Capítulo 12 - A beleza do caos
“Ela é deliciosamente caótica, uma linda bagunça. Ama-la é uma aventura esplêndida...”. Diana lembrava desta citação. Lembrava que havia a escrito no cartão do presente de um ano de namoro que deu a Rhian. Porque era como as coisas eram. Rhian era perfeita. E então subitamente caótica. Era linda, e então bagunçava todas as coisas. Ariana uma vez havia lhe dito que Rhian era feita de caos, mas não, não era, na verdade ela era uma causadora de caos. O causava como ninguém. E o caos de Rhian costumava ser assustador, ao mesmo que era quase poético de tão bonito... Seu caos era feito de sentimentos. Sentimentos demais eram sempre o único motivo do caos de Rhian Keir.
E Diana sentia que aquela sua única frase causaria um caos e tanto.
Rhian tirou Diana de sua coxa assim que a ouviu dizendo aquelas quatro palavras desoladoras: Ela é minha esposa.
_ Você... Se casou?_ Perguntou Rhian, absolutamente incrédula, levantando da cadeira onde estava_ Você..._ E aqueles olhos se encheram quando ela olhou para a tela do notebook, olhou para a mulher com quem o amor da sua vida estava lhe dizendo que era casada. E aquilo esmagou o coração de Diana, não era para ser daquele jeito, sabia que não era_ Casou com ela, Diana? Com esta moça aqui?
_ Rhian..._ Matava Diana ver aqueles olhos tão magoados. Rhian quase nunca se magoava, mas quando o fazia...
_ Casou com ela, assumiu mais do que um compromisso, você... Ah não..._ E Rhian sentiu o chão desaparecendo de sob os seus pés.
_ Rhian ouça, você precisa me ouvir, precisa ficar calma e me ouvir...
_ Eu estou louca para ouvir você_ Ela disse, voltando-se para Diana imperativamente_ Você casou, Diana? Casou de verdade? Eu quero ouvir claramente da sua boca!
_ Rhian, se você me deixar explicar...
_ Explicar? Ela usa o seu sobrenome, Diana!_ Disse, explodindo em mágoa e aflição só de uma vez_ Não, espera, espera..._ E correu para as mochilas, revirando tudo o que havia dentro e a dinâmica entre elas mudava de lado de acordo com a dona da dor. Quando Diana estava ferida, Rhian era a pessoa mais calma possível, mas quando Rhian estava ferida... Coisas e emoções voavam pelos recintos. Ela revirou as mochilas, freneticamente, buscando por algo que Diana não fazia ideia do que era.
_ Rhian espera, calma, deixa eu contar tudo isso pra você. Rhian...?
_ Aqui!_ Disse, erguendo a identificação federal de Diana de dentro de uma das mochilas_ Não é um “R”, é outra letra, você assina o sobrenome dela?_ E aquilo não parava de machucar Rhian, não parava de corta-la por dentro, de machucar todos os sentimentos bonitos que Rhian só nutria por Diana..._ Eu achei que estava errado, que havia borrado por causa da água, mas não, não é?
_ Rhian...
_ Que letra é essa aqui, Diana? Responde pra mim!
_ É um “H”. De Harumi_ Disse, vencida, sabendo que não adiantava mais negar nada agora, era melhor dizer tudo de uma vez. Um melhor dentro das possibilidades da situação, porque nada parecia melhor, nada parecia menos doloroso_ Eu fiquei com um sobrenome dela, ela ficou com um meu.
_ Então..._ E os olhos de Rhian se encheram outra vez olhando para ela, extremamente magoada, não estava acreditando no que estava ouvindo, deveria ser alguma brincadeira, não podia acreditar que...
Estava casada. A mulher que amava, por quem era louca. Havia casado com outra. Havia um “H” no meio de seu nome. Não era um K, era um H. Era um H. E Rhian não entendia, não conseguia compreender aquilo, e menos ainda conseguia controlar. Mas Diana viu que ela tentou. Tentou controlar a respiração de choro, controlar seus olhos se enchendo de pesar, mas ela não conseguiu, era demais, era muito para o tanto que ela amava aquela sua maldita namorada...
Rhian levou as mãos trêmulas até a cabeça e chorou, enquanto seu corpo inteiro vibrava tentando segurar sentimentos que ela não queria mostrar, não queria sentir, ter, mas Rhian era tão transparente que tudo se mostrava, a dor se torcia por seu corpo inteiro, viva, pulsante e para Diana nada poderia ser pior. Havia ferido Rhian outra vez, sabia que havia e não fazia ideia de como poderia consertar uma coisa assim.
_ Rhian, calma. Amor, olha pra mim..._ E Diana tentou toca-la, mas Rhian não deixou, fugiu do toque dela, da pena dela.
