu me esquecia de tudo o que eu aprendi desde criança. Eu gostava de ler a Bíblia, não que Deus não me amasse por eu ser assim. Ele não gosta do que não é correto, mas de mim eu sei que gosta. Foi um dos motivos por eu ter ficado muito tempo sem ninguém. Essa luta dentro de mim era constante, por ser contraditório ao que eu acreditava, por ironia, ou capricho da vida.
Então falei:
- Vamos.
Senão eu iria acabar cedendo.
- Vamos.
Fui falando onde eu morava. Ela ria, e eu sem entender o motivo do riso. Ela me perguntou se eu morava só. Falei que não.
- Não?!
- Não. Eu moro com meu cachorro e dois peixes.
Ela riu, e em seguida falou:
- Então quero agora mesmo conhecer os três.
Fiquei uns minutos olhando para ela e pensando: "Ela está querendo!". E ri depois.
Chegando ao condomínio, ela deixou o carro na área de visitantes. Falei com o porteiro e subimos.
Sétimo andar. Apertou o botão no elevador, 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, ambas sem falar nada. Apenas olhares e aquela vontade de beijá-la; mas, olhando a câmera, eu fiquei apenas na vontade.
Abri a porta, Ralf já estava esperando, queria sair, mas eu o fiz esperar um pouco. Ele era tranquilo, nem estranhou a presença da visita, e como iria estranhar?
Pedi para ela sentar, perguntei se queria beber alguma coisa. Eu não bebia, mas tinha um vinho que o meu irmão trouxe da Itália quando veio me visitar.
- Aceito uma taça de vinho, sim, por favor.
A seguir, como eu sou movida à música, liguei o som, levei-a até a sacada, mostrei os meus peixes, e ficamos um pouco admirando o céu estrelado.
Perguntei onde ela morava e se morava só.
Ela riu e disse que hoje ela mora só, e ficou rindo.
- Está vendo aquele condomínio lá na frente?
- Sim.
- Moro lá.
- Sério?! Então somos quase vizinhas.
- Pois é.
"Isso não vai dar certo", murmurei, brincando.
- Fica para jantar comigo? - perguntei.
- Que tal amanhã?
- Combinado. Posso mandar entregar flores amanhã no seu apartamento?
- Deixa para você me entregar quando eu vier jantar aqui.
- Tudo bem.
Falei para ela que eu tinha uma floricultura. Ela trabalhava no ramo de modas, isso explicava toda a sua elegância.
Ela pegou o número do meu telefone, e eu, o dela. Antes de sair, ela bagunçou o pelo do Ralf e tropeçou no tapete. Como eu estava ao lado, segurei-a, ficando a centímetros do seu rosto, dava até para sentir sua respiração. Quando eu ia roubar-lhe um beijo, o celular dela tocou.
- Não vou poder vir amanhã, mas fica para semana que vem.
- Combinado. Eu acompanho você até o portão.
Ela veio para beijar o meu rosto. Eu disse brincando que um beijo no rosto era muito perigoso, pois ficava muito próximo da boca. Peguei sua mão e beijei.
- Até mais!
- Até! A noite ainda não acabou - e saiu rindo.
Fazia tempo que eu não me sentia assim, leve. Eu nem sentia minhas pernas enquanto caminhava, eu flutuava, deu até vontade de escrever um poema, fazia tempo que eu não escrevia. Depois de passear com o Ralf, fui para o quarto escrever, queria entregá-lo junto com as flores.
Sentada na cama, a vasilha de lixo ficou pelo meio de rascunhos. Eu atirava, fazendo cesta. Depois de alguns rascunhos escritos, consegui terminar o poema. Eu esperava que ela gostasse.
Passaram-se três horas, quando ouvi o toque de mensagem no celular. Era ela. A mensagem dizia assim:
"Boa noite! Lembra que eu falei que a noite ainda não tinha terminado? Vá até a varanda e olhe em direção ao meu apartamento."
Levantei correndo, curiosa para saber o que ela iria aprontar. Quando olhei, lá estava ela, com um pijama de seda branco. Quando ela começou lentamente a tirar o pijama, embaixo, tinha uma lingerie preta. Depois, ela enviou uma foto, na qual vi que tinha um laço azul que segurava as duas partes da lingerie. Era tão ousado, que dava para ver a sua barriga por completo. Amiga, se eu tivesse asas. Ah! Não pensaria duas vezes, voaria ao seu encontro. Nem precisaria muito esforço para arrancar a sua roupa, pois já estava quase nua.
Peguei o celular e liguei para ela.
- Posso ir aí?
Em meio a risos, ela disse:
- Hoje não.
- Você só está querendo me perturbar, não está?
- Talvez...
- Por que só vou poder ver você na segunda-feira?
- Depois conversamos sobre isso, agora vou dormir.
- Depois de ter conseguido o que você queria, agora vai dormir? - eu ria.
- Eu ainda não consegui nada - disse ela.
Rimos juntas, e nos despedimos. Fui direto ao banheiro tomar um banho frio para apagar o fogo que queimava dentro de mim.
Eu a conheci há uma semana e já não conseguia parar de pensar nela. O que ela tem que as outras não têm? Estava ficando incontrolável. Tinha a plena consciência de que a culpa era minha. Se eu não tivesse falado nada quando a conheci, não teria chegado a esse ponto, mas, antes de me julgar, imagine você diante do oceano, olhando o sol se pôr. Imaginou? Impossível não admirar, não é?
Não sei o que ela queria realmente comigo, talvez fosse apenas uma aventura. Fosse o que fosse, eu não iria mais resistir, não mesmo!
Sempre tive poucas amigas, mas as que eu tinha eram verdadeiras, amigas para toda hora. Rebeca e Elisa eram exemplos de seres humanos, tinham uma alma nobre, ainda bem que Deus me presenteou com a amizade delas.
Rebeca era professora, formada em Letras, lecionava em duas faculdades, trabalhava praticamente o dia todo, tinha a difícil tarefa de ajudar a formar cidadãos que no futuro construirão a nossa sociedade. Professor é uma das profissões mais antigas e importantes. É uma pena que os políticos em nosso país não pensem assim, aliás, pensar, acho que eles até pensam, mas não fazem nada para melhorar as condições do professor. Enquanto eles ganham rios de dinheiro por mês, e sem relatar os benefícios, o professor tem que se virar com o salário injusto que ganha. Hoje em dia, o maior desafio do professor é ensinar para alunos que não "querem" aprender, e um dos motivos pela falta de interesse é que o governo não utiliza de nenhuma política de incentivo para que os alunos tenham interesse aos estudos. Tem que amar a profissão. Rebeca tinha como escolher outra profissão; mas, como era uma sonhadora e acreditava que poderia ajudar a construir uma sociedade mais justa e humana, escolhera ser professora por prazer e amava ensinar. Só amando mesmo para conseguir caminhar nessa difícil missão.
E, antes que você pergunte, não, ela não era gay. Casou, teve um filho, ficou casada por pouco tempo. Sempre foi linda, despertava os olhares quando passava. Um dia, um suposto comerciante começou a paquerá-la. Cheio da lábia, logo conseguiu conquistá-la. Em poucos meses, já estavam casados. Ela, pura, achava que estava vivendo um conto de fadas. Na noite de núpcias, ele a violentou... Uma semana depois, ela descobriu que ele saía com outras, vivia em farras. Ele só casou com ela para dar um golpe, já que, apesar de ela ser professora, era filha única de uma família rica. Já era costume dele fazer isso, enganar mulheres. Um amigo dele confessou tudo para ela.
Foi uma luta para ela conseguir se livrar dele, tentou duas vezes. Nessa ida e volta, ela acabou ficando grávida. Em uma noite, quando ela não queria dar a chave do carro, ele começou a agredi-la, bateu a cabeça dela na parede, só não sei como não perdeu o bebê.
Depois desse dia, ela ficou decidida a sair de casa, pois tinha certeza de que, se continuasse com ele, iria acabar morta. Assim, foi morar com os pais por um tempo. Ele, com medo de os pais dela o denunciarem, sumiu. Nunca mais ela teve notícias dele.
Elisa era um doce de pessoa, educada, muito educada. Era estilista. Só tinha um problema: não conseguia ficar sozinha, gostava muito de ficar na sala de bate-papo, e, se você não sabe como funciona uma sala de bate papo de lésbicas, vou falar mais ou menos como é. As mais frequentes são três tipos de mulheres que entram na sala: a primeira é aquela que, quando você dá um "oi", vai logo falando: "estou à procura de uma mulher linda, elegante, inteligente", só falta dizer também que seja rica. Até parece que o caráter da pessoa se define por sua beleza e inteligência! Se fosse assim, o pessoal lá de Brasília era todo honesto: em relação à inteligência, usa dela para destruir o nosso país.
A segunda é aquela que faz tantas perguntas, que você se sente como se estivesse em uma entrevista de emprego. Só falta perguntar quanto você tem na conta bancária. Até parece que quem entra na sala só fala a verdade. É por isso que tem pessoas que acabam se ferrando por acreditar em papo de quem não conhecem. Algumas pessoas falam o que você quer ouvir, e não o que elas são de verdade. Em relação aos homens, a situação piora.
A terceira é aquela que só entra quando está carente, procurando algo para preencher sua solidão, ou até mesmo só para conversar. A pessoa mal conhece você e já fala da sua vida, fala do relacionamento que não deu certo, que no momento busca fazer amizade, mas, se rolar outra coisa, está de bom tamanho.
Às vezes, acontece de você encontrar uma pessoa legal e construir um relacionamento sólido.
Porém, se você não tem beleza, inteligência e não é bem-sucedida, esqueça sala de bate-papo, vá procurar mulher na balada mesmo, olho no olho, vai ser mais fácil, o máximo que você vai dizer é um "oi", e o beijo rola solto.
Elisa um dia encontrou Noemi. Apaixonaram-se, não demorou muito e foram morar juntas. Apesar disso, deu certo o relacionamento, que só não suportou a crise dos seis anos, a rotina, segundo Noemi.
Com o tempo, Noemi acabou se apaixonando por uma colega de trabalho. Sabemos que o motivo do rompimento dela com Elisa não foi a rotina, mas o fato de ela não gostar de verdade da minha amiga. Então ela encontrou alguém que realmente fizesse o seu coração vibrar. Falo isso porque Elisa encontrou uma carta em que Noemi dizia palavras nunca ditas a ela. Continuaram, por algum tempo, morando juntas; mas, quando o sentimento acaba, vem a frieza, a falta de diálogo, dorme em camas separadas, até que um dos dois decida sair de casa. Por que tem que ser sempre assim?
