O decorrer daquela manha continuava tranquila para as duas crianças que estavam sobre a sombra de uma árvore, no enorme pátio daquela escola. Bia e Miguel conversavam sobre tudo que tinha acontecido desde o acidente de Manuela. O jovem menino sempre honrou o que havia prometido para Carolina... Jamais falar sobre ela para Manuela, pois só assim Malvina deixaria os irmãos em paz.

Miguel com o passar dos anos entendeu o que Carol quis fazer... Claro que Carolina jamais diria para o menino que estava fazendo aquilo para que não os separassem... Mas ele era muito esperto!

- Bia... Lembra que combinamos de ajudar elas? – Falou encarando a amiga.

- Claro! Mas não tenho nenhuma ideia de como fazer isso...

- Bom, eu já me antecipei. – Bia o olhou curiosa.

- E o que você está planejando? – Miguel mostrou o celular para ela. – Mas quem são esses três?

- Olha melhor Bia... – Disse pensativo.

- Espera é a sua mãe e... Os pais da minha Dinda? – Não estava entendendo nada.

- Isso... Parece que eles já se conheciam muito antes de tudo isso! – A garota estava sem palavras... “Porque os pais de Carol nunca falaram nada?” Pensou.

- Onde você encontrou?

- Uns dias atrás eu vi minha mãe no quarto, olhando pra uma foto. Ela não demonstra seus sentimentos, mas enquanto mirrava essa foto eu vi algo... Entende? – Bia sentiu-se mal por ele, pois ter mãe e não receber amor é pior que perdê-la cedo... – Mas não é só isso... Quando cheguei na escola fiquei te esperando, enquanto você não chegava, estava observando minha mãe e elas se encontraram por acaso...

- Elas? Malvina e tia Samira? – Estava de boca aberta, pois Samira a tinha levado até a escola.

- Sim... E elas pareciam que estavam agitadas...

- Você acha que deveríamos contar a elas?

- Sim! Precisamos, pois quero ás ver juntas... Sei que Carol fez uma escolha pelas duas e não acho que Manu deveria ficar sem compreender tudo.

- Tudo? O que você sabe Miguel...

O menino começou a relatar o que viu pela parte da manhã e da tarde no dia do acidente de Manuela, ele era muito novinho, mas certas cenas nem o tempo apagam... O vento soprava levemente e se não fosse pela história de Miguel, teria sido um dia normal para os dois.

- Por isso minha Dinda fez você prometer que não contaria nada para a Manu!

- É... 

- E Manu tá achando que elas... – Foi interrompida.

- Por isso preciso ver a Carol! Como faço Bia?

- Liga pro seu pai!

- Pra?

- Ora Miguel! Para ele nós levar...

Bianca jamais deixaria seu melhor amigo sozinho... Sempre estaria ao seu lado!

 

§

 

Carol mostrava o projeto “Mar Aberto” para Manu quando a porta foi aberta revelando três pessoas que as olhavam.

- Ana está tudo bem? – Perguntou Carol desconfiada.

- Precisamos conversar... Nós quatro. – Respondeu para a amiga.

- Bom, sendo assim, acho que os deixarei. Com licença. – Marta olhou para Carolina que sorriu em resposta.

- Temos algo para contar a vocês! – Esclareceu Félix.

Manuela e Carolina trocaram olhares enquanto iam em direção ao sofá, fazendo sinal para que os amigos se juntassem a elas.

- Vocês dois estão se pegando e vieram pedir nossa benção... É isso? – Carolina riu divertida e Félix corou na hora.

- Como? – Perguntou Manu olhando para os dois.

- Tá na cara deles Manu! A Aninha ai não demonstra, mas o Félix tá com cara de quem aprontou... – Não conseguia parar de rir.

- Bem que eu gostaria... Aí Ana! – Comenta Félix pensativo levando um beliscão. Ana cerrou os olhos.

- A próxima é você! – Apontou o dedo para Carolina que puxou Manu em sua frente.

- Nem vem que estou protegida!

- Me usando como escudo? – Manu a encarou.

- Claro amor... Você vai me proteger da fúria dela, não vai? – Falou Carol fingindo medo.

- Vou pensar no seu caso... – Carol a abraçou por trás sussurrando em seu ouvido.

- Talvez você queira um incentivo pra pensar... – Manu ficou com as bochechas iguais as de Félix e Ana completou.

- Opa... Finalmente teve sex* dos bons Carol? – Aninha caiu na gargalhada sendo acompanhada por todos.

- É parece que nos acertamos Ana... – Respondeu Carol sorrindo – Mas o que vocês vieram fazer... Não foi pra benção que eu sei.