_ Você assina o nome dela?_ Ela perguntou, com aqueles olhos lindos tão cheios de dor.
_ Não, eu assino o meu nome, isso só foi algo que ela me pediu para fazer, eu...
E havia uma coisa sobre Rhian. Não havia mente dentro da cabeça dela quando ela se machucava, sabia. Mas Rhian sempre seria o herói de Diana, ainda que vez ou outra, ela perdesse a cabeça.
Rhian enfiou o pé na cadeira entre elas, fazendo o móvel voar para o outro lado do quarto.
_ Você assina o nome dela!_ E a respiração de Diana deu um pulo no peito com o estrondo na parede, mas não era nada que ainda não houvesse visto, presenciado, causado. Era daquele caos que falava, que a chocava, mas que era tão Rhian que Diana não conseguia temer_ Ela é sua mulher, sua mulher! Como você pode fazer isso comigo, Diana? Como você pode...?!_ E Rhian derrubou coisas que haviam sobre a mesa furiosamente, descontroladamente, fechou os punhos e soltou um enorme grito de raiva e frustração que arranhou os ouvidos e o coração de Diana. E Rhian virou-se de costas, esmurrando a parede continuamente, o punho cerrado, os olhos cerrados, sentindo tanto, mas tanto... E ela ia se machucar. Ia ainda se machucar.
Diana agarrou-a por trás, abraçando-a contra si ao segurar os punhos dela firmemente e Rhian começou a forçar, lutando, com raiva, mas incapaz de sair dos braços daquela que amava, ainda que estivesse a odiando tanto...
_ Shsss amor, não, não, não faz isso...
_ Você assina o nome dela, da sua mulher!
_ Eu só tenho uma mulher. E ainda não assino o nome dela_ Respondeu, segurando-a contra si, tentando acalma-la_ Rhian, as coisas não são assim, não é como você está pensando...
_ Como você faz isso comigo?_ Perguntou em meio àquela crise de choro, agarrando-se aos braços de Diana, agora mais ferida do que enfurecida e o coração de Diana se esmagava um pouco mais ao vê-la assim.
_ Eu não fiz com você, eu fiz contra mim mesma, deixa eu falar pra você sobre isso..._ Falou numa voz calma, tentando amenizar aquela coisa que pulsava por Rhian, seus batimentos acelerados, sua pele quente, era como se houvesse um incêndio inteiro por baixo da pele dela, e será que não havia?
_ Você mente pra mim..._ Ela disse, encostando a testa na parede, soltando o ar pela boca numa bagunça de expressões tão grande que Diana nem sabia. Diana podia senti-la, a convulsão ardendo por dentro feito um vulcão prestes a entrar em erupção. Será que podia com aquele vulcão? Era a pergunta que há dois anos, Diana havia fugido para não responder.
_ Rhian para, eu nunca menti pra você...
_ Você mente, você mente pra mim o tempo todo!_ E Rhian soltou-se dos braços dela, tentando se afastar daquele domínio que ela tinha sobre si_ Mente e abusa do que eu sinto por você! Como você tem coragem de dizer que me ama quando casa com outra, quando assina o maldito nome da outra?!
_ Nós não estávamos juntas, Rhian, por favor, ouça a droga da história!
_ Nós sempre estivemos juntas, Diana, para mim eu nunca fui de ninguém diferente de você! Você disse que havia sido terrível ficar longe de mim! Que me esperava na sua porta todos os dias, que pensava em mim o tempo todo..._ A cabeça de Rhian girava em rotações descompassadas e doloridas, era claro, era visível.
_ E eu pensava, amor, espera, me ouve...
_ Pensava em mim quando fodia com a outra, é isso? Eu devo encarar como um elogio?!_ Esbravejou voltando-se cheia de lágrimas.
_ Rhian para! Tudo o que eu disse pra você é verdade, estar aqui não prova o suficiente?! Rhian, a Andressa... Foi um erro, na verdade isso tudo...
_ Um erro?_ E Rhian andou para cima dela nervosamente enquanto a sua voz tornava-se mais rouca que o habitual_ Um erro é você quebrar um vaso da varanda enquanto limpa a casa, casar com outra enquanto eu te amo tanto é ser muito filha da puta!_ E avançou em cima dela, com punhos e sentimentos transbordados e quebrados em cacos cortantes.
_ Rhian não!_ E Diana recuou, escapando dela e então a pegou, a segurou pelos punhos os empurrando para baixo, tentando contê-la_ Para! Não faz isso, você está certa, tá bem? Está certa!