E momentos que viveram juntas não contam? Não tem carinho, respeito: qual é o problema em manter um diálogo pelo menos para perguntar se a outra está bem? Dar um pouco de atenção a alguém de quem gosta, ou com quem viveu, não vai dizer que você quer voltar, ou alimentar esperança; não, vai apenas amenizar o sofrimento do outro.
Elisa ficou muito mal quando sua ex-mulher saiu de casa. Passou um bom tempo indo à psicóloga, o que não resolveu muito. Logo voltou à vida de antes na sala de bate-papo. Não demorou muito, lá estava ela com outra mulher, mesmo ainda gostando da Noemi, só para não curtir a solidão. De vez em quando, Elisa se queixa de sua tristeza, diz que não consegue esquecer Noemi.
Marquei com minhas amigas para irmos ao parque, gostávamos de fazer piquenique de tardezinha. Elisa gostava de tocar violão, fazíamos uma festa. Eu não desgrudava do meu chimarrão, enquanto elas, da taça de vinho.
Já tinha comentado com elas sobre a Giovanna, mas não detalhadamente. Elas morriam de rir enquanto eu falava. Foi quando a Elisa falou:
- Mas você não disse que não ia mais ficar com mulheres?!
- Sim. Eu disse que ia tentar, eu tentei, você sabe.
- Sei! ...
- Eu disse não para outras, lembra?
- Ah! Mas eram mulheres com menos de 40 anos - riu.
Tive que rir também.
- Você nunca gostou de mulheres mais novas, né?
- Verdade.
- Agora a primeira mulher madura, elegante, que aparece você não consegue resistir?
Fiquei em silêncio por alguns minutos, quando a Rebeca disse:
- Para que lutar contra o que você sente? Amor é amor. Mas eu compreendo, sua criação foi diferente, você cresceu ouvindo dizer que o homem foi feito para a mulher e vice-versa. Eu sei que você acredita nos princípios da Bíblia, sei também que a sua luta é constante. Não precisa se martirizar, todo mundo cai, levanta, cai e levanta de novo. Seja qual for o caminho que você escolher, só desejo que fique bem, feliz, você ficou isolada por muito tempo, sofrendo. Deixa acontecer, senão ficará mais triste ainda. Ninguém pode decidir por você, ninguém. Afinal, a consciência é sua. E, se você decidir ficar com a Giovanna, isso não quer dizer que você deixou de acreditar em Deus. Ou não?
Vieram as duas e me abraçaram.
- Agora vamos mudar de assunto. Vou tocar uma música para alegrar o ambiente - disse Elisa.
Depois de termos assistido ao pôr do sol, cada uma seguiu seu destino.
E, quando cheguei a casa, fui dedicar um pouco do meu tempo com os meus amores, fui olhar os meus peixes, sempre com o celular na mão, esperando que ela me ligasse ou mandasse uma mensagem. A cada segundo, eu olhava. Não queria incomodá-la, por isso esperava.
Sem sono, fiquei olhando a janela, mas ela não apareceu. Aproveitei a noite para escrever alguns poemas.
Parecia que o domingo passava lentamente, os ponteiros do relógio pareciam não funcionar, até o sol demorou a se pôr.
Segunda-feira, mal consegui fechar os olhos, nem precisei do despertador. Levantei... peguei o poema que eu tinha feito, li umas cinco vezes e fui trabalhar. Enquanto eu escolhia o vaso com orquídeas azuis, o telefone vibrou, e o meu coração em seguida. Era ela perguntando-me se ainda íamos jantar. Falei que sim, mas não na minha casa, e sim em um restaurante. Pedi para ela passar em minha casa para me pegar. Tinha ido mais cedo do que de costume, só trabalhei até o meio-dia, ia almoçar em casa. Queria dormir um pouco. Depois de resolver as coisas, fui para casa.
Adormeci com o rascunho do poema, estava decorando. Acordei quando a Joana bateu na porta do meu quarto, era a moça que cuidava da casa.
- Ainda vai precisar de mim? Já saí com o Ralf e coloquei ração para os peixes.
- Obrigada! Pode ir, sim. Não vou precisar, não. Ah! Tire folga amanhã.
- Tchau, Laura!
- Tchau!
Liguei para Elisa e pedi uma dica de que roupa usar. Eu tirava fotos das roupas e mandava para ela escolher. O look escolhido foi uma gravata-laço preta na camisa branca, combinando com a calça boyfriend e um blazer 7/8 azul com um sapato plataforma da mesma cor. Só a Elisa mesmo para me convencer a usar um sapato plataforma. A ocasião valia a pena.
Não demorou muito para ela me ligar.
- Já estou aqui no portão esperando.
- Já estou descendo, não fuja.
- Pode deixar.
"Sublime", falei, quando a vi.
- É essa paz que me vem quando,
Silenciosamente,
te vejo no espelho refletindo
através dos meus olhos
feito um recanto ameno.
Silenciosamente, meus olhos
disparam sempre em busca dos teus,
serenos, longe ou perto, sempre
sublimes.
Sublime é essa paz límpida
tal o céu azul que vem de ti
no reflexo de cada sorriso teu,
sublime.
Algumas mulheres escolhem uma roupa para ficarem lindas; já aquelas que possuem uma beleza diferente das outras fazem com que a mais simples roupa se transforme no mais belo look.
Ela usava um blazer marrom, camisa creme com detalhes na frente e botões, uma calça social de brim preta e um sapato scarpin marrom. Estava com o cabelo preso.
Ficaram visíveis seus brincos pequenos de prata, acho que ela não usava brinco de ouro para não ofuscar o brilho dela.
Já tentou olhar cinco minutos o sol em uma tarde de verão?
Seria assim com ela.
Depois de recitar o poema, ela sorriu para mim diferente. Ficou seduzida por minha admiração.
Abri a porta do carro e a levei a um restaurante em que eu gostava de ir. Temos a sorte de morarmos em uma cidade onde a culinária é diversificada.
Puxei a cadeira para ela sentar e olhamos o cardápio, escolhemos salmão grelhado com legumes, arroz branco acompanhado de um molho e, como sobremesa, hot holl. Ela se deliciava com sua taça de vinho, e eu, com minha água com gás.
Conversamos sobre a noite de sexta-feira, falei que ela e as flores eram deslumbrantes e cheias de artifícios para conquistar outros seres humanos. "As flores, assim como você, têm um poder de sedução poética, foram feitas para fazer com que a vida tenha mais sentido, tenha beleza, perfume, sutiliza e amor."
Ela não falava nada, apenas me olhava com um olhar doce.
Eram quase 22h quando chegamos a casa, peguei as flores e lhe entreguei.
- São lindas, obrigada!
- Escolhi essas porque combinam com a beleza dos seus olhos.
- Obrigada! Você, como sempre, galanteadora - riu ela.
- Eu é que agradeço por você me presentear esses dias com o seu sorriso. Desde o dia em que eu a vi, tudo ao meu redor tem tido mais brilho.
Quando terminei de recitar novamente o poema, ela levantou a mão, convidando-me para dançar. Toquei a sua mão, parecia que eu estava tocando em algodão, de tão macia. E, com o meu corpo colado no dela, sentindo sua respiração, seu perfume invadindo a minha alma, seu rosto próximo ao meu, amiga, amiga, ela tocou os lábios dela no meu rosto, parecia que o meu corpo iria entrar em erupção. E, sob o som das batidas do meu coração, toquei sua pele com o meu rosto. E, quando eu estava quase sem respiração, ela tocou seus lábios nos meus. Então eu a beijei, beijei de maneira como nunca tinha beijado alguém. Seus lábios pareciam ter néctar, eu não conseguia parar de beijá-la. A cada toque neles, o meu desejo aumentava mais.
Minhas mãos deslizavam sobre as suas costas e subiam até o pescoço, segurando o seu rosto, e, sem muita pressa, fui tirando cada botão de sua blusa com os meus lábios. Ela sentou no sofá. Tirei o sapato dela, beijei os seus pés, arranquei a sua calça, e, quando ela estava só de lingerie, mapeei seu corpo com os meus olhos e os meus lábios. Os meus olhos foram privilegiados em poder contemplar a arte mais bela, parecia que cada parte do seu corpo foi perfeitamente esculpida. E, depois de me deliciar com seu corpo, fizemos amor ali mesmo, no sofá. Em seguida, continuamos na cama. Parecia que meu corpo não queria mais sair de cima do dela. Ficamos até amanhecer, depois ela adormeceu em meus braços. Velei o seu sono por alguns minutos e adormeci também.
Eram 9h quando eu acordei. Tirei a mão dela de cima do meu corpo devagar para não a acordar, pois ela dormia feito um anjo.
Um dia antes, tinha dito para a Joana que não precisava vir trabalhar. Eu preparei um suco, separei algumas frutas, torradas, mel e levei com uma rosa ao lado para ela na cama. Ela acordou com o barulho da janela quando eu fui abrir.
Recebeu-me com um beijo e um sorriso leve no rosto.
- Que horas são?
- Nove e meia.
- Nossa! Eu tenho que ir embora, não era para eu acordar tão tarde.
- Nem eu, já liguei avisando que eu só ia passar no trabalho mais tarde. Olha o que eu preparei para você: café da manhã.
- Obrigada! Você está me acostumando mal.
- Gostaria de tê-la sempre aqui do meu lado.
- Ah, é?
- Sim. No final do mês é o meu aniversário, gostaria de passar com você, se for possível.
- Hum... vou fazer o possível, mas quero que seja em um lugar onde ninguém venha nos incomodar.
- Tudo bem, eu já sei onde passaremos, se você for.
- Onde?
- Eu tenho uma casa no campo, o lugar é perfeito.
- Então vou preparar algo especial para você.
- Especial? O que mais poderia ser especial do que a ter ao meu lado?
- Espere e verá!
- Se eu vou ter uma surpresa, então vou fazer uma para você também - eu ri.
- Mas o aniversário é seu.
- Sei, mas quero comemorar cada momento em que eu for passar com você, pois você tem sido cada batida do meu coração, o ar que eu respiro e o motivo pelo qual eu acordo todos os dias feliz.
- Você é tão fofa, que dá vontade de levar você para casa - disse ela, em meio a risos.
- Se você for me levar, vai ter que levar os meus animais também.
- Levo, sim.
Depois de tomarmos café, fizemos amor mais um pouco e tomamos um banho. Fui à sala recolher as roupas jogadas no tapete. Quando ela estava se vestindo, eu queria tirar a roupa dela de novo, mas ela tinha que ir, estava preocupada com algumas ligações perdidas no celular. Falou que mais tarde me ligaria, agradeceu pelas flores, pelo poema e pela noite, nos beijamos durante uns cinco minutos e ela partiu.
