No decorrer da minha adolescência, esse meu senso de justiça aguçado, após presenciar cenas terríveis de bullying com pessoas próximas a mim na escola pública, então passei a me engajar em diversos projetos sociais na comunidade onde morava no intuito de diminuir os danos não só do bullying, mas também de outros tipos de agressões. Acho que foi ali, vendo a injustiça ao meu redor, que meu amor pelo direito começou e, também, meu sonho um dia de trabalhar no Ministério Público (MP).

Há 4 anos atrás, após passar no concurso para promotoria, resolvi adquirir um apartamento, pois antes disso trabalhava como advogada de uma empresa de grande porte, o que me ajudou a juntar uma quantia razoável para realizar o sonho do primeiro imóvel. Moro num apartamento em Laranjeiras - Rio de Janeiro e essa aquisição foi quase tão difícil quanto passar na prova de vestibular de direito na Universidade Federal Fluminense (UFF), pois quem mora no Rio sabe que não é fácil achar um apartamento grande, daqueles antigos, que ainda estejam à venda. Por mais que sempre tenha amado morar em casas, devido a minha profissão, resolvi morar em apartamento e assim o fiz. Talvez eu mude isso nos próximos anos, afinal, hoje em dia temos diversas opções de condomínios na cidade, que oferecem a mesma ou até uma maior segurança para os moradores, mas no final eu sempre acabo adiando este plano, pois quem me conhece sabe que eu odeio mudança. Sou uma daquelas jovens pessoas, que possuem espírito de idoso, sabe? Tenho minhas rotinas que são seguidas impreterivelmente nos horários estipulados por mim, sou organizada e tenho manias de pôr tudo em ordem, seja ela alfabética, de tamanho, cores ou qualquer outro tipo de organização que exista na face da terra e isso é motivo de muita implicância por parte dos meus amigos, que sempre me dizem que sou "toda trabalhada no TOC" e que falta na minha vida uma mulher que faça bagunça em toda minha organização, mas eu sempre respondo que já avancei muito quando resolvi dividir minha vida com um ser do sex* masculino: meu cachorro. Às vezes até penso sobre isso, mas vivo há tanto tempo sozinha e focando toda energia e tempo que tenho para o meu trabalho, que não sei se conseguiria manter um relacionamento. Não vou dizer que não tenha meus casinhos uma vez ou outra, mas daí transformar isso numa vida conjugal é outra coisa. Além disso, quando a noite passa e acordo ao lado de qualquer mulher, eu me sinto péssima. Sei que isso é horrível de se dizer, mas esta é a realidade, ao menos a minha. Sinto uma sensação de desespero, agonia, não sei direito! Só sei que me vem uma vontade louca de desaparecer daquele lugar e ter de volta minha vida organizada e monótona de sempre, então me contento com as minhas saídas com os meus amigos e aplaco a solidão de vez em quando com uma mulher interessante. Apesar que ultimamente tem sido muito difícil encontrar amigos disponíveis para sair. Parece que quando você tem mais  que 25 anos, existe uma pressão da sociedade para que você passe a ter uma vida mais estável, com filhos, cachorros e tudo mais. Talvez este seja o motivo de  eu ter menos amigos solteiros agora, vai saber. Eu, Manoela, Cadu e Pedro, somos os últimos dos moicanos.

