CapÃtulo 56 – Hoje eu sei disso
Hoje eu sei disso
Estou andando distraída. Óculos escuros cobrem os meus olhos azuis. Estou saindo do Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli– (MARGS). Ele é considerado o maior e mais importante acervo público de arte gaúcha. Muitas dessas obras assinadas por renomados artistas locais, nacionais e sem contar nas importantes exposições estrangeiras. Passei horas sendo agraciada e encantada com esse algo tão profundo e único que é a arte. A arte de criar. A arte de trazer a vida. A pura e simples arte de ser aquilo que se respira e transforma-lo em algo mais.
O museu é um imponente prédio que fica situado na Praça da Alfândega, no Centro Histórico da cidade. Fazia tanto tempo que não vinha até aqui. Pretendo rever vários lugares antes de pegar a estrada novamente. Talvez eu volte algum dia. Mas agora é o momento de seguir em frente de verdade. Dou um suspiro...
-Talvez algum dia... – Sussurro baixinho, meus passos me levam até uma cafeteria de esquina. Involuntariamente um sorriso me foge.
Conheço muito bem esse lugar. Sempre vinha aqui com Pri e Paco. Antes de Sam fazer parte de minha vida. Olho em volta, esse lugar parou no tempo. Sinto uma saudade mansa do tempo vivido sem preocupação e sem o acumulo de erros meus e dos outros. Crescer não é tão agradável quanto imaginávamos.
-Meu Deus! - Ouço uma voz supressa que soa ao meu lado me chamando a atenção. –Não acredito. - Encaro os olhos verdes a minha frente.
-Paco! - Me jogo nos braços calorosos a minha frente. O homem de sorriso fácil me ampara apertado.
-Quando foi que voltou? - Paco se afasta momentos depois me conduzindo até a nossa mesa. Sempre sentávamos ali. Dou um sorriso saudoso daqueles tempos. Daqueles velhos tempos passados.
-Há algumas semanas. - Digo envergonhada. Me sentado a sua frente.
-E quando pretendia me ver? - Ele pergunta chateado.
-Nem mesmo pensei em ficar por tanto tempo. - Digo sincera. –Mas vovô Bernardo me convenceu.
-Fico feliz que esteja aqui. - Paco se tornou um homem lindo. Alto, forte, e aqueles olhos verdes... “Meu Deus se eu gostasse da fruta” Penso contendo um sorriso.
-Você está lindo! - Digo pegando-o de supressa. Vejo-o acanhado pela primeira vez na minha vida. E caio na gargalhada.
-Hahaha... engraçadinha. - Ele levanta a mão chamando a garçonete que prontamente se aproxima anotando ao nosso pedido.
Conversamos bastante. Paco como sempre me arrancou varias risadas. Ele não mudou nada, continuava o mesmo cara atencioso, carinhoso e amigo. Ele estava fazendo a sua pós em engenharia mecânica. E pelo que me contou continuava sem se apegar a ninguém. “Isso também não mudou nada.” Penso fazendo uma careta ao me lembrar dos corações partidos que ele colecionava. Agora deve ser bem pior. Afinal, ele não era mais um garotinho. Confesso, aquele ar cafajeste que ele tinha encantava.
-Pretende ficar por muito tempo? - O homem a minha frente pergunta encostando no encosto da cadeira. Seus olhos verdes sempre atentos em minha direção. Pareciam fascinados.
-Tempo suficiente. - Digo retirando os óculos escuros e colocando-os sobre a mesa. -Por mim já teria ido embora. Mas...
-Ainda bem que não foi. - Sua voz soa baixinha. -Se o tivesse feito antes jamais a encontraria.
-Desculpe. - Minha voz soa sincera.
-Não se preocupe com isso. - Paco me encara profundamente. -Você me compensa depois. - Ele sussurra arteiro.
-Hum... - Meus olhos sustentam os seus. –O que tem em mente? - Pergunto já prevendo a resposta.
-Que tal uma noite de balada? - Sua voz soa esperançosa. -O que acha?
-Por mim está marcado. - Falo o animando. –É bom que matamos um pouco a saudade.
-Como foi ficar longe por tanto tempo? - Paco me pergunta momentos depois.
-Foi necessário. - Sussurro sincera.
-Mas precisava ficar por tanto tempo? - Ele se queixa entristecido.
-Paco... - Minha voz embarga. –Eu nem mesmo cogitei a ideia de voltar algum dia. Mas olha eu aqui. - Forço um sorriso. -Quando vovó Catherine me ligou, eu juro que minha vontade foi de recursar. Pra falar a verdade eu até fiz isso. Só que ela não aceitou um não. E eu devia isso ao vovô.
