Capítulo 6
Pietra
A música velha infância dos tribalistas toca no meu rádio stereo , tentava a todo custo terminar a infame lição de matemática , mas meus pensamentos iam para Clara e o dia maravilhoso que passamos. Os beijos, os toques, a conversa, Clara se tornara muito melhor do que eu imaginara. Sei que não deveria ter ficado chateada quando me falara das meninas, mas meu ciúmes foi demais, imaginar Clara beijando outra me deixava brava. O amor é assim mesmo, totalmente irracional. E sim tive vontade de tê-la completamente, mas sabia que ela não estava pronta, a esperaria o tempo que fosse. Ao pensar nisso, imaginei o depois, o que afinal faríamos, meu pai ainda dominava a minha vida. Mas não deixei a tristeza me abater, queria aproveitar tudo o que pudesse com meu amor.
Quando cheguei de manhã no colégio, a vi sentada na calçada, meu sorriso se abriu e senti vontade de beija-la. Clara estava com sua maquiagem pesada, sua máscara, seus olhos pararam no meu por um tempo, os desvia, se levanta e entra. Fiquei imensamente triste, mas sabia que ela fazia o necessário, mesmo que não houvéssemos discutido o depois, sabia que na escola, o lugar mais perigoso para nós, teríamos que seguir como antes. Fui para sala, mas ela não estava ali, não tinha ninguém ainda e como não tinha vontade de jogar conversa fora com nenhum dos meus colegas, fui para meu lugar tentar terminar os deveres de matemática que ontem não havia conseguido. Qual foi minha surpresa ao encontrar um botão de rosa em cima da minha carteira e junto a ele meu chocolate preferido. Meu suspiro foi audível, cheirei a flor e depois a coloquei no meu exemplar de Assassinato do expresso do oriente de Agatha Christie e comi meu chocolate com o coração cheio de amor.
A classe foi se enchendo, Clara tropeçou ao entrar, por causa do estúpido do Rogério que estava na porta e colocou o pé na frente dela, a raiva subiu pelo meu corpo e me levantei disposta a mandar tudo a merd* e defende-la daqueles animais, mas Clara me fitou e vi que implorava que não fizesse nada. Sentei novamente ainda fervendo e ela foi para sua carteira indiferente como sempre.
Meus olhos encheram-se de lágrimas, por minha impotência e raiva deles a tratarem assim. Clara é fenomenal, uma pessoa digna e cheia de amor. Sequei rapidamente uma lágrima teimosa que desceu pelo meu rosto, mas Vanessa acabou percebendo e disse parecendo meio enojada:
- o que você tem?
- nada, minha TPM está atacada.
Menti e voltei minha atenção ao caderno, um pouco depois meus olhos desviaram para Clara, em nenhum momento os delas saíram da lousa.
O intervalo era a pior hora para mim, tinha que fingir que gostava de conversar com aquelas pessoas. Debora sentou-se ao meu lado, jogou o longo cabelo loiro por cima do ombro e cochichou no meu ouvido:
- o Mauricio está doido para ficar com você amiga.
Mauricio era tão ruim quanto Rogério, disse o mais suave possível para ela:
- não estou afim de ninguém.
Debora me olhou surpresa e sua expressão transmitia como eu era idiota por negar ficar com um dos caras mais gostosos da escola, mas ela apenas balançou a cabeça e falou:
- tudo bem, mas pode ter certeza que ele vai tentar alguma coisa no festival.
- que festival?
- nossa, esses anos lá longe fizeram você esquecer do festival de Serra Negra?
- ata.
Me lembrava vagamente desse festival, então cabelos negros me chamam a atenção, observo Clara entrar no banheiro. Solto já me levantando:
- tentar todo mundo pode.
E sigo para o banheiro.