- Bom e o que é tão importante assim... Estou ficando preocupada. – Manuela olhou para ambos.

- É sobre vocês, na verdade sobre você Manu...

- Fala logo Félix... – Manuela não estava com tanta paciência, pois os dois não estavam com uma cara muito boa. – Aconteceu alguma coisa com o Miguel?

- Não! – Félix respondeu de imediato.

- Na verdade é referente à Malvina... – Manu na hora olhou para sua namorada e lembrou do dia de seu acidente. Carolina notou algo nos olhos de Manu, mas não soube decifrar.

- O que ela aprontou agora? – Carol quis saber.

- Não foi bem agora... Já fazem alguns anos! – Félix respondeu.

- Na verdade 25 anos... – Completou Ana. Manu estava sem entender o que acontecia e muito menos o rumo daquela conversa. Ana olhou para a amiga, que estava sem entender e voltou seus olhos para Manu. – Eu e Félix estamos investigando Malvina... Desde que vocês foram viajar. Bom... Félix foi atrás do hospital onde Malvina supostamente teria ganhado você, mas...

- Mas não existem registros de Malvina na data de seu nascimento Manu.

- O que vocês estão insinuando? Elas são muito parecidas, não tem como Malvina e Manu não possuir o mesmo sangue. – Carol falou curiosa.

- É por isso que fomos atrás dos registros de quando Malvina doou sangue e... Os testes feitos na época passaram despercebidos, mas... – Ana fez uma longa pausa.

- Mas o que Ana? – Manu já estava inquieta.

- Olha Manu a Malvina não é sua... Mãe... – Ana olhou para Félix como se pedisse ajuda.

- Como? – Perguntou perplexa.

- Ela Manu, é sua irmã... – Completou o rapaz.

Foi como se o tempo congelasse. Manuela observava tudo em câmera lenta... Não entendia o que estava acontecendo, como poderia? Saber que sua vida não passou de mentiras e segredos! Sua mãe... Não era quem sempre achou que fosse, mesmo não sendo uma mãe para ela, era a única mãe que conhecia! E Francisco? Como ficaria quando soubesse... O homem que tanto amou... Não era seu pai...

Carolina estava tão abalada quanto sua mulher. Que espécie de pessoa era Malvina? Até onde ela seria capaz de chegar para ter o que queria? Mas... O que realmente aquela mulher queria...

- Isso quer dizer que eu e Miguel... Não somos irmãos? – Falou deixando as lágrimas banharem seu rosto.

- Ele é seu sobrinho Manu... Você ainda pode ter a guarda dele, fica tranquila. – Félix tentou acalmá-la.

- Manu olha pra mim... – Falou carinhosamente Carolina – Ela pode não ser sua mãe, mas é sua irmã... Seja lá o que ela fez... Temos que descobrir. Sei que deve estar doendo, mas eu estou aqui! E temos dois anjos da guarda conosco! – Abraçou fortemente Manu, tendo o gesto retribuído na mesma intensidade, enquanto olhava para os amigos, que lhe sorriam. – E quanto ao Francisco – Carol viu isso nos olhos marejados de Manu – tenho certeza que ele sempre te amará como uma filha! Pois ele te criou com todo o amor de um pai e isso sangue algum modifica...

- Te amo tanto Carol! – Beijou levemente os lábios de Carolina – Não saberia o que fazer sem ter você aqui comigo...

- Eu sei meu amor... Também te amo! Mas se eu não estivesse ao seu lado tenho certeza... Amor não iria lhe faltar! – Olhou feliz para os dois a sua frente que corresponderam o gesto.

 

§

 

A paisagem ia modificando conforme o carro seguia sua direção. O motorista estranhou ter seus dois passageiros tão quietos no banco de trás. O que eles tanto queriam conversar com Carolina afinal?

- Vocês não vão mesmo me contar o que está havendo? – Perguntou Francisco olhando pelo retrovisor.

- Bem que eu gostaria pai, mas preciso falar antes com a Carol... É que...

- Vocês tem um segredo... Não é mesmo!  - Afirmou o homem.

- Temos. – Sorriu o jovem menino para seu pai.

- Tudo bem Miguel eu tenho orgulho de você meu filho... Por guardar isso por tanto tempo, mas não se esqueçam que estou aqui para ajuda-los, os dois – olhou para Bia que prontamente respondeu.

- Nós sabemos tio Francisco! Né Miguel?

- Com certeza!

Nem Miguel nem Bia conheciam aquele caminho. Estavam a imaginar onde Francisco os estava levando... Assim que pararam em frente a um enorme portão ficaram ainda mais curiosos!