_ O que? Eu estou certa? Não Diana, eu nunca estou certa, você nunca tem a culpa, mesmo quando eu tenho razão!_ Disse, apontando contra o peito extremamente machucada_ É minha culpa, não é? É minha culpa você ter me deixado no pior momento da minha vida, então é minha culpa você ter casado com essa vadia! Você me destruiu quando me deixou! Você não faz ideia de como me destruiu! Você é o meu real masoquismo, você faz tudo isso, me causa as piores coisas e eu volto pra você, volto só pra você vir aqui e me destruir novamente! O que você fez comigo, Diana?! O que você me deu pra beber aquela noite?!
_ Rhian..._ Ela iria voltar mesmo a aquela noite? Diana havia a dopado, a feito dormir, posto comprimidos em sua água com gás, não queria que Rhian acordasse enquanto estivesse indo embora.
_ Você fez amor comigo e depois foi embora_ E mais lágrimas caíram daqueles olhos verdes_ Que tipo de monstro você é? Eu havia enterrado a minha mãe não fazia nem um mês. E eu perdoei você por isso, não levei nem uma semana para perdoar porque só de olhar pra você eu já esqueço das coisas que você já me fez passar, esqueço de como me machucou, de como me feriu e então você volta pra mim e faz de novo? Nós dormimos juntas, Diana! Agora, nós dormimos juntas, nós fizemos as pazes, você disse que queria ficar comigo...
_ E eu quero ficar, eu já fiquei! Rhian, por favor, eu... Eu sou culpada de tudo o que você está me acusando, eu fui fraca, infantil, eu não fazia ideia de como era essa dor, mas agora eu faço, ideia disso e de tantas outras coisas...
_ Tanto que casou com outra! Como você faz isso comigo, Diana?!_ E agarrou-se nos braços dela outra vez, desesperadamente, olhando naqueles olhos que tanto amava e odiava_ Como você tem coragem de fazer isso com a mulher que você diz que ama, que você diz que é sua?!_ E escorregou para baixo, agarrando-se pelos punhos, pela blusa de Diana.
_ Amor, não, para, não faz isso_ E Diana puxou-a de volta, tentando mantê-la de pé, nunca admitiria que sua namorada estivesse abaixo da linha de seus olhos_ Vem aqui, eu não fui no inferno buscar você pra te machucar, Rhian, por Deus, me escuta...
_ Não, eu já disse que não!_ E agarrou-a pela camiseta tão forte que Diana sentiu o tecido ardendo em sua pele_ O que você achou, Diana? Achou que não era importante me dizer que era casada, que havia feito uma vida com outra pessoa? Por favor, eu não acredito nisso!_ E mais pesar derreteu pelo rosto dela.
Diana segurou os punhos dela, mantendo-a perto de si.
_ Rhian, não é isso, não tem vida, não tem profundidade...
_ Mas casou com a vadia de qualquer forma!_ E empurrou-a, levando a mão trêmula a cabeça mais uma vez_ Eu estou aqui pensando em todas as pessoas que eu perguntava sobre você, ninguém me falou de casamento, por pena provavelmente, afinal eu estava ali, presa numa vida interrompida por você, ainda esperando que você mudasse de ideia, que pudesse voltar pra mim enquanto você..._ E colocou aqueles olhos partidos dentro dos de Diana mais uma vez_ Construía uma vida. Do lado de outra. Dando a ela uma aliança, um nome, coisas que tantas vezes você negou pra mim!
Aquela ferida. Ainda estava aberta, ainda pulsava, Diana sabia. Por isso não queria dizer nada sobre Andressa. Mas não era como se aquele corte não pulsasse em Diana também, pulsava e a tirava do sério todas as vezes que voltava à tona.
_ Por que eu neguei pra você? Por que, Rhian?
_ Porque achava que eu era louca, que não tinha controle, não, esperava, achava que eu ia deixar você, trair você? Você passou quatro anos do meu lado e quantas vezes me pegou com outra?!
_ Você não dormiu com ninguém enquanto nós estávamos separadas, não é? Com ninguém, Rhian? Kiria, Mali, ninguém é claro!
_ Dormi com metade do Rio de Janeiro e metade das Bahamas, mas não casei com nenhuma vadia!_ E derrubou o abajur que havia restado sobre a mesa, furiosamente e faria o mesmo com tudo o que visse pela frente, Diana sabia. Então agarrou-a outra vez, detendo as mãos dela ao segura-la pelos punhos.
_ Rhian, chega disso!
_ Não encosta em mim, você não tem mais o direito de encostar em mim! Como você casa, Diana, como casa com uma japonesa sem graça, como você faz isso?!_ E cravou sua raiva e seus dedos por ela e Diana perdeu a paciência. A empurrou para trás, fazendo-a soltar seus braços.
