CapÃtulo 19
-- Vocês preferem ficar ai, discutindo o sex* dos anjos? Servi o jantar faz tempo. – repreendeu os dois de forma assustadora, com uma colher de pau na mão.
-- Não Isa, agente “tava” falando mesmo era de luta, “tá ligada”? Mel... – viu a expressão sisuda da morena e completou seu nome – Melissa entende de luta, e dança capoeira. A gente “tava” falando sobre isso. E porque falar de sex* dos anjos deve de ser pecado, né?
-- Tem razão Júnior, deve ser mesmo pecado. – respondeu fingindo inocência. – Ainda mais com a autoridade suprema da casa segurando uma colher de pau de forma assustadora. – beijou o rosto de Isadora – Não é loirinha? – apertou a bunda da namorada que a olhou com malícia. – Quando Isadora sentou ao lado de Melissa, o telefone tocou e Júnior resolveu atender.
-- Isa, Roberta quer falar com você. – chamou inocentemente sem perceber o tamanho da bomba que acabava de entregar nas mãos da amiga.
-- Vai atender Isadora? – a olhou com uma expressão enigmática.
-- Acho que devo isso a ela. – levantou-se e pegou o aparelho. Júnior sentou a mesa e puxou conversa com Melissa que não ouviu nada do que ele falava. – Oi Beta, sim... Claro... Hoje não posso... É uma matéria realmente complicada, ainda mais pelo professor... – ela sorriu enquanto ouvia alguma coisa. Melissa a olhou sorrindo, empolgada com a conversa, levantou-se e saiu da mesa. – Amanhã, sim... Você me pega? Pode ser... Então eu lhe espero... Outro... – Isadora desligou, e ao retornar a mesa, ficou surpresa ao cruzar com Melissa indo para o escritório. As duas se avaliaram, e só então ela observou a expressão fechada da namorada que passou direto para o escritório. Isadora baixou a cabeça por uns instantes, como se buscasse forças ou argumentos que sanassem a fúria de Melissa, e só então a seguiu. Júnior ainda lhe perguntou alguma coisa, e obteve como resposta um aceno para que ele aguardasse.
-- Mel abre aqui. – bateu de leve - Quero falar com você... – pediu segurando a maçaneta da porta – Amor, por favor, vamos conversar... – imaginou que aquela conversa não iria ser fácil, isto se ela cedesse a ponto de ouvi-la. – Melissa, abre já esta porta ou eu... – pensou um pouco no que poderia fazer – ou arrombo. – concluiu com uma voz firme e autoritária, mas que surtiu efeito sobre a morena, fazendo-a abrir. – “Ainda bem que ela abriu como eu iria arrombar essa porta?”.
-- Não quero conversar Isadora. – respondeu após abrir a porta e se afastar.
-- Não quer, mas vai. – fechou a porta após entrar – Melissa, eu não sou nenhuma leviana... – pensou em um termo qualquer para emprega-lo. Mel... – passou a mão pelo rosto da namorada, que rejeitou o carinho, virando-se de lado – Por que todas essas armas? Sabe o quanto lhe amo e mesmo assim tem dúvidas?
-- O que vocês farão amanhã? – perguntou com os braços cruzados, em pé, escorada na mesa do escritório e com sua cabeça baixa.
-- Nós vamos almoçar juntas. Eu... – foi interrompida.
-- ALMOÇAR? Vai almoçar com aquela “fulaninha” que outro dia me empurrou na boate?
-- Melissa, você também provocou. – falou em tom de reconciliação.
-- PROVOQUEI? O QUE MAIS PROVOQUEI ISADORA?
-- Meu coração... Ele foi imensamente provocado e invadido por você, desde os meus treze anos... – acariciou o rosto da mulher amada com os nós dos dedos – Não consigo entender seu ciúme amor. Mel, você foi e sempre será a mulher da minha vida. Eu só quero explicar para Roberta que não tem como continuarmos um namoro... Amo outra pessoa, mas acho que ela sente alguma coisa por mim, e por respeito a isso, devo conversar pessoalmente e explicar que não rola mais... –usou um tom reconciliador e compreensivo, tentando acalmar a fera morena que parecia não amolecer com tais argumentos. – E se fosse o inverso? Você a sair com uma pessoa que está namorando, e depois ela simplesmente desaparece, sem notícias ou satisfação?
