Capítulo 30
“As duas permaneceram de mãos dadas aguardando o atendimento, quando a porta do banheiro abriu e Adriana saiu para a recepção dando de cara com Ana Paula. Foi um impacto para ambas, os olhares se encontraram como fogo cruzado em um tiroteio, azuis e castanhos se encaravam sem nada a dizer.”
Adriana viu Ana de mãos dadas com outra mulher, aparentava ser mais velha, elegante assim como a loira estava, Ana vestia uma saia cinza chumbo colada no corpo na altura dos joelhos, uma blusa de seda creme e o cabelo preso em um rab* de cavalo, fitou a mulher mais velha e deduziu que também seria advogada, e ficou magoada com a cena, ela estava com outra mulher, deduziu que Gisele não estava mais em sua vida e ainda assim ela não teve coragem de lutar pelo seu amor.
Ana ficou sem ação ao encontrar Adriana, confirmou sua suspeita de que avistara a morena naquele dia na praia, ela estava ali em pé na sua frente, ao seu alcance, linda, bronzeada pelo sol do Rio de Janeiro, vestia um short jeans curtinho, e uma camiseta azul marinho que deixava sua tatuagem à mostra, estava bem despojada, mas o olhar dela era de mágoa e reprovação o que a fez sentir-se envergonhada.
Alheias ao que se passava dentro das duas mulheres, Viviane continuava lendo sua revista e Lívia deu a confirmação para Adriana sobre sua situação com Ana.
-- Mau amor, você quer sair daqui e ir direto para o restaurante ou quer passar lá em casa antes para tomar um banho e trocar de roupas? -- Lívia perguntava --
-- O que? – Ana saiu do transe –
Adriana ficou pálida com a frase de Lívia, sentiu-se a última mulher no mundo, não conseguia tirar os olhos da mulher que roubou o seu coração e não deu valor a ele. Fazia um esforço tremendo para não abraçar Ana Paula em seu colo e embalar sua saudade, queria beijá-la e sentir o coração saltar dentro do peito com o toque da advogada, mas sua razão a impedia de dar esse passo.
Foram segundos entre o encontro e a frase de Lívia que pareceram uma eternidade para as duas mulheres, percebendo o impasse, Ana soltou a mão de Lívia sem dar resposta para a sua pergunta.
-- O que foi Ana? – Lívia ficou intrigada com sua reação –
O Sr. Rodolfo veio com o contrato nas mãos e tirou a todos daquela saia justa entregando os disfarces que pairavam na sala.
-- Aqui Adriana, o contrato para você assinar.
Viviane finalmente desviou a atenção da leitura e levantou o rosto para olhar o documento.
Lìvia entendeu que era a Adriana, a dona do apartamento e da paixão de Ana, entendeu a inércia da loira e o porquê ela soltou sua mão. Ficou chateada de perceber o quanto a presença de Adriana mexeu com Ana Paula.
-- Oi Drica. – Ana falou sem graça –
Só então Viviane reconheceu a voz que ouviu ao celular ao atender a ligação dela quando ainda estavam em Boston. Olhou para o rosto da loira e analisou a expressão dela e olhou para Adriana percebendo o abalo que a morena sofreu ao reencontrar a advogada. Seu olhar havia mudado.
Ouvir sua voz novamente depois daquele telefonema foi uma tortura, seu nome soava como a mais bela sinfonia, mas seu coração machucado não permitia mais que ela se entregasse para Ana.
-- Oi.—respondeu secamente e desviou o olhar – Onde eu assino Sr. Rodolfo?
-- Aqui minha filha. – o senhor apontou o papel –
Adriana segurou a caneta e começou a assinar os papéis para tentar sair logo dali. Viviane já se posicionou para ficar de frente para as meninas, olhando para a loira com cara de poucos amigos. Ana ficou sem graça pela resposta seca da morena.
O advogado se dirigiu para Lívia para atendê-la enquanto esperava Adriana terminar.
-- Boa tarde, querida. Posso ajudar?