_ Sabe do que mais Rhian? Você está vingada, ela me traiu! Essa japonesa sem graça me traiu no meu próprio sofá! Pode se sentir melhor agora? Você quer fazer piada com isso? Aquelas que você adora fazer? Vá em frente, você está livre para se sentir melhor!_ E encostou-se na parede, sentindo subitamente uma pulsação crescendo em sua mente, aquele monstro na sua cabeça, por que ele não ficava quieto, por que não parava de se mexer?! Monstros a parte, a mudança de tom e de comportamento pegou Rhian totalmente de surpresa. Ela parou de forçar, de jogar tudo pelos ares. Parou e enfim, quis ouvir o que Diana estava falando.
_ O que você está dizendo?
_ Eu peguei aquela vadia amassando uma das alunas dela no meu sofá_ Disse com os olhos baixos, envergonhados ou sentidos? Rhian não conseguia precisar_ No meu sofá! Ela estava com a garota no meu sofá..._ Falou, e seus olhos se encheram de uma emoção mais confusa ainda.
_ Ela... Traiu você? A tal de Andressa?
_ No meu sofá!_ E na voz dela aquilo parecia mais importante do que o fato de sua esposa tê-la traído. E então Rhian entendeu_ No sofá que eu comprei pensando em você..._ E fechou os olhos por um instante, sentindo aquela instabilidade se apossando de sua mente e inesperadamente, Rhian se acalmou.
_ Do que você está falando?
_ Nós temos uma história longa com sofás, você e eu, e eu me lembro, eu me lembro..._ E tomou uma longa respiração, controlando a sua cabeça_ Do dia em que fui comprar aquele sofá para o apartamento novo. Grande, confortável, preto. E eu pensei no tipo de amor que eu faria nele com você. E então eu tive que colocar o nosso sofá na sala daquele apartamento que eu dividia com Andressa, não com você_ Disse com uma dor enorme na voz_ E era assim com cada coisa que eu comprava. Pensava se você gostaria daquele móvel, se não, e a organização, você sempre gostou de janelas abertas, de luz natural, eu cuidei disso também, e quando dei por mim, tinha o apartamento perfeito para nós duas, mas era Andressa quem estava comigo_ E deixou-se escorregar até o chão, sua coxa estava começando a arder, sua mente estava começando a arder. E Rhian estava lhe deixando falar, então continuou, derramando tudo, como se estivesse sufocada por tudo aquilo_ Ela sempre me acusava de trair ela com você. Dizia que eu era distante em tempo integral, que vivia inventando motivos para ficar fora de casa, eu comecei a faculdade de jornalismo pouco depois que a gente foi morar junto, e ela não estava errada. Eu não queria ficar em casa com ela. E como eu nunca estava lá, ela voltou a dar aulas no tempo livre e houve esse dia. Estava chovendo muito, eu saí de carro, mas fiquei presa, tudo estava inundando e eu decidi parar o carro num estacionamento e voltar a pé para casa. E ela estava lá, em cima da garota, no meu sofá. Eu não fiz um escândalo. Eu só me tranquei no quarto. Só me deitei na cama igual a nossa cama da cobertura que eu havia comprado. E ela ficou lá, desesperada, batendo na porta, querendo conversar enquanto a única coisa na qual eu conseguia pensar era em qual de nós duas era mais filha da puta. Ela por estar com aquela garota no meu sofá, ou eu que não conseguia esquecer você. Que ficava comparando ela a você o tempo inteiro. E é claro que não havia competição. Andressa é maravilhosa. Mas não é você. Faz tudo perfeito, mas eu não gosto de perfeição, eu gosto de você. Com todas “as amigas”, os descontroles, as coisas ruins. Então Rhian, você está certa. E Andressa está certa também. A filha da puta sou eu. Por ter sido covarde e ter deixado você. Por ter iludido a Andressa aceitando esse maldito pedido de casamento.
Houve um silêncio naquele quarto revirado e caótico de sentimentos partidos. E então Rhian o quebrou. Com uma suavidade que somente Rhian conseguia.
_ Você abusa de nós duas. De mim e dessa coitada com quem você casou...
_ Rhian...
_ Abusa das duas! Será que não percebe, que não vê isso? Você sempre me fez sentir culpada pelas besteiras que você cometia, Diana, mas não dessa vez, não é culpa minha, não é culpa dela, é culpa sua, somente culpa sua!_ E o espelho na parede estilhaçou em mil pedaços quando o punho de Rhian o acertou em cheio e Diana perdeu a paciência, Rhian precisava ter algum controle.
_ Rhian! Rhian, já chega!_ E segurou os braços dela outra vez e quando empurrou-a para prendê-la contra a parede, sua cabeça martelou, bateu forte, causando uma vibração enorme em sua mente, Diana apertou os olhos, mas se retomou_ Já chega disso, para!
E Rhian segurou-a pela garganta, se apoiando nela, olhando nos olhos dela, sentindo a pele dela queimando contra a sua, puxando-a contra o seu corpo...
