CapÃtulo 29 – Quando apenas amar já não é suficiente
Quando apenas amar já não é suficiente
E novamente aquela sensação de calmaria. O silêncio era tão agradável. Caibo perfeitamente nesse lugar tão cheio de nada. Aqui já não existem todos os meus pedaços cortantes. Respirar já não é mais tão primordial. A dor que me suprimia já não me humilhava ou me fazia refém. Ser quem eu sou nunca foi tão agradável. De repente sinto algo me puxando, me empurrando e me chamando. De repente ser a solidão já não era tão aceitável. E como se o ar fosse restabelecido em meus pulmões. Os meus olhos se abrem. Eles se abrem para um novo dia. Respiro fundo. Eu ainda estou viva.
Olho para o lado. Vovó Rúbia dormia sentada em uma poltrona toda desajeitada. Suas mãos seguravam a minha, como se assim fosse o suficiente para me manter ao seu lado. Talvez, somente talvez realmente fosse. Sua cabeça estava jogada para o lado. Seus cabelos curtos desalinhados. Sua feição estava tão calma. Fico por longos minutos admirando aquela senhora de bondade infinita. Mas de repente aqueles olhos acinzentados se abrem me atingindo. Eles se enchem de água com tanta rapidez. Eu apenas lhe dou um sorriso de lado. Minha intenção nunca foi de preocupa-la. Mas nem tudo é como gostaríamos que fosse.
-E então. - Digo lhe olhando com carinho. –Quantos meses eu perdi dessa vez? - Digo brincando.
-Oh, Liz. - Vovó deixa as lágrimas fugirem. –Nunca mais, está me ouvindo bem?! Nunca mais se atreva a fazer isso. - Ela diz chorosa. –Eu só tenho você. Se algo te acontecesse, o que seria de mim? - Vovó diz angustiada.
Vovó Rúbia ergue a minha mão que está entre as suas e a leva até seus lábios a beijando. Logo depois vovó a leva a colocando sobre os seus cabelos. Ela abaixa a cabeça e com a minha mão entre as suas, ela acaricia seus cabelos com ternura. Não vejo os seus olhos, mas sei que eles estão chovendo. Por que eu posso ver enquanto as suas gotas caiam. E isso partia o meu coração. E ficamos assim por longos minutos.
-Nunca me assuste desse jeito. - Ela pediu com a voz embargada. –Eu não sei o que seria de mim se eu também te perdesse. - Ela solta a minha mão.
-Eu estou bem vovó. - Digo baixinho.
-Não tenho mais idade para esses tipos de sustos Lizandra! - Seus olhos me atingem novamente. –Não tenho mais idade para perder mais ninguém que eu amo.
-Eu sinto muito. - Digo envergonhada.
-Oh, meu amor. - Vejo-a encolher os ombros. –Eu que sinto muito. - A senhora ao meu lado direito sussurra. –Eu sinto muito por não ter sido capaz de te proteger.
-Eu sei que sou difícil. - Digo olhando para o teto. –Talvez seja por isso que seja tão difícil me amar.
-Nunca diga uma coisa dessas! - Vovó me repreende.
-Mas é verdade vovó. - Fecho os meus olhos tentando conter a tempestade. –Por que as pessoas que amamos precisam nos machucar?
-Elas não precisam Liz. - Sua voz sai angustiada. –Elas não precisam e nem deveriam fazer isso.
-Então por que elas fazem? – Pergunto com calma.
-Por que elas são bobas. - Vovó diz simples.
-Verdade vovó, elas são muito bobas. - Dou um sorrisinho de lado. –Mas mesmo assim, isso dói muito. Dói ser mastigada e jogada no lixo.
-Liz...
-Dói vovó, dói ser esquecida por tanto tempo. Dói ser odiada. Dói cada palavra que foi cuspida sem anestesia. - Dou um suspiro cansada. –Dói ter seu sangue e nunca ter tido o seu amor.
-Seu pai...
-Ele não é mais meu pai. - Digo firme. –Pra falar a verdade. - Meus olhos se voltam para os acinzentados. –Ele nunca foi.
-Ele continua sendo seu pai, Liz.
-Não, ele deixou de ser meu pai há muito tempo. - Minha voz sai sentida. -O que aconteceu foi só um dos estragos que ele vinha causando em minha vida. Foi o maior de todos.