-- Sim, eu vim para renovar o contrato de aluguel do apartamento da Moreira Cesar. – disse sem graça –
-- Ah sim, você é a inquilina da Adriana! Que coincidência, as duas aqui na mesma hora, assim fica mais fácil. – o senhor saiu rindo –
Adriana levantou a cabeça e olhou para a professora, entendeu que ela quem estava morando em seu apartamento e ficou com ciumes de pensar que Ana Paula estava se encontrando com ela onde já vivera momentos intimos consigo. A loira não parava de decepcionar o coração da morena.
Ana voltou a falar com Adriana, tentando uma aproximação. Isso deixou Lívia desconfortável e Viviane irritada com a advogada.
-- Adriana eu preciso conversar com você. – se aproximou da morena –
-- Ana, nós não temos nada para conversar. – não olhou para a loira –
-- Eu preciso te explicar o que aconteceu. – seu olhar era tenso –
-- Ana você teve tempo suficiente para me explicar o que você quisesse. – olhou para a loira com lágrimas nos olhos – Hoje você tem que dar explicações para outra pessoa, não para mim. – olhou para Lívia –
Ana ficou sem graça, mas ainda assim insistiu. Adriana terminava os contratos e entregou ao advogado que levou para Lívia assinar também. O clima no lugar era tenso.
-- Eu realmente preciso conversar com você. – segurou o braço da morena –
Adriana fechou os olhos ao sentir o calor da pele da amada, o toque leve trouxe várias recordações, sensações que até então estavam adormecidas, esquecidas em algum canto escuro dentro do seu coração.
Se aproximou mais de Ana Paula quase encostando seu rosto no dela. Seus olhos soltavam faíscas.
-- Eu sinto muito Ana. – olhou nos olhos da loira—
Adriana pegou sua bolsa e deixou a advogada em pé sem ação diante da sua negativa.
-- Vamos Vivi? – olhou para a ruiva e estendeu a mão para segurá-la – Foi um prazer te conhecer. – falou para Lívia –
-- O prazer foi meu. – Lívia falava com respeito –
Ana ficou assistindo a morena sair do seu alcance, acompanhada de Viviane, a ruiva olhava para ela como se quisesse lhe dizer algumas coisas que estavam engasgadas em seu íntimo, segurou o ombro da Adriana com a mão livre para dar apoio à morena.
No corredor do prédio Adriana foi soltando a emoção de ter reencontrado com Ana Paula. As lágrimas escorriam sem controle, ela apertou o botão do elevador e o choro veio compulsivo. Viviane assistindo a dor da amiga a puxou pela mão abraçando e embalando o sofrimento da morena.
Adriana se deixou proteger pela amiga, estava precisando daquele colo, daquele apoio que encontrou em Viviane. Estava machucada, não só no corpo como na alma, o coração estava em pedaços, percebeu que não havia cicatrizado ainda como pensara.
-- Dri, não fica assim, vida que segue.
-- Desculpa Vivi. – soluçava –
-- Não tem o que se desculpar. – se afastou da morena e segurou seu rosto entre as mãos –
Não deu tempo de o elevador chegar antes das advogadas saírem da imobiliária, Ana e Lívia deram de cara com a cena das contadoras, o rosto banhado de lágrimas, com os olhos e o nariz vermelho de Adriana fez o coração de Ana cortar ao meio. Sentiu ciumes ao ver Viviane abraçada à sua morena, “sua morena” não, Adriana nunca foi sua. Ana não se permitiu acolher aquele amor, aquela paixão que a morena lhe ofereceu. Ela perdeu a oportunidade que teve, não tinha mais o que fazer.
Uma ultima vez, castanhos e azuis se encontraram, o elevador fez o som característico de chegada ao andar, e Adriana e Viviane entraram, saindo do campo de visão das advogadas.
