Capítulo 11
SEIS MESES DEPOIS...
Pietra
- Pietra... oi ...
Olho assustada para a mulher sentada a minha frente do outro lado da mesa, ela está com expressão frustrada que já conheço, novamente havia me distraído. Doutora Marta Comby, minha psiquiatra, suspira alto e recua na cadeira, coloca as mãos sobre a mesa e diz resoluta:
- não posso recomendar antidepressivos se não conversar comigo Pietra.
Esfrego a testa, endireito os óculos e suspiro cansada:
- não sei porque tenho que falar, acho que dá para ver que estou depressiva.
- não posso fazer isso Pietra- ela diz delicada, tentando outra tática que não a aspereza - você está em terapia há 2 meses e não disse nada, não consigo te ajudar assim.
- se me der antidepressivos, isso me ajudaria.
- não vai acontecer.
Levanto nervosa, busquei a terapia porque não aguentava mais, estava nos Estados Unidos a cinco meses, fazendo cursos que ocupavam todo o meu tempo, mas não conseguia pegar as matérias. Eu mal comia, só saia de casa para a faculdade. E o problema mais perigoso de todos, não conseguia dormir. Era cochilar que os pesadelos me atacavam, ora era meu pai fazendo alguma maldade com ela, ora era a cena final do nosso término, a dor que causei, suas palavras me ferindo até a alma.
Mas queria remédios e não conversa, e infelizmente isso não teria, apelo então:
- pode pelo menos me passar um tranquilizante forte, onde eu apague a noite toda, por favor Doutora Comby, preciso dormir para pelo menos tentar estudar.
Ela suspira alto e acaba pegando o receituário e começa anotar o nome do remédio, estende a receita mas antes de entregar, me avisa:
- eles vão te ajudar a dormir Pietra, mas se não falar o que está acontecendo, vai ficar pior.
Eu duvidava disso, apenas puxei a receita, peguei minhas coisas e sai da sala dela.
Caminhei pelas ruas do bairro, o inverno estava rigoroso, as pessoas andavam com cuidado porque a neve estava por todo o lado, enfiei o gorro mais para baixo e coloquei o cachecol sobre o rosto. Aquele tempo combinava com o meu coração, sei que pode parecer clichê, mas estava congelada por dentro, sem ela na minha vida, sem poder nem escrever ou saber onde ela estava. Depois da briga, ela foi embora com o pai, ainda tentei apelar para Ana me dar um endereço, mas ela se recusou, disse que se amiga descobrisse que tinha me passado qualquer informação, ela sumiria. Não insisti mais.
Meu mundo era apenas branco e vazio, e continuei assim por um longo tempo.
DOIS ANOS DEPOIS ...
Clara
Estacionei a minha moto bis e caminhei vagarosa para entrada do presidio, era um grande portão azul ladeado por um muro enorme onde tinha uma guarita com um policial que olhava para todos os lados portando um arma que eu não tinha ideia do nome. No meio do portalzão, tinha um menor que abriu assim que parei na frente, uma policial mandou entrar e ficar na fila com umas duzentas pessoas.
Passei pela humilhação da revista, sabia que seria difícil, mas eu precisava vê-la, pelo uma vez.
Já me correspondia há dois anos com minha mãe, contava coisas da minha vida, menos aquela que mais me marcou, como finalmente havia conseguido entra na faculdade de arquitetura, que era caro para cacete mesmo com bolsa parcial, que ilusão a minha achando que aquela miséria que juntei daria para alguma coisa. Que para ajudar na renda ,trabalhava em um restaurante onde as gorjetas eram ótimas, contei que papai conseguira um emprego onde fazia a mesma coisa que o anterior, mas agora era líder e ganhava o dobro. Contei que sou lésbica, para os dois.
Meu pai como esperava me aceitou, e para ele contei sobre Pietra. Minha mãe disse que estava orgulhosa de mim e que seria sempre sua filha.