Quando entro, tem duas meninas conversando na área da pia , a última porta dos reservados está fechada. Entro no adjacente e espero, as duas meninas vão embora, ouço a porta abrir do reservado ao lado, e logo depois a água correr. Abro a porta e vejo Clara lavando as mãos, não tem mais ninguém. Saio correndo e a puxo para dentro, por um segundo ela se assusta, mas percebe que sou eu. Ficamos nos olhando, até que ela me beija suavemente, minhas mãos se enfi*m naquela cabeleira sedosa e suas mãos se apertam na minha cintura. O beijo dura pouco, cochicho no seu ouvido:
- obrigada pelos presentes.
Ela beija meu pescoço me fazendo arrepiar e fala com a aquela voz rouca que tanto amo:
- de nada.
Depois seus olhos grudam nos meus e vejo a dor neles:
- e horrível ficar tão perto de você e não poder te tocar ou falar contigo Pe.
Meu coração retumba com o antigo apelido, estamos falando aos sussurros:
- sinto o mesmo, que ódio daquele Rogério.
Ela me beija novamente nos lábios e depois pede ainda sobre eles:
- por favor Pe, não se intromete vai ser pior, já lido com eles há anos.
- e tão difícil ver isso Clara!
- eu sei, mas logo isso não terá mais importância.
Quando abria a boca para perguntar o porquê daquela afirmação, ouvimos vozes de outras meninas e ficamos em silêncio. Clara vai até o fim do reservado tentando esconder os pés caso alguém perceba dois pares por baixo da porta, mas isso não acontece. Logo estamos sozinhas novamente, ela me abraça apertado , segura uma mecha do meu cabelo enrolando no dedo e pergunta:
- vai ao festival certo?
- vou.
- eu te vejo lá.
Eu a puxo antes de sair e a beijo novamente, ela espia do lado de fora como não há ninguém , sai.
A semana foi longa, não consegui mais ficar com Clara a sós, mas como nada de ruim dura para sempre, sábado chegou e com ele o festival. Infelizmente tinha que ir com meus "amigos", fomos todos de ônibus, porque o policiamento seria intenso na estrada, por conta da festa, e ninguém se arriscaria a dirigir sem carteira.
O Festival ficava em uma área verde enorme, tinha um parque de diversões com roda gigante , carrinhos de bate-bate e outras coisas assim. Um palco onde algum grupo desconhecido tocava , barracas de comidas e bebidas a perder de vista. Mauricio que além de vir ao meu lado no ônibus, ficou ao meu lado com um maldito carrapato. Debora tinha razão, ele não iria me deixar em paz, isso me angustiou, porque precisava de espaço para poder procurar Clara.
O lugar começava a encher, os meninos haviam comprado bebidas alcoólicas e passavam de um para outro. E minha sorte começou a mudar quando Mauricio, talvez entendendo que não conseguiria nada de mim, resolveu encher a cara e me deixar em paz.
Meus olhos a todo momento procurava por ela, até que enfim a encontrei, minha libido se elevou consideravelmente ao observar Clara. Ela usava um short curto com meia calça preta arrastão por baixo, uma camisa listrada de preto e branco e uma jaqueta de couro preta. Os cabelos soltos espalhados pelos ombros, a maquiagem leve, como eu gostava. Estava ao lado de Ana e Artur, seus olhos percorrendo o lugar como os meus estavam antes, finalmente ela me encontra, um sorriso se abriu e senti minhas pernas bambearem, linda como uma deusa do Rock.
Justo quando me preparava para ir até ela , Mauricio resolveu ser um peso morto, pousa seu braço pesado sobre meu ombro e tenta me virar para ele, não aceitei seu incentivo e antes que pudesse me afastar completamente ,sua boca encosta no meu ouvido e seu hálito de puro álcool invade meu nariz, com a voz arrastada diz:
- quero beijar sua boca Pepe.
Minha cara queima de raiva, meus olhos que não haviam saído de Clara, não perdem seu sorriso esmaecer , ela diz algo para Ana e se afasta do casal. Empurro Mauricio encolerizada e digo:
- vai ficar querendo imbecil.
Todos me olham assustado com minha reação, mas pouco me importa, me afasto deles e vou a procura de quem realmente quero beijar.