-- Vamos esperar o próximo. – Lívia disse –
Ana apenas consentiu sem palavras, lágrimas rolaram pelo seu rosto, se penalizava por ter feito a morena sofrer tanto. Lìvia afagou seu rosto, limpando algumas gotas que teimavam em cair, e abraçou a loira. Caminharam até o elevador e apertaram o botão para aguardar o equipamento.
Já na rua, Adriana ainda chorava, Viviane tentava respeitar o momento da morena, caminhou ao seu lado em silêncio até chegar ao carro que estava estacionado na rua.
-- Deixa que eu dirijo. – Vivi estendeu a mão pedindo as chaves –
-- Você não sabe o caminho. – a voz ainda estava embargada –
-- O GPS me leva. – apontou para o painel –
Adriana vencida entregou as chaves do carro para Viviane, as duas seguiram o seu caminho de volta para Copacabana. Viviane dirigia devagar, sem pressa enquanto via o olhar perdido de Adriana que mirava a janela, ela ligou o rádio do carro para se distrair. Ana Carolina ditou o ritmo da volta para asa.
https://www.youtube.com/watch?v=qVFNG4aKUp4
É MÁGOA – ANA CAROLINA
É mágoa
Já vou dizendo de antemão
Se eu encontrar com você
Tô com três pedras na mão
Eu só queria distância da nossa distância
Saí por aí procurando uma contramão
Acabei chegando na sua rua
Na dúvida qual era a sua janela
Lembrei que era pra cada um ficar na sua
Mas é que até a minha solidão tava na dela
Atirei uma pedra na sua janela
E logo correndo me arrependi
Foi o medo de te acertar
Mas era pra te acertar
E disso eu quase me esqueci
Atirei outra pedra na sua janela
Uma que não fez o menor ruído
Não quebrou, não rachou, não deu em nada
E eu pensei: talvez você tenha me esquecido
Eu só não consegui foi te acertar o coração
Porque eu já era o alvo
De tanto que eu tinha sofrido
Aí nem precisava mais de pedra
Minha raiva quase transpassa
A espessura do seu vidro
É mágoa
O que eu choro é água com sal
Se der um vento é maremoto
Se eu for embora não sou mais eu
Água de torneira não volta
E eu vou embora
Adeus
Chegando na orla de Copacabana, Viviane encostou o carro em uma vaga e esperou Adriana se mover, o que não aconteceu.
-- Dri, -- segurou a mão da morena – Vamos sentar ali na areia.
A morena enxugou algumas lágrimas que escorriam com as costas da mão e saiu do carro, retirou as sandálias e foi caminhando com elas nas mãos ao lado de Viviane. Sentaram-se em uma mesa de um quiosque da orla, Viviane pediu as duas águas de coco enquanto Adriana continuava em silêncio olhando o mar tomando a areia de Copacabana e o sol se esconder por trás das cortinas da noite, que descia no horizonte alaranjando a paisagem.
Depois que o garoto entregou os dois cocos na mesa Viviane resolveu chamar Adriana de volta para a realidade.
-- Dri, conversa comigo. – seu olhar era terno –
-- Vivi, me desculpe pela minha fraqueza.
-- Amiga, você não tem do que se desculpar. Por que você acha que me deve desculpas?
-- Porque nós estamos juntas, mesmo sem compromisso, é como se você fosse minha mulher, nós dormimos juntas, fazemos sex*, e de repente você me vê aos prantos por causa de outra mulher, eu me sinto te desrespeitando.—lágrimas caiam de seus olhos -- Desculpe.
-- Dri, você não me deve nada, pode ficar tranquila, eu tenho plena consciencia de que você não me pertence, eu te adoro, mas é isso, eu adoraria ter me apaixonado, mas não rolou, eu estou bem. – fazia um esforço para não demonstrar que mentia --
-- Jura? Eu não quero te magoar Vivi. – limpava uma lágrima com os dedos –
-- Juro. Você é linda Dri, uma mulher maravilhosa, você tem caráter, não merece sofrer desse jeito.
-- Obrigada Vivi.