-Fico imensamente feliz que tenha voltado. Nem que seja por alguns míseros instantes. - Ele dar um dos seus sorrisos arteiros. –Só assim posso te contempla. Você está ainda mais linda. Como você pode está ainda mais linda?!
-Idiota! - Balanço a cabeça em negativas.
-Sentir saudade todos os dias. - Ele sussurra mansamente. –Nunca imaginei que estivesse tão ferida ao ponto de deixar tudo pra trás. Nem mesmo pude me despedi. - Ele lamenta.
-Foi aterrorizante. Mas estou bem melhor agora. - Minha voz sai calma. –O que aconteceu me afetou de uma forma tão profunda que jamais imaginei que resistiria. Foi como me perder em um luto eterno. Em um vazio tão degradante que eu precisei respirar outros ares. Precisei fugir. - Essa é uma das poucas vezes que admito isso. Eu realmente fugir. Fugir para não sentir.
-Você apenas se foi, você se foi nos deixando pra trás. - Paco me olha sentido. -Liz, não existia apenas Samantha. Nunca existiu apenas ela.
-Hoje eu sei disso.
Sentir saudade de ficar assim atoa. Nem mesmo me lembro qual foi a última vez em que Paco e eu estivemos sozinhos por tanto tempo. Não me lembrava que ele era tão importante em minha vida. Ou que foi tão importante algum dia. Aqueles olhos verdes sempre me passaram tanta calma. Eles sempre me olhavam com carinho, um carinho saudoso. Conversamos como há tempos não fazíamos. Rimos de nossas próprias tolices, dos nossos erros necessários. Falamos sobre as nossas experiências, de nossas frustrações. Foi sem duvida uma boa conversa. Uma das melhores conversas.
-Sabe, quando vovó Rúbia morreu... - Meu coração se aperta ao me lembrar da senhora de sorriso fácil. Mais eu faço de tudo para expulsar aquela sensação ruim. Afinal, sei que vovó Rúbia jamais iria querer me ver assim. –Eu fiquei sem chão. Eu havia acabado de perder a única pessoa que me resgatou do meu caos. A única pessoa que realmente lutou por mim bravamente. Foi extremamente doloroso ter a certeza que eu não mais a veria. - Paco apenas fica ali, me ouvindo. Havia me esquecido o quanto ele era um bom ouvinte. O melhor de todos. –E só de saber que jamais a verei de novo...
-Sinto muito por isso. - Ele sussurra. –Eu fui ao enterro. - Fico supressa ao ouvi-lo. –Mas você já não estava lá.
-Eu só precisava respirar. – Minha voz embarga. –Precisava desesperadamente respirar.
-Assim como você fez há dez anos atrás?! - Paco diz desviando os olhos dos meus por alguns segundos. -Se eu soubesse que você iria embora... eu... eu jamais teria...
-Eu não podia ficar. – Digo interrompendo o homem de olhos verdes a minha frente. Ele apenas abaixa a cabeça. –Eu só não conseguia ficar. – Dou um sorriso angustiado. -Eu não consegui ficar em nenhuma das minhas perdas profundas.
Coloco os fones de ouvido. Os meus olhos continuam olhando para o céu, encantados. “Hoje será um dia bonito”. Dou um sorriso feliz. E sem titubear, começo a correr. O meu caminho é sempre o mesmo. A cachoeira. Virou habito correr até lá. E logo depois me aprofundar em suas águas. Vovô Bernardo me roubou mais alguns dias. Então, aqui estou eu.
Confesso que estou adorando ficar aqui. Sinto como se eu fizesse parte de uma família novamente. Ao menos até o momento em que Dr. Gustavo não se faz presente. Ele não me deixa em paz. Tento ignorá-lo o máximo que posso. Mas só que às vezes é impossível. E acabamos em discursão. Ele implorando uma chance de fazer parte de minha vida. E eu o empurrando o máximo que posso para a borda.
Sem falar em Camila. Eu a adoro, ela é divertida e atenciosa. Mas tenho medo de machuca-la. Nunca dei espaço para as suas investidas. Mas o coração é terra que ninguém manda. Espero que ela encontre alguém digno, alguém que a mereça. “Eu adoraria tê-la como minha irmã caçula.” Faço uma careta engraçada com esse pensamento. Balaço a cabeça tentando expulsar esses tolos pensamentos. Afinal, eu nunca farei parte de sua família. Dr. Gustavo cuidou disso muito bem alguns anos atrás. Então nunca seremos irmãs. Nunca seremos...