Então chegara a hora da verdade, aguardava roendo as unhas, hábito ridículo e pouco higiênico eu sei, no grande pátio do presidio. Tinha mesas estilo piquenique, muitas famílias ocupavam várias, peguei a mais longe e fiquei aguardando.
Sonia apareceu momentos depois, não a conhecia, já que nunca tinha visto uma foto da minha mãe, mas ela me viu e sorriu, e era o meu sorriso!
Enquanto ela vinha em minha direção ,considerei no que mais parecia com ela, os olhos , não só a cor o formato também. A altura, os cabelos lisos e castanhos escuros, apesar que os dela estarem embranquecendo acima da cabeça. Eu era uma cópia mais jovem da minha mãe e fiquei me perguntando o quanto foi difícil para meu pai ver a mulher que o destruiu sempre que me olhava. Levantei nervosa, não sabia como agir, mas ela apenas parou na minha frente e ficamos nos olhando, até minha mãe dizer emocionada:
- você é tão linda filha.
Comecei a chorar e a abracei, finalmente perdoando minha mãe. E a única pessoa que queria compartilhar isso, não fazia mais parte da minha vida. Chorei mais.
Mas não choraria para sempre.
CINCO ANOS DEPOIS...
Pietra
Eu estava bêbada e na cama de alguém que não tinha a menor ideia de quem era. Me levantei tonta e fitei aqueles ombros largos, desci mais o olhar e admirei a bunda dele. Então tudo voltou assim como minha vontade de vomitar. Sai cambaleando atrás de um banheiro, encontrei na segunda porta de um corredor desconhecido e me joguei no chão de joelhos, levantei a tampa da privada, todo a tequila e whisky fizeram um caminho de fogo pela minha garganta a fora. Fazia apenas algumas horas que tinha pisado em terras brasileiras, e meu pai exigiu que fosse até a sede que ficava na cidade de Pé de vento, a fábrica ficava em Cêu azul, para começar a me familiarizar com a empresa. Estava cansada, mas acatei as ordens. Ele me disse que começaria debaixo, com os estagiários. Não me importei, o quanto mais longe ficasse dele, melhor.
Conheci meus colegas, duas moças com aparência de eficiência pura e meu atual companheiro de cama. Seu nome era Otavio, éramos da mesma idade, mas ao contrário das moças, ele era mais acessível. Conversamos por um tempo, ele descobriu quem eu era, mas não deu importância. Quando chegou o final do expediente, me convidou para sair em um happy hour, lembrei a ele que estávamos na segunda feira.
Ele apenas deu de ombro e me estendeu a mão, eu fui.
Estava sozinha há 5 anos, depois dela, nunca mais fiquei com ninguém. E sei que gosto de mulheres, mas depois da quarta ou quinta dose de tequila, não me lembro direito, me peguei achando Otavio muito atraente, nunca tinha ficado com um cara. Decidi experimentar, sei o que você está pensando. Que estou cumprindo mais uma exigência do meu pai, talvez esteja. Mas agora que estou aqui deitada no chão do banheiro dessa casa desconhecida, percebo que noite que tive não foi ruim, foi diferente e no começo incomodou um pouco e não g*zei mas Otavio fora extremamente atencioso. Talvez apenas curta o Otavio por um tempo, talvez consiga finalmente me encaixar.
SETE ANOS DEPOIS ...
Clara
Ela estava me enlouquecendo, estávamos em uma balada de música eletrônica, as batidas parecia acompanhar meu coração descompassado, e Estela se esfregava em mim como uma gata no cio. Não me entenda mal, estava adorando. Apertei sua bunda, enquanto sua língua lambia meu pescoço, ela mordeu o lóbulo da minha orelha e falou:
- vamos embora.
Não pensei duas vezes, agarrei sua mão e saímos, assim que entramos no carro dela, Estela me puxou para o banco de trás e saciamos nossos desejos ali mesmo.