-- É verdade, eu te adoro, você foi a melhor pessoa que eu poderia ter conhecido nessa minha vida louca, você me ajudou a crescer, a dar valor ao que eu tenho, me ensinou a aproveitar as oportunidades que eu tive e estava desperdiçando. Obrigada por tudo Dri.
Adriana ouvia aquele relato e emocionada deixava novamente lágrimas caírem em seu rosto. Olhou para Viviane e sorriu para a ruiva.
-- Vivi, eu juro que eu queria ter me apaixonado por você, mas infelizmente não aconteceu. – baixou os olhos --
-- Sem problemas, não era pra ser. – resolveu mudar de assunto -- Agora você quer conversar sobre ela?
-- Você não sabe o esforço que foi não abraçá-la e matar as saudades que eu guardo dentro do peito, eu achei que estava bem, mas agora eu vejo que não estou pronta para reencontrá-la. – olhava para o chão --
-- Aquela mulher que estava com ela, você conhece?
-- Não, eu não sei quem é, não é a Gisele, elas estavam de mãos dadas, você viu?
-- Sim. – bebia a água de coco –
-- Sabe o que me deixa mais chateada, é que se ela está com outra mulher, é porque não está mais com Gisele, eu me pergunto por que ela não lutou por mim quando teve chance?
-- Não dá para saber. – olhava para a amiga --
-- Eu fiquei meses andando de muletas, quase morri em um acidente provocado por ela, eu tenho uma barra de titanio dentro da perna, meus pais não falam mais comigo, e tudo isso por uma pessoa que não lutou por mim. – sua voz ainda era embargada --
-- Eu estava mesmo para te perguntar sobre isso, os seus pais, você quase não fala deles, o que houve?
-- Eu contei sobre minha paixão por Ana, e minha mãe surtou, me largou sozinha no hospital, recém-operada, eu ia ficar na casa dela durante minha recuperação, tive que ir para o meu apartamento.
-- Mas você ficou sozinha? Sem poder mexer a perna?
-- Eu fiquei sozinha, as meninas me ajudaram no inicio, Felipe também. Ai depois eu contratei uma enfermeira para passar o dia comigo, pelo menos enquanto eu só podia usar a cadeira de rodas.
-- Caramba amiga, mas não tinha uma hora pior pra você falar com ela não?
-- Alessandra fez a mesma pergunta. – riu por um momento –
-- E a Ana?
-- Ela sumiu, simplesmente desapareceu, eu ligava, mandava e-mail, torpedo, só não fiz sinal de fumaça porque eu não podia sair de casa para acender a fogueira.
-- Que safadeza, ela sabia que tinha sido a cachorra da namorada dela que te atropelou?
-- Eu nem sei, por que ela nunca mais falou comigo. Mas deve saber, porque Isa me falou uma vez que ela um dia me explicaria tudo, que foi para me proteger.
-- Você acha que a Gicobra ameaçou te matar?
(homenagem às leitoras que me deram esse incentivo, rs)
-- Gicobra?— finalmente riu --
-- É a tal Gisele, ela é uma cobra né Dri, Deus me livre. – fez o sinal da cruz --
-- Ai Vivi, só você mesmo pra me fazer rir. – pegou a coco na mesa e bebeu um gole –
-- Dri, você ainda é muito apaixonada por ela, não adianta ficar assim, se remoendo, ou vocês conversam e se resolvem, ou você nunca vai conseguir se desligar desse caso mal resolvido.
Adriana olhou para a amiga admirada com a maturidade que ela falava.
-- Viviane, eu tenho que adimitir, você mudou muito desde que eu te conheci.
-- A vida me ensinou amiga. E bateu forte pra eu aprender. – seus olhos também lacrimejaram--
-- Sabe Viviane, eu acho que tudo o que acontece com a gente tem um propósito, nada acontece por acaso.
-- É eu também penso isso.
Um silencio se fez presente entre as meninas, que admiravam o colorido no horizonte do espetáculo que o pôr do sol produzia ao tocar o mar de Copacabana.