-- O que tem isso? Aconteceu comigo. – respondeu com um imenso bico, permanecia de braços cruzados e, encostada a mesa.
-- O que tem? O que tem que não sou eu. – segurou as duas mãos da morena, abrindo seus braços – O que tem amor? Você sabe o quanto sou incapaz de ferir alguém... - beijou uma mão de cada vez - Por favor, eu preciso desse voto de confiança. – envolveu-se nos longos braços de Melissa.
-- Onde marcaram de almoçar? Ela vai lhe pegar em algum local? – deixou que Isadora se envolvesse em seus braços lhe abraçando em seguida.
-- Ela vai me pegar na biblioteca às doze horas e, provavelmente vamos almoçar no bar do Chico.
-- Um pé sujo? Ela quer levar a namorada para comer em um bar pé sujo? Ela realmente quer alguma coisa séria com você. – balançou a cabeça em sinal negativo, observando-a.
-- Por que você tem de ser tão irritantemente esnobe quando quer argumentar alguma coisa? – obteve como resposta um balançar de ombros. As duas ficaram se olhando, olhos verdes vidrados nos azuis, até que Isadora desmanchou o contato puxando a morena para um beijo. – Eu lhe amo tanto sua riquinha esnobe. – disse entre um beijo e outro.
-- Não vem com riquinha esnobe não... Se eu quisesse lutar por uma mulher que digo “gostar” – fez aspas com os dedos – faria de tudo para conseguir um dinheiro, ou desconto maior, nem que lavasse os pratos por uma semana, só para leva-la para comer em um lugar mais digno. Agora um “pf” pé sujo, perto da universidade, e ainda com uma “vitrine” com vários tipos de ovos coloridos, e um cartaz: “não asseitamos fiado”... Não apela Isadora. – fez uma careta.
-- Mel nem todo mundo é rico como você. – argumentou segurando o riso com as observações feitas. – Ela ainda é estudante.
-- Tem razão, mas, lembra-se quando me chamou para almoçar a primeira vez? Lembra onde me levou? Esqueceu que tentei, por diversas vezes, convencê-la ao menos “rachar” a conta? Você não deixava, e até se irritava quando tentava argumentar. – olhou a loirinha – Éramos estudantes de colégio, nossa situação agora é melhor.
-- Tudo bem, você venceu. – começaram a rir com a expressão de vencida de Isadora – Mas agora, eu posso ao menos satisfazê-la com um simples jantar?
-- Sua sorte é que amo as suas panquecas, ainda mais...
-- Ainda mais quando capricho no requeijão. – adiantou-se antes que a morena concluísse.
-- Isso mesmo! – beijou-lhe a ponta do nariz – Vamos lá. – saíram abraçadas, para espanto de Júnior que pensava o pior por causa dos gritos de Melissa. – A propósito, como você iria arrombar a porta? – perguntou com uma expressão zombeteira.
-- Tenho meus métodos, – sorriu – e caso o Junior não funcionasse, tentaria um pé de cabra. – estavam sentando a mesa e o rapaz pode ouvir a conversa.
-- Eu lhe ajudava Isa, derrubaria a porta em um golpe, mas... – pensou um pouco – como você ia colocar o pé da cabra ali? Ia ter coragem de “ampulhar” à perna do coitado do serzinho humano?
-- Isso é uma longa conversa que deixarei para depois do jantar, Ju. – respondeu com um ar de derrota, fazendo Melissa sorrir.
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No outro dia, Melissa acordou mais cedo e preparou um café da manhã especial para sua pequena, que ao perceber a mesa posta com uma rosa no centro, começou a rir.
-- Mel... Isso tudo é para mim?
-- Para a mulher mais linda, deliciosamente gostosa e apetitosa que conheço. – Isadora pulou para os seus braços, envolvendo-a com as pernas pela cintura, e com os braços pelo pescoço, enchendo-a de beijos por todo o rosto, pescoço e lábios. Renderam-se a um beijo mais profundo até Melissa colocá-la no chão e puxar a cadeira para ela sentar. – Minha senhora, sente-se, por favor, que sua escrava irá lhe servir.