_ Quanto tempo?
_ O quê?
_ Você conheceu ela, quanto tempo depois de mim?
_ Rhian...
_ Quanto tempo?!_ Ela repetiu, imperativamente.
_ Um ano_ Respondeu, sentindo sua mente apertando outra vez.
_ E quanto tempo até casar com ela?
_ Rhian, isso é irrelevante..._ E sua cabeça estava começando a doer mais, Diana sentia sua visão embaçando, mas precisava se manter.
_ Quanto tempo até casar com ela, Diana?!
E Diana respirou fundo, sentindo o quarto se encolhendo para dentro de sua mente...
_ Cinco meses.
E Rhian não pode acreditar no que ouviu. Empurrou Diana novamente e daquela vez, Diana não conseguiria segura-la. Estava ocupada demais tentando não delirar.
_ Você tá brincando comigo?! Um ano e pouco e você já estava casada com outra?!
Diana já não tinha argumentos e nem achava que qualquer coisa que dissesse pudesse fazer diferença. Então não disse nada, apenas suspirou e olhou para Rhian tão destruída na sua frente.
_ O quê?_ E as lágrimas haviam voltado ao rosto dela_ Agora você vai ficar quieta me assistindo chorar?
_ Rhian...
_ Você não vai ficar aqui me vendo chorar, sai daqui Diana, desaparece da minha frente!
E tudo o que Diana queria era toca-la, beija-la, fazê-la mudar de ideia. Mas já havia estado naquela situação antes e sabia que nada adiantava quando Rhian entrava naquele estado de pura revolta.
_ Eu vou te dar uma hora.
_ O quê? Você sai daqui de uma vez!
_ Vou sair por uma hora e você vai me ouvir direito. Agora você para, para de quebrar tudo, não é a nossa casa...
_ Deve ser porque você fez uma casa com outra!_ E avançou nela com raiva outra vez, mas nunca o suficiente para machuca-la. Diana a neutralizou ainda que tonta estivesse. Rhian havia lutado com dois homens enormes e Diana podia para-la sozinha com a perna ferida e tonta de dor. Era icônico. E muito ilustrativo. Mulheres fortes sempre encontram fraqueza nos braços daqueles que amam. E Diana era toda a fraqueza de Rhian.
_ Para Rhian_ E Diana segurou-a pela cintura, pelo queixo, sentindo o rosto dela afundando em seu ombro_ Para e fica calma_ Sussurrou no ouvido dela a sentindo tão aos pedaços. Diana também estava aos pedaços. Estavam em metade nos braços uma da outra e aquilo não estava certo. De forma alguma estava certo.
_ Sai. Você sai. Eu não consigo sair. Sai daqui, Diana.
E como era horrível ouvi-la lhe mandando sair... Mas Diana soltou-a. E saiu de uma vez. Porque estava fisicamente exausta, mentalmente exausta, porque a última coisa que queria era desmaiar na frente de Rhian. Saiu e ouviu a porta batendo violentamente, ouviu o som de alguma coisa se quebrando contra a parede, estaria em si ou sua mente já estava voando? Diana nunca sabia. Caminhou até a sala e Kes segurou-a antes que ela caísse. Que caísse sem chão. Porque não havia chão nenhum sob os seus pés.
_ Diana? Ei, Diana! Calma, calma, eu tenho você..._ E Kes conduziu-a para o sofá, sentindo-a extremamente tonta_ Está tudo bem? Diana, olha aqui pra mim, você está bem?_ E sentou-a no sofá, abaixando-se a frente dela_ Você está com febre, o que aconteceu lá dentro? Eu ouvi os gritos.
_ Olha... Eu acho que estraguei tudo...
_ Tudo? Tudo o quê?
_ Rhian e eu. Eu estraguei tudo..._ E fechou os olhos, sentindo-se muito cansada.
_Diana, ei..._ E tocou o rosto dela, preocupada_ Rhian é louca por você, como você pode ter estragado tudo?
_ Eu estou casada, Kes. Casada e não é com ela...
***
Isis fez um milagre na cozinha da cobertura. Ariana deveria ter tomates, ovos, carne moída e pães dormidos e ela transformou tudo numa deliciosa refeição com cara de árabe. Fazia mágica como a irmã, Ariana nunca na vida havia comido tão bem quanto nos quatro anos em que Diana havia estado naquela cozinha. Comeram juntas no balcão americano.
_ Então, está me dizendo que...?