**************************
Depois de sairem do prédio da imobiliária, Lívia e Ana seguiram para o apartamento da morena. Silenciosamente as duas fizeram a viagem até o local, quando entraram na sala, Lívia não se conteve mais e questionou Ana Paula.
-- Ana, eu acho que nós precisamos conversar. – deixava a bolsa sobre a mesa –
-- Pode falar Lívia. – ela já sabia do que se tratava, sentou-se no sofá –
-- Ana, o que aconteceu lá na imobiliária? – sentou ao lado da amada –
-- Ela é a Adriana, a dona desse apartamento.
-- Eu percebi isso. O que eu pergunto é sobre a sua reação ao encontrar com ela.
-- Lívia, por favor, não me cobre explicações que eu não posso te dar.
-- Ana, você ama essa moça?
-- O que?
-- Olha nos meus olhos e me diz se você ama essa moça. – Lívia segurou o rosto de Ana e a fez olhar para si –
-- Lívia eu não sei. – desvencilhou-se da morena e levantou do sofá –
Lívia permaneceu sentada tentando analisar as reações da loira, sabia que ela estava muito confusa, seus sentimentos estavam conflituosos, ela não queria pressioná-la, mas também não estava disposta a entrar de cabeça nessa relação sem saber o que esperar.
-- Ana você precisa de um tempo para organizar a sua vida, colocar sua cabeça no lugar, escolher em qual porto você quer atracar.
-- Eu sei, eu preciso mesmo organizar minhas ideias, eu ainda fiquei muito abalada com a presença dela. – ainda olhava pela janela –
O sol ia se pondo, a noite caia como um peso nas costas de Ana Paula, ela sentia que o caso com Adriana estava mal resolvido, ela se sentia presa à contadora, ela precisava explicar a sua ausência.
-- Ana é melhor você ir embora, eu vou parar de te ligar e te dar o tempo que você precisa para se encontrar.
Ana virou para olhar para Lìvia.
-- Você está terminando comigo?
-- Eu não sabia que estávamos namorando. – falava calmamente –
-- Lívia não fala assim, não me deixa. – uma lágrima escorria pelo seu rosto –
-- Ana, eu realmente não sei o que você quer, você chorou no meu colo por essa menina, e hoje você a viu, ficou toda derretida, e ainda espera que eu fique com você esperando o dia que você vai voltar para ela e me deixar? – Lívia levantou do sofá --
-- Não é assim.Por que você está falando isso?
-- Porque hoje eu vi o quanto essa mulher mexe com você, você ainda tem o coração preso a ela, eu não quero sofrer novamente pelo mesmo erro Ana.
-- Eu sou o seu erro então? – dizia magoada –
-- Eu não disse isso, não é você, mas o meu sentimento que me parece ser só meu.
-- Claro que não Lívia, eu te adoro, a sua presença fez com que eu abrisse os olhos e me libertasse do relacionamento que eu tinha com Gisele, eu preciso de você. – abraçou a morena --
-- Para ser o seu porto seguro enquanto você se morde de ciúmes da outra?
-- Lívia, pára. – andou pela sala –
-- É verdade Ana, eu reparei bem no seu olhar quando saímos da sala e ela estava abraçada àquela ruiva. Você quis pular no pescoço das duas. – mexia nos cabelos –
Ana não respondeu por que era verdade, ela sentiu um ciume irracional quando avistou Adriana com Viviane no corredor, mas ainda não conseguia dizer se tinha amor por Adriana. O sentimento era confuso, intenso, mas não é claro. Ana não sabia dimensionar o que tinha no peito por Adriana.
-- Você não consegue dizer que me ama, e nem a ela, sabe o que eu acho, você não tem amor por ninguém, está perdida dentro de você, se encontra Ana.
Ana Paula apenas escutava, pensava ser verdade o que Livia dizia, ela não conseguia dizer que amava a morena, e nem a professora, o que estava acontecendo com ela?
-- Ana é melhor nós pararmos por aqui, eu não quero me machucar, ou ser traída, me procura quando descobrir o que você quer da sua vida.