O homem havia ligado para Carol, que acabou por liberar a saída de Bia. Não havia clima para continuar na empresa naquele dia, então as duas resolveram voltar para casa. Manu ainda não tinha se mudado, até porque Carol não tinha se manifestado, e a moça não iria se oferecer pra ir morar com ela – mulher difícil essa! – só havia levado algumas roupas, para ocasiões especiais...

Estavam na sala quando Alfa começou a latir. Carolina foi até a porta para abri-la. Sorriu assim que Bia pulou em seu colo pra beijar sua bochecha! Manu não ficou para trás e deu um longo abraço em Miguel.

- Hora de trocar! Também quero beijar essa moça linda! – Disse Bia divertida! Carol cerrou os olhos e bagunçou o cabelo de sua afilhada.

- Essa “moça linda” já está comprometida com uma bela, elegante, galante e despojada mulher! – Falou Carol toda séria.

- Nossa o vocabulário mudou? – Perguntou Manu feliz com Bia nos braços.

- Tudo mudou meu amor! O vocabulário... O lugar... As situações... No entanto meu amor por você só soube se multiplicar! – Falou piscando para Miguel que achou tudo muito divertido.

- Nossa Carol... Quando eu crescer quero ser galanteador que nem você! Sorriu feliz para a jovem.

- Pra que Miguel? – Perguntou Bia incomodada. – Dinda é muito namoradeira... E você só vai namorar comigo!

- Eu sei Bia, mas eu quero lhe galantear todos os dias! – Piscou de volta para Carolina que admirou a saída do rapaz... “É ele será muito bom”, pensou sorrindo.

- Então, você é muito “namoradeira”? Conte-me mais sobre isso! – Manu falou próxima de Carolina, mas todos ouviram. Sendo a vez de Francisco salvar o dia.

- Bom eles estão entregues! E acho que não faço parte desta pequenina – fez referência ao tamanho das crianças – conversa. – Olhou carinhosamente para Manu.

- Pai... – Manu não sabia o que falar.

- Tudo bem Manu... Temos muito tempo para conversar, mas acho que vocês duas tem coisas inacabadas, só tomem cuidado, está bem? – Todos estranharam o comentário do homem.

- Te amo pai! – Manu o abraçou forte.

- Eu também meu amor os dois! E isso nada será capaz de mudar... Ouviram! – Francisco os presenteou com um belo sorriso, o mesmo que Miguel possui.

Os quatro ficaram observando Francisco sair com o carro pelo longo pátio à frente. E os olhos voltaram se para os dois aventureiros de plantão.

- E então? O que tanto querem falar comigo? – Falou Carol enquanto todos sentavam em cima do tapete peludão que ficava depositado em frente ao enorme sofá.

- Carol é sobre aquilo que você me pediu pra não contar... – Falou Miguel apreensivo, enquanto os olhos de Manu voltavam-se para ele – Mas também sobre o que eu vi no mesmo dia a tarde.

- Tudo bem Miguel... Pode falar o que você quiser... – Carol sorriu encorajando o menino.

- Tá – respirou fundo – lá vou eu... Naquela manhã do acidente da minha irmã você esteve lá em casa – Manu olhou lembrando-se de quando sua mãe falou, que elas eram amantes – mas antes disso Malvina falava com alguém no telefone...

- Com quem? – Perguntou preocupada.

- Não sei Carol, mas ela falou que era pra essa pessoa voltar... Aí você chegou e foi aquela confusão! Depois da briga – “briga” pensou Manu – você não percebeu que a Malvina havia puxado o seu medalhão...

- Eu imaginei que ele tivesse caído quando ela me derrubou no chão, mas nunca que ela tinha pegado de propósito...

- Eu fiquei o dia inteiro de olho nela... Ela estava estranha, com um brilho que me assustava! Foi quando Manu apareceu para me ver e bom... – Ele olhou para a irmã que estava começando a ligar os fatos...

- E o que houve Miguel? – Carolina estava com muita raiva de Malvina...

- Ela falou que vocês... Você e ela eram...

- Nós? Pera... erámos? – Carol pensou um pouco e olhou para Manu. – Não acredito...

- Amantes... – Miguel falou num sussurro.

- O que? Mas como alguém pode ser tão louca! – Carol levantou querendo socar alguém. – Espera... Você acreditou nisso Manuela? Você acreditou na louca da sua mãe! Achou mesmo que enquanto eu estava com você, eu estava com ela?! Responde Manuela! – Carol já estava fora de si! Como alguém pode ser tão má... Sem amor pelos outros, mas Manu ter acreditado nela... Doía. Rapidamente Manuela levantou para encara-la.