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Mais um dia em que acordo às 05h00 da manhã e como sempre, curto meus 2 minutinhos de preguiça num dos lugares que mais amo no mundo: minha cama. Levanto, tomo um copo d'água, faço minha higiene matinal e pego meu fiel escudeiro Apolo para iniciar nossa caminhada de sempre. Após sair do apartamento, damos início a procissão e depois de 40 minutos com Apolo benzendo os postes, resolvo retornar para o apartamento, pois precisava chegar no meu escritório às 09h00 da manhã. O caminho de volta é ainda mais longo, pois o meu deus grego possui uma beleza ímpar e uma simpatia fora do comum, que fazia todas as mulheres, crianças e idosos pararem para fazer um pequeno afago e foi num desses momentos que conheci minha ex-namorada e atual melhor amiga, Manoela. Ela estava sentada na grama do parque em frente ao meu apartamento, quando Apolo simplesmente me deu um golpe (de profissional, diria eu), me enrolou na sua guia e depois , não me perguntem como, se soltou. Isso mesmo! Ele me golpeou, me enrolou, se soltou e foi correndo na direção de uma linda loira, que estava sentada fazendo um lanche no parque. Não acreditei quando vi a cena, pois quando ele chegou perto da loira, ele parou de correr, e passou a andar como um Lorde Inglês, fazendo charme e balançando aquele rabo mais majestoso que o de um pavão na frente da moça. Quando Manoela viu o meu cachorro, que devia ganhar o Oscar devido a magnífica atuação após falsamente interpretar o papel de um anjinho, ela se derreteu por ele e foi assim que começou nossa história. Descobrimos que morávamos no mesmo prédio, nos envolvemos e ficamos namorando por 3 meses, até descobrirmos que éramos melhores como amigas do que namoradas.

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Segunda-feira nunca é um dia fácil, não é verdade? E é justamente por isso, que em todas as segundas-feiras eu acordo com uma âncora amarrada no meu pé esquerdo e a preguiça toma conta de mim. O celular desperta, mas eu penso que é uma alucinação ou qualquer outra coisa que me faça acreditar que não preciso levantar e por conta disso já são 7h30 da manhã. Eu me levanto bruscamente me dando conta que tenho uma reunião no primeiro horário do dia. Corro para o banheiro e jogo uma água rápida no corpo, enquanto escovo os dentes ao mesmo tempo. Taí uma mania que foge do meu padrão organizado: minha escova de dente nunca fica em cima do lavatório, pois o lugar dela é na prateleira do box. Acabando o banho, pego no guarda-roupa o primeiro terninho que vi pela frente. Após vesti-lo e pôr os sapatos, olho pra frente e vejo Apolo me olhando com a cara mais triste e fofa do mundo, como quem diz: "Mãe, você não vai me levar para fazer xixi?". Como assim eu esqueci do Apolo, gente? Sem outra alternativa, ligo para minha amiga, fiel escudeira, e anjo da guarda, Manoela.

Ela me atende após o terceiro toque do telefone:

--Manu, bom dia! Você está linda hoje, sabia? - Digo para ela.

--Mentirosa! Você nem está aqui para saber se estou linda ou não. Diz logo o que precisa, pois certamente este elogio não está saindo assim do nada. - Ela responde entre risos.

--Puxa vida! É isso o que você pensa da sua melhor amiga? Pois bem, como estou muito atrasada, me declaro culpada e te imploro ajuda! Preciso que você leve o Apolo para fazer xixi e depois o traga são e salvo, em troca permito você usar o meu deus grego para conquistar belas donzelas perdidas por Laranjeiras. Fechado?

--Fechado! Estarei aí em 2 minutos. - Ela responde com a voz mais satisfeita do universo.

Após exatos 2 minutos minha campainha toca. Abro a porta e Manoela se joga nos meus braços me dando um beijo estalado na bochecha.

--Bom dia, minha morena mais linda do mundo! - Diz Manu.

--Bom dia, minha querida! Muito obrigada por isso, viu? -Agradeço fazendo um carinho naquela cabeleira loira.

--Alex, estou mais do que acostumada com os seus atrasos nas segundas. Relaxa, mulher! Onde está Apolo? - Pergunta Manu.

--Serve aquele ali abanando o rabo pra você e preparado para correr em 3, 2, 1? - Digo isso em meio a risos.

Enquanto finalizo uma maquiagem básica, Manoela abre minha geladeira, os armários da cozinha e reclama:

--Não acredito que uma mulher linda, gostosa e bem sucedida como você, não tem nada para comer ou beber nesta casa. Você está passando fome, Alex? Se for isso avisa, te empresto 100 temers ou golpes, como você preferir - Pergunta Manu com uma voz debochada, enquanto se abaixava para brincar com Apolo.

--Ai, Manu! Você sabe que não gosto de cozinhar só pra mim, então acabo comendo mais na rua.  - Respondo.