Lívia deixou Ana em pé no meio da sala e foi para o quarto chorar sua dor de ter se enganado a respeito de Ana Paula, ela continuava com medo de se entregar a algo mais sério e intenso. Era sua sina abandonar os relacionamentos quando via que eles ficavam mais sérios. No fundo ela sabia que Gisele nunca sairia de casa para morar com ela, foi o que provavelmente a prendeu tanto tempo com a ex-namorada.
Ana Paula queria tudo e não tinha nada, as mulheres da sua vida estavam indo embora, ela estava sozinha. Sentia-se mal por ter feito tão mal a tantas pessoas boas e que a amam, mas não entendia porque ela afastava as pessoas que simplesmente queriam amá-la.
Pegou sua bolsa e colocou no ombro, olhou mais uma vez para aquela sala que conhecia muito bem. Andou pelo corredor até a porta do quarto que estava fechada, podia ouvir o som do choro de Lívia, apoiou uma mão e encostou o rosto na porta. Queria dizer que sentia muito, mas voltou atrás, percebeu que dizia isso muitas vezes e não era mais o que queria fazer.
Saiu do apartamento de Lívia cabisbaixa, chegando à rua caminhou até o apartamento de Isadora, o porteiro informou que a moradora não estava em casa, ela resolveuu aguardar a amiga. Ligou para ela avisando que estava no prédio.
-- Oi Ana.
-- Isa, você vai vir direto para casa?
-- Sim, eu já estou na ponte, chegando ao pedágio, por quê?
-- Eu estou aqui te esperando.
--- Tudo bem, em meia hora eu chego ai.
Ana ficou sentada no hall do prédio até Isadora chegar, pensava em sua vida, analisava suas ações, constatou que sua tragetoria havia sido apenas de magoar as pessoas, mulheres maravilhosas que entraram em sua vida e se dispuseram a entregar o seu amor e ela simplesmente deixava escapar. Percebeu como fez mal a essas mulheres.
Isadora chegou e a encontrou triste, sentada em um dos sofás do hall.
-- Ana, o que aconteceu?
-- Amiga, eu sou um fracasso.
Abraçou Isadora que a afagou, e a levou para o apartamento para conversarem.
-- Ana o que está acontecendo?
-- Isadora eu sou um fracasso na minha vida, eu só sei magoar as pessoas, por que eu sou assim? – uma lágrima rolou –
-- Ana o que aconteceu? Você está me deixando aflita. – deixava os sapatos no corredor --
-- Adriana está no Rio.
-- Você a encontrou? – fez uma expressão de espanto –
-- Sim, hoje aqui em Niterói, na imoboliária, eu estava com Lívia.
-- Puta que pariu, mas que coincidências o destino promove.
Ana relatou o encontro e a decisão de Lívia em terminar com ela. A forma como estava se sentindo e que achava que ficaria sozinha pelo resto da vida.
-- Ana, você tem que parar de ter medo, toda vez que você for enfrentar um passo mais sério você vai fugir?
-- Eu acho que eu preciso de um psiquiatra.
-- Você precisa se encontrar e escolher quem você quer ter para sua vida, ou você vai acabar sozinha, Ana. Você sempre afasta as mulheres com quem se relaciona.
-- Não é assim. – ainda chorava –
-- Lívia foi a primeira, você ficou com medo de ir para São Paulo com ela porque seria um passo mais sério na sua vida, vocês iriam morar juntas.
Ana escutava em silêncio.
-- Depois você namorou a Cris, terminou com ela porque ela era ciumenta, essa foi a desculpa, porque foi coincidentemente na mesma época que ela comprou aquele anel de compromisso e te deu de presente oficializando o namoro.
-- Ela é ciumenta.
-- Mas eu nunca a vi dando barraco como os que Gisele dava, essa ai sim, era um poço de ciumes. E com ela eu nunca vi você reclamando.
-- Isa, eu não sei o que fazer.