Refleti um pouco sobre a noite que eu tive com ela, cada pensamento que eu tinha aumentava ainda mais meus desejos, a vontade de ligar para ela foi imensa, mas eu esperei que ligasse.
Ao sair de casa, tentei deixar a imagem do seu rosto, mas o seu semblante me acompanhava aonde eu ia. Desde que eu a conheci, mudei um pouco, o trânsito não me incomodava mais, os meus funcionários perceberam um brilho a mais nos meus olhos, eu estava me sentindo leve, feliz. Não que eu não fosse feliz, mas era bom ter em quem pensar, a quem beijar, alguém que fizesse sentir aquele frio na barriga, alguém que conseguisse mudar o seu humor, alguém que fizesse sorrir do nada, alguém com quem você pudesse dividir a cama e ter em seus braços.
A cada minuto, ansiosamente, olhava o telefone e pedia ao sol para se esconder. Era incrível como ela me inspirava. Queria estar com ela, ligar; mas, como não era possível no momento, aliviava a minha ansiedade escrevendo:
As horas não passam, lentamente os ponteiros do relógio vão mudando de lugar, tudo ao meu redor não parece funcionar sem você aqui.
Enquanto o tempo vai passando devagar, serei como a lua, que espera anoitecer para surgir e mostrar todo o seu mistério e beleza.
E eu vou levando lentamente meu suspiro de encontro ao azul-celeste que se esconde através dos seus olhos, e, quando eu te encontrar, saciar-me-ei das curvas profundas do seu corpo, assim como o beija-flor se alimenta do néctar das flores.
Anoiteceu, os ponteiros do relógio rapidamente vão mudando de lugar, e, quando amanhecer, partiremos em direção ao mar para vermos juntas o que me fez te esperar, o mais belo de todos os sentimentos, o amor, o amor sem fronteiras, sem limites, sem idade e sem cor. Apenas o amor, o amor que corta céus, atravessa oceanos e pacientemente acelera o tempo para devanear-se e descansar em seus braços.
E, antes de pegar o elevador, o telefone tocou, e ela falou:
- Desculpe-me por não ter ligado antes, estava resolvendo umas coisas do trabalho. Eu vou viajar amanhã, volto antes do final de semana, eu irei passar com você, mais tarde eu passo aí para te ver. Saudades, beijo na ponta do nariz.
Viajar? Interroguei-me. Viajar para onde?
Já fiquei de bico, só desfiz quando o Ralf pulou em meu colo. Fiquei fazendo carinho nele e conversando:
- Vê se pode, ela vai viajar. Viajar com quem?
"Não passa de hoje, hoje, quando ela vier aqui, vou perguntar tudo, mesmo que venha a doer, eu vou perguntar. Vou... Vou, sim."
Já tinha avisado ao porteiro que a deixasse subir quando ela chegasse, sem precisar avisar.
Não demorou muito, a campainha tocou. Eu tremi, e não sei por que tremi. Antes de abrir a porta, já sentia seu perfume atravessá-la.
No intuito de conter as minhas perguntas, respirei fundo e abri.
Fui recebida com seu olhar sereno, já estava tomada mesmo por seu perfume, eu era uma presa fácil para ela, a sua beleza me deixava tonta. Nem lembrava mais o que eu iria dizer-lhe, eu só conseguia pensar em saciar os seus lábios e mergulhar no seu corpo. E, antes que eu fizesse isso, ela o fez.
Não conseguíamos mais nos controlar, ficar perto sem nos tocar, cada toque era um arrepio, era um fogo que não acabava.
E, quando já estávamos na cama, com o meu coração colocado no dela, pedi para que os ponteiros do relógio parassem naquele momento. Senti inveja da colônia que banhava o seu corpo todos os dias, do espelho que a contemplava todas as manhãs, mas agradeci em silêncio por poder tê-la ao anoitecer, mesmo que não fosse todos os dias.
Fomos até a janela olhar o céu estrelado e ver a lua, que banhava a nossa noite.
- Olha aquela estrela - eu disse -, supergigante, rigel, maior do que o Sol e mais brilhante, é minha preferida, ela tem a cor dos seus olhos. E a lua, cheia de mistérios e atrevida, às vezes aparece durante o dia tentando roubar a cena do sol.
Ela sorriu e perguntou se eu a achava parecida com a lua misteriosa e atrevida.
Eu apenas sorria, não queria falar nada, não ali com ela entre o meu corpo.
- Passione, eu falei, já que você vai ficar fora estes dias, eu vou procurar uma professora para me ensinar a tocar violino, vou comprar um também.
- Deixa para comprar na semana que vem, eu vou com você escolher - disse ela.
- Então combinado - falei.
- Você vai procurar um professor ou professora? - ela perguntou, com ar de quem estava com ciúme.
- Qual é a diferença?
- Nenhuma, desde que, se for professora, não seja charmosa.
- Não confia em mim?
- Em você talvez, mas nelas não. Você sabe como são as mulheres quando querem alguma coisa, fazem de tudo para conseguir. E ninguém resiste a uma tentação por muito tempo, resiste?
- Se você está dizendo! Mas não precisa se preocupar, você tem tudo o que eu busco em uma mulher; olhar, eu posso até olhar para outras, só para não perder o costume - disse eu, entre risos -, mas é só você que eu desejo e quero. E, se não for para ficar com você, não ficarei com mais ninguém, eu espero que você seja a última mulher a ganhar o meu coração.
- Uau! Não sabia que eu tinha esse poder todo sobre você. Fico elogiada e agradecida, você sabe como agradar a uma mulher.
- Primeiro, eu as observo, não existem mulheres feias, cada uma tem algo de belo para se apreciar. Eu as observo e, quando tenho oportunidade, falo a elas o que querem ouvir, com uma diferença: sem precisar mentir - ri.
- Ah, é? Não estou gostando dessa conversa.
- Estou brincando. Eu falei para você que eu fiquei muito tempo sozinha, eu acredito que você será a minha última.
- Por que você fala isso?
- Eu sou um pouco complicada, conversamos sobre isso outro dia.
- Engraçado, você sempre foge desses assuntos.
- Pois é! Corro mesmo.
- Queria amanhecer aqui, mas tenho que ir, amanhã cedo vou viajar, minha passione.
- Ah! Fica mais um pouco, como vou conseguir respirar esses dias sem você?
- Você, você... Vou sentir a sua falta também, prometo mandar mensagem para você.
- Promete?
- Sim.
- Então tudo bem.
Partiu... Fiquei apenas com a saudade e dormi abraçada com o travesseiro em que ela deixou o cheiro dos seus cabelos.
Quando acordei, arrisquei e mandei uma mensagem, desejando uma boa viagem a ela. Ela gentilmente me respondeu:
- Obrigada! Tenha um ótimo dia.
Fiquei alegre em ter tido a resposta dela. Mas eu não voltaria a incomodá-la antes que voltasse de viagem. Eu estava tão feliz, que deixava as minhas desconfianças de lado.
O meu dia foi normal, mas a noite, a noite vinha com a lembrança dela. Queria pular os dias, como se pula de um lado para outro, mas eu tinha que esperar amanhecer, anoitecer, amanhecer, anoitecer...
Parte ruim de quando você está amando é essa, a ausência da amada. Mas o que deixa contente é que você sabe que ela vai voltar para os seus braços.
Liguei para as minhas amigas, falei que iria passar o meu aniversário com a Giovanna, você já imagina, não? Ficaram uma fera, eu sempre viajava com elas, mas dessa vez seria diferente. Falei que eu comemorava com elas na sexta-feira, iríamos almoçar, e falei que iria precisar de um favor das duas. Como éramos amigas há muito tempo, elas acabaram compreendendo o momento e falaram que iriam me ajudar, sim, na minha extravagância.
Faltava um dia para o fim de semana, fui trabalhar cedo, pedi para minha secretária resolver as coisas, pois eu me ausentaria. As minhas amigas me levaram para almoçar no shopping e me fizeram escolher os presentes, essa parte eu gostei. Depois, resolvemos dar uns giros pela cidade. Elas tinham reservado uma surpresa, vendaram os meus olhos, fizeram-me caminhar um pouco, quando me pediram para baixar a cabeça e sentar, só tiraram a venda dos meus olhos quando ouvi um barulho, mas não tinha como escapar: já estava no alto, em um helicóptero. Depois de insistirem muito, olhei para baixo, assim poderia registrar a cidade do alto. Passamos pelo centro e seguimos até o parque, até a Avenida Faria Lima. Foi um passeio diferente e lindo, pois ver o reflexo do helicóptero naqueles prédios brilhantes e enormes, ver estátuas de mulheres do jeito que vieram ao mundo, pensei que estava na Itália diante de estátuas romanas. Se não fosse o medo que tenho de altura, teria curtido o passeio mais um pouco. Quando desci, estava meio tonta, sem forças para bater nelas por terem feito isso.
E, por último, passamos no parque, ficamos combinando tudo sobre o final de semana na casa de campo. Agradeci pelos presentes e pela ajuda delas. Desejaram-me boa sorte e, em seguida, nos despedimos.
Para minha surpresa, quando cheguei ao portão de casa, alguém tinha deixado um coração enorme de pelúcia e um bilhete que dizia:
"Obrigada por ter me escolhido para ser a sua dona e a sua paixão. Espero que dure para sempre todo o carinho que temos uma pela outra, mesmo que não estejamos juntas, te quero agora, amanhã, depois e para sempre, fisicamente, ou até em pensamentos. Com carinho, a sua Passione."
Ela voltou de viagem. Não me enganei, eu sabia que ela voltaria para mim; assim como a noite cai todos os dias, ela voltaria.
E, antes que ela ligasse, eu me atrevi de novo e liguei:
- Desculpe-me por ligar, você pode falar?
- Sim.
- Obrigada pelo presente. E como foi de viagem?
- Bem, obrigada por perguntar. Estou com saudades.
- Eu também. Você pode vir aqui para combinarmos a viagem de amanhã?
- É claro, vou, sim. Estou indo.
Era visível o meu semblante mudar quando eu ouvia a sua voz, ou quando ela vinha ao meu encontro. Estava totalmente tomada por esse sentimento invisível que se chama amor.
Já estava esperando-a na porta. Ouvi os seus passos, abri a porta. Que alívio! Ficamos abraçadas ali por muito tempo.
- Ainda bem que você voltou, se você fica fora mais um dia, eu não aguentaria até amanhã - eu disse.