-- Adoro tudo isso! – confessou enquanto pegava o copo de suco que lhe foi oferecido.
-- Eu sei, por isso que fiz. – respondeu orgulhosa.
-- Nossa! Esse pão está fresquinho... Mel, você foi à padaria hoje?
-- Acha que serviria pão dormido para você? Por favor, senhora, não sou uma estudante que “sente algo por você”. – fez uma voz de desdém – Eu sou a mulher que lhe ama e espero que seja recíproco o sentimento.
-- Tem dúvidas? – perguntou com a boca cheia.
-- Ouvi um negócio ai sobre pão dormido? – Júnior interrompeu sem se importar se atrapalhava ou não as duas mulheres. – Ele dormiu aonde?
-- No forno, e se fosse você nem abria, porque o pão ainda nem desfez a cama, está tudo lá dentro. – Melissa respondeu com ironia. – E ainda, corre o risco de você ter que arrumar o seu quarto, e o forno. - o rapaz fez uma cara espanto.
-- Melissa Cristina! – Isadora repreendeu, pronunciando Cristina, para provoca-la e disfarçar sua vontade de rir.
-- Pode deixar. - respondeu se sentando a mesa. - Isa me obriga a arrumar e limpar o quarto, e eu não quero isso também no forno. – Melissa, aguardou Júnior terminar de falar, para enfi*r um pão dentro de sua boca, sendo, novamente, repreendida por Isadora.
-- Olha como esse pão está bom.
-- Melissa! - “Parece uma criança aprontando suas travessuras.” – pensou após repreendê-la.
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Os três saíram juntos, mas, Júnior desceu na academia, e deixando as duas sozinhas. Durante o trajeto, Melissa dirigia com total atenção no trânsito, mesmo assim, observava Isadora que permanecia em silêncio, fato raro, ela estranhou.
-- O que há?
-- Estou pensando no que vou falar com Roberta. – respondeu olhando pela janela.
-- Ah não! Novamente essa “breguinha”?
-- Melissa, eu não posso simplesmente chegar para ela e falar: “Olha, estou aqui para terminar o que mal começamos porque estou namorando outra mulher, tchau!”.
-- Por que não? O que ela tem de tão especial assim? E que papo é esse de outra mulher? – observou-a rapidamente – Outra mulher é ela.
-- O fato de gostar de mim, por exemplo. – observou a morena dirigindo com a expressão fechada. – Isso que me faz considera-la, uma questão de respeito.
-- Também gosto, e nem por isso você fica calada pensando o que vai falar para mim. E sempre respeitei as pessoas.
-- Não falei que você faltou com respeito alguém, apenas conclui que devo respeita-la. Nós ainda somos namoradas. – neste momento sentiu uma freada brusca. Melissa havia puxado o carro para o acostamento, parou e encarou Isadora com uma expressão fechada - Nossa situação é bem diferente e você sabe disso. – tentou consertar o que havia falado antes, pela primeira vez ela sentiu Melissa se fechar, havia sempre espaço para brincadeiras entre as duas, até mesmo nas brigas, com exceção, apenas, na noite da boate.
-- Diferente em que? Isadora, eu pensei que você estivesse namorando comigo, mas pelo que observo, estou indo bem depressa.
-- Nos conhecemos há anos Melissa, isso faz com que tudo fique diferente. – passou a mão pelo rosto buscando paciência - Nós já nos conhecemos, e para de pensar que não é minha namorada, estou me irritando.
-- Agora sou a sua namorada novamente? – permanecia olhando-a. – Eu nunca lhe vi pensar, meditar ou coisa parecida para conversar comigo.
-- Melissa, nós somos amigas. – perdeu de vez a paciência - Não vem com essa de saber falar porque passamos esses anos todos gostando uma da outra e não falávamos.
-- Agora somos amigas? Interessante... – ligou o carro e saiu.
-- Arhg! Por que você tem que ser tão metódica, e levar tudo ao pé da letra?
-- Talvez seja porque não estou suportando esse negócio de você dizer que vai almoçar com sua namorada. Ah, tem o detalhe de ir para universidade com a amiga. – respondeu com ironia. Permaneceram alguns minutos em silêncio.