--Pois saiba, que amanhã eu virei aqui e prepararei um café da manhã decente pra você. Dê uma olhada para você mesma no espelho e poderá ter uma noção do quanto você está mais magra. Esse negócio de viver pro trabalho e não se alimentar bem não é vida. Então, saia do trabalho hoje, olhe seu WhatsApp e compre tudo que estiver na lista que mandarei para você. É uma ordem, ouviu bem? - Pergunta Manu com uma cara brava e preocupada ao mesmo tempo.

--Manu, não precisa se preocupar. Eu estou bem. Além do mais, quem te ouve falar assim pode até pensar que somos casadas ou pior, que eu sou uma mandada. - Brinco com minha amiga e depois dou uma gargalhada.

--Bom... você é quem sabe. Se não comprar, nunca mais farei aquele Temaki que você ama e que só eu sei fazer. Lembra dele? Temos um acordo ou não? - Manu me chantageia de forma descarada, com as mãos na cintura e com ar de quem sabe todos os meus pontos fracos.

--Tá bom, sua chata! Agora realmente preciso ir. Obrigada por sempre se preocupar comigo e me socorrer nas segundas. --Digo sorrindo, após dar um abraço carinhoso nela.

--Você é minha estrelinha, lembra? Vou cuidar sempre de você, sua boca aberta! - Brinca Manu, implicando comigo por um apelido que odeio.

--Boca aberta é seu... Ah, Esquece! Vai ter volta ainda. - Respondo sorrindo e apertando suas bochechas, enquanto ela tentava se afastar dos apertões.

Dou um beijo no Apolo, me despeço dessas duas figuras que são tão importantes para mim e sigo para o estacionamento para pegar meu carro. Entro e ligo o som, seleciono a pasta do Frejat para ouvir no caminho para o trabalho. Saio do estacionamento cantarolando e me deparo com um tempo chuvoso e com um trânsito caótico e começo a dirigir. Após alguns minutos um carro furou o sinal e quase bateu em mim, mas por sorte percebi que ele iria avançar e acelerei  um pouco mais quando passei pelo cruzamento. Fico mais atenta ainda após o ocorrido e penso novamente que segunda-feira realmente não é o meu dia de sorte. Após mais alguns minutos dirigindo em direção ao centro da cidade, peguei um engarrafamento que durou 40 minutos, mas antes do mesmo acabar liguei para a minha secretária e pedi que todos os profissionais do ministério público que participariam da reunião fossem avisados que eu chegaria atrasada e que a esta precisaria ser remarcada para às 10h00 da manhã. Aproveitei que estava parada por conta do engarrafamento e resolvi repassar os pontos do caso que seriam tratados na reunião preparatória para a audiência marcada para amanhã. O Ministério Público (MP), neste caso representado por mim, investiga há 6 meses uma quadrilha que acreditamos ser responsáveis por assaltos à diversos carros-fortes em diferentes pontos da cidade, que já somam um montante de 3 milhões de reais e o armamento dos seguranças. Caso venhamos a obter sucesso neste caso, poderemos desmantelar essa quadrilha que, de acordo com algumas testemunhas, age há 2 anos no estado. Após o recebimento de denúncias no Disque-denúncia, a promotoria conseguiu algumas informações que puderam ser utilizadas para buscar novas provas que pudessem consolidar o caso. Graças a isso, temos importantes testemunhas que irão depor amanhã além, é claro, do reconhecimento dos suspeitos pelos seguranças dos carros-fortes. É um processo importante para o MP e é um caso que está nos tirando o sono.

--Amanhã será o grande dia! - falei sozinha no carro, enquanto pensava sobre o caso e escutava as buzinas insistentes dos outros motoristas.

--Esses idiotas acham que buzinar é uma fórmula mágica para o trânsito andar. Será que se eu buzinar também o congestionamento acaba? - Falei sorrindo.

Lentamente o trânsito foi melhorando e quando estava prestes a entrar na Avenida Presidente Vargas, o sinal fechou.

--Sério isso? Todo castigo pra corno é pouco, como diz meu pai! - Balancei minha cabeça em sinal de frustração.