Depois ela me deixou em casa , quer dizer a casa que dividia com meu pai e logo com minha mãe, pois é.
Totalmente louco.
Fui nas pontas dos pés até o banheiro, mesmo sendo sexta e meu pai não precisar trabalhar no dia seguinte e graças ao meu novo emprego que começaria na segunda, nem eu, ainda assim não queria acorda-lo.
Finalmente depois de meses correndo atrás de um estágio de arquitetura, eu havia conseguido e melhor ainda, em um grande escritório da cidade. Por isso a noitada com Estela, estávamos comemorando. E apesar de ficarmos sempre, Estela era minha amiga apenas, amizade colorida e verdade, mas apenas isso.
Os anos que passaram não me deixaram tempo para namorar, sempre estava focada em terminar a faculdade e em trabalhar. É claro que havia ficado com algumas mulheres, mas nenhuma teve a paciência de aguentar meu ritmo. Pelo menos e isso que dizia a mim, que meu medo de me apaixonar novamente, nada tinha a ver com a dor que senti há tantos anos atrás, ou que Pietra de alguma forma ainda estivesse em meu coração.
Quem sabe agora que me dedicaria apenas a minha carreira, sobrasse tempo para pensar em namoro.
Terminei meu banho, vesti meu pijama e fui deitar, tirei meus pensamentos do futuro longínquo e comecei a pensar no meu futuro mais próximo.
Minha mãe sairia no próximo mês, e não tinha onde ficar, portanto precisava ficar conosco. Pelo menos até ela se acertar. Meu pai relutou bastante, mas acabou aceitando. Eu estava feliz e temerosa com esse arranjo, mas não podia deixar minha mãe na rua e não podia escolher entre os dois.
DEZ ANOS DEPOIS
Pietra
Estava petrificada.
Estávamos em restaurante que abrira há pouco tempo em Céu Azul, o meu estado de choque total se deve ao fato , que a minha frente está Otavio de joelhos, no meio do salão lotado, com uma caixinha na mão:
Seus olhos estão marejados e sua voz treme quando ele pede:
- Pietra , me daria a imensa honra de se casar comigo?
Minha vontade é rir, mas me seguro, sei que ele não entenderia minha histeria. Não sei de onde Otavio achou que estou pronta para um casamento. E certo que namorávamos há 5 anos, que ele havia conseguido a promoção dentro da empresa do meu pai, ainda assim nunca dei indicações para esse pedido. Olhei a redor e todos nos olhavam com expectativa, sabia que isso cairia no ouvido do meu pai antes que dissesse sim.
Espera , era isso o que eu queria?
Mais uma vez olhei para o homem na minha frente, ele era gentil, engraçado, carinhoso e me fazia ter bons orgasm* de vez em quando. Ele seria um pai maravilhoso, e não posso negar que aos 27 anos o meu relógio biológico começara a apitar. Eu queria ser mãe. E era feliz com ele, não o tipo de felicidade que tive com Clara, mas sempre que esse tipo de pensamento me invadia, eu o apagava dizendo a mim que éramos adolescentes e sentíamos tudo exageradamente. E principalmente que nunca mais veria Clara.
E foi essa certeza absoluta que me fez assentir positivamente, ele se levantou com um sorriso sincero e colocou o anel no meu dedo. Depois me beijou docemente e as pessoas do restaurante aplaudiram enlouquecidas.
E isso ai, iria me casar.
Fim do capítulo
olá,
Um capitulo curtinho nessa segunda feira, só para deixar vc6 curiosas com o que vem pela frente!!
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perolams
Em: 15/05/2018
CCom 27 anos e um diploma americano Pietra ainda fica embaixo do pé do pai? Pqp, tava na hora de mandar esse mala pastar.
Resposta do autor:
Pos é ...mas no momento ela não enxerga isso..ela esteve a vida toda condicionada a ser o que o pai queria.
Mas aguarde... Pietra vai surpreender : )
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