-- Você precisa ficar sozinha e pensar, colocar sua vida em ordem, e perceber quem é a mulher que te faz falta, que faz você respirar mais forte, seu coração querer sair do peito, você tem que decidir quem é a mulher da sua vida. Lìvia ou Adriana?
-- Eu não sei.
-- Por isso você precisa se descobrir, para entender quem o seu corpo vai pedir. Só então você saberá qual caminho seguir.
Ana olhava atenta à amiga e concordou com o que Isadora dizia. Depois de tudo o que constatara, percebeu que Lívia sempre estava com a razão, ela precisava daquele tempo sozinha para refletir e se encontrar, para só então descobrir o que queria para sua vida.
-- Obrigada Isa.
-- Fica aqui, janta comigo.
-- Tudo bem.
*****************
Chegando em casa, as meninas encontraram Paula sozinha no apartamento, ela estava preparando uma salada.
-- E ai turistas, como foi o dia? – sorria enquanto temperava a alface –
-- Foi bom. – Adriana se limitou a responder e foi em direção ao quarto –
Paula não entendeu nada e olhou Viviane encostar-se à porta da cozinha com um ar desanimado.
-- O que houve Vivi? Vocês brigaram? – limpava as mãos na toalha –
-- Não, você não vai acreditar no que aconteceu.
-- O que foi?
-- Encontramos com a Ana Paula na imobiliária lá em Niterói agora à tarde. – pegava um copo para beber água –
-- Sério? E o que aconteceu?
Viviane narrou à saia justa que foi na imobiliária, a reação de Adriana ao encontro e a conversa que tiveram na praia.
-- Vivi você realmente não se apaixonou pela Drica? Eu sinto que você mentiu para ela. – Paula falava baixinho –
-- Paulinha, eu tenho um sentimento forte por ela sim, eu me apaixonei, mas eu não quero ser mais um fardo para a Drica carregar, ela já sofre tanto por causa dessa loira aguada. – bebeu um gole de água –
-- Ai Vivi, não se coloque como um peso, Adriana merece saber dos seus sentimentos por ela.
-- Não Paula, é melhor assim, eu vou seguir com minha vida e procurar alguém que me ame e consiga me conquistar.
-- Vem cá menina maluquinha. – Paula a abraçou—
Viviane deixou–se embalar pela mais nova amiga, e finalmente deixou a emoção aflorar, chorou no colo de Paula que a confortava.
No quarto, Adriana sentou na cama e mirou um ponto fixo no armário. Pensava em tudo que passou no último ano até chegar até ali. Aprendeu a amar, sentiu a dor do abandono, abdicou de uma vida inteira para fugir e hoje se via ainda presa aquele amor que tanto lhe trouxe dor.
Pegou suas roupas e entrou no banheiro, as lágrimas escorriam junto com as gotas de água que desciam do chuveiro, chorava sozinha, consumida pela dor da perda, foram tantas que nem sabia qual doía mais.
Saiu do banheiro e percebeu movimentação na cozinha, Paula deveria estar terminando o jantar, foi direto para o quarto e encontrou Viviane pegando suas roupas para tomar um banho e depois jantar, percebeu que a ruiva havia chorado. Isso a intrigou.
-- Vivi, você está chorando por quê? – deixava a toalha estendida em uma cadeira –
-- Eu não estou chorando não. – fungava e tinha os olhos vermelhos –
-- Ah tá, então você esfregou um quilo de cebolas nos olhos ao invés de cortá-las.
A ruiva riu da amiga. E voltou a chorar, não conseguiu conter as lágrimas.
-- O que foi? Eu te aborreci?
-- Não, nunca Dri. Você é minha melhor amiga. – limpava o rosto com a toalha que estava nas mãos –
-- O que foi? – também tinha o rosto marcado pelo choro –
Viviane permaneceu em silêncio, apenas tentava se controlar para não deixar a emoção lhe trair novamente, respirou fundo, mas não conseguiu conter as lágrimas. Voltou a chorar, contida, mas Adriana podia perceber que era um choro sofrido. Abraçou a amiga e desejou não fazer parte da causa daquele sofrimento. Estava emocionada ainda e chorou junto com Viviane.