-Vai ficar tudo bem. - A senhora diz com uma segurança que nem ela mesma acreditava.
-A senhora acha mesmo? - Dou um sorriso irônico. –Por que nunca mais nada vai ficar bem. Enquanto eu ficar aqui, enquanto eu respirar esse ar contaminado. Eu morrerei lentamente. Serei destruída pedaço a pedaço até não restar mais nada.
-A dor precisa ser sentida. Ela precisa respirar até morrer.
-E se ela me arrastar com ela? E se eu não for forte o suficiente? - Pergunto desesperada. –Eu só quero ir embora vovó. - Fecho os meus olhos. -Eu só quero ir pra bem longe.
-Pensei que tivesse parado de fugir? - A senhora diz cautelosa.
-Eu não estou fugindo. - Olho para a senhora de expressão calma. –Eu só estou cansada de ser machucada. Eu só não consigo mais... –Coloco a minha mão boa sobre a que estava ferida. –Eu só não consigo mais perder.
-Você tem noção do quanto isso é sufocante? - Vovó coloca as mãos sobre o rosto. –Me sinto tão inútil.
-Vovó. - A chamo angustiada. A senhora me encara com aflição. –Eu quero ir embora daqui. - Os meus olhos a imploraram cheios de lágrimas
-Oh, Liz... - A voz de vovó sai em desespero. Por que ela assim como eu, sabia o que isso significava.
-Eu só quero... só quero respirar sem que doa tanto. - Minha voz sai sofrida.
-Tudo bem. - Vovó me conforta. –Iremos quando você quiser.
-Podemos ir agora mesmo? - Pergunto esperançosa.
-Não minha querida. - Seus olhos me consolam. - Você precisa ganhar alta primeiro.
-Mas quando isso vai acontecer? - Pergunto, fazendo bico.
-Quando for à hora.
-Credo vovó. Isso ajudou muito. - Reclamo emburrada.
Conversamos por mais algum tempo. Logo depois um silêncio assustador reinou. Sei que estou sendo observada pela mulher mais velha. Mas isso não me incomoda. Vovó me conhece tão bem. Fico ali perdida em meus pensamentos. É tão difícil aceitar que não poderei mais tocar. Que minha mão agora é inútil para deslizar com perfeição sobre as teclas de um piano. Como poderei me conectar novamente com mamãe? Como poderei senti-la próxima a mim? Papai disse que eu nunca a mereceria. Será por isso que fui castigada?
Se ele soubesse o estrago que fez em minha alma. Talvez choraria. Talvez por uma única vez se importaria de verdade. Mas isso pra mim não importa. Já não importa muita coisa. Talvez ir pra longe seja o certo. Afinal, ele nunca me quis. E Samantha... Samantha me magoou profundamente. Ela pegou o meu amor e o fez em trapos. Pegou o meu doce sentimento e o transformou em um veneno mortal. Por que senti-lo, é isso. É como respirar e morrer ou mesmo tempo.
Talvez esse seja o nosso destino desde o começo, e apenas estávamos tentando ir contra. Só lamento deixar para trás as outras pessoas. As outras pessoas que me são gentis, aquelas outras que eu passarei a eternidade sentindo saudade. Por que o amor se manifesta de varias maneiras. Ele se manifesta e nos atingi como uma poção de adrenalina. Ele nos respira e nos liberta. É como um amontoado de grandes proporções. É como um tudo tão gratificante que não sentir esse tipo de amor sem forma, é como nunca existir. Por que esse tipo de amor não se constrói por base em uma definição. Esse tipo de amor não precisa ser nomeado. Por que esse tipo de amor nasceu apenas para ser sentido.
E eu sentirei saudade todos os dias. Sentirei saudade das conversas, dos sorrisos, dos olhares e dos pequenos gestos. Sentirei saudade do silêncio cúmplice, da gritaria e da bagunça. Sim, eu sentirei saudade de tudo isso, e daquele pouco que é tão bastante para me faltar. E o que eu levar talvez se torne a saudade daquelas outras pessoas que me são importantes. E também lhe faltem o pouco que eu arrastei para longe. Lhe faltem aquele meu pouco que é tão eu.