Olho encantada para a queda d’água. Jamais me cansarei de admira-la. Outro dia mesmo trouxe minha câmera. E me divertir tirando um mundo de fotos que ficaram maravilhosas. Eternizei vários cantinhos dessa fazenda. Bibi odiava quando eu a pegava distraída e capturava o seu momento. Vovó Catherine também se zangava, mas logo depois me sorria alegre com brilhos nos olhos. Já Larissa e Gael, faziam altas posses divertidas. Eles amavam tanto quanto eu. E dávamos varias gargalhadas. Dou um suspiro. “É hora de voltar para o meu mundo” Penso com pesar. Se eu ficar por mais tempo talvez eu não consiga. Então, adeus...
Faço uma careta quando encaro o curral ao longe. O lado onde fica os currais e as baias são os únicos lugares que eu não me atrevo a me aproximar em toda a fazenda. Mantenho o máximo de distancia possível. Pra falar a verdade, qualquer lugar que tenha...
Meus pés travam na hora quando olho pra frente. Meu coração se acelera. Minhas mãos suam. Mais o animal continua correndo em minha direção. Correndo tão rapidamente. Arregalo os meus olhos assustada. Não daria tempo de fugir.
-Ai meu Deus! - Grito apavorada. Mas antes que eu possa fazer alguma coisa, o animal se joga sobre mim me derrubando no chão. –Pare. - Reclamo tentando proteger o meu rosto com as mãos. Mas o cachorro não parava de latir e me lamber. –Pare com isso.
-Érabos! - Uma voz rouca soa chamando a atenção do cachorro.
O animal sai de cima de mim tão rápido quanto chegou. Estou indignada. “Já pensou se esse animal tivesse me mordido.” Penso revoltada. Reclamo raivosa me levantando. Tento limpa a poeira de meu corpo e a baba que o cachorro deixou.
-Esse bicho poderia ter me mordido. - Continuo reclamando sem levantar a minha cabeça.
Então estranho o silêncio. Quando ergo os meus olhos para ver o que estava acontecendo, meu corpo paralisa. Olhos amarelados me encarravam supressos. Então meu traidor coração acelera. Um nó se forma em minha garganta. Uma adrenalina até então esquecida atravessa o meu corpo me deixando assustada. Ali estava ela. Como uma miragem bem na minha frente.
-Lizandra?! - A mulher a minha frente sussurra assustada. E então o meu coração erra uma batida.
Fim do capítulo
Boa noite!
"O amor calcula as horas por meses, e os dias por anos; e a cada pequena ausência é uma eternidade" - John Dryden
Mas ainda é melhor sofrer com a ausência eterna de um amor, do que nunca ter sentido.
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LeticiaFed
Em: 31/12/2018
Querida autora, creio que voltará somente ano que vem, nos deixando nesse suspense danado do reencontro das meninas. Mas volta, por favor, né? Logo... Um ótimo 2019 para você! E parabéns pela história, que muitas outras venham a seguir. Beijo!
Resposta do autor:
Boa noite!
Fico honrada de que esteja apreciando esse meu ar gentil. Escrever é algo surpreendente. É viver varias vidas em uma só. É sentir profundamente.
Obrigado! Espero que seu início de ano esteja sendo agradável e, que o restante seja ainda melhor.
Que assim seja! Que minha alma seja arrebatada em inspiração. E que eu exale essa dadiva maravilhosa que é a escrita. Que as minhas mãos deslizem sobre esse respirar inocente e transforme em um mar de emoções.
Bjus...
Kiss Potter
Em: 04/12/2018
Eita... meu coração!!!
OMG! Preciso urgentemente do próximo capítulo.
Autora, please... não demore.
Bjs!
Resposta do autor:
Boa noite!
Eita meu coração quem fala sou eu. Rsrsrs...
Sinto muito mesmo pelo demora. Pode rrsrsrs...
Mas imprevistos acontecem, então sinto muito pela espera.
Bjus...
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LeticiaFed
Em: 04/12/2018
Ai, ai, ai...E agora a espera pelo próximo capítulo e saber o que aconteceu com Sam nesse meio tempo.
Não briguem muito, tá meninas? Favor passar esse recado pra elas ;)
Resposta do autor:
Boa noite minha linda!
Pode deixar. Farei isso! Mas não garanto nada. Rsrsrs...
Bjus...
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Raffaella_13
Em: 02/12/2018
E o momento mais esperado chegou!! Embora eu tenho receio de como será esse reencontro acho que já chegou a hora delas se resolverem seja para ficarem juntas ou seguirem cada uma o seu caminho mas tô aqui na torcida para que fiquem juntas que se casem e tenha vários bebês kkkkkkkkkkk Luah arrasou como sempre,beijos #Que venha o próximo capítulo!!
Resposta do autor:
Boa noite minha linda.
Desculpe pela demora em atualizar. Mas... Rsrsrs...
Realmente, até eu mesma estava ansiosa por esse momento o reencontro. Veremos o que acontece daqui pra frente.
Obrigado!
Bjus...
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