Ela, sorrindo, respondeu:
- Eu não deixaria você morrer sem uma última noite, amor.
Sentamos, combinamos que iríamos no carro dela. Falei que iríamos ficar só na casa de campo, lá já estava tudo pronto. Ela deitou no meu colo enquanto eu conversava, pois estava cansada da viagem.
Perguntou se eu tinha conseguido encontrar um professor de música, falei que sim: "Vou começar quando eu comprar o violino. Deixei para comprar junto com você, como queria".
Interrogou-me de novo: "professor ou professora?".
Tive que rir. Perguntou por que eu estava rindo. Titubeei.
- Está titubeando por quê?
- Eu?
- Sim, senhorita?
- Não, gaguejei.
- Não vai falar?
- Vou, sim, é... hum... Eu encontrei um próximo ao bairro... Mulher.
- Mulher! Como ela é?
- Eu não reparei muito nela, só tenho olhos para você.
- Sei, fala...
- Tem duas pernas, dois braços...
Ela levantou do meu colo e ficou afastada.
- Estou brincando, volta aqui. Eu falo como ela é, mas você tem que ficar aqui pertinho.
Ela voltou, segurei na mão dela, tentei beijar o seu rosto, mas ela se esquivou.
Não sei por que essa implicância toda com uma simples professora de música. Dizem que as mulheres têm um sexto sentido, mas eu não me interessaria por outra, eu a respeitava, nunca faria nada para magoá-la, a não ser que ela fizesse isso primeiro.
Tive que descrever a minha professora de música para tranquilizá-la.
- Vamos lá: ela tem o cabelo preto grande com uma franja, ela estava com o cabelo preso, pelo menos no dia em que eu a vi, usava uma calça folgada social preta de boca de sino, blazer do mesmo tecido da calça e uma blusa branca por baixo. Não usava maquiagem. Só isso.
Giovanna ficou me olhando, olhando:
- Sem maquiagem, hein? Para quem não tinha reparado muito, até que você foi bem detalhista, não acha?
- Passione, esqueça isso, você não vai para a academia? Se você continuar com isso, eu também vou começar a ficar com ciúme do seu professor, que é forte e lindo, e sem falar nas outras mulheres que tem lá, todas malhadas.
Depois que eu falei isso, ela levantou para ir embora. Segurei o seu braço e falei:
- Perdão! - pensei em ficar de joelhos, mas lembrei que adorar, só o Criador. - As aulas vão ser aqui em casa, você pode vir quando quiser, está bem?
Ela balançou a cabeça, concordando.
Mulheres com qualquer coisa já ficam de birra, e isso porque não falei que a minha professora de música, mesmo sem maquiagem, era linda. Ela era daquelas mulheres que não precisam fazer muito esforço para ficarem lindas, possuem uma beleza natural, como as flores que nascem em meio às plantas selvagens, se destacam por sua pureza e luminosidade. Tudo bem que ela tinha um jeito meio diferente de se vestir, o que a tornava mais fascinante. Eu não pensei, mas os outros devem ficar imaginando o que tem embaixo daquelas roupas.
- Agora que já está tudo resolvido, você pode me dar um beijinho, nem que seja na ponta do nariz?
- Vou ficar de olho, hein?! - ela exclamou.
Ela não resistiu à minha cara de peixe fora da água e me beijou. Depois foi embora, íamos sair antes de o sol nascer.
Fazia frio na bela manhã de sábado, o vento balançava seus cachos, visualizando-se ainda mais seu rosto. Alguns carros já oscilavam pelas ruas da cidade. Partimos antes de o sol expandir seus raios. Foram duas horas até pegarmos a balsa. Com o motor do conversível desligado, pudemos contemplar o sol nascer em meio às águas, apesar de que seu semblante brilhava mais do que o sol, a ponto de roubar toda a minha atenção e a do Ralf, que estava assustado em meio a tanta água.
- Obrigada por estar aqui comigo - eu disse.
E, antes que o sol iluminasse totalmente o dia, ela me beijou e me desejou feliz aniversário.
Minha família já tinha me ligado desejando felicidades. Minha mãe disse que era para eu ter juízo. Indaguei: "E quando foi que me faltou?".
Mãe é tudo igual, pensa que você vai ser sempre uma criança que ela coloca no colo. Se dependesse delas, os filhos nunca sairiam de baixo dos seus olhos, da sua proteção. E os filhos não veem à hora de ficar independentes para viverem a sua vida. Mas a verdade é que, quando a coisa não dá certo, quando você precisa de ajuda, é a família que está sempre pronta para ajudar. A família é um bem maior que uma pessoa pode ter. E as mães, então! Quando todo mundo some, elas estão lá, mesmo longe, elas sempre dão um jeito de nos proteger; a palavra "mãe" deveria ser sinônimo de vida. É por isso que o amor de Deus é comparado com o amor de uma mãe.
Minha mãe não sabe que eu saio com mulheres, nunca falei nada, não quero magoá-la, o único que sabe é meu irmão que mora na Itália. Não falei porque acho que não é necessário. Não que ela venha a me rejeitar, não é isso, ela é uma pessoa sábia, compreensiva, mas vai ficar triste. Sei que vai permanecer ao meu lado, tenho certeza de que ela nunca desistiria de mim. Mãe é mãe, acho que ela desconfia, mas não fala nada. Se até os animais conhecem bem seus filhos, o que dizer do ser humano?
Quando chegamos a casa, parecia que estávamos em um paraíso preparado para nós, só ela e eu, a natureza verde e colorida, os pássaros em bandos cantavam de alegria em ter uma hóspede tão sublime. As flores se abriam e derramavam todo o seu perfume em agradecimento à presença da mais bela de todas.
Parecia que eu estava sonhando, era tudo tão mágico, tão perfeito, só sentia que era real quando senti seus lábios gelados no meu rosto.
Retiramos algumas coisas do carro, entramos... Fomos à cozinha para tomarmos café. Quando abri a geladeira, tinha um bolo com duas velinhas com os números 33, foram minhas amigas que deixaram. Olhei as horas no relógio na parede, já estava quase na hora. Coloquei uma calça leve creme e uma blusa sem manga azul. Ela continuou no quarto se arrumando.
- Vamos, vamos... - falei.
Você sabe que as mulheres demoram muito para se vestir. Enquanto ela se vestia, eu fui preparar uma cesta com frutas. Coloquei a máquina fotográfica na bolsa e fui preparar a charrete.
Meia hora depois, quando tudo estava pronto, ela apareceu usando um vestido branco de alcinha com um decote na frente com cordões azuis, e, na parte de baixo, um bordado em forma de flores. Aproximei-me com o meu companheiro fiel e disse que tinha valido a pena toda demora. Eu já tinha feito um arco de flores para ela, foi um realce a mais sobre os seus cabelos.
Levantei a minha mão, convidando-a para entrar na charrete, e do outro lado o nosso cão de guarda. "Vou raptar você", eu disse. "Eu a levarei para o mais alto das montanhas, viverei do mel dos seus lábios e, nas noites frias, me aquecerei do fogo que vem do seu corpo, não precisarei da luz do sol e nem da lua, pois o brilho dos seus olhos será a minha claridade. A única testemunha que você terá será o meu cachorro, como ele é fiel a mim, não terei nenhum problema."
Entre risos, ela falou que estava presa a mim. Como iria fugir naquele momento, se o que ela queria era ser raptada por mim?
Guiei-os na charrete entre colunas de plantas, caprichosamente feitas pela natureza, até chegarmos ao lago.
Peguei-a no colo, colocando-a no chão. Colocamos a manta sobre a grama e os outros objetos.
Enquanto ela brincava com o cachorro, fui preparando a câmera fotográfica e aproveitava para admirar sua beleza com a lente. Eu tinha que registrar aquele momento de felicidade, pois não sabia até quando duraria. Eu programava a câmera e ia correndo para sair na foto junto com eles. Passamos a manhã toda tirando fotos. A que eu mais gostei foi a que ela estava em pé, eu de cócoras olhando para ela de um lado e o Ralf do outro lado. Ficávamos selecionando, ela preferiu a que tiramos deitadas, formando um círculo. Ela estava bem à vontade, pois sabia que eu era discreta, não mostraria a ninguém, a não ser para minhas amigas.
Não pense, amiga, que a nossa diversão só ficou em tirar fotos e correr pela grama verde feito borboletas que acabaram de sair da pupa. Eu só espero que o nosso romance não dure o mesmo tempo da vida de três borboletas.
O barco já estava pronto perto do lago. Fomos até o meio do lago e, na hora combinada, apareceu um helicóptero um pouco distante do barco, lançando pétalas de flores sobre a nossa cabeça. Se você tivesse visto o rosto dela, amiga, teria se encantado também. Ali, eu me apaixonei de novo, mas pela mesma pessoa, não cansava de admirar o seu semblante cheio de vida. Ela ficou tão radiante, que senti o meu rosto brilhar também.
- Gostou da surpresa? - perguntei.
- Sim, muito. Você está se saindo melhor do que os homens.
- Fazer o que, se eu sei como agradar a uma mulher? Tenho mania de ficar olhando-as demais, confesso, mas eu nunca invado o espaço delas com palavras que, para os homens, são elogios, porém sabemos que são adjetivos grosseiros.
- Quer dizer que você gosta de ficar olhando-as, hein?
- Eu olhava, sim, antes de conhecer você, mas era para buscar alguma inspiração. Agora não preciso mais, você é o poema que os poetas gostariam de escrever, é a imagem que os artistas gostariam de pintar, é a nota musical que os compositores gostariam de compor.
- Sabe o que mais me atraiu em você?
- A minha cara de boba quando a via?
- Não, boba. Foi esse seu romantismo que não se vê mais por aí, o seu olhar doce me admirando, seu respeito, não tive como não ceder e cair nos seus braços como uma virgem que se entrega pela primeira vez. Toda mulher gosta de receber carinho, respeito e admiração.
Fiquei sorrindo feito uma boba.
Já que falávamos sobre os homens, pensei em perguntar se ela tinha um, mas sei que ela ficaria uma fera, e para que perguntar, se ela estava quase o tempo todo comigo? Se ela falasse que sim, estragaria o meu dia, o nosso dia.
É claro que eu sabia que muito homem desejava tê-la, mas fui eu que ela escolhera, pelo menos eu achava.
Tive um dia mágico ao lado dela, não conseguia pensar em mais nada, só em ficar ali para sempre.