Clara
Estou fervendo de ódio, maldito Mauricio e sua mão boba, queria ter ido até lá e arrancado aqueles dedos, quebrado aquele sorriso idiota que ele mostrava. Mas o que fiz? Sai fugindo como uma covarde que sou. Pietra estava estonteante, com um vestido branco com estampa de borboletas, sem alça e acima dos joelhos, deixando aquele exemplar de pernas lindas para fora. Os cabelos loiros presos em apenas um lado da cabeça e jogado sobre o ombro. Passo pela roda gigante, sigo até a barraca de cachorro quente, havia dado a desculpa para Ana que iria comprar algo para comermos, mas só queria me afastar daquela imagem medonha dele a abraçando e cochichando no seu ouvido.
A fila está grande, entro atrás de duas senhoras e fico remoendo a raiva, de tão distraída que estou não a percebo logo. Então sinto seu perfume inconfundível, levanto meu rosto e a expressão de Pietra é de pesar:
- me desculpe por aquele troglodita.
Ela corajosamente entrelaça os dedos nos meus e me puxa para longe da fila, andamos de mãos dadas no meio da multidão, no caminho noto alguns olhares estranhos, mas nenhum são daqueles que me detestam e percebo pela primeira vez que mesmo que saísse da cidade, as pessoas ainda me desprezariam por quem sou. Isso me entristece, mas antes que possa pensar seriamente sobre isso, Pietra está me levando para área onde a floresta faz limite com o festival. Adentramos no meios das árvores, e quando finalmente estamos longe dos olhos de todos, ela me encosta em uma arvore e me beija. Minha boca a recebe sem resistência e feliz me entrego aquele momento maravilhoso. Ela para e estamos respirando com dificuldade:
- está uma tentação, Clara.
- me arrumei pensando em você.
Seus olhos ardem nos meus e ela me beija de novo, suas mãos caminham por todo meu corpo, mas nunca deixando de respeitar meus limites imposto desde aquele dia na cachoeira. Começo a sentir a necessidade de ir mais além, mas ainda não me atrevo. Depois de vários minutos de amassos, voltamos para o festival.
Não estamos mais de mãos dadas, compramos comida e sempre espreitando o povo da cidade para que não nos vejam, voltamos até Ana e Artur, que agora conhecemos oficialmente. Pedimos a eles que nos afastemos o mais longe possível de onde estávamos, agora o lugar está tão lotado que seria impossível que alguns dos colegas de Pietra nos visse, mas em todo caso meio que nos escondemos atrás de algumas barracas, se Artur percebeu a loucura, não disse nada. Eu começo a gostar muito dele, um cara tímido, mas bem engraçado e posso ver de longe que está totalmente apaixonado por Ana.
Conversamos, rimos e nos divertimos muito, em alguns momentos Pietra apoia o braço sobre o meu ou passa sobre meu ombro, de fora as pessoas apenas notaria apenas duas amigas, mas nós ( isso inclui a Ana) sabemos que é muito mais. Ana e Artur vão andar de roda gigante , nós duas ficamos e vamos mais para atrás das barracas, sentamos na grama.
O céu começa a se tingir de laranja, observamos o pôr do sol, com Pietra entrelaçando os dedos nos meus e a cabeça encostada em meu ombro.
É um momento perfeito.
Para completar o nosso dia, a música Everthing do Lifehouse começa a tocar nos auto falantes, a fito intensamente e digo:
- essa é nossa música.
Pietra ouve mais um pouco, sei que ela está entendendo, inglês para ela e uma segunda língua, eu tenho que procurar as traduções com meu velho dicionário. No refrão seus olhos se enchem de lágrimas e ela confirma em um inglês exato:
- you are all i want! ( Você é tudo o que quero!)
E me beija, deixo minhas lágrimas se misturarem ao nosso beijo.
Fim do capítulo
Olá,
Se quiserem, escutem a musica Everthing do Lifehouse, ( além de ser uma das minhas preferidas da trilha sonora da série Smallville) e a música que escutei sem parar para esse livro.
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