-- Mel, nós somos namoradas, eu só quero que você entenda o meu lado: não consigo... Eu me sinto mal... Não vou magoar ninguém gratuitamente. – declarou pausadamente, e colocou a mão por cima da perna da morena, apertando-a em sinal de cumplicidade.
-- Tudo bem, mas eu quero saber o que você vai falar para ela. – concluiu em um tom sério e seco.
-- Não sei Melissa. Ainda não sei o rumo da conversa e...
-- RUMO? - interrompeu - O que é isso? Por acaso se ela quiser ter um rumo diferente, vai conseguir?
-- Eu não acredito! Não vou responder essa pergunta. – retirou a mão, cruzou os braços e virou o rosto para janela.
-- Isadora essa “inha” está afim de você... Ela vai abrir aquele sorrisão de cadela no cio quando chegar perto...
-- Que palavreado é este Melissa Cristina?
-- Oh como odeio quando me chama assim! – falou com ironia – Não mude de assunto.
-- Esse assunto esgotou meu limite de bobagens... – bufou – que droga! Nem o Júnior consegue me irritar assim.
-- Depois de abrir o sorrisão vai querer um beijo... - continuou sem se importar com o que Isadora falava - E como estarão em local público, e você sendo discreta, ela vai lhe chamar para ir a algum lugar apropriado... Quem sabe o banheiro do pé sujo que é bem a cara dela? – passou a mão pelo rosto - Quando você, finalmente falar em terminar, ela fará aquele drama, deixando-a se sentir o pior dos seres...
-- Melissa... – tentou interromper, mas a morena prosseguiu.
-- Ela vai arrumar algum motivo para ficar com você... “Eu morro sem você, Isadora!” – imitou uma voz estridente.
-- Para Melissa! Está se baseando em você mesma?
-- Isadora, eu conheci vários tipos de pessoas por ai para saber como funciona a mente humana. – foi à vez de Melissa bufar – Armará o maior circo para lhe sensibilizar a ficar com ela... – falou após estacionar o carro - Cuidado para não chamar atenção de todos, em volta, com o dramalhão universitário que ela fará.
-- Oh! Falou a voz da experiência. – foi irônica - Eu sei como você pensa Melissa Cristina. – a morena mal estacionou o carro, a loirinha desceu – Eu sei o que quero e com quem quero, ou seja, por mais absurdos que tenha escutado aqui neste carro hoje, nada mudará o que sinto e penso. Boa aula dona Melissa Cristina.
-- Isadora espera! – pediu em vão, a loirinha desceu sem ao menos se despedir melhor – Droga! Essa garota vai me enlouquecer... – bateu com a cabeça no volante, mas foi interrompida da sua autopunição pelo toque do telefone. – Oi mãe... Lógico, mais do que nunca preciso ficar ocupada no almoço... Sim, depois, beijos.
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-- Que mau humor é esse hoje? Começaram as briguinhas de casal?
-- Não enche Débora. – falou irritada.
-- O casal maravilha que vivia no paraíso saiu em férias? – Isadora a olhou firme.
-- Vou me sentar em outro lugar se continuar.
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Ao meio dia, Isadora se encontrou com Roberta. Quando ela sorriu e tentou uma aproximação maior, Isadora se lembrou de Melissa.
-- Dorinha, vamos a algum lugar mais apropriado...
-- Roberta nós precisamos conversar antes... – estava nervosa. - Também quero almoçar, estou com fome.
-- Poxa, estou louca para lhe beijar, você sumiu. – tentou pegar a mão de Isadora que se afastou um pouco - Quase uma semana... Nem minhas ligações você retornou. Achei um milagre seu amigo lhe chamar e você atender.
-- Eu sei que sumi e... Sabe Roberta, é sobre isso que eu quero conversar – não parava de ouvir a voz da morena lhe indicando os caminhos que a menina faria. - "Oh Melissa! Sempre com suas teorias me tirando do sério" - reclamou para si mesma.
-- Vamos almoçar então. – chegaram ao bar e Roberta pediu dois pratos feitos e um ovo cozido colorido.
“Droga Melissa, por que você tem que ser tão irritantemente coerente?” – não deixava de pensar nas palavras da morena.
-- Quer também um ovo Isadora? – tentou pegar a mão da loirinha que estava sobre a mesa, mas ela percebeu e puxou.