Enquanto eu a guiava de volta, ela contemplava as paisagens pelo caminho. Já eram 18h quando começamos a preparar o jantar, tínhamos combinado de deixar tudo pronto antes de tomarmos banho. Antes de ela subir para tomar banho, disse-me que tinha dois presentes para mim. Tentei descobrir o que era, mas ela não falou. Mulher gosta de fazer mistério em tudo, e ela já era misteriosa por natureza.
Resolvi me arrumar no outro quarto, quis deixá-la à vontade e com os mistérios dela. O Ralf e eu fomos nos vestir no outro quarto: como era um jantar especial, o Ralf também tinha que estar elegante. Coloquei uma roupinha preta nele e uma gravata-borboleta azul-clara. Eu vesti uma calça preta, apertada no calcanhar e um pouco folgada na cintura. Usei uma gravata-cinto azul-clara, um blazer sem manga e sem botões da mesma cor da calça, uma blusa da cor da gravata em seda e um sapato de couro italiano preto de salto pequeno.
Ela tinha ido para o quarto primeiro para se arrumar, e nós já estávamos na sala de jantar esperando-a.
Quando ouvimos os passos dela, pulamos da poltrona e ficamos em pé no início da escada, aguardando-a aparecer. Foi quando ouvimos o barulho de trovões e a luminosidade dos raios no céu, clareando a sua entrada. Até os céus se renderam ao seu encanto, dava para ouvir cada gota de água que caía. E as notas da sua essência invadiram a nossa alma, nos hipnotizando, tinha cheiro de baunilha e floral branco, misturou com o cheiro amadeirado que vinha de fora.
A sua colônia lembrava a mais famosa das rainhas, uma mulher glamourosa, uma Cleópatra nos dias de hoje.
Seu corpo foi coroado com um vestido longo da cor dos seus olhos, com detalhes bordados, a manga do vestido ao ombro e o decote em forma de laço que realçava os seus seios, e, entre seus braços, outra parte de tecido que vinha de trás do vestido. O detalhe da sua roupa desenhava ainda mais suas curvas. Ela também usava um sapato prata que combinava com seus brincos em forma de taça.
A cada passo que ela dava em minha direção, meu corpo tremia e o meu coração acelerava.
E, depois de beijar a sua mão, continuei segurando-a e disse:
- É mágico o seu semblante, é como olhar o céu estrelado e tentar descobrir o nome de cada uma delas,
É como olhar a lua e descobrir a magia da luz que reluz do seu olhar sedutor,
É mágico o seu sorriso doce, é como o néctar das flores, quando provado causa arrepios em cada parte do meu corpo.
Entre risos, ela disse que eu deveria escrever um livro de poemas. Sorri também e lhe convidei para sentar em uma cadeira para podermos registrar aquele momento. Ela já tinha tirado a minha gravata-cinto e colocou na minha blusa, e sentou na cadeira. Sentei no tapete ao lado dela. Enquanto ela olhava para a câmera, eu olhava para ela, e, para demonstrar seu domínio diante das lentes, puxou a minha gravata, e o flash da câmera disparou.
Depois de nos deliciarmos com o jantar, ela acendeu as velinhas. Eu fechei os meus olhos e, antes de apagá-las, fiz um pedido.
- O que você pediu, Laura?
- Não falaria nem sob tortura do exército russo.
- Não vai falar, não? Então não darei o presente que comprei!
- Ah, é assim, é? Então você vai ficar sem ganhar um pedaço do bolo.
- Assim não vale.
- Estou brincando, amore.
- Eu sei, passione, eu também.
Ela levantou para pegar o presente e entregou-me. Depois de abraçar-me forte, senti a maciez do tecido do vestido dela. Em seguida, falou:
- Não importa o que venha a acontecer, eu sempre a amarei, pois os momentos que passamos juntas ficarão para sempre na minha memória.
Eu agradeci pelo presente e perguntei-lhe se estava pensando em me deixar, pois estava parecendo uma despedida. "Tem algo que você ainda não me contou sobre você?"
- Hoje não é um dia para estar falando sobre a minha vida, você não vai abrir o presente?
- Vou, sim, calma aí.
Quando abri o presente, meu sorriso foi de canto a canto. Era um violino, por isso ela me pediu para esperar. Ela mandara escrever em cima do violino "Para sempre passione".
Abracei-a e dei-lhe mil beijos. Fiquei namorando meu violino um pouco e disse:
- Já ganhei um presente, e o outro?
- O outro? - sorriu. - Só posso revelar quando estivermos no quarto.
- Não seja por isso, querida!
Fui conduzindo-a até o quarto, e, a cada degrau que subíamos, me perturbava com o seu olhar sedutor. Quando eu já não aguentava mais, ela me lançou sobre a cama de madeira, era uma cama estilo europeu neoclássico. Quando eu ia beijá-la, ela afastou-se e, em meio à canção dançante, começou a tortura. Eu, com as mãos amarradas com a gravata, não tinha como tocá-la. Ela, segurando a madeira da cama, ia do chão até a cama. Tirou o sapato olhando para mim, ficou em pé na cama, deslizava a sua mão sobre o corpo e lentamente ia tirando o vestido, lançando-o sobre o meu rosto, quando senti seu perfume, e ela de leve movimentou a sua calcinha da cor do vestido, colocando o dedo na boca. Amiga, amiga, tive vontade de ter a força da princesa guerreira para desatar aquela gravata e tomá-la sobre o meu corpo. E, achando que a tortura tinha acabado, ela desceu a alça da lingerie e, quando ia aparecendo, virava de costas e bailava para lá e para cá. Fechei os meus olhos, não queria continuar, não com as mãos amarradas. Mas ela continuou, e, no momento em que senti seus lábios no meu pescoço, tive que abrir os olhos, seus olhos estavam tão perto dos meus, que não conseguia mais fechá-los. Ela virou novamente e tirou a lingerie por completo. Quando ela ficou de frente, pude contemplar seu corpo perfeito, encostando-o sobre o meu, mordendo os meus lábios. Ela sentiu o meu coração tentar furar o tecido da pele. E, depois de jogar champanhe na minha barriga e ter sugado tudo, ela desatou a gravata, e, quando ia se entregar, eu resolvi torturá-la também.
Antes que ela percebesse, tirei-a de cima do meu corpo e a coloquei sobre a cama, o domínio agora era meu.
Ao lado da cama, tinha um balde com gelo e champanhe, ela tinha preparado. Amarrei suas mãos na cama, peguei uma pedra de gelo e, com a boca, fui deslizando sobre o seu corpo. Parecia que eu tinha colocado o gelo sobre uma chapa quente, evaporou em minutos. Depois, comecei a beijar seus pés, pés de rainha, até chegar ao pescoço, sussurrando de leve em seu ouvido. Acariciava seu rosto, seus lábios, seus cabelos e, quando ela queria me beijar, eu não deixava. Depois de ter acariciado todo o seu corpo de frente e atrás, eu a soltei e, com a força de uma leoa, segurei os seus cabelos e nos beijamos.
Dois corpos se transformaram em um, fizemos amor até os pássaros cantarem e, com os corpos cansados, adormecemos.
O sol já tinha dado as caras quando acordei, com os lábios dela em meu rosto.
- Bom dia! - ela praticamente recitou. - Dormiu bem?
- Bom dia! E como eu não dormiria bem ao lado da mulher que amo?!
- Confesso que foi a melhor noite que eu tive, e com você sei que terei outras melhores ainda.
Foi aí que compreendi a leveza do seu rosto.
Ela tinha preparado um café da manhã para nós. Eu estava um pouco assustada com o rumo que as coisas tinham tomado. A felicidade era constante na minha vida, esse é o poder que uma mulher tem sobre um ser mortal. Enquanto está trazendo felicidade, está bom, o ruim é quando começar a causar dor. Eu sabia que tinha algo de estranho, eu só não queria descobrir ainda. Falo isso porque às vezes a pegava afastada ao telefone, falando baixo.
Queria desfrutar da sua companhia a cada minuto como se fosse o último.
E, antes de retornamos para nossas casas, saímos para cavalgar no campo. Ela não sabia montar, então a levei no meu cavalo, que era manso, cooperou, e eu achei até bem melhor, senti seus cabelos no meu rosto ao segurá-la sobre os meus braços.
Ela se sentiu segura em meus braços e não se importava quando eu colocava o cavalo para correr um pouco. Foi bom sentir o vento trazendo o seu cheiro, e melhor ainda foi poder contribuir com seu riso, com o brilho dos seus olhos, que, em meio à luz do sol, mudaram de cor. Às vezes, eu ficava com dúvida se ela era uma mulher ou um fruto da minha imaginação. Sua beleza era tão suave, ela era tão gentil, carinhosa, como pode existir uma criatura assim, tão formidável?
Infelizmente, tínhamos que retornar... Despedimo-nos do ar puro, da beleza que a natureza nos presenteava e, antes que o sol ficasse no meio do céu, já estávamos em casa. Foi quando eu falei:
- Quer que eu vá com você até a sua casa?
- Minha casa?
- Sim. Por quê? Está escondendo alguma coisa, que eu não possa ir até lá?
- Não! É que eu fico mais à vontade na sua casa, só isso.
- Sei.
- Vai ficar de bico agora só porque falei que não?
- E se eu ficar?
- Para com isso, deixa de besteira, mal chegamos e já estamos discutindo.
- E a culpa é minha?
- E não foi você quem começou?
- Tudo bem, eu vou entrar, até mais!
- Até amanhã. E vê se desfaz esse bico - riu.
- Hum, está tudo bem, não precisa se preocupar.
- Quer que eu suba com vocês?
- Não, obrigada! Você deve estar cansada, nos falamos depois.
- Não acredito que a senhorita ficou chateada só porque eu não quis que você fosse comigo até a minha casa.
- Não tenho o direito de achar estranho? Se você sempre vem aqui, por que eu não posso ir lá?
- Está bom. Vamos até a minha casa.
- Não, não vou mais.
- Assim fica difícil. Passamos um final de semana perfeito, agora você quer estragar tudo por uma besteira?
- Desculpe! Eu sou chata mesmo.
Eu admiti estar errada, pois não queria que ela percebesse minhas desconfianças e também não queria terminar aquele dia magoando-a, nem a ela, nem a mim.
Não sei que caminho tomaram os meus pensamentos, quando olhei para ela, tinha facilidade de me controlar. Aproveitou meu momento de admiração e me abraçou, dizendo suavemente:
- Eu a amo!
Como era bom poder ouvir isso, nunca tive até hoje sensação melhor do que descansar nos seus braços.
Eu, apesar de romântica, tinha certa dificuldade de dizer "eu te amo", então falei:
- Igualmente.
Partiu, logo depois, em meio ao barulho da buzina do carro. Fiquei na calçada até o carro dela sumir. Em seguida, entrei.