_ Andressa está casada com a Diana. Olha, como eu te disse, a Diana ficou muito abalada com o final do relacionamento com a Rhian, voltou para a Brasília e lá continuou saindo com mulheres, nada sério, nem nada que a interessasse, até ela conhecer a Andressa no curso de formação. A Andressa é... Bonita, inteligente, e acredite ou não, ela pode ser muito divertida. E é louca pela Diana. Mas eu nunca achei que chegariam a casar, nem nada disso. Este casamento veio de duas atitudes desesperadas: Andressa estava desesperada para manter Diana com ela, e a Diana estava desesperada para esquecer a Rhian, e foi assim que tudo aconteceu.
_ Mas..._ Ariana estava boquiaberta_ Rhian não fazia ideia disso.
_ Mas agora Diana já deve ter contado...
_ Tem certeza? Elas pareciam muito bem juntas.
_ Acha que Rhian não reagiria bem?
_ A Diana casada com outra?_ E Ariana cruzou aqueles grandes olhos castanhos_ Isis, será um tsunami.
Bem, já estava sendo. E Diana havia sobrevivido apenas a primeira onda...
Kes voltou da cozinha com os comprimidos que Diana havia pedido, sentia sua cabeça apertando, sua mente se torcendo e não era apenas o delírio, era o que Rhian deveria estar sentindo, era o que ela faria com tudo o que Diana havia contado, não era para ser daquela forma, não era. No dia em que sentou no colo dela junto ao canal e perguntou sobre a vida dela, contaria, iria contar para ela sobre seu pai, sobre seu casamento, mas de alguma forma não conseguiu. E agora tudo havia acontecido.
_ Aqui, os comprimidos_ E Kes deu a ela um copo com água_ Diana isso tudo...
_ É um erro. Um erro enorme, ela só precisa se acalmar para ver melhor, você sabe como Rhian é...
_ Cegueira momentânea causada por fúria, sim, eu sei.
_ Diana!_ E ouviram Rhian gritando o nome dela e a voz dela estava ainda mais rouca e desesperada_ Diana!
_ Pronto, por que você não vai para o meu quarto até ela se acalmar? Deixa ela quebrar o quarto inteiro, a casa inteira, eu sou rica, eu só não quero que ela...
_ Kes, ela é minha mulher, ela nunca me machucaria. Eu tenho que cuidar dela, coisa que não fiz da outra vez..._ Disse, já se pondo de pé mesmo com as voltas em sua cabeça e os pontos em sua coxa latejando profundamente.
_ Quer parar um tornado com a mão, Diana Ferraz?
_ Um vulcão_ E caminhou para o corredor, ouvindo Rhian chamando seu nome com tanta dor, com tanto desespero. Encontraram-se no meio do corredor, pouco antes da sala.
_ Como você pôde?!_ E Rhian avançou em Diana e Diana aparou o ímpeto dela com o seu corpo, com as suas mãos agarrando-a com firmeza enquanto subitamente Rhian parecia ainda mais agressiva e mais magoada do que antes.
_ Rhian espera! Espera, calma..._ E Diana levou-a para trás, tentando mantê-la em seu corpo, sob seu domínio enquanto Rhian tentava machucar, empurrar, fazê-la sentir de qualquer forma tudo aquilo que estava sentindo. Como se Diana já não estivesse sentindo o suficiente...
_ Como você pôde?! Diana, como você pôde fazer isso comigo?_ E o tom da voz dela era muito mais desesperado e desesperador, era mais arranhado, mais sentido_ Como pôde não pensar em mim, não se importar com nada, como pôde, como você pôde?!
_ Rhian, para!_ E Diana conseguiu leva-la de volta para o quarto, segurando os punhos dela, pegando-a pela cintura, e Rhian continuava se debatendo em seus braços, debatendo-se em seus sentimentos, em suas mágoas, no que tanto lhe doía.
_ Como você foi capaz, Diana?! Como pôde fazer isso comigo?!_ E Rhian se desfazia em lágrimas outra vez, num choro sentido, intenso, aflito e entre coloca-la para dentro e fechar a porta atrás delas, Diana viu o notebook atirado num canto, e tudo fez sentido.
A tela havia partido, mas continuava acesa, com a página do Facebook de Andressa aberta. A página repleta de fotos de Andressa ao lado de Diana. Fotos casuais, coisas de casal, Andressa adorava postar tudo na internet, postava dos cafés da manhã aos jantares, fotos delas no apartamento que dividiam, agarradas, sorrindo, em passeios, nas únicas férias que haviam tido, aquele tipo de falsa felicidade que a internet estava cheia. E enfim entendeu, entendeu porque Rhian estava chorando com tanta dor.
_ Rhian...