- Carol me escuta, por favor... – Olhou-a nos olhos e sentiu que podia continuar – Ela fez de tudo para tornar aquela situação convincente e quando me entregou o seu medalhão, que eu projetei... Não sabia o que fazer, por isso fui atrás de você, mas Malvina foi certeira, pois deu a entender que ela não era a única mulher que você pegava! Quando cheguei naquele barzinho e vi você com aquela mulher... Beijando-a... O que você queria que eu pensasse?

O silêncio tomou conta do ambiente. Os ânimos estavam exaltados... Miguel levantou e foi até elas.

- Não quero que vocês fiquem assim... Por isso contei, porque quero ver vocês juntas pra sempre! Não quero que vocês se separem por minha causa! – O menino havia entrado em desespero e abraçou fortemente a irmã.

- Espera Miguel não é sua culpa... – Manu tentou consola-lo – Eu e Carol um dia teríamos que ter essa conversa... – Foi bruscamente interrompida.

- É minha culpa sim... Porque a Carol só fez isso por minha causa! Porque a Malvina iria me mandar pra um colégio interno na Europa... – Olhou chorando para Carol e essa ajoelhou-se para abraça-lo – E eu sei de tudo... Eu vi quando minha mãe lhe mostrou os documentos da transferência... Me desculpa Carol... Mas eu não sei mais o que fazer! Queria ajuda-las, mas só fiz com que brigassem...

O choro do garoto não cessava e as duas mulheres não sabiam mais o que fazer. Carol estava sentada no chão com ele em seu colo, confortando-o, e Manu parada, absorvendo as informações...

- Miguel – Bia foi até eles – elas não estavam brigando. Só colocaram pra fora o que as estava sufocando, pois agora sim elas podem lutar quando a malvada da sua mãe! – Miguel pareceu se acalmar com as palavras de Bia.

- Mas... – Tentou argumentar.

- Mas nada Miguel! Olha, a Dinda e a Manu só estão doídas, pela forma com que as coisas aconteceram, mas agora elas podem pegar a única culpada e dar uma boa surra! – Falou decidida!

- Calma Bia também não é assim... – Carol sorriu para os dois – Olha Miguel, Bia está certa! – “Até na parte da surra”, pensou – Mas ninguém vai bater em ninguém... Ouviu senhorita Bianca! – A risada contida de Miguel trouxe Manu de volta de seus pensamentos.

- Exatamente! Carol tem razão... – Sentou-se com eles – E como já passou do horário de almoço, que tal uma pizza juntamente com uma maratona de filmes? – Abraçou Bia ao completar, enquanto Carol continuava com Miguel em seus braços.

- Harry Potter! – Os dois falaram ao mesmo tempo.

- Não poderia ser melhor! – Sorriu Carol para os três – Bia e Miguel arrumam os filmes, enquanto vou ver da pizza pra nós, ok? – Eles responderam com um enorme sorriso.

Carol afastou-se deles e Manu a seguiu. Assim que Carol fez a encomenda Manuela questionou-a.

- Por que não me contou que ela estava lhe chantageando? – Disse triste.

- Como Manu... Como eu teria coragem de fazer você escolher? – Uma lágrima escorreu pelo rosto de Manu enquanto ela se jogava nos braços da namorada.

- Isso tá doendo muito... Tudo isso... – Carol a abraçou forte.

- Em mim também... – Fez uma pausa antes de perguntar - Ainda quer ficar comigo Manuela?

- Mais do que tudo! – Carol sorriu feliz.

- Então só falta uma coisa... – Manu ficou observando Carol puxar o medalhão e abri-lo.

- Quer casar comigo Senhorita Fernandes? – Manuela não podia acreditar que as alianças estiveram todos aqueles anos dentro do medalhão...

- As alianças...

- Era mais um motivo para não tira-lo do peito, eu não sabia quando e nem como, mas tinha certeza, que um dia iria lhe entregar! – Manuela deu o mais encantador dos sorrisos.

- Aceito! Senhorita Portman! – Deu um saboroso beijo em sua noiva. – Mas tem uma coisa que estas me incomodando?

- E o que seria? – Perguntou desconfiada...

- Quer dizer que você é “namoradeira”? – Levantou a sobrancelha em desafio.

- Quem... – Respondeu temerosa.

- É o que vamos descobrir... – Manu empurrou Carolina contra a bancada da cozinha, pulando em seu colo em seguida.

- As crianças Manu...

- Elas estão ocupadas! E temos Alfa de babá...

- Ok... Não irei me fazer de rogada então! – Cafajeste era pouco para sorriso na face de Carol!

Em meio há um turbilhão de acontecimentos... Elas ainda assim... Encontraram um tempo para serem felizes... Os quatro.

 

 

 

 

 

Fim do capítulo