A semana prometia. Eu teria aula de violino no segundo dia da semana, seriam três dias de aulas. Eu estava ansiosa em aprender, amava música, tudo que fazia tinha que ter música pelo meio. Eu sabia que a Elisa e a Rebeca estavam loucas para saber como foi o meu final de semana com minha dama misteriosa. Liguei para elas no dia seguinte, fomos almoçar juntas, falei que tudo havia saído perfeitamente, agradeci-lhes por terem ajudado a preparar tudo. Falei que, na volta, tínhamos discutido um pouco, porque eu me ofereci em acompanhá-la até a sua casa, mas ela não deixou. Minhas amigas falaram que aí deveria ter alguma coisa, que era para eu ter cuidado, caso contrário eu ia acabar me machucando. Falei que elas estavam exagerando. Alertaram-me: "Fica de olho!". Rebeca me aconselhou a perguntar se ela era casada. Falei que já tinha tentado, mas não conseguia.
- Não conseguiu ou você está com medo de ela ser? - exclamou Elisa.
- Medo? E eu sou mulher de ter medo de algo? - disse, rindo. - Pior que estou mesmo, mas eu prometo para vocês que, quando eu tiver oportunidade, vou perguntar, sim.
Fiquei pensativa a tarde toda, só aliviei quando a campainha da minha casa tocou. Nem preciso dizer quem era: a entrada dela já era liberada no condomínio.
- Boa noite!
- Boa noite!
- Posso entrar?
- Não. Estou brincando, é claro que sim. Entre, por favor.
- Obrigada!
- Imagine.
- Como foi seu dia?
- Resolvi umas coisas no trabalho e depois fui almoçar com minhas amigas. E você?
- Fui trabalhar e fiquei pensando em você o dia todo.
Ela sabia como me enrolar, controlar.
- Pensando o quê?
- Se você estava chateada comigo!
- Não, já passou. Esqueça isso.
- Já esqueci. E as aulas de violino, quando começam?
- Amanhã.
- Amanhã?
- Sim, sim.
- Que horas vai ser?
- No mesmo horário em que você vai malhar.
- Hum...
- Dois...
- Engraçadinha.
- Você não está querendo vir aqui amanhã?
- Por que, não posso?
- Pode, sim, mas é meu primeiro dia de aula, vai ficar meio estranho você aqui.
- É só falar que somos amigas.
- É que eu não vou ficar muito à vontade.
- Por quê?
- Você rouba a minha concentração.
- Pensa que me enrola, hein?!
- Verdade.
- Vou fingir que acredito.
Era engraçado que ela tinha todo o direito de desconfiança, e eu não, logo eu, que não tinha nada para esconder.
Mulheres, mulheres. Quem consegue decifrá-las? Eu, que sou mulher, não consigo.
Ela perguntou se eu sabia pelo menos posicionar o violino no ombro. Eu ri: "O violino não, mas você, eu acho que consigo". Ela pensou em jogar o arco do violino na minha cabeça, mas se conteve.
Peguei o violino, que já estava fora da maleta, posicionei no meu ombro e, com o arco, fingia que estava tocando aos pés dela. Se a lente de uma câmera pudesse nos alcançar naquele momento, seria a imagem mais bela já registrada. Os raios da beleza dela contaminavam tudo o que estava ao redor. Até o meu cachorro me trocara por ela.
Já era tarde quando eu a acompanhei até o portão. Pedi para ela ter cuidado. Ela agradeceu a minha preocupação, me desejou uma boa noite e foi para o seu esconderijo.
Antes que eu chegasse ao trabalho no outro dia, Giovanna me ligou, queria saber como eu tinha passado a noite, falou que ia passar em casa hoje para rever as fotos na câmera, tudo desculpa só para conhecer de perto minha professora de música.
Falei que tudo bem, que eu tinha levado a câmera para o trabalho e que ainda não tinha tido tempo para ver também, mas que eu levaria para casa.
Depois de cinco horas trabalhando, dei uma pausa para ver as fotos, era visível a nossa felicidade em cada uma delas.
Em meio ao movimento das fotos, tive uma ideia, queria retribuir os presentes que ela me deu.
Mas o que comprar para ela? Ela tinha tudo, tinha que ser algo diferente, duradouro e que eu sabia que ela nunca tinha ganhado, algo que representasse, registrasse toda a sua beleza e leveza. Foi quando olhei uma foto da noite do meu aniversário, em que ela estava com o vestido azul, sentada. Sabe quando acende aquela luz? "É isso!", exclamei!
Rapidamente, olhei na agenda de telefone e fiz uma ligação. Marquei de conversar com um conhecido pessoalmente no dia seguinte, pois tinha que ir para casa mais cedo, seria minha primeira aula de música com o violino.
A professora chegou no horário marcado, o porteiro me avisou da chegada dela. Pedi para que ela subisse. Deixei a porta aberta, mesmo assim ela bateu, e eu fui encontrá-la.
- Boa noite, Laura!
- Boa noite, Aurora!
- Por favor, entre!
- Obrigada!
Acomodei-a, e ela deu uma prévia sobre o instrumento. Verificou se as cravelhas estavam devidamente encaixadas na voluta. O vendedor já tinha colocado as cordas. Ela me explicou que o violino era um instrumento muito delicado; que era importante ter um estojo duro; que, para iniciante, era bom começar com cordas de núcleos sintéticas e núcleo de nylon e que era para eu comprar também um descanso de queixo e de ombro, só até eu me acostumar.
Pediu-me para girar o parafuso do arco em sentido horário até que o espaço do fio e da vara ficasse grande. Recomendou-me não usar o dedo indicador, porque o óleo da minha pele iria passar para os fios, que deveriam manter-se sem óleo para obter melhor som para as cordas.
Pegou o breu "pó" da resina para eu passar no fio; segundo ela, para ficarem mais rígidos. Fez alguns ajustes nas cordas do violino. As cordas, dos tons menores para os maiores, deveriam ser afinadas em G, D, A e E, disse ela.
Posicionou o violino em meu ombro, me pediu para colocar parte do meu dedo indicador sobre a almofada e continuou falando: "Agora, coloque a ponta do seu dedo mindinho na parte plana do arco perto da base, mantendo-o ligeiramente curvado". E continuou explicando onde colocar cada dedo. Não demorou muito para ela pedir para eu movimentar a mão para cima e para baixo. O som não saiu bem, tinha que praticar mais.
Assustei-me com o som da campainha sobre o som do violino. Pedi desculpas à professora e fui abrir a porta, já sabia quem era.
Fui recebida com um beijo no rosto. Pedi para Giovanna entrar e apresentei-a à Aurora. Já estava terminando a aula.
Fiquei um pouco perturbada com a presença dela. Ela ficou sentada, só me olhando, enquanto a professora, atrás de mim, posicionava o violino corretamente em meu ombro. Achei normal, fazia parte da aula, a Giovanna é que não gostou muito, levantou e foi à cozinha beber água.
- Por hoje é só - disse Aurora. - Quando você tiver tempo, vai treinando com as cordas abertas, vai facilitar.
- Obrigada! Amanhã no mesmo horário?
- Sim.
E, antes de sair, falou que foi um prazer conhecer a Giovanna. Era uma pena que ela não achou o mesmo.
- Achei que você viria mais tarde, não foi malhar hoje?
- Fui, sim, saí mais cedo.
Ela ficou por alguns minutos me olhando, com aquele olhar de quem quer falar algo.
- Por que você está me olhando assim, aconteceu alguma coisa?
- Não, não aconteceu nada. E a aula foi produtiva?
- Sim, sim, muito.
- Ela deve ter a sua idade, não?
- Acho que sim. Não me diga que você está com ciúme dela só porque ela é mais nova que você?
Ela levantou e foi até a varanda da casa. Eu fui conversar com ela.
- Passione, passione, deixa de ser boba, você sabe que eu prefiro mulheres como você. Já falei que eu não tenho nenhum tipo de interesse por nenhuma outra. Olha para mim, escuta, se não der certo com você, não dará com mais ninguém.
- Está falando isso só para me agradar.
- Não, não mesmo, você sabe que eu gosto muito de você. Ou você tem dúvidas do meu sentimento?
- Não, não tenho.
- Então. Vem cá, para eu abraçar você. Agora vamos deitar um pouco, quero fazer carinho em você.
- Carinho, hein?!
Ainda bem que a sua fisionomia mudou, não queria vê-la triste, ainda mais por motivos bobos, sem fundamentos.
Vê se pode, ter insegurança só porque ela era doze anos mais velha do que eu, parece que ela não sabia que as mulheres maduras me atraíam, por serem mais educadas, por serem elegantes, pelo valor que dão à família e pela discrição do seu relacionamento.
Não foi só a beleza dela que me conquistou, a sua delicadeza, o esplendor do seu rosto e a suavidade do seu sorriso.
Coloquei-a sobre os meus braços, acariciando os seus cabelos e suas mãos. Ela acabou dormindo sobre o meu peito.
Aproveitei para registrar a sua imagem enquanto ela dormia, era muito prazeroso poder contemplá-la. Foi uma pena que eu a tinha que despertar do seu sono, dei-lhe um beijo no rosto e a chamei suavemente, para não a assustar.
Ela não demorou em acordar feito uma flor desabrochando. Seus olhos clareavam o quarto todo, parecia que o sol nascera ali mesmo.
- Desculpe-me por ter acordado você.
- Imagina. Eu tinha que levantar mesmo, estava cansada!
- Tem trabalhado muito?
- Um pouco.
- Quer jantar antes de você ir?
- Sim, assim fico mais um pouco com você.
- Que bom, vou preparar uma comida leve para nós.
Enquanto eu preparava o jantar, ela ficava me observando e deslizando o anel do dedo: teria coragem de dar-lhe um barril de ouro, se eu tivesse, por seus pensamentos naquele momento.
Pedi para ela me ajudar a preparar a salada. Foi quando o molho caiu em cima da sua mão. Aproveitei para segurá-la e limpar com meus lábios e, depois do seu sorriso irresistível, eu a coloquei rapidamente entre os meus braços e falei que não conseguia resistir à sua boca. Deixei de lado o jantar e alimentei-me do líquido que vinha dos seus lábios carnudos. Entre um beijo e outro, não sei como eu consegui, mas a coloquei em cima da pia da cozinha e, quando ela já estava sem roupa, levei-a para o quarto.
Ela e eu parecíamos álcool e fogo, com qualquer tipo de toque na pele, vinha aquele arrepio e, no mesmo tempo, aquela vontade incontrolável de tê-la em meus braços.