_ Como você pôde, Diana?!_ E empurrou-a, saindo dos braços dela, apertando as mãos, curvando-se sobre seu próprio corpo, tão machucada, tão ferida, sentindo tanta, mas tanta dor_ Como você pôde fazer isso comigo? Me explica, me diz, porque eu não consigo entender! Você nunca pensou em mim? Nunca pensou que por algum motivo essas fotos poderiam chegar até mim? Nunca pensou em como eu me sentiria vendo toda essa sua felicidade com outra pessoa? Como você pôde, como você pôde?!_ E avançou em Diana outra vez, que apenas prendeu os braços dela, tentando mantê-la, mas deixando-a falar, falar tudo o que queria, com a boca e com o corpo, Rhian era tão transparente que os sentimentos passavam por baixo da pele dela e pulsavam, visíveis, vivos, Diana podia sentir.
_ Rhian para, você vai se machucar...
_ Eu já estou machucada!_ E agarrou Diana pela camiseta, olhando em seus olhos, chorando tanto, tão magoada_ Você já me machucou demais, como você faz isso comigo? Com a mulher que você diz que ama, Diana, como pôde não se importar, não se preocupar em me ferir, em me fazer chorar, você sempre disse que odiava me ver chorar!
_ E eu odeio, Rhian, para, para meu amor..._ E tocou o rosto dela, tentando acalma-la, mas Rhian não deixou, empurrou a mão dela, o carinho dela.
_ Você não tem coração!_ E agarrou a camiseta dela de novo tão forte que o tecido rasgou, trazendo-a para perto, a atacando outra vez_ Você é uma egoísta que só pensa em você, você não pensou em mim, Diana, nem um pouco, nem por um segundo! Como você foi capaz, como você foi...?!
_ Rhian, Rhian...!_ E Diana segurou os pulsos dela tentando se defender e como Rhian não parava, Diana ficou sem alternativas. Pegou-a com mais força e a derrubou na cama, segurando os punhos cerrados dela que tentavam lhe atingir, imobilizando-a contra o colchão para que não machucasse Diana ou machucasse a si mesma.
_ Você não tinha o direito! Você não tinha o direito de fazer isso comigo, com a mulher que você escravizou, que andava de joelhos atrás de você, implorando pelo seu amor, você não tinha, não tinha!_ E se debatia, e tentava escapar, forçava e Diana só tentava mantê-la contra a cama, sentiu os pontos de sua coxa se apertando, sentia sua mente querendo lhe fazer de refém, mas não podia, tinha que ficar acordada, tinha que ficar inteira, tinha que cuidar de Rhian, devia isto a ela, devia. E Diana nem sequer fazia ideia do quanto realmente devia..._ Meu pai me machucou, Romeo me machucou, mas você levou isso a outro extremo! Por que, Diana, por quê? Eu amo tanto você...
E as primeiras lágrimas escaparam de Diana. Sabia que ela amava. E sabia que tudo aquilo feria Rhian extremamente, e Diana não queria, já havia quisto, era verdade, já havia quisto magoa-la, machuca-la, mas não queria mais, não queria agora.
_ Eu sou sua mulher_ E Rhian tentou erguer os pulsos presos por Diana contra a cama, mas não tinha forças, as lágrimas se multiplicavam, as feridas também_ Eu sou sua mulher, você deveria cuidar de mim, cuidar do que eu sinto, não deveria me machucar! Eu odeio você! Eu odeio, odeio...! Sai daqui, me deixa sozinha!
_ Você pode me odiar, mas vai me odiar de perto, eu não vou a lugar nenhum.
_ Não! Você sai, eu não quero mais você, não quero quem mente pra mim, quem não se importa, eu não quero... Eu quero odiar você, eu quero odiar você..._ Queria, Rhian queria odiá-la, mas não conseguia. Ainda que estivesse doendo, Rhian não conseguia desejar não amar Diana, não querê-la como queria, então apenas lhe restava odiá-la momentaneamente, ou ama-la no ódio, ou odiá-la amando-a muito, amando-a demais, porque este era o caso. Rhian a amava, a amava demais...
Rhian chorou muito, sentiu demais, se feriu demais, mas com toda a certeza sabia, tudo teria doído muito mais se Diana tivesse ido embora.
Ela não foi. Diana ficou ali, segurando-a até Rhian parar de lutar, até parar de se debater e só sobrar o choro, intenso, dolorido, inesgotável. Rhian não conseguia parar de chorar, não conseguia parar de sentir, a noite caiu lá fora e ela continuava sentindo, sofrendo, agarrada na pele de Diana, nos braços dela, naquele ódio que queria tanto sentir, mas não conseguia, não podia. E de alguma forma Diana acalmou-a. E quando anoiteceu lá fora, houve um silêncio ensurdecedor que era quebrado somente pelos soluços de Rhian, o último resquício daquele choro que Diana achou que nunca iria parar. Deitou-se por trás dela, ela permitiu, e Diana continuava a segurando firme, com medo que ela escapasse de alguma forma, que levantasse e quebrasse tudo ou pior, que se quebrasse por dentro um pouco mais. E havia arranhões pela pele das duas, havia marcas de pressão ainda que sem intenção, havia um cansaço físico e mental que bateu em ambas de maneira cruel. Rhian estava acabada quando parou de chorar. Sem luz naqueles olhos bonitos. Olhava para a janela, mas não parecia ver nada, e não via. Não via nada.