-- Obrigada. Quero conversar.
-- O que tem a me dizer? – perguntou se aproximando do rosto de Isadora. – Eu lhe acho tão linda.
-- Acho que nós duas... Roberta... Acho que nós não ficaremos bem, somos diferentes e... – ela se aproximou mais – Roberta, por favor, estamos em um local público, não quero me expor. – repreendeu.
-- Desculpa! – percebeu a expressão da loirinha – Falou que somos diferentes... Como assim? – perguntou comendo o ovo.
-- Em muitas coisas. A começar por mim mesma... – forçou um sorriso - Sou uma pessoa extremamente difícil de conviver.
-- Não parece, pelo contrário, sempre lhe achei tão meiga e doce. – tentou passar a mão pelo rosto de Isadora, que se esquivou. – Qual é Dorinha, desde que nos encontramos você ainda não me deixou fazer um carinho?
-- Roberta, além de estarmos em público, você está com a mão com cheiro de ovo.
-- Então vamos ao banheiro, e poderemos ter uns minutos, só nosso.
-- Passei a manhã toda em aula, estou com fome, vamos esperar a comida, primeiro.
-- Tudo bem. – limpou as mãos sujas no papel e observou a expressão da loirinha – Dorinha, por que você ainda não saiu da casa daquela sua amiga?
-- Não tenho como sair agora
-- Por quê?
-- Roberta, não está dando mais, acho que não deveríamos ter arriscado assim. – mudou o assunto.
-- Do que está falando minha?
“Ela não é burra, então só pode se fazer de desentendida” – pensou.
-- Não deveríamos ter arriscado assim... Nossa relação foi um erro, eu gosto muito de você como amiga, e acho que forçamos.
-- Você tem outra pessoa Isadora?
Isadora tentou explicar os motivos para o final do relacionamento, mas a garota estava irredutível.
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Enquanto isso, no outro lado da cidade, Melissa era aguardada por sua mãe.
-- Olá mamãe
-- Melissa Cristina, meu amor. – beijaram-se – Minha filha, como você está linda! – Ester constatou, após examiná-la.
“Bem coisa de mãe mesmo” – Melissa pensou com o comentário.
-- Estou do mesmo jeito que me viu semana passada, mamãe.
-- Não acho. – a avaliou e depois a fitou nos olhos - Filha, você está mais leve, suave, mas, tem uma expressãozinha de preocupação neste olhar.
-- Eu? Preocupada? Com que estaria preocupada, mamãe?
-- Isso é o que vou descobrir agora. – olhou firme dentro dos olhos azuis, e ela acabou se rendendo.
-- Tudo bem mãe, sei que não consigo omitir algo por muito tempo de você. – olhou de um lado a outro e prosseguiu – Mãe, o assunto é um pouco delicado... É que a Isadora... Ela mãe... Eu e a Isa... – não sabia como contar – Mãe esta conversa precisa ser assim no seco? – pensou em pedir algo forte para beber.
-- Claro que não minha filha, podemos ir a um parque aquático... – foi irônica e pode perceber o quanto a filha estava embaraçada com a situação. Analisou bem a expressão de Melissa e concluiu o óbvio. – Quando vocês começaram a namorar?
-- Como? O que disse? – Melissa parecia não ter entendido bem a pergunta e quase cuspiu fora o pouco de água que havia acabado de ingerir.
-- Quando você e Isadora se entenderam? – perguntou bebendo um pouco de vinho e observando-a.
-- Co...co...como a sen...senhora sa... sabe?
-- Só um cego para não perceber, Cristina. Eu sou sua mãe, como não perceberia algo assim?
-- Vai ficar com raiva de mim? Pedir para acabar minha relação?
-- Por quê? – pegou as mãos da filha – Porque está feliz? Com esta expressão linda de quem acabou de sair do paraíso? – apertou as mãos da filha, passando-lhe segurança, e então, sorriu. – Eu já havia percebido que vocês se completavam desde que fui chamada naquela escola. Minha filha, preferi que vocês se descobrissem. – estava se divertindo – Imagina se iria perder o desenrolar de todo esse romance dramático de novela. – revirou os olhos e sorriu – Adolescentes adora dramatizar, e vocês resolveram complicar de uma forma... – bebeu mais um pouco de vinho – Olha o tempo que demoraram para se assumiram.