Alimentamo-nos de amor naquela noite. Ela disse brincando que, se soubesse, teria deixado para sorrir para mim só depois do jantar. Falei que ela era a culpada por esse desejo incontrolável que ardia dentro de mim, a fome até passou, mas meu desejo por ela não. Foi quando ela falou:
- Não sei como você conseguiu ficar tanto tempo só.
- Sem sex*, você quer dizer?
- Sim - disse, rindo.
- Vou ser sincera com você: o difícil não foi ficar sem mulheres, eu não conseguia ficar sem sex* - ri. - Era um tormento, nem dormindo eu tinha sossego.
- Já percebi o quanto você gosta. Tenho que começar a trabalhar menos agora para poder ter energia para você - falou, entre risos.
- Ah! Até parece que só eu que gosto.
- Verdade, é por isso que nos damos tão bem - ria.
Todo relacionamento no começo é assim, esse desejo, essa vontade de estar perto o tempo todo, os defeitos não são visíveis, sempre fazemos de tudo para agradar ao outro, o novo sempre é mais atraente, desperta a curiosidade, tornando-se mais fascinante. E o proibido, o proibido sempre é mais doce. Mas só até que não venha à tona. Acredito que, quando existe amor de verdade, você sempre vê novidade todos os dias na amada: o beijo continua o mesmo desde quando se conheceram; o arrepio é frequente, toda vez que você escuta "eu te amo"; o trabalho, a família, os amigos, nada disso atrapalha, ou diminui seu tempo, porque cada minuto que você passa ao lado de quem ama parece eterno.
Ela acabou decidindo dormir em casa, e, com ela entre os meus braços, como eu iria falar com Deus naquela noite, como? Será que Ele iria me ouvir?
Agradeci em silêncio pela vida, pela proteção da minha família e amigos, e, se eu estivesse fazendo algo de errado, que Ele me perdoasse.
Meu coração entristecia toda vez que ela tinha que ir embora. Hoje, eu sei por que Elisa casou em pouco tempo, tinha encontrado a sua metade, foi uma pena que a metade da outra não era ela. Eu esperava que não acontecesse o mesmo comigo. Mudei o meu trajeto hoje ao centro da cidade. O céu estava escuro, as nuvens carregadas, não demorou muito para chover. Eu iria encontrar com um conhecido meu, era um pintor, um gênio na pintura. E, antes de chegar ao local combinado, em meio à tempestade, eu esperava o farol abrir, quando olhei em direção à porta do carro e vi uma senhora. Ela era tão pequenina, que tive que levantar a cabeça para poder vê-la direito. Fiquei admirada com a garra dela e criatividade. Ela mesma tinha feito uma capa para se proteger da chuva, carregava uma carroça com um monte de papelões. É comum ver mendigos no centro da cidade, mas aquela senhora me chamou atenção por já ter certa idade e, mesmo em meio às dificuldades, não deixava de buscar honestamente o seu ganha-pão: enquanto os engravatados de Brasília vivem em casas luxuosas, gastam o nosso dinheiro futilmente, existem pessoas que não têm nem uma casinha para se proteger da chuva, do sol, do frio, não têm nem o que comer. E nós reclamamos do banquete que temos em nossas casas, passamos horas escolhendo uma roupa, são tantas, que cada dia é uma diferente.
Baixei o vidro do carro e buzinei. Quando ela olhou, eu acenei, fiz um gesto de que eu queria falar com ela. Encostei o carro em frente a uma lanchonete, saí e fiquei embaixo do toldo para me proteger da chuva.
Foi até melhor para ela também, assim ela descansou um pouco, tão pequena arrastando aquela carroça.
Não tive como não me emocionar ao contemplar de perto seu rosto enrugado, só não sabia se pela idade ou por enfrentar todos os dias o sol quente sem uma proteção. Seu olhar era calmo e distante, sem brilho, talvez por falta de esperança.
Viver sem teto, sem alimento, sem o que vestir, sem água, deve ser duro. Mas mais duro ainda deve ser viver sem esperança, sem fé alguma que venha aliviar ou alimentar a sua alma. Uma pessoa sem fé não vive, vegeta.
Perguntei se ela havia tomado café. Que insensível eu fui: é claro que não. Talvez o seu cansaço tenha dificultado o seu sorriso quando perguntei, ou ficou com vergonha de dizer para alguém tão jovem. Mesmo assim, ela respondeu que não. Pedi para ela esperar enquanto eu comprava algo para ela comer.
Depois que eu entreguei o alimento a ela, seu sorriso mudou, transformou-se naquele sorriso puro de quando você é criança e ganha um doce. Senti os meus olhos se transformarem em um oceano. Ela me agradeceu, e eu saí antes que as minhas lágrimas se misturassem com as gotas de água que caíam do céu. É comum dar o que comer e vestir a eles, mas dificilmente eles recebem carinho da parte dos outros.
Pedi desculpas a Lorenzo, o pintor, pelo meu atraso. Ele disse que o trânsito já é lento, e chovendo, então... Mas só eu sabia o verdadeiro motivo. Estava na galeria dele, eram impressionantes os seus quadros: pareciam fotografias; mesmo olhando de perto, era difícil perceber a pintura. Tinha certeza de que ele faria uma obra-prima para mim, mas também, com a fotografia que eu levei, até um iniciante conseguiria, não com o mesmo glamour que ele.
Expliquei a ele como eu queria, e queria o mais rápido possível. Ele me explicou que levaria alguns meses, mas trabalharia esses meses em meu quadro. Agradeci e fui correndo, tinha que passar na minha empresa, pois, antes de escurecer, voltaria para casa, eu não queria deixar a minha professora esperando...
Na volta para casa, ficava olhando o telefone, esperando que Giovanna ligasse ou mandasse mensagem, era comum ela fazer isso. Acho que ela estava esperando eu chegar à minha casa, assim ela aproveitaria e iria lá assistir às minhas aulas de violino, talvez me vigiar, logo eu, que sou tão fiel a ela. Se ela soubesse, se ela soubesse!
Já era de tardezinha, eu recebi Aurora com os olhos de curiosidade: "O que eu aprenderia hoje?".
Ela sentou junto a mim e disse:
- O que a levou a escolher tocar violino? Sabe que o violino, assim como o piano, são os instrumentos mais difíceis de aprender?
- Sei, sim. Optei por aprender a tocar o violino pelo som suave e pela calma que transmite quando tocado. O violino é um instrumento romântico. Todo instrumento se torna difícil quando você não se dedica. Algumas pessoas têm mais facilidade de aprender, outras não, mas o que vai diferenciar é a força de vontade de cada um, e eu quero mesmo aprender.
- "A prática leva à perfeição" - disse ela.
- Então vou praticar e, se eu não conseguir a perfeição, pelo menos vou conseguir manuseá-lo corretamente.
- Muito bem, que bom que você pensa assim. Já vi que logo você vai me dispensar.
- Dispensar?! Não, como eu dispensaria uma professora ilustre assim? Vou precisar de você por muito tempo.
- Então vamos praticar.
Eu gostava de vê-la tocando, parecia tão fácil, ela deslizava suavemente o arco nas cordas do violino, e eu, quando fazia isso, assassinava a canção.
Ouvi o telefone tocar, e deixei tocar, não queria parar no meio da aula. Ao terminar a aula, olhei, tinha três chamadas perdidas de Giovanna. Depois que me despedi da professora, eu retornei a ligação.
- Boa noite! Perdão por não ter atendido, eu estava no meio da aula, não tinha como parar.
- Boa noite! Tudo bem, me desculpe por atrapalhar, só liguei para ouvir a sua voz.
- Falando assim, você me desmancha. Senti sua falta o dia todo.
- O que você fez de diferente hoje?
- Eu fui ao centro da cidade conhecer a loja de quadros de um conhecido meu.
- E nem me convidou para ir com você?
- Ah, você estava ocupada, foi rápido, também.
- Comprou algum?
- Para que comprar um quadro se eu posso contemplar a mais bela imagem?
- Qual?
- Você.
- Só você, mesmo! Eu sou uma mulher normal.
- Então acabaram de mudar o significado de normal no dicionário.
- Você não existe.
- Existo só para você.
- Se eu estivesse aí, encheria você de beijos.
- Está esperando o que para vir?
- Hoje não vai dar.
- Sério? O Ralf está com saudades de você - ri.
- O Ralf, hein, espertinha?!
- Nós estamos.
- E a aula?
- Que aula?
- Você sabe de que aula estou falando.
- Ah, a de violino! Acho que daqui a cinco anos eu consigo tocar perfeitamente. Estou brincando. Se você vier aqui hoje, mostro como eu já manejo bem o violino.
- Ah, é? Engraçadinha.
- Você me acha engraçada, então devo largar as flores e montar um circo.
- Hoje você está demais, o que aconteceu?
- Você ainda pergunta.
- Fala, está me deixando curiosa.
- Como eu não seria a pessoa mais feliz deste mundo com você ao meu lado?
- Agora foi você que me quebrou - riu.
- Então, você vem?
- Eu gostaria de ir, sim, mas hoje não posso mesmo.
- Tudo bem. Eu vou sobreviver a esta noite sem você.
- Dramática. Está tentando me enrolar para não responder à minha pergunta.
- Verdade, a aula é um pouco difícil, mas tudo é complicado no começo, com o tempo eu vou adquirindo prática. Prometo que faço uma serenata para você quando eu me tornar uma profissional.
- Vou cobrar uma serenata com um pedido de casamento.
- Casamento?
Se ela estava falando em casamento, então minhas desconfianças não eram válidas, ou ela estava brincando comigo?
- Eu casei com você desde o dia em que a vi, só que eu me esqueci de avisar a você.
- Já vi que você hoje tirou a noite só para me fazer rir, o que é bom, sorrir faz bem para o coração.
O tempo não era a meu favor quando eu estava com ela ou conversava, ele corria feito um trem desgovernado, já era tarde da noite quando paramos de conversar.
E, na cama, antes de dormir, me peguei revirando meus pensamentos: não conseguia esquecer aquele rosto maltratado daquela senhora, e eu nem o seu nome perguntei. Será que ela tinha família ali? Por que ela foi parar nas ruas? Qual era a sua história?
Espero que eu a veja de novo, assim posso saber mais sobre sua vida.
Passei a noite me revirando na cama, até conseguir dormir.
Havia sete minutos que eu joguei água fria no meu rosto para despertar o sono. Antes de ir para o trabalho, peguei o violino e tentei tocar uma música suave, assim não incomodaria os vizinhos, sob o olhar atento do meu cachorro, ele sabia que não ia sair nada de suave. Chamei-o para sentar perto e fui treinando: para quem começou apenas há dois dias, até que me saí bem.