Olho novamente para vovó, ela está concentrada em uma revista de moda. Não sei que graça tem esse seu mundo brilhante. Mas eu sei o quanto lhe é importante esse pedacinho de holofote. Pelo que entendi, tive um ataque de pânico. Talvez ser exposta a toda aquela adrenalina não tenha me feito bem. Até quando papai e Samantha me fariam mal? Até quando eles me diminuiriam a pedaços? Dou um suspiro e volto a olhar o teto. Vovó repete o meu ato do suspiro chamando novamente a minha atenção. A senhora coloca a revista sobre o colo e me encara por longos minutos.
-Você tem absoluta certeza que quer mesmo deixa-la? – Vovó me pergunta séria.
-Quem? - Pergunto sem entender alguns minutos depois.
-Samantha. - Vovó diz baixinho como se fosse um segredo.
-Sabe quando apenas amar já não é suficiente? - Pergunto com um nó na garganta.
-Samantha te feriu tão profundamente assim Liz? - Seus olhos estão nublados.
-Ela me feriu tanto vovó, que acho que não consigo mais sentir, não aquele tipo de sentimento bonito sem que esteja maculado. - Minha voz sai embargada. –Eu não consigo olhava sem que meu coração se parta em milhares de pedaços. E eu odeio sentir isso.
-Mas deixa-la não vai diminuir essa dor. - A senhora diz com compaixão. –Não vai amenizar o estrago feito. Só vai deixar saudade.
-Talvez. - Digo pensando por alguns segundos. –Mas talvez a saudade doa mesmo do que está ao lado dela. Talvez não seja tão ruim.
-Esse é o seu primeiro amor, Liz. - Vovó abaixa a cabeça. –E às vezes ele dura para sempre. - Seus olhos acinzentados se aprofundam nos meus. –Às vezes é inútil fugir. Por que ele sempre vai está aqui. - Vovó diz apontando para o peito esquerdo. –E aqui. - E logo depois para a cabeça. –E disso, ninguém foge.
Fim do capítulo
Boa noite! Espero que todas tenham um delicioso final de semana.
Bjusss...
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Pryscylla
Em: 12/05/2018
A Liz só sofre, sera que ela terá um pouco de felicidade? Espero que sim.
Bjus
Resposta do autor:
Também espero!
Não posso deixar a minha linda garota de olhos azuis só se machucando. Mas ela terá que passar por mais algumas coisinhas até o momento em que tudo será resolvido.
Então, Liz terá que sofrer só mais um tantinho assim...
Só não me odeie por isso.
Bjus...
patty-321
Em: 12/05/2018
E liz. Amar dói. Ja sentir isso tb. Mas e melhor do que não sentir. E ela vai pra longe viver outras experiências e veremos como sera a liZ do presente. Parabens pela estória. Excelente. Tb estou me aventurando a escrever, e viciante. Vicio do bem. Bom fds.
Resposta do autor:
Q maravilhoso! Escrever realmente é viciante. É algo que não há palavras o suficiente para descrever. Ali é o seu mundo. Você pode ser e escrever o quiser. Não há regras ou tabu. É apenas você e sua imaginação. Então a use e abuse. rsrsrs...
Beijos linda!
PS: Dizem algumas pessoas que devemos fazer essas três coisas antes de morrer. Plantar uma árvore, escrever um livro e ter um filho.
Então estamos no caminho certo. Rsrsrs...
Eu já plantei mais de uma árvore. Amo escrever. Então já é um passo positivo para segui em frente em questão ao livro.
Já o filho... srsrsrs... Deixo pra próxima.
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preguicella
Em: 11/05/2018
Que peninha da Liz, gente! Tão novinha e com uma carga de sofrimento tão grande. Os amores que tanto magoam! Aff, que ela vai embora correndo e consiga se fortalecer e recuperar um pouco da fé no amor!
Bjão e ótimo final de semana pra vc tb!
Resposta do autor:
Que assim seja.
É uma pena existir esses “amores que magoam”. Por que esse tipo de amor pode transformar uma vida inteira. Pode colocar um ponto final em uma eternidade completa e feliz. Afinal, somos seres ansiosos por sentir...
Bjuss...
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erikarenata
Em: 11/05/2018
Vc está sendo uma ótima autora para a primeira história. Que escrita cativante!!!
espero ansiosamente pelo próximo capítulo
parabens mais uma vez =D
Resposta do autor:
Obrigado!
Espero melhorar cada vez mais. Por que escrever é algo fascinante. E saber que esse meu pequeno universo de palavras cativa outras pessoas, é como respirar...
Afinal, a escrita é como a liberdade.
Bjus...
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