-- Mãe... – deixou duas lágrimas rolarem – Eu lhe amo muito. – beijou as mãos que envolviam as suas. – Papai também sabe?
-- Desconfia, mas não tem a certeza que sempre tive.
-- Será que ele...
-- Não minha filha, seu pai vai entender. Nós só queremos sua felicidade, seja como for. – interrompeu após perceber a preocupação nos olhos azuis. – Sua segurança, sua saúde e sua felicidade são as únicas coisas que nos preocupam.
-- Mãe, eu amo muito vocês... – enxugou uma lágrima – Você, o papai e a Isa, são as pessoas mais importantes da minha vida.
-- Seu avô? Ele não entra neste núcleo? - estranhou, pois a filha sempre fez as vontades do homem que interferia sempre em suas ações.
-- Mamãe, primeiro ele NUNCA vai aceitar minha relação e segundo, eu andei descobrindo algumas coisas...
-- O que?
-- Melhor não saber... Eu tenho medo que papai descubra. – passou a mão pelo rosto.
-- Melissa Cristina, se envolve seu pai, isto me envolve diretamente.
-- Mãe...
-- Melissa Cristina, eu exijo.
-- Tudo bem – respondeu derrotada – Lembra aquela caixa que era da vovó? Aquela grande que tinha umas joias e fotos antigas... – observou a expressão de dúvida de Ester – Mãe, aquela que ficou com papai.
-- Ah! Agora lembro. O que tem aquela caixa?
-- Estou com ela lá no apartamento... Ano passado, estava me sentindo sozinha, porque Isa... – percebeu que iria falar demais – Bem, o importante é que comecei a mexer nela, ver as fotos e achei um fundo falso.
-- Aquela caixa tem fundo falso?
-- Tem... – bebeu um pouco de água – Achei este fundo e levantei. Mãe tinha várias cartas, bem antigas... Comecei a ler, queria conhecer um pouco da história de Cristina, a mulher com quem me pareço. – o garçom as interrompeu, Ester escolheu pelas duas e voltou a olhar para Melissa.
-- E o que tinha escrito?
-- Algumas destas cartas eram escritas por ela... Mãe, tudo o que ouvi a vida toda sobre minha avó era mentira. – Ester parecia não entender – Vovó era uma pessoa triste, solitária... Era infeliz.
-- Ela escreveu isso nas cartas?
-- Ela sempre começava as cartas com a mesma frase: “meu amor eterno”. – olhou a expressão de Ester – Pensei que seria vovô e achei lindo aquilo, mas fui lendo uma a uma. Pelas datas estava lendo de trás para frente, remontei o bolo de papel, abrindo cada uma delas e colocando-as na ordem certa... Quando cheguei ao final, ou seja, nas últimas cartas, percebi que havia outro bolo, só que estas eram endereçadas a vovó e por um homem.
-- Não era seu avô? – Melissa fez um sinal negativo com a cabeça.
-- Era o avô de Isadora, Eliezer Marcondes.
-- Como? Você quer dizer que o avô de Isadora conheceu Cristina?
-- Mãe, eles estavam apaixonados, amavam-se e pretendiam se casar. Por algum motivo que não entendi qual, o vô Eliezer precisou viajar, e neste meio tempo vovô surgiu e começou a investir em uma relação com Cristina. Ela sempre se esquivou, e depois de muito insistir e não conseguir nada... – limpou o rosto e respirou fundo - Ele apareceu um dia na casa dela, aproveitando que seus pais haviam saído com os dois irmãos... Mamãe, vovô a violentou, forçou a vovó a manter relações com ele.
-- O que? – bebeu um longo gole de vinho – Cristina tem isso nas cartas? – Ester estava de boca aberta.
-- Tem. Ela escrevia para este “tal amor”, só depois de colocar as cartas na ordem cronológica entendi que era o vô Eliezer. Estas cartas não foram enviadas, mas vi o quanto ela sofreu durante o curto espaço de tempo que viveu com meu avô.
-- Cris... – engoliu seco – Seu pai?