Passaram-se meses. Durante esse tempo, o meu relacionamento com Giovanna era o mesmo: durante a semana nos víamos, finais de semana era raro ela ir à minha casa, eu não conhecia ninguém próximo a ela e nem ela conhecia os meus. Eu tinha tido um bom avanço nas minhas aulas de violino. Aurora, que nunca falava da sua vida, me contou que morava só e não tinha namorado. Quase que eu perguntei: e namorada? Mas ficava só observando-a enquanto ela falava. De umas semanas para cá, ela tem mudado seu look, agora usa saia, vi até uma tatuagem no tornozelo dela, suas pernas também são lindas, mas essa parte deixa para lá, não quero confusão. Ela é uma mulher atraente, sim, seus olhos da cor do cabelo, a boca parece que foi desenhada, de tão perfeita que é.
Um dia, ao término da aula, Aurora, quando ia embora, tropeçou no cachorro, vindo a tombar para trás. Nesse momento, eu a segurei em meus braços, e pude sentir a maciez dos seus cabelos. E, quando ela ficou de frente, eu, ainda segurando a sua cintura fina, percebi que tinha sentido a mesma vontade que eu: olhava com desejo em direção à minha boca pela primeira vez. E eu senti vontade de descobrir os segredos do seu beijo, mas como eu poderia fazer isso se amava a Giovanna? Eu seria incapaz de magoá-la. Já quatro meses de relacionamento, eu tinha conquistado a confiança dela; sabia que, se eu perdesse, seria para sempre.
Ninguém está livre de que apareça outra pessoa que desperte interesse, afinal somos humanos, cada um deve saber como escapar ou vencer seus desejos para que não venha a estragar a sua vida amorosa. O novo sempre desperta curiosidade, ainda mais depois de sentir o perfume dela, tinha um cheiro suave, só senti mesmo porque eu estava muito próxima do seu corpo. Às vezes, eu tenho a sensação de que gosto mais de mulher do que muitos homens. É tão forte e incontrolável o que sinto por elas, que às vezes chega a me incomodar.
Soltei sua cintura antes que ela deixasse de lado sua timidez e me beijasse. Perguntei se tinha se machucado. Ela só balançou a cabeça que não e saiu. Parecia fugir da minha presença, nem se despediu direito.
Antes que eu fechasse a porta, Giovanna apareceu. Fiquei saltitante com a sua chegada e disse:
- Que bom que você chegou.
Abracei-a, para que ela não percebesse o meu incômodo.
- Está tudo bem, Laura?
- Sim, e com você?
- Estou bem. Encontrei a sua professora lá fora, acho que ela estava tão aérea, que nem me viu passar.
- É, ela é um pouco desligada mesmo.
Fui logo mudando de assunto, para que ela cessasse as perguntas. Eu não queria ter que mentir para ela sobre o que tinha acontecido, mesmo que causasse ciúme.
- Estava pensando em sequestrar você amanhã.
- Sequestrar?
- Sim, quero deixar as obrigações do dia a dia e levá-la a um lugar onde possa sentir o seu cheiro misturado com o cheiro da natureza. Tem como você ir comigo amanhã?
- Sim, mas para onde?
- Vai ser um sequestro, não posso falar o esconderijo.
- Tudo bem, senhorita misteriosa.
Fiquei um bom tempo curtindo a companhia dela. Eu estava sobre o seu peito ouvindo as batidas do seu coração, quando ela perguntou:
- Quantas horas levará para chegar até o esconderijo?
- Se você me levar sobre suas asas de anjo, em minutos estaremos lá.
- Deixa de gracinha, fala.
- Umas três horas, dá para a gente ir e voltar no mesmo dia. Amanhã cedinho, espero você em frente ao portão. Iremos em seu carro, assim podemos ver melhor as paisagens pelo caminho.
- Combinado, então. Vou me recolher, nos vemos amanhã na hora marcada. Boa noite!
- Boa noite!
O clima estava favorável naquela manhã, eu gostava de viajar ao seu lado, ficar longe desse turbilhão de gente, assim eu não dividiria a sua atenção com mais ninguém.
Fui dirigindo na direção da divisa de São Paulo e Paraná. Eu a levei a uma cachoeira, talvez a mais bela. Ela se encantou com a paisagem.
A cachoeira tinha 106 metros. Ficava em meio aos cânions, formando um verdadeiro cartão-postal: se olhássemos bem de longe, dava para ver seu formato de coração. Lugar perfeito para passarmos o dia, só éramos ela, eu e a natureza ao nosso redor.
Fizemos uma breve caminhada pela mata. Ela se lançou na água, disse que iria lavar a alma, e fiquei observando-a se banhar por um tempo, até que ela veio e me jogou na água também. Depois de nos banharmos, ficamos deitadas sobre o tapete de plantas. Segurei a mão dela e, juntas, olhávamos para o céu. Aproveitei a distração dela e lhe roubei um beijo. Falei que, se ela não tivesse gostado, devolvesse.
Eu tinha um dom de arrancar o seu sorriso, e ela, de fazer o meu olhar brilhar com mais intensidade.
Ela se divertia olhando as nuvens, dando forma a cada uma delas; apesar da maturidade, tinha uma criança dentro dela, admirável, uma mulher admirável. Esqueci-me de observar o céu azul e fixei minha atenção em seus olhos, era igual, só que os seus olhos, eu contemplava de perto.
Ela interrompeu a minha contemplação:
- Laura!
- Fala, passione.
- Não minta para mim.
Pronto, fiquei assustada, achando que ela falaria de novo da professora, mas o alívio veio quando ela falou:
- Você já veio antes com outra mulher aqui?
- Sim, com duas.
Ela abriu os olhos, parecia o mar se abrindo.
- E você fala assim normalmente: "com duas".
- Calma, com minhas amigas.
- Ah, tá!
- É gostoso aqui, o lugar é inspirador, não é que eu não goste de ir à praia, mas eu gosto do frescor do lugar, do silêncio, do verde, do ar puro.
- Verdade, aqui dá uma sensação de paz, né?
- Não é o lugar que traz paz, é a sua presença.
Ela apertou minhas bochechas e me encheu de beijos.
Ficamos abraçadas em silêncio, só ouvindo o barulho da cachoeira, o canto dos pássaros e o barulho do vento que balançava as árvores.
Ela aproveitou a calmaria do lugar e disse:
- Você me ama?
- Ainda há dúvidas?
- Você nunca fala.
- Às vezes, quem fala muito não sente.
- É bom ouvir "eu te amo".
- Eu sei.
- Sabe e não fala.
- É...
Respirei fundo, olhei para o céu, retornei o meu olhar nos olhos dela. Não tive como escapar dessa vez, como não diria diante do sorriso mais lindo visto por olhos humanos?
Minhas mãos suavam, meu corpo tremia. Ela percebeu e me abraçou, sentiu o meu coração bater forte e disse:
- Calma, se não sente, não precisa falar.
Depois do abraço, meu corpo tinha ficado mais calmo. Toquei o seu rosto macio, sorri para ela e disse:
- Ti voglio bene, "eu te amo!".
Senti um alívio dentro de mim. Levantei, abri os meus braços, olhando a sua face, e gritei:
- Eu te amo, te amo, te amo, te amo... - só parei de gritar quando ela me calou com um beijo.
Eu não gostava de falar, pois não saberia até quando duraria aquele sonho, não queria que ela me cobrasse depois.
Algumas pessoas mal se conhecem e já fazem juras de amor, prometem o céu e a terra sem saber que rumo o relacionamento vai ter. Nunca prometa algo que você não possa cumprir, às vezes passamos dez anos ao lado de alguém e só descobrimos quem ele é realmente depois da separação.
Foi muito bom passar o dia naquele lugar, o romantismo beirava cada paisagem. Ela, sorrindo, falou que eu não precisava gritar tanto, pois ela não era surda. Eu só queria que ela não ficasse com dúvidas, por isso gritei para os céus ouvirem.
Tínhamos levado um monte de balões de festa, nas cores azul e branco. Eu amarrei todos em um mesmo cordão, escrevi em alguns "eu te amo", registrei a sua imagem enquanto ela soltava o cordão. E os balões subiam lentamente. Ficamos olhando e rindo até eles desaparecerem entre as colinas.
- Se isso é um sonho, quero ficar sonhando para sempre - falei, na volta para casa.
Já era noite quando chegamos à minha casa. Convidei-a para entrar. Ela aceitou: tinha se tornado tão comum a sua visita, que só estava faltando ela trazer suas roupas para ficar de vez morando comigo.
Mas uma coisa de cada vez. Eu falei que a amava, agora o próximo passo seria pedir-lhe para vivermos juntas, dividir a mesma cama todos os dias, dormir e acordar ao seu lado sempre.
Coloquei a mão no bolso para pegar a chave da porta, mas não estava.
- O que foi, Laura?
- A chave, você viu onde eu coloquei?
- Você não colocou dentro da minha bolsa?
- Verdade. Cadê a sua bolsa?
- Está no carro.
- Me dá a chave do carro, vou lá pegar.
- Aqui.
Peguei o elevador e desci de novo. Abri o carro, peguei a bolsa dela, mas tinha tanta coisa dentro, que a tive que esvaziar sobre o banco do carro.
Foi quando vi uma aliança. Era tão fina, que, embaixo de um anel maior, não dava para ver. Olhei e tinha um nome gravado. Ele não me era estranho.
- Ela é casada, meu Deus! Casada! Não, não pode ser! Como ela conseguiu esconder tanto tempo isso de mim?
Fim do capítulo
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+ Todos os direitos reservados.
+ Obra registrada na Biblioteca Nacional.
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+ Capa criada por Naty Pinho.
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#LGBT
Comentar este capítulo:
Nelma Leonidio da Silva Autora da história
Em: 21/06/2018
Consegui um tempinho hoje e postei mais um capítulo do romance, não deixe de comentar para que eu continue a postar.
Beijos
Thaci
Em: 18/06/2018
Boa noite,Nelma!!!
Amei o primeiro capítulo. E agora o que a Laura irá fazer? Vai confrontar a Giovana? O irá terminar o namoro? Aguardando cena do próximo capítulo. Parabéns pela escrita. E gostaria de saber se continuará a postá-la aqui no Lettera? Pois já quero acompanhá-la capítulo por capítulo. Nota mil.
Resposta do autor:
Boa noite! Thaci.
Feliz por ter gostado e comentado.
Vou continuar postando sim. Próximo capítulo sábado a noite.
Arrivederci!
Até mais!
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