Depois de um tempo Vivi se desprendeu do abraço da morena e olhou em seus olhos, os verdes brilhantes estavam escuros.
-- Vivi, me conta o que deixou você assim?
-- Dri, eu não queria te complicar.
-- Você não vai me complicar, o que houve?
-- Dri, eu menti pra você hoje.
-- Mentiu para mim? – não entendeu --
-- Eu me apaixonei por você sim, eu menti quando disse que não. E ouvir você dizer que não tem o mesmo sentimento por mim doeu sabe. – baixou os olhos –
Adriana levou um balde de água fria, ela suspeitava dos sentimentos de Viviane, mas não quis enxergar, sentiu um aperto e se sentiu a pior mulher do mundo, se deixou levar pela promessa de Viviane que não se apaixonaria facilmente, e acabou magoando a ruiva.
-- Eu sinto muito Vivi, eu sempre tive esse medo e agora eu não sei o que fazer. – segurava as mãos da ruiva – Eu fiz com você o que ela fez comigo.
Paula foi para o seu quarto que é ao lado do quarto de hóspedes e podia escutar algumas palavras que eram ditas, e percebeu que as duas estavam se despindo de suas prisões, segredos não eram mais bem vindos e torceu para que os corações naquele quarto encontrassem uma direção.
-- Você nunca me iludiu Dri, você sempre foi honesta comigo, sempre me disse que seu coração era de outra pessoa, e eu quis arriscar, eu quis correr esse risco e me joguei de cabeça. Você não agiu como ela. – fez um carinho em seu rosto –
-- Me perdoa Vivi, eu tentei, mas eu não consegui. – chorava mais intensamente –
-- Não tem o que perdoar, me apaixonar por você não foi ruim, ao contrário, me fez uma mulher de verdade, até então eu era uma patricinha mimada que não tinha responsabilidade, hoje eu sou uma mulher graças ao que você me ensinou.
-- Não faz assim que eu choro mais ainda. – a voz falhava –
-- É verdade, você me ensinou a ser quem eu sou, e eu me apaixonei por isso, mas vai passar. Eu vou ficar bem.
-- É melhor eu ir dormir na sala a partir de agora.
-- Não, nem pensar, você continua dormindo aqui comigo.
-- Mas Vivi, eu não quero causar mais sofrimento, ficando perto de você, é melhor a gente parar de se tratar como namoradas, eu não quero que você sofra mais.
-- Não, fica aqui comigo. – Viviane abraçou Adriana -- Eu quero ter você por perto, até você voltar pra Harvard, eu quero aproveitar o que eu puder do seu colo, do seu carinho, da sua pele. – roçava o nariz no pescoço de Adriana –
-- Viviane, não faz isso. – Drica fechou os olhos –
-- Dri, eu te quero. – falava mansinho –
-- Vivi, nós não podemos. Eu não quero te machucar.
-- Eu assumo as consequencias Dri, eu te quero, fica comigo.
Dizendo isso, Viviane tomou a boca de Adriana na sua, e um beijo ardente começou, Adriana se rendeu ao dengo que Viviane fez e retribuiu com sofreguidão, estava confusa, sentida, e mesmo sabendo que era errada sua atitude de ceder aquele carinho à Viviane, sua amiga, amante, confidente, era a mulher que estava ali naquele quarto lhe oferecendo o seu melhor: o seu coração.
Paula tomou o seu banho, e quando saiu do banheiro passou pela porta do quarto de hóspedes, viu a cena e se perguntou o que aconteceria com aqueles corações. Balançou a cabeça e saiu para a cozinha.
Naquele quarto um pacto era selado, o silêncio era mantido e o futuro estava incerto, apenas a viagem de Adriana marcava uma certeza, em um ano tudo poderia mudar.
Fim do capítulo
Boa leitura!
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