-- Sim mamãe, ela engravidou. Sofreu muito. Não havia um dia que não chorasse, e, os pais dela achavam que havia se entregado a José de Alcântara espontaneamente.
-- Eles a forçaram a casar. – concluiu com tristeza.
-- Sim, forçaram o casamento. A partir desse dia, ela foi morrendo... – olhou para algum ponto da mesa – Mãe, à medida que papai se desenvolvia, vovó morria.
-- Cristina, você sabe o que isso significa?
-- Que vovô é um cafajeste sem escrúpulos.
-- Não... Quer dizer isso também... – estava confusa, era muita informação – Seu pai foi gerado em um ato covarde, ele não foi desejado.
-- Ela expressou que o bebê não tinha culpa, que deveria amá-lo incondicionalmente, mas ele seria para sempre o motivo de sua separação de Eliezer.
-- Meu Deus Cristina! Seu pai não imagina nada disso, pensa que foi gerado com muito amor.
-- Na última carta, inacabada, ela diz que está próximo à hora do parto... Ela sentia, e sabia que não conseguiria suportar tamanha infelicidade. – suspirou – O resto nós sabemos.
-- Aquele monstro asqueroso! Fez de tudo para me separar do seu pai quando nos conhecemos. Ele chegou a oferecer dinheiro ao meu pai para me mandar morar em outra cidade, mas nós vencemos e hoje estamos juntos e felizes. – desabafou irritada, e não percebeu o que acabava de falar para filha.
-- Espera mãe, você sabia que ele tinha feito isso? Papai sabia e vocês sempre aceitaram a presença dele na boa?
-- Não filha. – apertou a mão da morena - Seu pai não sabe de nada.
-- Como?
-- Meu pai aceitou ajuda financeira. Seu avô, sendo a raposa velha que é, vendo que não conseguiria nos separar, aceitou tudo de “bom grado”, e para seu pai não descobrir, forçou meu silêncio ou ele contestaria as promissórias, e cobraria o empréstimo.
-- Sempre achei você distante dele, mas pensei que fosse normal... – deu de ombros – Ele é assim com todo mundo.
-- Filha, eu nunca me senti bem naquela casa com ele por perto. – apertou a mão da morena - Por isso insisti para seu pai vir morar aqui quando você nasceu, usei como desculpa o fato de termos mais recursos, inclusive médico. Usei outros argumentos, mas acho que esse foi o principal. – lembrou-se da época – Pedi para Daniel ser discreto, e não comentar nada com ninguém, inclusive ele. Argumentei que era um homem só, poderia ficar triste com a nossa decisão.
-- Um homem que admirei a vida toda, e depois que entro na universidade, no curso que ele me instigou a vida inteira a fazer... – sentiu uma imensa tristeza – Descubro o belo canalha que é. – falou com pesar.
-- Filha, você ficou assim, imagina quando seu pai descobrir?
-- Mamãe será que ele vai um dia saber?
-- Cristina, esta é uma pergunta que me faço há anos. – observou a forma como a filha olhava para o vazio – Meu amor preciso explicar o motivo que pedi para você vir almoçar comigo.
-- Pensei que fosse apenas pelos meus lindos olhos. – sorriu.
-- Também, ainda mais quando sou uma das responsáveis por esta belíssima mulher. – entrou na brincadeira – Meu amor, aquele jovem que você namorou quando começou a faculdade... Aquele com cavanhaque...
-- Joaquim?
-- Sim. Ele esteve em nossa casa ontem para conversar com seu pai, mas não o encontrou.
-- O que ele queria?
-- Pedir sua mão.
-- O QUE? – gritou se esquecendo de onde estava e sentiu a mão de sua mãe apertando-a – Desculpe!
-- Tudo bem. – sorriu – Ele não viu seu pai, mas...
-- No mínimo deu de cara com o senhor José de Alcântara que deve ter escutado o tilintar das máquinas registradoras. – falou com ironia.
-- Isso mesmo. Sei que é horrível o que fiz, mas quando ouvi seu avô falar seu nome, minha curiosidade foi imensa e acabei me escondendo para escutar.
-- Uma boa causa mãe, “Papai do Céu” lhe perdoa. - constatou em tom de brincadeira e foi repreendida por Ester, também em tom de brincadeira.
-- Melissa Cristina!