_ Diana, você sai agora. Não pode dormir aqui_ Foi a primeira coisa que ela disse em uma hora. E disse muito calma, muito controlada.
_ Tudo bem, agora que você está calma eu saio. Mas antes, há coisas que você precisa saber.
_ Há mais coisas que eu preciso saber?_ Perguntou, sem se alterar.
_ É claro que há. Você precisa saber que eu nunca menti pra você..._ Disse, em sussurro junto ao ouvido dela enquanto a guardava nos seus braços_ Nunca, Rhian, em nenhum momento, eu nunca amei ninguém diferente de você nem por um segundo. E você está certa, eu não me importei sobre como você se sentiria sobre isso tudo, porque quando eu casei com a Andressa, eu só queria ferir você, só queria deixar você para trás porque eu estava tão magoada com tudo o que você disse pra mim que não queria mais amar você_ Falou e sua voz quebrou, o coração de Rhian reagiu, uma lágrima gastou daqueles olhos sentidos_ Você está me odiando agora, eu sei, mas eu odiei tanto você, tanto... Por ter me dito aquelas coisas, por ter destruído o nosso relacionamento, por ter manchado aquela coisa tão bonita que existia entre nós duas. Eu odiei você por tudo isso. Odiei muito, chorei muito, sofri muito, e eu queria que você soubesse que sim, eu conseguia viver bem sem você, longe de você, você lembra que me disse isso? Quando eu disse que estava indo embora e você disse...
_ Não consegue chegar nem na esquina sem mim_ Rhian lembrava, e lembraria para o resto da vida que havia conseguido dizer aquela crueldade para a mulher que amava, desdenhado da força dela, das coisas que ela sentia.
_ É. Você disse. Por isso e outras coisas eu quis machucar você. Mas não durou nada, eu não queria mais. Eu me rendi. Quando casei e nada mudou, eu me rendi. Eu vi que você estava certa, eu nunca vou conseguir viver direito sem você_ Quebrou em uma lágrima_ E talvez você não seja boa pra mim, talvez eu não seja boa pra você, mas eu amo você demais para simplesmente ir embora outra vez.
Outra lágrima de Rhian. Seca. Dolorida. E de tudo o que fazia sentido e o que não fazia, Rhian só sabia de uma coisa: do que precisava.
_ Agora você sai.
Sairia. Agora Diana podia sair. Deixou um beijo naquela tatuagem no ombro de Rhian e saiu do quarto, com sua cabeça cheia, seu corpo confuso e sair da escuridão do quarto para a claridade do corredor a derrubou. Nos braços de alguém.
_ Hey, hi!_ Lhe falou aquela moça que lhe segurou nos braços_ Are you fine?
_ Você só fala inglês? Eu acho que..._ Diana falava inglês fluente, mas não sentia-se capaz de entendê-la nem no básico.
_ Cassie?_ Chamou alto, olhando para trás, Kes deveria virar Cassie na língua local, deveria ser isso, estava na casa de Kes não estava? Diana não tinha certeza_ Cassie, honey, help me here...
***
_ Diana, você tem certeza que não quer que eu chame a Rhian? Ela é a única médica por perto, você não me parece bem..._ Dizia Kes abaixada perto da cama de outro quarto de hóspedes onde Diana insistia que iria dormir sozinha. Quando sua namorada chamou, Kes veio de imediato e ajudou Diana da forma que conseguia, que sabia, e Diana reagiu, pareceu se recuperar, mas Kes ainda não sabia. Havia trazido alguns travesseiros e cobertores, mas persistia na ideia de que ela deveria dormir com alguém por perto, por causa do tiro na coxa, por causa daquela febre.
_ Eu estou bem, é só... Uma febre chata_ Diana não havia delirado, estava lutando para se manter assim_ Eu já tomei o antitérmico, não se preocupe. Rhian precisa do tempo dela, você sabe como ela é...
_ Pois achei que ela não fosse mais assim. Não importa o que você fez nos últimos dois anos, você está aqui agora, está com ela, ponto.
_ Ela é impetuosa. E eu a amo assim. Eu..._ E engoliu, sentindo seu corpo começando a tremer, enrolou-se mais nos lençóis_ Eu cheguei a sentir falta até dessas crises. Ela vai pensar melhor...
E Kes apenas pensava se de fato, não deveria chamar Rhian. Diana não parecia nada bem, não precisava ser médica para perceber.