Capítulo 1
Águas Passadas
Jéssica já não estava de muito bom humor quando entrou no bar. A chuva pesada que começara há uma hora, não estava com jeito de parar tão cedo. Pediu uma cerveja e sentou-se em frente ao balcão da lanchonete, enquanto olhava disfarçadamente para a jovem sentada na mesa do canto.
Ela possuía um belo rosto, não havia dúvida, além de um incrível cabelo ruivo que lhe caía sobre os ombros.
Jéssica pegou o copo de cerveja e deu um gole, voltando rapidamente a sua atenção para a bela ruiva.
-- Você conhece aquela moça?
-- Não -- respondeu o garçom -- Deve ter entrado para se proteger da chuva.
Quando tornou a se virar, seus olhos se encontraram com os da moça. Sorriu, mas a garota fechou a cara e baixou a cabeça.
Tão pálida que parecia prestes a desmaiar, ela caminhou até a mesa.
-- Boa noite -- disse, olhando para os lábios rosados da ruiva.
Como ela não respondeu, se aproximou ainda mais, os olhos verdes atentos e curiosos.
-- Posso sentar?
-- Tenho um encontro -- ela disse.
-- Ah, desculpa -- Jéssica balançou a cabeça, acenando com uma das mãos, em um gesto de despedida.
-- Espera. Você está ensopada! -- disse, num misto de diversão e pena.
-- Pois é. Mesmo de guarda-chuva, fiquei encharcada.
- Senta.
-- Não quero atrapalhar o seu encontro.
-- Não se preocupe. Já passam das nove. Ela não virá mais.
-- Se você está dizendo. Vou acreditar -- sorriu de leve -- Me chamo, Jéssica. E você?
-- Samanta -- ela estendeu a mão.
Depois das apresentações, Jéssica chamou o garçom e voltou-se para ela:
-- Está gostando da banda?
Samanta afastou o olhar para o palco.
-- Esse estilo de música é muito... -- ela hesitou em busca da palavra adequada -- diferente.
-- É hip hop. Essa música é do Akon, você não conhece?
-- Não.
--Que mundo você vive? -- ela riu muito.
O garçom chegou e serviu cerveja para elas, Jéssica ergueu seu copo:
-- Ao nosso encontro não marcado -- ela brindou.
Desgostosa, Samanta consultou seu relógio e levantou-se.
-- Vou para casa. Já é tarde.
-- Agora não -- afirmou, Jéssica -- Essa música se chama Make you feel my love, da Adele.
"Quando a chuva estiver soprando no seu rosto
E o mundo todo incomodar você
Eu poderia te oferecer um abraço caloroso
Para fazer você sentir o meu amor"
-- Vamos dançar? -- Jéssica convidou e pôs-se em pé. Samanta a olhou indecisa e permaneceu sentada - Vamos! Essa será a nossa música.
Samanta aceitou a mão que Jéssica estendia e permitiu que a conduzisse até o meio da pista de dança. Ela a abraçou e começaram a acompanhar o ritmo.
Inclinando a cabeça para trás. Jéssica fitou aquele rosto branquinho, admirando a beleza natural da ruiva, a linha sensual da boca, os olhos castanhos.
Samanta encostou a cabeça no ombro de Jéssica. Um suspiro de felicidade escapou dos lábios da ruiva e ela apertou ainda mais os dedos em torno do pescoço dela.
-- Estou tão feliz em encontrá-la -- a voz de Jéssica era suave e verdadeira. Samanta estremeceu com a profundidade daquela emoção.
-- Também estou feliz -- Samanta fitou aqueles olhos verdes cintilantes, por um bom tempo.
Elas estavam quase paradas, e apenas movimentavam-se distraidamente ao ritmo da música.
De repente, Samanta consultou o relógio e afastou-se.
-- Preciso ir embora.
-- Eu te dou uma carona em meu guarda-chuva.
-- Não precisa -- libertando-se dos braços dela, Samanta caminhou na direção da porta.
Jéssica pegou o guarda-chuva, pagou a comanda e saiu correndo atrás dela.
-- Samanta. Espera!
Chovia torrencialmente. Ela abriu o guarda-chuva e segurando-o sobre a cabeça parou ao lado dela.
-- Tem lugar para mais uma -- os lábios dela tocaram nos cabelos castanhos de Samanta. Jéssica engoliu em seco e sentiu o coração bater apressado enquanto procurava uma maneira de começar o assunto. Decidiu por ir direto ao ponto: -- Estou maluca por você, Samanta. Completamente maluca -- Jéssica a observava atentamente, registrando cada reação.
Samanta se surpreendeu, arregalou os olhos e enrubesceu, o que fez com que ficasse ainda mais bonita.
-- Posso te dar um beijo? Se você não gostar, me devolve!
Como aconteceu, Jéssica jamais teria certeza. Talvez elas estivessem próximas demais debaixo do guarda-chuva. Mas de algum modo, quando perceberam, já estavam se beijando há muito tempo.
Elas caminharam abraçadas e em silêncio, absorvendo a magia da noite chuvosa que as uniu.
Meia hora depois, pararam em frente a uma casa branca. Com um sorriso gentil Samanta se despediu e ameaçou se afastar. Mas, antes que conseguisse, Jéssica a segurou por um braço.
-- Temos um encontro? -- perguntou sorrindo.
-- Sábado às oito? - ela lançou um olhar tão lindo, que foi capaz de fazer Jéssica estremecer.
- Estarei lá. Com certeza.
Jéssica foi para casa feliz. Estava tão ansiosa em rever a ruiva, que não aguentou esperar até sábado. Dois dias depois estava batendo palmas em frente a casa de Samanta. Uma senhora, prontamente atendeu.
--Bom dia!
-- Bom dia! Gostaria de falar com a Samanta.
A mulher baixou os olhos.
-- Faz vinte anos que a minha filha morreu.
Surpresa e embaraçada, Jéssica empalideceu.
- Impossível.
- Infelizmente é verdade.
A senhora já ia entrando quando ela perguntou:
-- O que aconteceu?
-- Ela foi atropelada quando estava a caminho de um bar aqui perto -- a mulher demonstrava muito sofrimento -- Ela tinha um encontro marcado para as oito horas. Samanta estava tão feliz.
Arrasada e assustada, Jéssica foi para casa.
No sábado...
Jéssica parou diante da mesa.
Samanta levantou a cabeça, arqueando uma sobrancelha numa expressão de surpresa.
-- Pensei que não viesse.
Jéssica segurou levemente o queixo dela e olhou-a fixamente.
-- Nem a morte me impediria de vir.
Samanta sorriu lindamente.
-- Escute! A nossa música! Adele, não é mesmo?
-- Sim -- Uma expressão marota brincou em seus olhos -- Vamos dançar?
Fim do capítulo
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Lily Porto
Em: 17/05/2018
Encantador. A mente viajou fácil...
Bjs.
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