-- Mãe pode esquecer um pouco esse nome por pelo menos um século? Ou só Melissa ou só Cristina.
-- Também acho feio, mas fazer o que? Seu pai aceitou a sugestão do seu avô em colocar Cristina... – fez uma careta e prosseguiu – Ele vai lhe procurar e convidá-la para jantar, sair, essas coisas. Seu avô vai favorecer situações onde vocês se encontrem por “acaso”, e ainda vai lhe aconselhar a sair com o jovem rapaz. - estava sendo irônica.
-- Ou seja, ele vai me oferecer de bandeja.
-- Meu bem vou aguardar seu pai retornar e conversar com ele. Não permitirei que este cafajeste interfira na sua felicidade, como quis fazer comigo e Daniel, e como fez com sua avó.
-- Teremos de agir com calma. Não quero que meu pai sofra por alguém que não vale nada.
-- E eu quero que você se abra com Isadora, conte a ela as tramoias do seu avô antes que...
-- Não posso – interrompeu.
-- Como não pode?
-- Mãe, o pai de Isadora é da mesma raça do senhor José, ela já sofreu muito por isso. Tenho medo que ela descubra quem meu avô realmente é... Não sei explicar, mas tenho muito medo que ela imagine que sou igual.
-- Ela nunca pensaria isso de você. – acariciou o rosto da filha – Ela lhe ama, e sabe quem realmente é. Conte ao menos a parte de Joaquim, ele pode aparecer na sua casa ou na universidade e Isa perceber, o real interesse por trás da presença indesejável?
-- Ela conheceu Joaquim. – fez uma expressão de preocupação – E lançou a sentença de morte para nossa amizade.
-- Cristina, ele é tudo, menos seu amigo.
-- Por que diz isso?
-- Ele foi conversar com seu pai e aproveitou para falar com seu avô, o certo seria conversar com você. – Melissa ao ouvir o argumento da mãe ficou pensativa, e concordou que o melhor mesmo seria contar esta história para sua namorada. As duas ainda conversaram por mais duas horas, o que ocupou a cabeça da morena.
Fim do capítulo
Bom final de semana a todas!
Comentar este capítulo:
Lili
Em: 12/06/2017
Caraca agora o bagulho ficou tenso, Isa já sabe deste da adolescência, como realmente é o avô de Mel.
Agora vem o pilantra do Joaquim se meter, pra se dar bem em cima da mel.
Que raiva do avô e desse Joaquim.
Resposta do autor:
Juntou o avô da Mel e Joaquim, não dá um! ELe é mau carater e o outro não tem caráter, ética, nada. Vamos esperar que elas continuem conversando, sempre. Beijos e boa semana.
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NeyK
Em: 11/06/2017
A Mel cantou a pedra direitinho kkkkkkkk o avô da Mel é um belo FDP. eu nem vou comentar essa falta de comunicação, sempre da merda.
Resposta do autor:
Mel já conhece bem mais a natureza das pessoas, diferente de Isa. Aguarde mais aventuras... Beijos e boa semana
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ik felix
Em: 11/06/2017
Querida Rafa,
Não sei pra que essa frescura de ficar cheia de dedos para terminar esse "namoro" com a Roberta. E mais essa agora desse Joaquim.
Cara elas precisam conversar e sem esconder nada, do contrário vai dar merda e com certeza deve ser o motivo que levou elas se afastarem. Abraço.
IK.
Resposta do autor:
Ik, a Isadora é uma pessoa muito "certinha", cheia de moral e ética, essa coisa de "se encher de dedos", porque ela não queria magoar a garota, respeitar o sentimento da outra, mas, quando entendeu que Roberta estava dramatizando, perdeu a paciência. Ela conversarão, espere.. Beijos
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Mille
Em: 11/06/2017
Bom dia Rafa
Mel descobrindo os podres do avô e tem que ter bastante cuidado nesse "amigo" Joaquim e José é capaz de tudo para ter mais poder e sem pensar no bem estar de quem quer que seja.
Mel falou tudo que iria acontecer na conversa com a Roberta.
Bjus e até o próximo
Resposta do autor:
O avô della já sabe: não tem nenhum carater, mas esse Joaquim... Para que veio, né? Vamos aguardar. Beijos
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